Acórdão nº 301/19.4GABNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 20 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução20 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: Por sentença de 12 de Dezembro de 2019, proferida no processo especial abreviado com o número acima indicado do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém (Juízo Local Criminal de Benavente – Juiz 1) a acusação foi julgada procedente por provada e em consequência decidiu-se: Condenar o arguido PMMO pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 69°, n° 1, al. a), e 292°, n° 1, do Cód. Penal, na pena de 110 (cento e dez) dias de multa, à razão diária de 6 (seis euros), totalizando 660 (seiscentos e sessenta euros), e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 (seis) meses. Notifique o arguido para entregar a carta de condução no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado desta sentença, sob pena de responsabilidade penal pelo crime de desobediência do artigo 348.º, n.º 1, al. b), do CP. Inconformado o arguido recorreu, tendo concluído a motivação do seguinte modo: «a)A sentença “a quo” encontra-se impregnada de erros de julgamento

  1. É assim, pois, desde logo a sentença “a quo” julgou, salvo o devido respeito, incorretamente improcedente a nulidade invocada relativamente à prova obtida através do alcoolímetro DRAGER ALCOTEST 7110 MK III P, nº ARAA 0068

  2. Os elementos constantes dos autos impunham a procedência daquela nulidade, pois, desde logo, resulta dos autos que o aparelho utilizado para medir a TAS do recorrente já havia caducado

  3. É assim, pois, nos termos dos arts.º 6.º, nº 3 da Portaria 1556/2007 e 2.º, nº 2 do Decreto-Lei nº 291/90, a aprovação de modelo é válida por um período de 10 anos. Prazo esse que, conforme explicitado nos arts.º 8º a 13.º das alegações, deve contar-se desde a aprovação de modelo pelo IPQ, entendimento que como se explanou naqueles arts tem claro suporte na legislação aplicável

  4. Surpreendentemente, o Tribunal “a quo”, considerou _ através de uma interpretação contra legem e fundamentando-se numa lógica incompreensível de que segue esse entendimento por esse ser o entendimento da maioria da doutrina, não procedendo a qualquer esforço para sustentar juridicamente esse entendimento, conforme demonstrado nos arts.º 21º a 39º das alegações, _ que o mencionado prazo de validade de 10 anos se deve contar do despacho de autorização de uso da ANSR

  5. Não tendo o entendimento pugnado pelo Tribunal “a quo” qualquer sustentação na legislação aplicável, sendo, inclusive, contrário à mesma, impõe-se o entendimento de que o mencionado prazo de 10 anos se conta a partir da aprovação de modelo do IPQ

  6. Sendo o referido despacho nº 11 037/2007 de aprovação do modelo nº 211.06.07.3.06 datado de 24 de abril de 2007, o qual foi publicado em Diário da República, 2.ª série, nº 109, em 06 de Junho de 2007, é inequívoco que caducou em 06 de Junho de 2017 a aprovação do modelo de alcoolímetro da marca DRAGER, ALCOTEST 7110 MKIII P, pelo que em 02 de agosto de 2019, data em que o aparelho foi usado para medir a concentração mássica de álcool no sangue do recorrente, o modelo do aparelho utilizado encontrava-se já caducado

  7. Razão pela qual, a prova obtida mediante o referido alcoolímetro não poderia ser considerada para efeitos de condenação do recorrente, uma vez que, não foram respeitadas as normas legais às quais se encontra vinculado este meio de obtenção de prova. Consubstanciando essa consideração clara violação das normas legais constantes nos art.º 6.º, nº 3 da Portaria 1556/2007 e 14.º, nº 1 e 2 da Lei nº 18/2007, e por conseguinte, encontra-se ferida de nulidade, nos termos do art.º 125.º do CPP

  8. O Tribunal “a quo”, talvez por saber que o entendimento de que o mencionado prazo de 10 anos se deve contar do despacho de aprovação de uso da ANSR não encontra qualquer sustentação legal, considerou a possibilidade de o modelo de aprovação do aparelho já ter caducado, relativamente ao que considerou ser “também entendimento dominante da Jurisprudência dos Tribunais Superiores que ainda que o prazo de validade de dez anos tivesse sido excedido relativamente ao aparelho que foi usado no teste, não se verifica a sua nulidade, porquanto não é a homologação do aparelho, mas a sua submissão a operações de verificação, que atesta a fiabilidade do resultado obtido (cfr. Acórdão da Relação do Porto de18-12-2018)”. No entanto, não se trata de ser o entendimento da jurisprudência dominante, é esse o entendimento que resulta da lei, máxime do art.º 2.º, nº 7 do Decreto-Lei nº 291/90 e do art.º 10.º da Portaria 1556/2007, nos quais se estabelece, respetivamente que “os instrumentos de medição em utilização cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação aplicáveis” e que “os alcoolímetros cujo modelo tenha sido objecto de autorização de uso, determinada ao abrigo da legislação anterior, poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis da verificação periódica”

  9. Sucede que, a procedência da nulidade arguida deverá manter-se, não obstante o disposto no art.º 2.º, nº7 do Decreto-Lei nº 291/90 e no art.º 10.º da Portaria nº 1556/2007, pois, como explicitado nos arts.º 42º a 57º das alegações, essas disposições não têm aplicação no casu sub judice, uma vez que, têm subjacente uma lógica de continuidade, ou seja, de que a caducidade do modelo do aparelho só não afetará os aparelhos que hajam sido objeto de primeira verificação antes da data em que expira o modelo de aprovação e que se mantenham em utilização após esse período, o que não sucedeu no presente caso, dado que o concreto aparelho foi sujeito, após a sua caducidade, a primeira verificação, por motivo de violação do sistema de selagem, o que implicou uma retirada do mesmo de utilização e subsequente reintrodução

  10. Não tendo aplicação o disposto nos acima citados arts.º 2.º, nº 7 e 10.º, aplica-se a regra geral no sentido de que o modelo dos aparelhos são válidos por 10 anos, não podendo ser utilizados os aparelhos após a caducidade do modelo (art.º 2.º, nº 2 do Decreto-Lei nº 291/90, de 20 de setembro), pelo que comprovada a caducidade do modelo do aparelho deverá a arguida nulidade ser julgada procedente (V. arts.º 59º a 64º das alegações)

  11. Impondo-se conclusão similar à da Relação de Évora, no Acórdão de 18 de Novembro de 2010 (proc. nº 273/09.3GELSB.E1.6F, disponível in www.dgsi.pt), no sentido de que “tratando-se de prova legal vinculada à existência de homologação e aprovação, inexistindo esta, o valor probatório do alcoolímetro é nulo e, sendo esse o único elemento de prova que conduziu à prova dos factos, haverá que deles absolver o Arguido”

  12. Revela-se deste modo evidente que andou mal o Tribunal “a quo” ao julgar improcedente a nulidade arguida, tendo a todo o custo tentado valorar a prova obtida com desrespeito pela legislação aplicável, o que não se pode permitir! n) Ademais, da análise da sentença “a quo” resulta ainda que a mesma adotou um raciocínio incoerente, dado que apesar de não ter considerado que a verificação de 10-10-2019 consubstanciou uma verdadeira primeira verificação para efeitos de apreciação da questão da caducidade do modelo, já o considerou no que concerne ao EMA a efetuar ao valor registado no aparelho, pois manteve o desconto 5% efetuado pela GNR, dado que, à TAS de 2,62 g/l registada foi considerada para efeitos de imputação dos factos ao arguido a TAS de 2,489 g/l e não 2,410 g/l, TAS a considerar no caso de se proceder ao desconto de 8% (V. arts.º 66º a 73º das alegações)

  13. Ademais, a circunstância de que a referida verificação de 10-10-2018 correspondeu a uma verdadeira primeira verificação, e que tal designação não lhe foi atribuída por lapso, é o facto de em 21-10-2019, o aparelho em causa ter novamente sido sujeito a verificação pelo IPQ, o que fora considerado na sentença “a quo”, e essa ter merecido a designação de verificação periódica, o que denota que não é, inadvertidamente, atribuída a todas as verificações a designação de primeira verificação

  14. Tal circunstancialismo legitima o recorrente a entender que o Tribunal “a quo” apenas parece ter considerado que a verificação de 10-10-2018 não corresponde a uma primeira verificação para efeitos de aplicação de algumas disposições legais, diga-se, as mais desfavoráveis, mas já não para aplicação das mais benéficas

    Subsidiariamente e sem conceber, q) Relativamente à motivação da matéria de facto, também não andou bem o Tribunal “a quo”, desde logo, ao valorar negativamente a circunstância de o recorrente à data dos factos se encontrar a tomar medicação por virtude de sofrer de depressão, pois, o recorrente fez prova junto do Tribunal “a quo” de que estava a tomar os referidos medicamentos para demonstrar que estava a ser medicado para a depressão de que padecia, pretendendo-se sim demonstrar que esse quadro clínico afetou de decisão e discernimento (e não os medicamentos que estava a tomar por indicação médica)

  15. O facto de se encontrar a tomar medicação, revela que o recorrente padecia de depressão, conforme comprovado nos autos, o que, apesar de não ter sido considerado pelo Tribunal “a quo” determina irremediavelmente uma afetação da capacidade de decisão, do discernimento, do sentido de perceção dos atos, pois provoca alterações da concentração, memória e raciocínio, bem como, dores de cabeça, perturbações digestivas, dor crónica, mal-estar geral, o que é apreensível por uma simples pesquisa sobre os sintomas de tal doença, devendo ser este o facto a considerar para efeitos dos presentes autos e não a simples circunstância de se encontrar medicado e optar por iniciar a atividade de condução

  16. Ainda no que concerne à motivação da matéria de facto, considerou, sem qualquer justificação para tal, que o Tribunal “a quo” que o arguido “reconhece...

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