Acórdão nº 51/18.9T8BGC-A.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelRICARDO COSTA
Data da Resolução10 de Novembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 51/18.9T8BGC-A.G1.S1 Revista – Tribunal recorrido: Relação de Guimarães, 2.ª Secção Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1.

Os Executados “Pereira & Rocha, Lda.”, AA e BB deduziram Oposição mediante Embargos à Execução Comum para pagamento de quantia certa que lhes moveram os Exequentes CC, DD e EE, autuada por apenso a processo de execução, tendo em vista julgar totalmente procedente a Oposição, invocando a excepção de inexequibilidade do título executivo com absolvição da instância, a excepção de prescrição, com absolvição do pedido dos Oponentes, as excepções inominadas de nulidade da fiança ou do benefício da excussão prévia, igualmente com absolvição do pedido, e, por fim, a improcedência da execução por injustificada e ilegítima, com a mesma absolvição do pedido dos Oponentes, tudo em relação a promessa de arrendamento para fins comerciais em que os Exequentes são herdeiros do senhorio originário. Justificaram o primeiro fundamento da oposição no facto de, sendo o título dado à execução composto por um contrato-promessa de arrendamento acompanhado de uma notificação judicial avulsa, este não preencher os requisitos exigidos pelo art. 14.º-A do NRAU, aprovado pela Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro.

Os Exequentes apresentaram Contestação aos Embargados alegando a improcedência das excepções, pugnando pela prossecução do processo de execução, condenando os Executados/Oponentes nos valores peticionados.

Foi dispensada a realização de audiência prévia (fls. 27).

Foi proferido despacho saneador pelo Juiz 1 do Juízo de Execução de Guimarães no Tribunal Judicial da Comarca da ...

(fls. 27 e ss), em 25/9/2018, no qual, conhecendo-se da excepção de “inexistência de título executivo”, se decidiu: “julgar os presentes embargos de executado procedentes (procedência da exceção de inexistência de título executivo) e, em consequência, determino a extinção da execução apensa”.

2.

Inconformados, os Embargados/Exequentes interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães (TRG), visando a revogação da decisão proferida e a sua substituição por outra que ordene o prosseguimento da execução (fls. 30 e ss).

Contra-alegaram os Executados-Embargantes propugnando a manutenção do decidido. O TRG proferiu acórdão em 31/10/2019, identificando como questão decidenda: “saber se um contrato-promessa de arrendamento comercial, que foi celebrado em 05/03/1999, pode ser havido como contrato de arrendamento, constituindo o título executivo criado pelo art. 14.º-A do NRAU (aprovado pela Lei n.º 6/2006 de 27 de Fevereiro)”. Decidiu “julgar agora improcedente a excepção peremptória de inexistência do título, determinando-se o prosseguimento dos presentes embargos para conhecimento dos outros fundamentos de oposição à execução invocados”.

  1. Agora demonstrando o seu inconformismo, os Executados-Embargantes interpuseram recurso de revista para o STJ, tendo por base os arts. 671º, 1, e 674º, 1, a), do CPC, visando a revogação do acórdão recorrido e substituindo-se por outro que julgue procedente a excepção de inexistência ou inexequibilidade do título dado à execução.

    No final das respectivas alegações, foram apresentadas as seguintes Conclusões: “1ª- Independentemente do respeito que a mesma lhe merece, não pode o Recorrente conformar-se com o douto Acórdão proferido pelo Ex.mo Tribunal a quo, pois entende o Recorrente que, na mui douta decisão recorrida, não foram aplicadas nem interpretadas adequadamente, entre outras, as normas legais que disciplinam os títulos que podem servir de base à execução no caso de resolução de contrato de arrendamento com fundamento em falta de pagamento de rendas e o abuso do direito; 2ª- Deste modo, no presente recurso está agora, essencialmente, em causa saber se: a)- O comprovativo da notificação judicial avulsa acompanhada por contrato promessa de arrendamento para fins não habitacionais em apreço nos autos pode e deve ser considerado como título executivo; b)- Consiste em venire contra factum proprium por parte dos Recorrentes a invocação, nos autos, da nulidade da falta de outorga do contrato definitivo por escritura pública para efeitos de arguição da inexistência do título executivo; 3ª- Sendo que, na esteira da sentença proferida pelo Ex.mo Tribunal de 1.ª Instância, a qual, a qual se subscreve na parte em que conclui pela inexistência do título executivo, que se passa a transcrever: “E não existindo um ‘contrato de arrendamento’ válido – o documento apresentado à execução nunca pode integrar a denominação de ‘contrato de arrendamento’ vertida no citado artigo 15º do NRAU –, impõe-se concluir que esta argumentação dos embargantes merece vencimento”; 4ª- Com efeito, os títulos aos quais a lei confere força executiva estão taxativamente identificados no artigo 703º do CPC, por via do qual, designadamente pela sua alínea d), se admite que sirvam de base à execução os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva; 5ª- Por sua vez, determina o artigo 14º-A do NRAU que um contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário; 6ª- Tal como é reconhecido pelas diversas instâncias judiciais, estamos perante de um “título executivo complexo (…) composto por dois elementos, o contrato de arrendamento e comprovativo de comunicação ao arrendatário”, sendo que apenas se pode concluir, como lucidamente fez o mui douto Tribunal de 1ª Instância, que “faltando um deles, ou ambos, não haverá título executivo”; 7ª- Acontece, porém, que, no caso em apreço e vertido nos autos, sendo o título dado à execução composto por contrato promessa de arrendamento acompanhado por notificação judicial avulsa, inexiste o primeiro elemento supracitado e, em consequência, título executivo; 8ª- Não obstante alguma jurisprudência ter vindo a aceitar a convolação de contratos de promessa de arrendamento em efetivos e vigentes contratos de arrendamento, quando haja ocupação imediata do putativo arrendatário sobre o imóvel, no caso em apreço nos autos não pode existir a referida convolação; 9ª- Na verdade, o supra referido entendimento, designadamente nos arestos citados pela própria Recorrida em sede de apelação, sustentam-se no facto de os contratos promessa de arrendamento assumirem a forma legalmente prescrita para o contrato de arrendamento prometido.

    10ª- Como os Recorridos bem sabem e não podem ignorar (até porque a respetiva forma é imputável ao senhorio), na data dos factos em apreço nos autos, ou seja, na data da celebração do dito contrato promessa, os contratos de arrendamento para comércio ou indústria, por via do artigo 7º do RAU, na redação em vigor naquela data, deviam necessariamente serem outorgados mediante escritura pública; 11ª- Sendo que a descrita inobservância da forma legal por parte da Recorrida no invocado contrato de arrendamento determina a sua nulidade; 12ª- Ora, tratando-se de um hipotético contrato de arrendamento, a respetiva nulidade, decorrente da inobservância da forma legalmente prescrita, determina a impossibilidade de se convolar o referido contrato promessa de arrendamento num verdadeiro contrato de arrendamento; 13ª- Não obstante, na opinião do Ex.mo Tribunal recorrido se sustentar a outorga, no caso vertidos nos autos, de um verdadeiro contrato de arrendamento, uma vez que alegadamente se verificam “todas as cláusulas típicas do contrato de arrendamento”, na data da sua outorga, o referido “contrato de arrendamento” não assumiu a forma legalmente prescrita para o efeito, ou seja, a escritura pública; 14ª- O que não sucedeu, como do referido contrato promessa resulta, designadamente da “alínea A” do contrato promessa em crise atenta a impossibilidade diretamente imputável ao promitente senhorio decorrente da falta de registo da propriedade a seu favor e da inexistência de licença de ocupação devidamente atualizada; 15ª- E não pela alegada falta de exigência por parte dos Recorrentes da outorga da competente escritura pública; 16ª- Não sendo possível compreender, atenta a falta de dados existentes nos autos, como pode concluiu o Venerando Tribunal a quo, como “assente que nem o «senhorio» nem os ora Apelados/Embargante algumas vez exigiram à contraparte a celebração da escritura”; 17ª- Assim sendo, como respeitosamente se entende ser e tal como resulta da mui douta sentença recorrida, a nulidade do hipotético contrato de arrendamento determina a invocada e declarada inexistência do primeiro elemento previsto no artigos 14º-A e 15º, Nº 2, ambos do NRAU, e, em consequência, a inexistência, nos autos, de título executivo, 18ª- Pois, não existindo um “contrato de arrendamento” legalmente válido, os documentos apresentados nos autos – contrato promessa de arrendamento e notificação judicial avulsa – nunca poderão servir de base à pretendida, mas ilegítima, execução, nos termos do disposto nos artigos 703º do CPC e 14º-A e 15º do NRAU; 19ª- Caso assim se não entenda, o que se não concede e por mera hipótese se acautela, no caso vertido nos autos não estamos perante um verdadeiro contrato de arrendamento, mas um contrato promessa de arrendamento, nos termos em que foram celebrados e declarados no documento junto aos autos pela Recorrida; 20ª- Inexistindo qualquer elemento nos autos que possa permitir ao Julgador, a quo ou ad quem, interpretar as declarações vertidas no contrato promessa em crise nos autos e, dessa forma, proceder à sua convolação em contrato de arrendamento; 21ª- Sendo que, a referida convolação por parte do Venerando tribunal Recorrido é verdadeiramente contra legem, uma vez que, tendo efeitos retroativos à data da sua celebração, não pode converter a forma de documento particular para a exigida redução a escrito por via de escritura pública como exigido pelo artigo 7º do RAU...

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