Acórdão nº 028/19.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução04 de Novembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

*** Acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

A…………, com os demais sinais identificativos dos autos, ao abrigo do disposto nos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei (DL.) n.º 10/2011 de 20 de janeiro, que estabeleceu o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT) e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário, do Supremo Tribunal Administrativo, recurso, para uniformização de jurisprudência, da decisão (singular) proferida, no âmbito de pedido de pronúncia arbitral, que formulou no processo nº 392/2018-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), a qual julgou totalmente improcedente o pedido de arbitragem e manteve ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), referente ao ano de 2016, no valor de € 7.311,44.

Apontou-lhe contradição/oposição com o decidido no acórdão, do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 5 de julho de 2005 (processo n.º 05675/01).

O recorrente (rte) apresentou alegação, com as seguintes conclusões: « 10. O Recorrente interpõe para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, com base em oposição da decisão arbitral proferida no presente processo com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 05-07-2005, no âmbito do processo n.° 05675/01, em que é relator o Ex.mo Venerando Juiz Desembargador Francisco Rothes, disponível em www.dgsi.pt.

  1. O presente recurso tem como fundamento o facto dos Acórdãos em confronto assentarem em situações de facto idênticas nos seus contornos essenciais e em ambas as decisões a questão de direito subjacente respeitar à tributação dos rendimentos derivados de prestações de serviços (trabalho independente), ao abrigo de Convenção celebrada para evitar a dupla tributação.

  2. Com efeito, a decisão arbitral proferida colide frontalmente com o acórdão prolatado pelo Tribunal Central Administrativo Sul acima referido, encontrando-se irremediavelmente inquinada do ponto de vista jurídico por errada interpretação do artigo 14° da Convenção celebrada para evitar a dupla tributação.

  3. Ainda que o acórdão fundamento se refira à Convenção celebrada entre Portugal e Espanha, e o processo arbitral se refira à Convenção celebrada entre Portugal e o Reino Unido, o artigo 14° das duas convenções têm exatamente a mesma redação, já que todas as convenções celebradas por Portugal seguiram o modelo de Convenção da OCDE.

  4. Estando assim em causa uma diferente interpretação do artigo 14° da referida Convenção.

  5. Note-se que o modelo de Convenção da OCDE é, desde a sua criação, direcionada para a tributação no Estado da residência, sendo que a grande maioria das regras que a compõem introduzem direitos de tributação ao Estado-residência ou descrevem de forma detalhada os casos onde o Estado-fonte poderá tributar (competência cumulativa).

  6. Com efeito, enquanto a decisão arbitral entendeu que “prevê a Convenção, no seu artigo 14°, que os rendimentos do trabalho independente são tributados exclusivamente no Estado de residência do Requerente se os mesmos não forem imputados a estabelecimento estável”.

  7. Já em sentido oposto se pronunciou o acórdão fundamento, ao referir que “demonstrado que está que não havia lugar a tributação pelo Estado Português em IRS dos rendimentos pagos em 1994 por uma sociedade portuguesa a um cidadão espanhol a título de “comissões de vendas”, por este não ter residência em estabelecimento estável ou instalação fixa em Portugal ao qual pudessem ser imputáveis os rendimentos em causa (atento o disposto nos arts. 7.° e 14.º da Convenção Para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Espanha, aprovada pelo Decreto-lei n.° 49.223, de 4 de setembro de 1969, em vigor à data), não pode a AT liquidar àquela sociedade o IRS que considerou que esta deixou de reter na fonte, por força do disposto nos arts. 91.º e 94.° do CIRS (na versão em vigor à data)”.

  8. O acórdão fundamento refere ainda que “atenta a factualidade provada, designadamente a que se refere à residência do cidadão espanhol beneficiário dos rendimentos em causa e à inexistência de estabelecimento ou instalações fixas no nosso País, é inquestionável que, qualquer que seja a qualificação que se faça dos rendimentos em causa pagos ao referido cidadão espanhol pela ora Recorrente, o Estado português, no âmbito da CDT acima referida, reconhece ao Estado espanhol o poder exclusivo de tributar aqueles rendimentos (cfr. os arts. 7.º e 14.° CDT citados na nota de rodapé com o nº 6)”.

  9. Assim, a decisão arbitral procedeu a errada interpretação da redação do artigo 14° da Convenção de dupla tributação celebrada com o Reino Unido, ao concluir que os rendimentos de trabalho independente são tributados exclusivamente no Estado da residência, se os mesmos não foram imputados a estabelecimento estável.

  10. No entanto, a redação do artigo 14° da referida Convenção impõe a tributação dos rendimentos de trabalho independente no Estado da residência, se o sujeito passivo não dispuser de forma habitual, no outro Estado, uma instalação fixa para o exercício das suas atividades (sublinhado nosso).

  11. Com efeito, a redação do artigo 14° da Convenção não se refere a estabelecimento estável, mas sim a instalação fixa.

  12. Já o acórdão fundamento entendeu que não havia lugar a tributação em Portugal dos rendimentos de trabalho independente, por o mesmo não ter residência “nem estabelecimento estável ou instalação fixa em Portugal ao qual pudessem ser imputáveis os rendimentos em causa (atento o disposto nos arts. 7o e 14.° da Convenção (...)” 23. O acórdão fundamento quando se refere a estabelecimento estável (primeiro termo utilizado) refere-se ao artigo 7º (primeiro artigo referido) da Convenção, que de facto exige a existência de um estabelecimento estável para que os lucros das empresas possam ser tributados no outro Estado, que não o da sede da empresa.

  13. E quando se refere a instalação fixa refere-se ao artigo 14° da Convenção, que exige ao sujeito passivo, profissional liberal, disponha de uma instalação fixa de forma habitual para o exercício da sua atividade no outro Estado, para que aí possa ser tributado e não ser tributado no Estado da residência.

  14. Assim, o acórdão fundamento entendeu que no caso de rendimentos de trabalho dependente, o artigo 14° exige uma instalação fixa no outro país, para que os rendimentos sejam aí tributados.

  15. Ao contrário da decisão arbitral que interpretou o artigo 14° da Convenção exige a existência de um estabelecimento estável, não fazendo qualquer referência a instalação fixa, ao contrário da letra da lei.

  16. Ora, o artigo 14° das Convenções celebradas entre Portugal e o Reino Unido e entre Portugal e a Espanha tem exatamente a mesma redação.

  17. Tendo a mesma redação, a interpretação a fazer à redação de uma convenção não pode ser diferente da interpretação a fazer à redação de outra convenção.

  18. Com efeito, os conceitos de estabelecimento estável e de instalação fixa são diferentes e não podem ser confundidos.

  19. Como acima se referiu, as Convenções celebradas por Portugal para evitar a dupla tributação seguiram o modelo de Convenção da OCDE, motivo pelo qual as redações das convenções são praticamente iguais.

  20. Demonstrada que está uma evidente contradição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento quanto à interpretação feita ao artigo 14° da Convenção, isto é, que existe uma evidente contradição sobre a mesma questão fundamental de direito, importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que, definitivamente, decida a questão controvertida.

  21. A infração a que se refere o artigo 152° n.° 2 do CPTA consiste num erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Tribunal Arbitral Singular adotou uma interpretação da referida norma do artigo 14° da Convenção, em patente desconformidade com o quadro jurídico vigente.

Nestes termos, nos mais de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Ex.as, deve o presente recurso por oposição de acórdãos ser admitido e posteriormente julgado procedente, por provado, devendo, em consequência e nos termos e com os fundamentos acima indicados, ser proferido acórdão que decida no sentido preconizado no acórdão fundamento, fazendo-se assim JUSTIÇA.

» * Por despacho da Exma. Conselheira-relatora, foi o recurso admitido, com efeito suspensivo.

* A recorrida (rda), autoridade tributária e aduaneira (AT), contra-alegou e concluiu: « I. O presente recurso para uniformização de jurisprudência, interposto por A…………, tem por base alegada oposição entre decisão proferida por Tribunal Arbitral em matéria Tributária, constituído sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa...

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