Acórdão nº 1041/11.8BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelLUÍSA SOARES
Data da Resolução22 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I – RELATÓRIO A Fazenda Pública, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a oposição à execução deduzida por L..........

, contra a decisão de reversão proferida nos processos de execução fiscal nºs .......... e aps., .......... e aps., .......... e aps., e .......... e aps., instaurados originariamente contra a sociedade “A.........., Lda.”, por dívidas tributárias no montante total de € 66.102,90.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos: “I. A douta sentença a quo, com a ressalva da devida vénia, fez uma errónea valoração da prova produzida, a qual não avaliza o julgamento da matéria de facto no sentido em que foi efectuado.

II. Vem a Oponente responsabilizada pelo pagamento subsidiário das dívidas em cobrança coerciva, relativamente às quais é devedora originária a sociedade “A…….., Lda”, por o prazo de pagamento voluntário destas ter ocorrido durante o período da respectiva gerência, nos termos expressos na alínea b) do nº 1 do art.º 24º da LGT.

III. Não se pode ter como satisfeito o ónus legal que impende sobre a Oponente, de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento dos impostos em causa na execução, quando os factos constitutivos desta responsabilidade - falta de pagamento e/ou entrega do imposto – ocorreram em data anterior à data da ocorrência do facto que determinou a alegada incapacidade da Oponente para o exercício das funções de gerência da sociedade devedora originária.

IV. Com efeito, arguindo a Oponente que, na sequência de um acidente de que foi vítima, ocorrido em 02-04-2008, se viu incapacitada a partir desta data, para conduzir os destinos da sociedade e nada diz relativamente ao período temporal anterior àquela mesma data, tal significa que nenhuma prova fez de que não foi responsável pela insuficiência de património societário para pagamento das dívidas cujos prazos legais de pagamento são anteriores à data em que, alegadamente, sofreu o acidente.

V. Assim e quanto a estas dívidas, apenas se pode concluir ser a Oponente parte legítima na execução.

VI. Porém, importa ainda considerar que da prova produzida pela Oponente, não se pode considerar como inequivocamente demonstrado que esta tenha deixado de exercer funções de gerência efectiva da sociedade após a data de 02-04-2008, motivo pelo qual, ainda que algum prazo de pagamento voluntário das dívidas terminasse para além desta data, sempre se mostrariam verificados na pessoa da Oponente os pressupostos da responsabilidade subsidiária pelo respectivo pagamento.

VII. Deve assim ser revogada a douta Sentença recorrida, por padecer de erro de julgamento, consubstanciado na errada interpretação dos preceitos legais convocados para sustentar a extinção das execuções contra a Oponente e na incorrecta apreciação e valoração da matéria de facto, ao não cuidar que os factos constitutivos da responsabilidade da Oponente se verificaram em data anterior - e, nalguns casos bastante anterior - à data a partir da qual julgou como cessada a responsabilidade daquela, motivo pelo qual, o julgamento de que a Oponente não teve culpa pelo não pagamento das dívidas exequendas não tem qualquer suporte factual.

VIII. A sentença recorrida fez, assim incorrecta interpretação dos factos e consequente aplicação da lei, violando o disposto nos art.ºs nº 24º, nº 1, alínea b) e 74º da LGT, e 342º do CC.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por Acórdão que declare a oposição improcedente, com as devidas e legais consequências.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO, FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”.

* * A Recorrida contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões: “A. O presente recurso foi interposto pela Fazenda Pública contra sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, no âmbito do processo n.° 1041/11.8BELRS, que julgou procedente a oposição judicial apresentada pela ora Recorrida por considerar que "(...) não foi por culpa da Oponente que o património da sociedade devedora originária se tornou insuficiente para a satisfação das dívidas tributárias, razão pela qual a oposição tem que proceder com base neste fundamento, quedando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas nos Autos nos termos do artigo 608° n° 2 do CPC, ex vi do artigo 2º al. e) do CPPT".

B. Não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, a Fazenda Pública vem agora recorrer alegando "(...) a sentença do douto Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e consequente erro de direito, entendendo a recorrente Fazenda Pública, por estas razões, que a Oponente deve ser julgada parte legítima e, em consequência, ser julgada totalmente improcedente a oposição" (cfr. artigos 24.° das alegações de recurso da Fazenda Pública).

C. A impugnação da decisão de lª instância relativa à matéria de facto, depende do cumprimento do ónus de alegação constante do artigo 640.° do Código de Processo Civil aplicável ex vi artigo 2.°, alínea e) do CPPT.

D. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem entendido que o incumprimento daquele ónus determina a imediata rejeição do recurso (Neste sentido veja-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15/05/2014, proferido no âmbito do Processo n.° 07508/14).

E. No caso em apreço, não tendo a Fazenda Pública cumprido o referido ónus, deverá presente recurso ser imediatamente rejeitado, quanto ao erro de julgamento da matéria de facto.

F. No respeita ao erro de julgamento de direito, também, carece de fundamento a pretensão da Recorrente.

G. O artigo 24.°, n.° 1 da LGT estabelece que: "Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: (...) b) pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”.

H. A luz do regime supra exposto, a responsabilidade subsidiária dos gerentes de sociedades de responsabilidade limitada depende fundamentalmente, de acordo com o citado artigo, do exercício de facto das funções de gerência e da existência de culpa do gerente na insuficiência do património da sociedade devedora originária para cumprir as dívidas fiscais.

I. A Fazenda Pública não alegou nem provou os factos que demonstrem o exercício da gerência de facto da ora Recorrida, como lhe competia, pelo que deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência (cfr. Sobre esta temática vejam-se, entre outros, o Acórdão do STA de 11/03/2009, proferido no processo n.° 0709/08, o Acórdão do STA de 02/03/2011, que julgou o processo n.° 0944/10 e o Acórdão do TCAN de 10/03/2016, proferido no âmbito do processo n.° 0163/06.7BEBRG).

J. Da factualidade dada como assente na sentença controvertida resulta que a Recorrida, em virtude das lesões sofridas no acidente, designadamente do traumatismo craniano com perda de conhecimento e da lesão medular que a deixou paraplégica, estava incapacitada para o exercício de quaisquer funções de gerência (cfr. Alíneas FF) a NN) do probatório da sentença recorrida).

K. "Após o acidente, a Oponente passou a necessitar de terceiros para se lavar, vestir e para realizar as tarefas indiferenciadas do dia-a-dia. Bem longe de ter condições para exercer as suas funções de gerente da A........., Lda. " (cfr. página 10 da sentença recorrida), pelo que se conclui que a ora Recorrida não exerceu a gerência de facto da sociedade devedora originária, e, por isso, não se verifica um dos pressupostos previstos no n.° 1 do artigo 24.° da LGT - o exercício de facto das funções de gerente - para que a reversão ocorra.

L. Para a verificação da responsabilidade subsidiária é ainda necessário que se demonstre a culpa do gerente na diminuição do património da sociedade devedora originária.

M. Atendendo a que a reversão das dívidas fiscais foi feita com base na alínea b) do n.° 1 do artigo 24.° da LGT, cabia à Recorrida demonstrar que não teve culpa na insuficiência do património da sociedade devedora originária para a satisfação das dívidas revertidas, por forma a ilidir a presunção de culpa prevista no referido preceito legal.

N. A jurisprudência dos Tribunais Superiores, entre outros, o Tribunal Central Administrativo Norte, no seu Acórdão de 26/10/2017, proferido no âmbito do processo n.° 001265/07.OBEVIS, tem entendido que "Para ilidir a presunção legal de culpa, deverá o oponente alegar os factos relevantes e demonstrativos das iniciativas que um gestor diligente sempre empreenderia em circunstâncias adversas de modo a evitar, ou minimizar, o impacto negativo de eventuais factores externos no desenvolvimento da actividade social. Para afastar a presunção, não exige a lei o sucesso total dessas diligências em evitar o encerramento da sociedade, ou da constituição das dívidas, pois nem tudo é previsível ou controlável e não cabe aos tribunais avaliar o mérito técnico da gestão desenvolvida pelos gerentes nem as capacidades inatas ou técnicas que cada sujeito é portador.

O que se exige é tão só o empenho e actividade dedicada do gestor no pagamento dos créditos fiscais e/ou na preservação do património que há-de, a final, garantir o seu pagamento (o património do devedor constitui a garantia geral dos créditos tributários - art.° 50°/1 LGT e 601° do Código Civil).

E se porventura esse pagamento se tornar impossível, que o gestor demonstre, pelo menos, ter feito tudo o que estava ao seu alcance para que os créditos fiscais não fossem defraudados. Esta exigência é o que se reputa de «condição mínima» para «desculpabilizar» a falta de pagamento de...

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