Acórdão nº 01958/20.9BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução31 de Outubro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

Partido CHEGA, devidamente identificado nos autos e neles representado pelo seu Presidente A…………….., vem intentar, ao abrigo do artigo 109.º e ss. do CPTA, a presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, sendo nela demandados a Presidência de Conselho de Ministros (PCM) e o Estado português.

Com a presente intimação, o requerente pretende que a mesma “seja considerada procedente, por provada e, em consequência” que a entidade Requerida seja “intimada a revogar as medidas adotadas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 89-A/2020, de 26 de Outubro, com efeito imediato, e que sejam tomadas todas as medidas necessárias para obstar à sua produção de efeitos”.

O A. identifica a limitação de vários direitos fundamentais cujo exercício em tempo útil se pretende proteger. Além do mais óbvio direito de deslocação ou circulação (art. 44.º da Constituição da República Portuguesa – CRP), são ainda dados como afectados pela alegada restrição da medida governamental a liberdade de culto (art. 41.º da CRP), o alegado direito à terceira idade (art. 72.º da CRP), o direito à família (art. 36.º, n.º 6), direito à integridade moral e física (art. 25.º), todos da CRP. Além destes direitos, alega-se que não foram respeitados o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1.º da CRP), o da universalidade (art. 12.º) e o da igualdade (art. 13.º), todos da CRP – cfr. alegações 43.ª e 44.ª Para fundar a inconstitucionalidade da restrição em causa, o A. invoca fundamentalmente o seguinte: i) violação dos artigos 18.º e 165.º da CRP, que atribuem a competência para restringir direitos, liberdades e garantias exclusivamente a lei da Assembleia da República (AR) e o decreto-lei autorizado do Governo; ii) falta de fundamentação da medida restritiva no artigo 19.º da CRP (“Esta limitação ao direito constitucionalmente consagrado à livre circulação, não foi efetuado ao abrigo do art.º 19.º da Constituição da República” (alegação 41.ª); iii) desproporcionalidade da medida restritiva, pois, desde logo, não se mostra adequada à prossecução do seu fim (evitar a propagação do coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19) dado que, por exemplo, “não há qualquer evidência, técnica e/ou científica, de que a deslocação dos cidadãos para visitar os cemitérios são deslocações que levam, necessariamente à propagação desta ou de outra qualquer outra doença” (alegação 15.ª) e porque a medida é aplicada igualmente a todos os concelhos ainda que a situação epidemiológica não seja idêntica em todos eles, ou seja, porque “o Estado trata de forma igual o que não tem comparação possível, no caso, tratar as zonas do país menos perigosas como se estas tivessem o mesmo grau de perigosidade que outras” (alegação 32.ª).

iv) violação do princípio da igualdade, em virtude de o Governo ter utilizado uma dualidade de critérios por comparação do que tem sido decidido em relação a outras situações; v) apenas o estado de emergência, e não o estado de calamidade, pode comportar medidas restritivas que não sejam adoptadas por lei ou decreto-lei autorizado.

Na alegação 52.ª são enunciados os motivos que justificam a sua procedência: “1) As partes têm legitimidade, nos termos e para os efeitos da alínea b), do n.º 1 do art.º 10º, art.º 14º, todos da Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de Agosto e art.ºs 8-A e 9º do CPTA; 2) A atuação supra descrita por parte da entidade Requerida, sem ter sido decretado Estado de Sítio ou Estado de Emergência, é manifestamente inconstitucional; 3) Ao restringir a liberdade de circulação sem quaisquer critérios e sem comprovada adequação da medida ao fim a que se destina, viola vários direitos e princípios constitucionais; 4) De modo que urge intimar a entidade Requerida a fazer cessar imediatamente a medida aprovada pelo Conselho de Ministros na Resolução do Conselho de Ministros n.º 89-A/2020, de 16 de Outubro; 5) Pois só assim será garantido o exercício em tempo útil do direito fundamental de liberdade de circulação, plasmado no art.º 44º da Constituição da República Portuguesa e respeitados o direito à dignidade da pessoa humana, o princípio da igualdade e proporcionalidade, nas suas três vertentes e, principalmente, a liberdade de culto prevista no art.º 41º da Constituição da República Portuguesa”.

  1. A presente intimação foi apresentada no TAC de Lisboa o qual, por despacho de fls. 24 a 26 (paginação SITAF) se julgou absolutamente incompetente em razão da hierarquia para conhecer do pedido determinando, em consequência, a remessa dos autos para este STA.

  2. Já neste STA, foi proferido despacho pela Relatora nos termos do artigo 109.º da CPTA, tendo-se decidido: i) Absolver o Estado da instância, dado tratar-se parte ilegítima nos de acordo com o disposto no artigo 10.º, n.º 1, do CPTA; ii) Aceitar a presente intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias e mandar citar a entidade demandada...

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