Acórdão nº 00340/13.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução30 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO A., com os sinais dos autos, vem interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga promanada no âmbito da Ação Administrativa Especial por si intentada contra o INSTITUTO DE EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL, I.P, também com os sinais dos autos, que julgou a presente ação improcedente.

Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) A - Quanto aos pontos 2, 4, 6 e 8 dos factos considerados pelo Tribunal como não provados, o A., em face da prova produzida em sede de audiência de julgamento, não pode estar de acordo.

B - Não corresponde à verdade que a testemunha V., prima do A., apenas acompanhou a fase de processo disciplinar e mesmo em par final do projeto no seu encerramento aquando da liquidação das dívidas.

C - O seu depoimento é claro sobre o entusiasmo e empenho inicial do A. no projeto.

Veja-se quando refere: “que acreditava nele... depois também teve que recorrer a alguns familiares...e sobretudo à mãe e do qual também conversava com a mãe dizendo que era um projeto que valia a pena investir. só que a certa altura as coisas começaram a ser muitíssimo difíceis e começamos a encarar a realidade... e na altura o meu primo... eu consegui perceber perfeitamente o momento de entusiasmo, do profissionalismo com que ele empregou nisto D- Como igualmente a referida testemunha ajudou o A. a angariar patrocinadores/investidores: “eu acompanhei as dificuldades que estava a ter em termos económicos para de alguma forma promover esta parte da publicidade e informação da revista. por outro lado também paralelamente a questão dos patrocinadores... consegui alguns mas também aqui muitas dificuldades na questão dos patrocinadores. nós íamos conversando, é normal que qualquer patrocinador só também invista a partir do momento em que sente o impacto que as revistas tem no mercado e a projeção da imagem e pronto tudo começou por aqui de alguma forma... eu aqui anda tentei tranquilizá-lo ... eu sei que ele foi investindo dinheiro próprio neste projeto. a mãe também colaborou, nós próprios, eu própria dizia à minha tia para ajudá-lo.” E - Do depoimento da testemunha V., testemunho isento e credível, com razão de ciência durante todo o processo e não apenas quando surgiram dificuldades.

F - Este testemunho implica que se considere provados os seguintes factos: a) O A. desenvolveu esforços de captação de publicidade, tentativas de encontrar investidores e divulgação da revista que se revelaram infrutíferos; b) O A. esgotou os seus meios financeiros para garantir a atividade da empresa; c) O A. esgotou os meios financeiros próprios e recorreu a empréstimos de familiares para honrar os compromissos mais prementes e evitar a insolvência; d) A falta de meios financeiros determinou o encerramento da atividade da publicação e a impossibilidade de assegurar as contratações previstas.

G - Em face destes factos que devem ser considerados provados, com os factos já considerados provados: 25. As receitas obtidas em publicidade foram escassas; 26. - O A. negociou o pagamento das diversas dividas contraídas e liquidou débitos, encerrando a empresa sem dívidas.

Temos que considerar que há por parte do A. um incumprimento contratual justificado.

H - Resulta provado que o A. chegou a uma situação em que tendo esgotado todas as suas fontes de apoio, tendo gastos todos as poupanças e fundos que possuía, não lhe restou outra alternativa que não fosse terminar com o projeto sob pena de entrar numa espiral de endividamento, podendo inclusive ser acusado de uma situação de insolvência culposa.

I - Como resultou do depoimento das testemunhas as dificuldades de tesouraria tornaram-se uma constante.

J - Instalou-se o desespero pela manifesta insuficiência de meios financeiros para satisfazer atempadamente os pagamentos correntes.

K - Os esforços de captação de publicidades e as tentativas de encontrar investidores revelaram-se infrutíferas e a empresa ficou sem condições para completar o investimento e as contratações previstas por absoluta falta de meios financeiros para o efeito.

L - O A. ficou abalado pelo desmoronar do projeto em que se empenhou com todas as suas energias e entrou num quadro de depressão psicológica profundo - facto em que a testemunha V. por diversas vezes refere.

M - O A. com a ajuda dos familiares negociou o pagamento das diversas dívidas contraídas.

N - Negociados e liquidados os débitos, a empresa foi encerrada sem recurso a insolvência e sem quaisquer dívidas ao fisco ou segurança social.

O - Todo este processo resultou na destruição do ambiente familiar do A., no consequente divórcio do A., objetivamente imputável a carências extremas de ordem financeira e no clima de insegurança e incerteza desde então rodearam a vida académica do casal e a vida do próprio casal.

P - O A. não teve culpa grave no sucedido, pois que não lhe era exigível que tivesse que levar a empresa à insolvência e ficar como ficou em situação de insolvência pessoal para manter um projeto condenado inelutavelmente ao fracasso.

Q - O incumprimento do A. encontra-se por isso justificado, não podendo ser considerado injustificado.

R - O A. agiu com toda a seriedade, empenho e melhor diligência de que era capaz.

S - Em todos os diplomas legais aplicáveis ao caso concreto dos autos verifica-se que não existe a definição do que se entende por incumprimento injustificado.

T - Trata-se, pois de um conceito indeterminado que terá que ser aferido concretamente.

U - O incumprimento injustificado, tem que ser um incumprimento com culpa por parte do promotor.

V - Nunca um incumprimento sem culpa por parte do promotor.

W - Ora, na situação dos autos, verifica-se que o promotor tentou por todos os meios assegurar a viabilidade do projeto.

X - Mas chegou a uma situação em que, tendo esgotado todas as fontes de apoio, tendo-se endividado para além das suas possibilidades, que não restou o promotor terminar com o projeto sob pena de entrar numa espiral de dívidas e mais dívidas, podendo inclusive ser acusado de uma situação de insolvência culposa nos termos dos art°s 18, n° 1; 186°, n° 3, ala a), 186°, n° 2, ala g), todos do CIRE.

Y - Com já se referiu o A. agiu com toda a seriedade, empenho e a melhor diligência de que era capaz.

Z - E nem se diga que se tratou de um risco associado ao negócio.

AA - A verdade, é que o IEFP tinha que fazer uma correta apreciação do projeto quanto à sua viabilidade e essa não foi feita.

AB - A concessão de incentivos ter que ser feita com correta e exigente avaliação dos projetos e não com ligeireza, sob pena de se transformar a situação desespero do desempregado, numa situação ainda mais angustiante, gravosa e calamitosa, como acabou por ficar a situação do promotor e recorrente (…)”.

*Notificado que foi para o efeito, o Recorrido produziu contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido quanto à improcedência da presente ação.

*O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

*O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional.

*Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* *II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a determinar se se a sentença recorrida incorre (i) em erro de julgamento da matéria de facto, bem como em (ii) erro de julgamento da matéria de direito, por incorreta interpretação do bloco legal aplicável por parte do Tribunal a quo, ao considerar não justificado o incumprimento do contrato de incentivos financeiros visado nos autos.

Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.

* *III – FUNDAMENTAÇÃO III.1 – DE FACTO O quadro fáctico apurado [positivo, negativo e respetiva motivação] na decisão judicial recorrida foi o seguinte: “(…) 1.

Em 7.8.2009 o A. apresentou junto do Instituto de Emprego e Formação Profissional, I.P. (doravante IEFP), no âmbito do Programa Operacional Potencial Humano, candidatura ao “Programa de Estímulo à Oferta de Emprego - PEOE” a que foi atribuída o número 083/ILE/09, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e da qual resulta, além do mais, serem objetivos do projeto “Criar uma revista, de âmbito nacional, especializada em questões relativas ao futebol de formação. Conquistar, a curto médio prazo, 5% do mercado potencial de um milhão de leitores, garante o sucesso do projeto; Alcançar o reconhecimento da marca para o incremento das receitas em publicidade. ”, com a criação de 5 postos de trabalho e um plano de investimento que incluía um capital fixo de € 30.387,00 e um fundo de maneio de € 20.000,00, correspondendo o financiamento a € 1222,00 relativos ao recebimento antecipado de prestações de desemprego, e financiamento do IEFP de € 3.889 de apoio ao investimento e € 45.276 de subsidio a fundo perdido. - cfr. doc. de fls. 107 e ss. do pa junto aos autos.

  1. Juntamente com a candidatura apresentou, além do mais, Plano de Negócios cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. doc. de fls. 58 e ss. do pa apenso aos autos.

  2. O IEFP procedeu a visita às instalações propostas pelo A. no âmbito da sua candidatura. - cfr. doc. de fls. 126 do pa.

  3. O IEFP procedeu à analise económico financeira do projeto tendo elaborado relatório cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. doc. de fls. 127 a 141 do pa apenso aos autos.

  4. Em 4.3.2010 foi elaborada a Informação n.° 289/DN-EBG/2010 da qual consta...

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