Acórdão nº 16407/15.6T9PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução04 de Novembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. – RELATÓRIO.

No processo comum colectivo nº 16407/15.6T9PRT, do tribunal judicial da comarca …, Juízo Central Criminal …, Juiz 1, por acórdão datado de 13/11/2019, depositado na mesma data, e no que ora importa salientar, foi decidido condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e em concurso real, de: “a) - treze crimes de burla qualificada, previstos e punidos pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nº 2, al. b), do Código Penal (Transportes Roças, Ginkgo, Transportes Centrais, Signicity, Transportes MEG, Transportes Manuel Mendes, PSST, DLB, A.A. Gouveia, Madeisobrosa, Totalplan, Jacunha, Visocarga), na pena de dois anos e quatro meses de prisão, por cada um; – dez crimes de burla qualificada, previstos e punidos pelos artigos 217.º. n.º 1. e 218.º. n.º 2, al. b), do Código Penal (Globex, Transjanardo, Kapa, Mar e Ar, Teu Transitário, Transoliveira, Ranatrans, Transneiva, Euro Ariz, Horatotal), na pena de dois anos e oito meses de prisão, por cada um; – dois crimes de burla qualificada, previstos e punidos pelos artigos 217.º. n.º 1. e 218.º. n.º 2, al. a) e b), do Código Penal (World Brothers, Abreu Carga), na pena de três anos e quatro meses de prisão, por cada um; – dois crimes de burla qualificada, previstos e punidos pelos artigos 217.º. n.º 1. e 218.º. n.º 2, al. a) e b), do Código Penal (J. Morais, SDV), na pena de quatro anos de prisão, por cada um; e, – um crime de burla qualificada, previsto e punido pelos artigos 217.º. n.º 1. e 218.º. n.º 2, al. a) e b), do Código Penal (Futurcargo), na pena de cinco anos de prisão.

  1. – convolar o crime de falsificação de documento que vinha imputado ao referido arguido para um crime de falsas declarações, previsto e punido pelo art.º 348.º-A, nº 1, do Código Penal, e condená-lo por tal crime na pena de quatro meses de prisão; e c) – condená-lo, em cúmulo jurídico das sobreditas penas, na pena única de dez (10) anos de prisão.

  2. – ao abrigo do disposto no art.º 111º, nºs. 2 e 4 do CPP, declarar a perda das vantagens obtidas pelo mesmo, no valor de € 398.844,00, a favor do Estado, condenando-o a pagar o equivalente a esse valor, por si recebido.

    (…) h) – julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por “WORLD BROTHERS – CONSULTADORIA E REPRESENTAÇÕES, LDA”., e, em consequência, condenar o mencionado arguido/demandado a pagar àquela a quantia de vinte e quatro mil setecentos e vinte e cinco euros, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento; i) – julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por “PSST – TRANSPORTES UNIPESSOAL, LDA.”, e, em consequência, condená-lo a pagar àquela a quantia de quatro mil oitocentos e cinquenta euros, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento; j) – julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por “TRANSOLIVEIRA, TRANSPORTES DE MERCADORIAS, LDA.”, e, em consequência, condená-lo a pagar àquela a quantia de catorze mil e setecentos euros; k) – julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por “TRANSNEIVA, SOCIEDADE DE TRANSPORTES, LDA.”, e, em consequência, condená-lo a pagar àquela a quantia de dezassete mil e trinta euros, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento; l) – julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por “KAPA TRANSITÁRIOS, LDA.”, e, em consequência, condená-lo a pagar àquela a quantia de onze mil oitocentos e sessenta e dois euros, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento; m) – julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por “EURO – ARIZ TRANSPORTES UNIPESSOAL, LDA.”, e, em consequência, condená-lo a pagar àquela a quantia de nove mil e cem euros, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento; e, n) – julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por “TRANSPORTES J. MORAIS, S.A.” e, em consequência, condená-lo a pagar àquela a quantia de quarenta e nove e quinze cêntimos. (…)” Em dissensão do julgado, impulsou, o arguido, recurso para o Tribunal da Relação do Porto – cfr. fls. 4404 a 4555 – que, por decisão prolatada a 1 de Abril de 2020 (fls. 4653 a 4705) – foi decidido (sic) “não conhecer de parte do recurso interposto pelo arguido AA por tal não fazer parte do seu delineado objecto inserto nas respectivas conclusões, em rejeitá-lo na parte em que impugnava a matéria de facto, bem como, e por inerência, às questões que a isso vinham associadas, atenta a sua manifesta improcedência e, no mais, em negar-lhe total provimento, em consequência do que decidem confirmar integralmente o acórdão recorrido.” Ainda desarraigada do julgado, impulsa recurso para este Supremo Tribunal de Justiça (fls. 4720 a 4770), rematando a prolixa argumentação com o epítome conclusivo que a seguir queda transcrito.

    §1.(a). – QUADRO CONCLUSIVO.

    §1.(a).i). – DO RECORRENTE.

    1. – Por Acórdão datado de 13-11-2019, proferido pelo Tribunal de 1ª Instância, o arguido foi condenado, pela prática de 28 (vinte e oito) crimes de burla qualificada e um crime de falsas declarações, na pena única de 10 anos de prisão, necessariamente efectiva.

    2. – O Acórdão recorrido decidiu não conhecer do Recurso do ora Recorrente, na parte da impugnação da matéria de facto, e todas as questões a esta associadas, rejeitando-o por manifesta improcedência e no mais, negou-lhe provimento, confirmando a Decisão recorrida (da 1ª Instância).

    3. – Com o devido respeito, o Recorrente cumpriu todos os requisitos constantes no artº 412, do C.P.P., pelo que, não se conforma com a rejeição, por manifesta improcedência.

    4. – Ora, no caso concreto, o Recorrente impugnou a decisão sobre a matéria de facto, indicou os pontos de facto concretos que considera incorrectamente julgados, transcreveu os depoimentos testemunhais (transcrição da prova), indicou as passagens e indicou as provas que impunham decisão diversa, tendo solicitado a alteração da matéria de facto.

    5. – Tudo como melhor consta na Motivação e Conclusões do Recurso, interposto para o Tribunal da Relação do Porto, que por razões de economia processual, aqui se dá por inteiramente reproduzido, para todos os efeitos legais.

    6. – O Recorrente cumpriu o preceituado no artº 412º, nº 3, do C.P.P., pelo que, não se conforma com a Rejeição do Recurso, na parte da impugnação da matéria de facto.

    7. – Assim, é inconstitucional a interpretação acolhida no Tribunal recorrido, da norma do artº 412, nº 3, do C.P.P., por violadora do artº 32, nº 1 e do Direito de Acesso à Justiça e aos Tribunais, artº 20, nº 1, ambos da Constituição da República Portuguesa.

    8. – Na verdade, foram violadas as garantias da sua defesa, não tendo sido assegurado ao Recorrente a análise da matéria de facto por um Tribunal Superior, em Recurso.

    9. – Na nossa modesta opinião, é inconstitucional a interpretação acolhida do artº 420, nº 1, do C.P.P., que permitiu rejeitar o Recurso por manifesta improcedência, porque violou as garantias de defesa do arguido constitucionalmente consagradas (artº 32, da C.R.P.).

    10. – Aqui se vem expressamente arguir a inconstitucionalidade dos artºs 412, nº 3 e 420, do C.P.P., na dimensão interpretativa do Acórdão recorrido, que rejeitou o Recurso da matéria de facto, sem o Recorrente ter sido, previamente convidado a efectuar a correcção ou aperfeiçoamento.

    11. – Assim, impedir, nestas circunstâncias, o direito ao Recurso do arguido é solução manifestamente gravosa, desproporcional e inconstitucional por violação das garantias de defesa e do acesso ao direito, artº 32 e artº 20, ambos da C.R.P., é contrário a um Estado de Direito Democrático e ao próprio artº 2 do Protocolo 7 do CEDH.

    12. – A norma do artº 412, do C.P.P., deve ser interpretada no sentido das especificações das alíneas do nº 3 se mostrarem cumpridas, caso o Recorrente transcreva (como transcreveu) as concretas passagens em que funda a sua impugnação da matéria de facto, como ocorreu no presente caso.

    13. – O Recorrente especifica na sua Motivação e nas Conclusões os concretos pontos de facto e aquelas concretas provas que impõem decisão diversa, por isso, o objeto do Recurso está suficientemente circunscrito e o Tribunal em condições de compreender o exato âmbito e alcance do Recurso.

    14. – Pelo que, inexiste, neste caso, qualquer falta substancial da impugnação da matéria de facto.

    15. – Deve, revogar-se a decisão recorrida, sendo substituída por outra, que imponha o conhecimento do Recurso, na parte em que foi rejeitado, impugnação da matéria de facto e questões a esta atinentes.

    16. - Acresce que, os factos alegados em sede de Contestação, com relevância para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa não foram relevados para a decisão, não foram dados como provados, nem como não provados (não obstante as testemunhas arroladas e inquiridas), em prejuízo do recorrente e seus direitos e garantias de defesa constitucionalmente consagradas.

    17. - Quanto aos factos alegados na Contestação, houve omissão de pronúncia o que integra a nulidade consubstanciada no artº 379, nº 1, por referência ao artº 374, nº 2, ambos do C.P.P., o que, implica também a nulidade nos termos dos artºs 374 e 379, nº 1, als. c) e d), todos do C.P.P., devendo implicar o reenvio da decisão recorrida para novo Julgamento.

    18. - A falta de fundamentação e a omissão dos factos alegados na Contestação, leva à conclusão que sobre eles não houve decisão, o que afecta o direito de defesa, e leva à nulidade do Acórdão recorrido, que aqui, tempestivamente se vem arguir e deve ser declarada com todas as legais consequências, artºs 374, nº 1, al. d) e 379, nº 1, als. a) e d), ambos do C.P.P.

    19. - Por falta de fundamentação, ausência dos factos alegados em Contestação, erros e omissões, deve a Sentença recorrida...

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