Acórdão nº 00749/10.9BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalh
Data da Resolução13 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO M.

, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, datada de 23 de janeiro de 2018, que julgou totalmente improcedente a sua pretensão (que apresentou a final da sua Petição inicial, nos seguintes termos: “… ser julgada provada e procedente, e por via disso ser o acto administrativo […] que aplicou a pena de demissão à Autora e obrigação de reposição da quantia de €897,80: A) Declarado nulo por omissão de diligência essencial para a descoberta da verdade. Ou quando assim não se entenda B) Invalidar-se ser o mesmo anulável por vício de violação de lei com as legais consequências.

[…]”), tendo consequentemente mantido o acto do Secretário de Estado Adjunto e da Educação, que lhe aplicou a pena disciplinar de demissão e a reposição da quantia de €897,80.

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 255 a 268 dos autos em suporte físico], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES: 1ª Da sentença recorrida consta como provado a matéria dos pontos 1 a 24 da “Fundamentação de facto” e que, por brevidade e economia processual se dão aqui como reproduzidos na íntegra.

  1. A recorrente pelos mesmos factos foi alvo de um processo crime que correu termos sob o nº 38/10.0TAPFR do Tribunal Judicial da Comarca de Paços de Ferreira (e não de Paredes como erradamente é referido na sentença recorrida).

  2. Neste processo foi proferida sentença que absolveu a aqui recorrente da prática do crime de peculato, tendo a decisão transitado em julgado em 03/09/2012.

  3. Apesar do procedimento disciplinar e procedimento criminal serem inteiramente independentes já que visam objetivos diferentes.

  4. Não se pode ignorar e é entendimento da doutrina e da jurisprudência que apesar da apontada autonomia, a decisão disciplinar, não pode deixar de atender aos factos que a decisão penal transitada julgou provados e que são também objeto de apreciação no processo disciplinar.

  5. Ou seja se uma sentença penal absolutória, só por si não é necessariamente elemento bastante para determinar a sanção disciplinar, se ainda não estiver aplicada, nem a fortiori, para permitir o deferimento do pedido de revisão se a sanção já tiver sido proferida; 7ª Já não será assim, “funcionando então como a circunstância ou meio de prova suscetível de demonstrar a inexistência dos factos que determinaram a condenação e que não pode ser utilizada pelo arguido no processo disciplinar” a que alude o artº 78º do E.D., “se a sentença penal absolutória que serve de fundamento ao pedido de revisão tiver dado como provados factos que eliminem ou destruam inquestionavelmente a prova produzida no processo disciplinar.” (vid. Ac. STA de 21-04-2005 disponível em http://www.dgsi.pt).

  6. Como é referido, por Paulo Veiga e Moura in Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública, Anotado, Coimbra Editora, pág. 79, “...perante uma decisão penal absolutória a dar por assente que o acusado não praticara os factos, já vimos que em sede disciplinar tal decisão penal tem de ser respeitada pela Administração, que não pode nem fazer prova sobre tais factos nem dar por provados os factos contrários. Contudo, na hipótese de antes da sentença penal absolutória a Administração ter aplicado uma pena ao trabalhador e de estar a decorrer na jurisdição administrativa a respetiva acção especial de impugnação, então quando transitar em julgado a sentença penal o Tribunal Administrativo está vinculado a respeitar a presunção legal da inexistência dos factos em que se baseou a punição disciplinar (a qual aliás, já decorria do princípio da presunção da inocência).

  7. O que manifestamente é o caso objeto do recurso! 10ª Analisando o teor da sentença penal e cuja certidão se encontra a fls. 194 a 210 dos presentes autos, nela é dado como provado desde logo que a Recorrente entre os dias 22 a 24 Julho de 2009 se encontrava-se formalmente em gozo de férias, tendo-se deslocado às instalações da Escola Secundária de (...), por conveniência de serviço.

  8. Quanto a esta matéria foi necessária produzir-se prova em sede de audiência de julgamento em sede penal para se esclarecer que a aqui recorrente apesar ter solicitado inicialmente férias para o período de 29 de Junho a 17 de Julho de 2009, de acordo com o mapa de férias a mesma havia apresentado um requerimento datado de 26/6/2009 em que solicitou ao Diretor da Escola uma alteração do seu período de férias para 29 de Junho a 3 de Julho e de 22 de Julho a 05 de Agosto.

  9. O referido requerimento foi deferido por despacho do Diretor da Escola de 26/6/2009, conforme documento junto a fls. 196 dos autos, o que está em perfeita consonância com o mapa de férias autorizadas, junto a fls. 19 do Volume 7, assinado pelo Diretor da Escola, com a folha de presenças constante de fls. 20 a 21 do referido Volume 7 e com a versão dos factos apresentada pela arguida de que alterou as suas férias a pedido do Diretor da Escola, por conveniência de serviço.

  10. Em sede disciplinar tal factualidade, estranhamente foi omitida! 14ª Ficou também provado em sede penal que a aqui recorrente, durante os dias 6 a 24 Julho de 2009, ajudou a efetuar as matrículas para o ano letivo de 2009/2010, tendo recebido as quantias entregues pelos respetivos encarregados de educação/alunos relativas a 515 matrículas, no valor global de 3.668,46 € e entregou nos cofres da Escola Secundária, pelo menos, a quantia de € 2.843,61.

  11. Esta factualidade está em nítida desconformidade com o apurado no procedimento disciplinar, já que no Relatório Final é dado como provado que a arguida efetuou 438 matriculas e recebeu e registou nos cofres da escola a quantia de 2. 829,24.

  12. No processo crime foi dado como provado, por sentença já transitada em julgado, que a quantia de € 824,85 (sendo €409,50 entregues para pagamento de seguro escolar) e ( € 415,35 € a pagamento de matrículas relativos a 91 alunos) não foi encontrada nos cofres da Escola Secundária.

  13. No procedimento disciplinar foi dado como provado, que a quantia de € 897,80 (sendo € 436,50 do seguro escolar/OGE) e 447,80 de outras rubricas e acrescido de € 13,50 (5 folhas não lançadas pela recorrente) foi recebida pela recorrente e não entregue por esta nos cofres da escola.

  14. Ficou provado no processo crime que no período de matrículas em causa reinou um estado de confusão motivado pelo volume de processos de matrícula e urgência de cumprimentos de prazos e demais formalidades de tais processos. (aliás conforme a Recorrente havia alegado na sua P.I. e também no processo disciplinar (basta atentar nas declarações do Diretor da Escola secundária) e que o Meritíssimo Juiz a quo fez tábua rasa.

  15. Ficou também provado naquele processo crime que a aqui recorrente enquanto Chefe de Serviços da Administração Escolar ajudou em tais tarefas para que todos os alunos tivessem os processos de matrícula tempestivamente concluídos.

  16. Pelo exposto, não restam dúvidas que a matéria de fato dada como provada na sentença penal e há muito transitada em julgado, veio eliminar e destruir de forma inquestionável a prova insipiente e contraditória do processo disciplinar.

  17. Pelo que é manifesto a falta de sustentação probatória para ter sido imputada à aqui recorrente a prática da infração disciplinar “de ter sido encontrada em alcance ou desvio de dinheiros públicos”.

  18. Acresce que também a sentença recorrida, fez errada aplicação do Direito ao não ter considerado a omissão de uma diligência de prova essencial para a descoberta da verdade material.

  19. A saber, a recorrente na sua Resposta à Nota de Culpa, requereu a averiguação e apuramento do valor recebido de matrículas diariamente no ano de 2009 a título de talonários, quem os passou, quem os registou e recebeu nas folhas diárias e quanto a esse título foi depositado no Banco, tendo o instrutor do processo indeferido esse requerimento probatório.

  20. Todavia, os talonários, cuja a averiguação se requereu, seriam documentos necessários para aferição das entradas de verbas e a um levantamento exaustivo, completo e objetivo do funcionamento dos Serviços Administrativos da Escola, sem o qual não estaria devidamente concluído o procedimento disciplinar.

  21. A possibilidade que o Instrutor tem de indeferimento de diligências probatórias requeridas por quem é arguido em processo disciplinar, restringe-se apenas às situações em que tais diligências não sejam legalmente admissíveis, não permitam a prova dos factos a que se destinam ou já estejam suficientemente provados os factos alegados pelo requerente da prova. (V. Artsº 37º e artº 53º nº 1 do Estatuto Disciplinar), situações que não são subsumíveis ao caso dos autos.

  22. Como se dispõe neste último normativo, “A diligência requerida pelo arguido pode ser recusada em despacho do instrutor, devidamente fundamentado, quando manifestamente impertinentes e desnecessárias.” 27ª A manifesta impertinência e a desnecessidade de tal produção de prova, nem sequer foi alegada pelo Instrutor, tendo este se bastado no Relatório Final com a alegação de “não pertinente”.

  23. Todavia, o Meritíssimo Juiz a quo entendeu, (quanto a nós erradamente), que a manifesta impertinencia estava demonstrada só pelo simples facto dos citados talonários cuja averiguação se pedia não serem relativos ao lapso temporal das alegadas datas da prática da infração disciplinar.

  24. Contudo a Recorrente no amplo direito da sua defesa e para a descoberta da verdade material, requereu a averiguação e apuramento do valor recebido de matriculas diariamente no ano de 2009 a titulo de talonários, quem os passou, quem os registou e recebeu nas folhas diárias e quanto a esse título foi depositado no Banco, tendo o instrutor do processo indeferido esse requerimento probatório.

  25. Não estava, pois, na disponibilidade nem no critério do Instrutor do processo (ou do Meritíssimo Juiz de 1ª...

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