Acórdão nº 328/05.3BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução05 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO C....., veio interpor recurso jurisdicional dirigido a este Tribunal tendo por objeto a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de Imposto Sucessório praticada no âmbito do processo de imposto sucessório nº ....., do Serviço de Finanças do Seixal 2.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “ i) Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida em 28 de Setembro de 2014, no processo de Impugnação Judicial que correu termos junto da 2.ª Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada sob o n.° 328/05.3 BEALM, que considerou não ser possível à RECORRENTE utilizar o pedido de revisão oficiosa, uma vez que o erro na desconsideração do passivo do Processo Sucessório é imputável a comportamento negligente do contribuinte.

ii. Ora, na data em que foi apresentado o pedido de revisão oficiosa (2002), o então artigo 78.°, n º3, da Lei Geral Tributária (actual artigo 78.°. n.° 4, da lei Geral Tributária) não fazia depender a possibilidade de apresentação do pedido de revisão oficiosa do facto do erro não ser imputável a comportamento negligente do contribuinte, redacção que apenas entrou em vigor com a Lei 60- A/2005, de 30 de Dezembro.

iii. É, pois, evidente e manifesto o erro de direito da Sentença recorrida ao negar a aplicação do então artigo 78.°, n.° 3, da Lei Geral Tributária, na redacção dada pela Lei 398/98, de 17 de Dezembro (actual artigo 78.°, n.° 4, da Lei Geral Tributária) à situação em apreço.

iv. Por outro lado, a Sentença recorrida assenta, ainda, em erro sobre os pressupostos de facto e de direito ao não reconhecer o erro imputável à Administração tributária na não consideração do passivo no processo do Imposto Sucessório.

v. Ora, como demonstrado nos autos, o acto de liquidação de Imposto Sucessório em apreço, fundou-se, única e exclusivamente, no activo da herança não tendo em consideração o passivo da herança, verbas essas que surgem identificadas na relação de bens apresentada pela RECORRENTE (cf. alínea c). da matéria de facto provada na Sentença recorrida).

vi. Ora, de acordo com o disposto no artigo 3 °. do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, sob a epígrafe “incidência real do imposto sobre as sucessões e doações”, o referido tributo incide sobre transmissões de bens móveis e de bens imóveis a título gratuito. Ou seja, o imposto incidirá sobre o acréscimo patrimonial, sem contrapartida, verificado na esfera jurídica do herdeiro ou do donatário, conforme esteja em causa uma sucessão ou uma doação. Assim sendo, a matéria colectável para efeitos de apuramento de Imposto Sucessório devido terá, obrigatoriamente, de sopesar - o que não se verificou, como demonstrado, na situação em apreço, quer o activo, quer o passivo a transmitir.

vii. Na verdade, e conforme demonstrado nos autos, a Administração tributária tomou conhecimento das diversas verbas do passivo através da relação de bens, ou seja, antes da liquidação do Imposto Sucessório em apreço, pelo que se deverá concluir ser-lhe imputável o erro na desconsideração do passivo do Processo Sucessório.

viii. É, pois, evidente o erro existente nos autos, justificador da necessidade de revisão oficiosa do acto.

ix Este meio de defesa é uma salvaguarda do sistema, o garante do cumprimento dos princípios do interesse público e da verdade material (cf. artigos 266 ° da Constituição da República Portuguesa, artigos 13º n° 1, 113º, n° 1, e 114º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e artigos 58.° e 99.°, da Lei Geral Tributária).

x. Note-se que esse erro na autoliquidação (em que não há intervenção administrativa) é imputável à Administração Tributária para este efeito.

xi. É evidente o erro de julgamento e violação dos artigos 266.° da Constituição da República Portuguesa e 78 °, n.° 4, impondo-se a revogação da Sentença e a revisão oficiosa do acto de liquidação.

xii. Acresce que, atento o disposto no artigo 266º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa e artigo 55.º da Lei Geral Tributária, a Administração tributária deve pautar a sua autuação pelo respeito pelo princípio da justiça.

xiii. Exige-se, pois, mais do que se ater em formalismos exacerbados, nos quais a Sentença recorrida também se apoiou, deverá ser promovida uma tributação justa no sentido de o montante de o imposto sucessório cobrado corresponder ao efectivo acréscimo patrimonial verificado na esfera da RECORRENTE (cf, DlOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Comentada e Anotada. 3ª Edição, Vislis Editores, pag. 243) xiv. Acresce que, em violação do disposto no n,° 5 do artigo 267 ° da Constituição da República Portuguesa e do disposto no artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo, vigente à data da emissão da liquidação de Imposto Sucessório ora controvertida - dispunha que os interessados gozam do direito a ser ouvidos antes da tomada a decisão finai, direito que não foi assegurado à ora RECORRENTE, uma vez que não foi notificada para se pronunciar em sede de audição prévia sobre a liquidação de Imposto Sucessório em apreço (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo, Secção do Contencioso Tributário, n.° 00330/03, datado de 27 de Maio de 2003 e Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.° 780/02, em 30 de Outubro de 2002).

xv. Do mesmo modo, em violação do disposto no artigo 267.º, nº 1, da Constituição da República e do artigo 60.º, nº 1, alínea b), da Lei Geral Tributária, a ora RECORRENTE não foi notificada para exercer o seu direito de audição prévia sobre o projecto de decisão do pedido de revisão oficiosa e do recurso hierárquico que lhe sucedeu xvi. O acto de liquidação de juros compensatórios não foi acompanhado, em violação do disposto no artigo 83.°, do Código do Processo Tributário (na redacção à data dos factos), de qualquer fundamentação que justificasse ou demonstrasse os pressupostos, de facto e de direito, da sua exigibilidade, pelo que os mesmos são ilegais (cfr Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 23 de Outubro de 2002, Processo n° 1145/02).

xvii. Conforme demonstrado nos autos, a RECORRENTE, em 27 de Dezembro de 2002, pagou a liquidação de Imposto Sucessório e respectivos juros compensatórios, ora contestados, pagamento este que, pelos motivos e com os fundamentos desenvolvidos na impugnação judicial e, agora em sede de recurso, não se mostrava devido, pelo que nos termos do disposto no artigo 43.° da Lei Geral Tributária, lhe deverá ser reconhecido o direito a receber juros indemnizatórios.

TERMOS EM QUE, COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVERÁ SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA, DETERMINANDO-SE A DESCIDA DOS AUTOS À PRIMEIRA INSTÂNCIA PARA PRODUÇÃO DE PROVA.

POR MERO DEVER DE CAUTELA, E CASO O PRESENTE TRIBUNAL CONSIDERE ESTAR NA POSSE DE TODOS OS ELEMENTOS PARA O EFEITO, REQUER-SE QUE SEJA CONHECIDO O MÉRITO DA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, ASSIM SE ANULANDO O ACTO DE LIQUIDAÇÃO DE IMPOSTO SUCESSÓRIO COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE, O PAGAMENTO OE JUROS INDEMNIZATÓRIOS, CALCULADOS À TAXA LEGAL ATÉ AO EFECTIVO REEMBOLSO DO VALOR PAGO PELA RECORRENTE.” *** A Recorrida, devidamente notificada optou por não apresentar contra-alegações.

*** O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.

*** Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.

*** II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: Com relevo para a decisão a proferir, julgo provados os seguintes factos: a) Em 10.07.1998, a aqui Impugnante foi notificada da liquidação de Imposto Sucessório - por óbito de D..... -, no valor global de €277.145,84, que integra a liquidação de juros compensatórios, no montante de €61.062,51 (cfr. fls. 37 e 89 do processo administrativo apenso); b) Em 27.12.2002, a Impugnante efectuou o pagamento da dívida e, na mesma data, apresentou requerimento solicitando a revisão da matéria colectável e consequente imposto, em virtude de não ter sido considerado na liquidação do imposto o passivo constante da relação de bens que anexou, e que ascendia a mais de 400.000.000$00 (cfr. fls. 2-32 e 37 do PA); c) Era o seguinte o passivo constante na relação de bens: Verba n° 1 — Despesas de funeral pagas à Agência Funerária S.....

, com sede em Almada, no valor de 162.950$00; Verba n° 2 - Dívida aos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Município de Almada, referente à 4a e última prestação, que no momento do falecimento tinha o valor de..250.000.3500; Verba n° 3 - Dívida a G.....

, residente em Lisboa, .....

, titulada pela consignação de rendas provenientes das verbas 6 a 22 (i.e. 16 das 41 fracções autónomas que integram as 47 verbas do activo), segundo escritura de 1.9.87, no valor de 5.000.000$00; Verba n° 4 - deve a herança à Caixa Geral de Depósitos, em capital e juros a quantia de.. ..298.000.000$00; Verba n° 5 - Deve a herança ao Banco de Fomento Nacional a quantia de 95.013.612$00.” (cfr. fls. 4 a 16 do PA); d) Em 11.02.2003, a aqui impugnante juntou ao processo de imposto sucessório em causa, duas certidões de dívida, passadas pela Caixa Geral de Depósitos, “por forma a fazer prova do passivo da herança”, certificando as quantias em dívida por parte dos herdeiros de D....., relativas a empréstimos concedidos (conforme documentos de fls. 33 a 35 do PA); e) Com base no requerimento referido na alínea b), e atendendo a que o mesmo foi dirigido ao Chefe do Serviço de Finanças, foi instaurado processo de reclamação graciosa...

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