Acórdão nº 1135/09.0TVLSB.L3.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelNUNO PINTO OLIVEIRA
Data da Resolução12 de Novembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO 1.

Equilog — Equipamentos e Tecnologias de Comunicação, Lda., com sede no Segundo Complexo Industrial , , , em , , em , freguesia de , concelho de …, instaurou acção declarativa de condenação, com processo ordinário contra: I. — AA, casado, …, residente na …, n" …, …; II. — BB, casado, residente na Rua …, n…, …, …, …; e III. — CC, solteiro, maior, residente na Rua de …, nº …, …, …, pedindo a condenação dos Réus no pagamento de: a) € 53.765,55, acrescidos de juros vencidos no valor de 42.824,75; b) Juros vincendos até integral cumprimento do montante em dívida; c) Custas judiciais, procuradoria condigna e demais encargos com o processo.

2.

Os Réus contestaram, defendendo-se por impugnação e por excepção.

3.

Os Réus AA e BB deduziram as excepções de caso julgado e de ilegitimidade.

4.

A Autora Equilog — Equipamentos e Tecnologias de Comunicação, Lda., replicou; deduziu oposição às excepções e deduziu o incidente de chamamento da Citronic, Lda.

5.

Admitido o chamamento, a Citronic foi citada, na pessoa do seu administrador de insolvência.

6.

O Tribunal de 1.ª instância proferiu sentença, em que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência:

  1. Condenou os réus AA, BB e CC a pagar à autora Equilog — Equipamentos e Tecnologias de Comunicação, Lda. a quantia de €53.765,44 (cinquenta e três mil, setecentos e sessenta e cinco euros e quarenta e quatro cêntimos), acrescida de juros, à taxa legal, vencidos desde a citação e vincendos até efectivo e integral pagamento; B) Absolveu os Réus do demais peticionado pela autora.

7.

Inconformados, os Réus interpuseram recurso de apelação.

8.

O Réu BB finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. Entre o facto gerador do crédito que a Autora se arroga e o momento em que ocorreu a "conduta ilícita dos Réus" decorrem 5 anos, sendo que ao longo desses anos os sócios da sociedade ISG (a devedora) não foram os mesmos.

  1. Condenou o tribunal a quo os RR como sócios e gerentes da sociedade devedora ao pagamento integral do crédito da Autora.

  2. No caso em apreço o está em causa uma responsabilidade directa dos sócios nos termos e para os efeitos do art. 78 n.° 1 do CSC, que é uma responsabilidade de carácter delitual, não havendo presunção da culpa a que se refere o art. 72 do CSC (aliás o n.° 5 do art. 78 remete especificamente para as disposições dos n.° s 3 a 6 do art. 72, e não o n.° 1 do art. 72 do CSC) pelo que o ónus da prova desta responsabilidade segue a regra geral da responsabilidade extracontratual (art. 487 do Cód. Civil).

  3. Considerou o tribunal a quo que a conduta dos RR aquando da celebração da escritura de dissolução é o facto gerador de responsabilidade - “(...), no que respeita à invocação do acto conducente à dissolução da sociedade ISG a realidade comporta diverso figurino.” 5. O tribunal a quo não deu como provado que " O crédito da A. para com a sociedade ISG era respeitante a facturas dos anos 2000 a 2001". Os meios de prova que impõem esta resposta documentos juntos à pi como doc. n.° 4 a 10, documento a fls. 97-08 dos presentes autos, documento a fls. 103 a 106 dos presentes autos, os depoimentos das testemunhas DD e EE, que se deixaram transcritos a fls- 12 e 13 do presente articulado e que aqui se dão como reproduzidos.

  4. O tribunal deu como não provado que "z) E que, aquando da escritura de dissolução o informaram que a ISG era uma sociedade sem actividade, sem qualquer tipo de património e sem qualquer dívida a qualquer entidade externa (38)." E devia dar como provado que "Aquando da escritura de dissolução a ISG era uma sociedade sem actividade e sem rendimentos” Os meios de prova que impõem esta resposta são: o documento a fls- 341 a 350 dos presentes autos, os factos que deu como provados em 20) e 21), o depoimento da testemunha DD que se deixou transcrito a fls- 16 e 17 do presente articulado e que aqui se dá como reproduzido.

  5. O tribunal a quo deu como provado que "38) Com essa actuação os réus impossibilitaram a autora de ver ressarcido o seu crédito reconhecido na acção declarativa e objecto da acção executiva (8)." e devia ter dado como não provado.

    Os meios de prova que impõem esta resposta são os depoimentos das testemunhas DD e EE (ambos a contrario sensu), que se deixaram transcritos a fls- 24 a 27 do presente articulado e que aqui se dão como reproduzidos 8. O tribunal a quo deu como provado que "42) Os réus, ao fazerem aquela declaração de 31) e ao não apresentaram a ISG à insolvência, fizeram-no de forma consciente e deliberada, sabendo que esse comportamento prejudicava os créditos da autora". E devia ter dado como não provado.

    Os meios de prova que impõem essa resposta testemunhas DD e EE (ambos a contrario sensu), que se deixaram transcritos a fls- 27 a 30 do presente articulado e que aqui se dão como reproduzidos 9. O tribunal a quo deu como provado que " 50) No balanço da ISG, Lda de 31.12.2005 consta no activo a seguinte menção: "Imobilizações corpóreas: (: (...) Equipamento administrativo AB € 8.575,71 (...); Depósitos bancários e caixa: Depósitos bancários (...); Depósitos bancários e caixa: Depósitos bancários AB € 431,05 (...) Caixa AB € 136,41 (...) ( fls 351 e 352)".e devia ter dado como provado que "No balanço da ISG, Lda de 31.12.2005 consta no activo a seguinte menção: "Imobilizações corpóreas: (...) Equipamento administrativo AL €96,78 (...); Depósitos bancários e caixa: Depósitos bancários AL € 431,05 (...) Caixa AL € 136,41 (...)" ( fls 343)” Os meios de prova que impõem esta resposta são os documentos juntos a fls. 343,351 e 352 dos presentes autos.

  6. Alicerçou o tribunal a quo a responsabilidade dos RR no disposto no art. 78 do CSC, considerando que "o acto conducente à dissolução da sociedade ISG" configura uma conduta ilícita violadora de disposições que se destinam a proteger os credores sociais.

  7. Enunciou da seguinte forma o preenchimento dos requisitos da responsabilidade: A - Conduta ilícita: ao "apresentarem-se" em 2/3/2006 sem qualquer documento comprovativo das contas da sociedade, declarando que" a ISG não tinha qualquer activo ou passivo tendo as ultimas contas aprovadas em 31/3/2005", indicaram falsamente que os direitos dos credores estavam satisfeitos ou acautelados, violando assim as disposições dos arts. 154, 158, 149, 152 e 70, todos do CSC, executando uma dissolução sem critérios objectivos; B - Resultado danoso: à data da dissolução o património social - activo liquido disponível - era insuficiente para a (integral) satisfação dos créditos da Autora C - Nexo de causalidade: sem a declaração fiel do passivo existente impossibilitou a satisfação de tal crédito, pois a sociedade tinha bens sociais que não vieram satisfazer o passivo existente.

  8. Concluindo o tribunal a quo pela responsabilização pessoal dos RR pelo pagamento integral do dano da autora que se consubstancia no valor total do crédito que detinha para com a sociedade ISG 13. O tribunal a quo fez má interpretação do artigo 78 do CSC, a responsabilidade perante credores e outros terceiros (sócios, trabalhadores, clientes) era, foi e será sempre uma responsabilidade condicionada, requerendo factores especiais.

  9. O objecto da previsão do artigo 78.° é o modo como o gerente ou administrador gere ou administra a sociedade, mas a sua responsabilidade surge quando, por na sua administração não ter observado alguma disposição legal ou contratual destinada à protecção dos credores, a sua actuação tem como consequência que o património social se tenha tornado insuficiente para satisfazer os respectivos créditos.

  10. Ora nada disso se ajusta à situação dos autos. Nesta, não está em causa a actuação do gerente no exercício da administração da sociedade, está em causa a decisão dos sócios de dissolver a sociedade e de operar a sua extinção sem liquidação com a alegação falsa da inexistência de passivo.

  11. Mas mesmo que se considere que os RR violaram as disposições elencadas pelo tribunal a quo, a sua conduta não tem qualquer influência sobre a solvabilidade da sociedade ISG nem sobre o pagamento ou não pagamento do crédito da A.

  12. A conduta dos RR - apresentarem-se sem qualquer documento de prestação de contas à data da dissolução - não causou qualquer dano para com a sociedade no sentido de diminuição do seu património social ao ponto de este se revelar insuficiente para a satisfação dos respectivos créditos — O valor do passivo da sociedade ISG diminuiu ao longo dos anos 2001 a 2005 — A solvabilidade da ISG era precária aquando da emissão da facturação originadora do crédito da A.(2001) — Não ocorreram danos para a sociedade ISG pela omissão dos RR .

  13. A responsabilidade só surge se da prática ou omissão dos administradores/gerentes tivesse advindo danos que atingissem o património social da sociedade, no sentido do património social se ter tornado insuficiente para a satisfação dos respectivos créditos; tem de haver um dano patrimonial para a sociedade - facto do qual não qualquer alegação nos autos ou comprovação.

  14. Não está alegado que existisse património social e este se tivesse tornado insuficiente para satisfazer os créditos da sociedade, ainda que obviamente a menção de que a liquidação da sociedade foi feita com a declaração dos sócios de não existir passivo a satisfazer nem activo a repartir entre eles tenha implícita a afirmação da inexistência de activos da sociedade que possam responder pelo crédito da autora.

  15. Só que para fazer actuar a responsabilidade do artigo 78.° era necessário mais, era necessário estabelecer uma relação de causa-efeito entre a actuação ilícita e a situação de insuficiência do património, a qual não decorre daquela decisão e declaração dos sócios porque essa insuficiência era preexistente.

  16. No campo de aplicação do artigo 483.° do Código Civil e atento o caso, para se poder afirmar a existência de um nexo de causalidade entre a decisão dos sócios de dissolverem a sociedade e a declararem de imediato liquidada por...

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