Acórdão nº 0940/13.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | SUZANA TAVARES DA SILVA |
Data da Resolução | 18 de Novembro de 2020 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I - Relatório 1 – A…………, S.A., com os sinais dos autos, intenta acção administrativa especial contra a Presidência do Conselho de Ministros e o Ministério das Finanças (Autoridade Tributária e Aduaneira), com vista à anulação do acto administrativo consubstanciado na resolução de contrato de concessão de benefícios fiscais nos termos da Resolução do Conselho de Ministros n.º 09/2013. Cumula este pedido com o pedido de condenação ao cumprimento, total ou parcial, deste contrato fiscal.
2 - O Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer tendo concluído “… pela procedência da presente acção, anulando-se o acto impugnado com base no invocado vício de falta de fundamentação, não implicando essa eventual anulação, salvo melhor entendimento, a procedência dos pedidos de cumulativa e subsidiariamente formulados, atenta a natureza formal do vício em causa que não impede que o conteúdo substancial do acto possa ser renovado, com expurgação do vício que o inquina”.
3 - Foi proferido despacho saneador não se suscitando questões quanto à competência do Tribunal em razão da nacionalidade, da hierarquia e do território, de igual modo não se suscitaram questões quanto à personalidade, capacidade e legitimidade da Autora e dos Réus.
Nesse despacho foi julgada improcedente a excepção da litispendência arguida na contestação pelo Réu Ministério das Finanças. No mesmo despacho foi considerada desnecessária a inquirição de testemunhas arroladas pela Autora, por se afigurar que a prova documental produzida nos autos é suficiente para a decisão da causa.
Finalmente, foi entendido não ser “possível conhecer imediatamente do mérito da causa neste despacho saneador, por a Autora não ter requerido a dispensa de alegações finais, conforme prevê a alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º do CPTA”. Nesta conformidade foi determinado que a Autora e as entidades demandadas fossem notificadas para apresentar, querendo, alegações escritas.
4 - A Autora apresentou alegações escritas que concluiu do seguinte modo:
a) O acto que determina a resolução sancionatória do presente contrato de concessão de benefícios fiscais deve ter-se por ilegítima, desde logo, porquanto o mesmo, de acordo com uma adequada leitura das normas legais e cláusulas contratuais tidas como aplicáveis, feita à luz dos princípios da boa-fé e da proporcionalidade, se deve ter por integral ou, ao menos, parcialmente, cumprido; b) Além disso, a resolução sancionatória do presente contrato estaria, sempre e em qualquer caso, dependente do incumprimento culposo, fruto de uma conduta censurável, da Autora, o que, no caso, manifestamente, não sucede (e daí também a ilegitimidade do acto de resolução sancionatória), dado que esta não só adoptou, sem solução de continuidade, a conduta própria de um bom pai de família, como, além disso, apenas circunstâncias anormais e imprevisíveis (ao menos no seu alcance efectivo ou no seu impacto real) a impediram de dar, mesmo que se adopte a perspectiva dos Réus (o que desde já se repudia) sobre os pressupostos de que era feito depender o efectivo cumprimento do contrato, plena resposta às exigências contratuais, ainda que consideradas nesta perspectiva enviesada; c) Acresce, por outro lado, que, em face do disposto no art.º 46.º da LGT, os créditos tributários emergentes para a Autora do Contrato de Concessão de Benefícios Fiscais ora em apreço já se haviam consolidado na sua esfera jurídica e isto na medida em que já havia caducado para a AT o direito à prática de qualquer acto de liquidação (adicional).
d) Por fim, o acto de resolução sancionatória do Contrato de Concessão de Benefícios Fiscais deve, ainda, ter-se por ilegal atenta a sua falta de fundamentação e isto na medida em que não dá a conhecer o iter cognoscitivo e valorativo que esteve na base da sua adopção.
Termos em que se conclui como na Petição Inicial, Requerendo-se que a presente acção seja julgada procedente, por provada, com as legais consequências.
5 - A Ré, Presidência do Conselho de Ministros, produziu as suas alegações escritas, tendo concluído do seguinte modo: 1.1. A A. nada aduz nas suas alegações escritas que permita concluir pela procedência da ação, limitando-se a tentar replicar às contestações anteriormente apresentadas; 1.2. De todo o modo, o ato impugnado é legal não padecendo de vício algum; 2.1. O Contrato de Investimento (CI) e o Contrato de Concessão de Benefícios Fiscais (CCBF) celebrados entre o Estado Português e a A. tiveram como período de vigência o período compreendido entre 8 de junho de 2004 e 31 de dezembro de 2008 (cf. Cláusula Décima- Segunda do CI junto sob Doc. n.º 3 da PI); 2.2. A alegação de que a candidatura objeto do CI e do CCBF diz respeito ao período compreendido entre 2002 e 2006, não é correta, não tendo qualquer correspondência com o que consta dos mencionados Contratos, constituindo uma violação do art. 238.º do Cód. Civil; 2.3. Ademais, só excecionalmente os contratos podem ter eficácia retroativa, não constando nem do CI, nem do CCBF, a indicação de qualquer exigência imperiosa de direito público que justificasse tal putativa eficácia retroativa; 2.4. Isto é, nem a Autora, nem o Estado Português atribuíram eficácia retroativa ao CCBF; 2.5. Nos termos do CCBF, a atribuição, em definitivo, de benefícios fiscais à A. ficou dependente da percentagem («grau» na linguagem do CCBF) de cumprimento dos objetivos contratuais (Grau de Cumprimento do Contrato ou "GCC"), através da medição de 4 indicadores/condições constantes em 5.2., Cláusulas Sétima e Décima Segunda do CCBF no período compreendido entre 8 de junho de 2004 e 31 de dezembro de 2008 (Doc. n.º 3 da PI); 2.6. Quanto à resolução do CCBF, releva-se que, entre outros casos, ficou previsto o não cumprimento pela A. dos objetivos previsto nas suas Cláusula Quinta e Sétima, designadamente, o não cumprimento do GCC e a não manutenção de 1904 postos de trabalho no final de 2008 (cf. Cláusula Décima do CCBF junto sob Doc. n.º 3 da PI); 2.7. A verificação do preenchimento do GCC e o próprio processo de resolução do CI por não cumprimento GCC não são automáticos, dependendo: - Do fecho dos respetivos exercícios por parte da A., o que, conforme é do domínio público, ocorre, no cenário mais curto, no final do primeiro trimestre do ano seguinte do exercício a analisar; - Da fiscalização e do acompanhamento do cumprimento do CI e do CCBF; - Da tramitação acordada nas Cláusulas Oitava a Décimas do CI, nos termos quais, haverá que se tomar em consideração, pelo menos um prazo adicional de mais 60 dias, contados de acordo com as regras fixada no CPA; 2.8. Nos anos subsequentes a 2004, o GCC pela A. foi sistematicamente inferior a 75%, concretamente de 69%, 70% e 71 %, respetivamente entre 2005 e 2007, e de 66% em 2008; 2.9. Em 2004, data da celebração do CI, a A. tinha ao seu serviço 1904 postos de trabalho, passando para 1139 em 2008, redução superior a 40%; 2.10. Assim, na vigência do CI e do CCBF os objetivos contratualmente fixados não foram cumpridos; 2.11. A própria A. confessa que não cumpriu o acordado no CCBF, quando tenta demonstrar que o período de verificação do GCC é outro que não o período fixado no mesmo; 2.12. Assim, impõe-se concluir que a A. não cumpriu as condições do CCBF que determinavam a atribuição do Incentivo Fiscal acordado, sendo correta a Resolução do Conselho de Ministros nº 9/2013, de 20 de janeiro - cf. Doc. n.º 1 da PI; 3.1. O direito de resolução da R. PCM do CCBF não depende de culpa, não estando em causa uma indemnização da A. ao Estado Português (nem sequer uma sanção ou um castigo); 3.2. Apenas o exercício de um direito potestativo, convencional, de resolução, consequência lógica e normal do não se terem verificado as condições de que dependia a concessão do benefício fiscal acordado, permitida nos termos do art. 432.º do Cód. Civil; 3.3. Ou seja, ao abrigo da autonomia privada, as partes acordaram que certos eventos objetivos - os previstos da Cláusula Décima do CCBF - conferiam a uma das partes - o Estado Português - o direito de, querendo, declarar resolvido o CI e o CCBF; 3.4. A tese da A. de que a resolução do CCBF teria se ser culposa levaria a um resultado absurdo e contrários às regras da boa-fé: o direito da A. a um benefício apesar de os resultados de que dependia a mencionada concessão não terem sido atingidos!; 3.5. Ademais, tal interpretação não tem um mínimo de correspondência no texto do CCBF, representando uma violação do artigo 238.º do Cód. Civil; 3.6. Com efeito, "facto imputável" apenas pretende significar o não cumprimento dos objetivos e obrigações do CCBF por um comportamento causal da A. ou dos seus sócios, isto é, por atos ou condutas dos mesmos, excluindo-se, assim e apenas, o não cumprimento por ato de terceiro; 3.7. De todo o modo, o não cumprimento da GCC só pode ser imputado à A., designadamente pela decisão de diminuir o número de postos de trabalho entre 2004 e 2008, na ordem dos 40%, através de despedimentos e/ou rescisões e/ou através da não contratação de novos trabalhadores em substituição dos trabalhadores que, nesse período, tenham decidido deixar de trabalhar com a A.; 4.1. Sem conceder, sempre se acrescentará que, ainda que o direito de resolução da R. PCM dependesse de um juízo de culpa da A., a mesma não demonstrou, como lhe competia, não ter atuado sem culpa (pelo menos, sob a forma de negligência); 4.2. A A. suporta a sua alegada diligência numa alteração das circunstâncias motivada por dois eventos, a saber: o 11 de setembro de 2001 e a liberalização do mercado dos têxteis em 2005; 4.3. Contudo, sem razão por ambas as situações serem antecipáveis pela A. à data da assinatura do Cl e do CCBF, 8 de junho de 2004, pelo que a A. necessariamente incorporou no contrato os riscos provenientes tais situações; 4.4. Quanto ao 11 de setembro de 2001, por razões óbvias, pois em 2004, os efeitos desse...
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