Acórdão nº 12847/18.7T8SNT.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelLUÍS ESPIRITO SANTO
Data da Resolução27 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção).

I – RELATÓRIO.

Instauraram A [ VIRGÍNIA …] e B [ ….VIEIRA ] a presente acção declarativa de condenação contra C [ CONDOMÍNIO DO PRÉDIO ….] e D [COMPANHIA DE SEGUROS …..] Alegaram essencialmente: São os únicos e universais herdeiros de E [ Aura ……] , falecida em 2 de Agosto de 2016.

Entre Julho de 2014 e Agosto de 2016 E foi proprietária da fracção designada pela letra “E”, correspondente ao 1.º andar direito, do prédio sito na Rua 25 de Abril, Praceta .., Bloco ….., Ericeira, no qual habitava.

No dia 2 de Agosto de 2016 faleceu E, em consequência da queda da varanda da sua fracção, cujo gradeamento cedeu, fazendo com que a mesma caísse de uma altura de aproximadamente 5 metros, vindo a embater na via pública.

O referido gradeamento, tendo em atenção a sua localização e função, assume a natureza de parte comum, sendo a sua manutenção, resultante do desgaste, da responsabilidade do condomínio.

Apesar de chamadas de atenção da E ao 1.º Réu, acerca do estado da varanda, o mesmo não só não procedeu à sua reparação, como nada fez para verificar a extensão da anomalia existente e/ou intensidade do potencial perigo.

E sempre que se deslocava à varanda fazia-o com todo o cuidado, sendo que o fatídico acontecimento apenas ocorreu porque a mesma se desequilibrou.

Concluem pedindo a condenação solidária dos Réus a pagarem: - € 192,34 ao Autor B a título de danos patrimoniais, pelo custo com as despesas de funeral; - € 1000 à Autora A, a título de danos patrimoniais, relativamente ao custo de reparação da varanda; - €50 000 aos Autores pelo dano não patrimonial decorrente da perda do direito à vida da sua mãe, E; - € 12500 a cada um dos autores pelos danos não patrimoniais sofridos com a morte da sua mãe; - € 35000 pelo dano decorrente do sofrimento da própria vítima, a qual teve a perfeita percepção da iminência da morte.

Devidamente citadas, vieram as Rés contestar.

Alegou o 1.º Réu: Aquando da última reparação das varandas do prédio, em 2013, ficou acordado entre todos os condóminos que, a partir de então, a manutenção das varandas passaria a ser da responsabilidade de cada fracção, facto esse do qual foi dado conhecimento à falecida E na Assembleia de Condóminos de 29 de Agosto de 2015, sendo que a mesma se conformou com tal esclarecimento, não tendo apresentado qualquer outra reclamação escrita ou oral à administração do condomínio.

Atento o silêncio da E, o 1.º Réu convenceu-se que a mesma havia procedido à reparação do gradeamento, pelo que se o mesmo não foi reparado tal se deveu a inércia da E que nem reparou nem realizou qualquer outra diligência junto da Administração no sentido da resolução da situação, criando a convicção de que a situação se encontrava resolvida.

Até ao dia de hoje os Autores não procederam à reparação /reposição do gradeamento, nem contactaram a Administração para o efeito, criando desta forma um risco acrescido para a segurança de quem utiliza a fracção.

Impugna ainda os danos invocados pelos Autores.

Alegou a 2.ª ré: A falecida E conhecia a situação de risco de queda da varanda do prédio e, ainda assim, abeirou-se da grade, colocando-se numa situação de perigo para si e para terceiros, devendo por isso também suportar as consequências da sua incúria.

Em todo o caso alega a 2.ª Ré que sempre se verifica uma causa de exclusão da sua responsabilidade, nos termos do art. 3.º, das condições gerais da apólice.

Os valores indemnizatórios peticionados pecam por exagero, tendo em atenção, nomeadamente, o distanciamento e falta de apoio dos Autores à sua mãe.

Terminam assim requerendo a improcedência da acção e a consequente absolvição do pedido.

Procedeu-se ao saneamento dos autos.

Realizou-se audiência de julgamento.

Foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente, condenando os Réus C e D. no pagamento: a) aos Autores da quantia de € 38 000 (trinta e oito mil euros) a título de dano morte e de € 8 000,00 (oito mil euros), a cada um, a título de danos não patrimoniais, b) ao Autor B da quantia de € 192,34 (cento e noventa e dois euros e trinta e quatro cêntimos) a título de danos patrimoniais, na vertente de dano emergente do sinistro; c) à Autora A da quantia de € 405,90 (quatrocentos e cinco euros e noventa cêntimos) a título de danos patrimoniais, na vertente de dano emergente, indemnização essa pela qual respondem ambas as Rés, sendo a 2.ª Ré apenas até ao limite de € 9000,00 (cobertura do seguro, deduzidos os 10% da franquia) (cfr. fls. 127 a 137).

Apresentaram os RR. recurso desta decisão, os quais foram admitidos como de apelação.

Juntas as competentes alegações, formulou o Réu C as seguintes conclusões: 1. A douta sentença sub judice julgou a acção, intentada por A e B, parcialmente procedente por parcialmente provada e, em consequência, condenou o aqui Recorrente no pagamento da quantia de € 38.000,00 (trinta e oito mil euros) a título do dano morte aos AA., e, a cada um dos AA., a quantia de €8.000,00 (oito mil euros) a título de danos não patrimoniais; além disso condenou o aqui Recorrente a pagar €192,34 (cento e noventa e dois euros e trinta e quatro cêntimos) ao A. B, e a pagar €405,90 (quatrocentos e cinco euros e noventa cêntimos) à A. A, a título de danos patrimoniais, na vertente de dano emergente.

  1. Para tanto, considerou provados, com relevo para o presente recurso, os seguintes factos: a. “A fração autónoma E correspondente ao 1º andar direito do prédio sito na Rua 25 de Abril, Praceta , Bloco .., n.º1, descrita na Conservatória do Registo Predial de Mafra – freguesia da Ericeira, sob o n.º2117/19941104- E, encontrava-se inscrita a favor de E por aquisição em partilha” – ponto 2 dos factos provados; b. “O 1.º Réu é o condomínio constituído em regime de propriedade horizontal onde se situa a fracção referida em 2.” – ponto 3 dos factos provados; c. “Em Assembleia de Condóminos ocorrida em 29 de agosto e 2015, a E informou o 1.º Réu de que o gradeamento metálico da sua fração necessitava de reparação por estar solto.” – ponto 9 dos factos provados; d. “Em momento e em circunstâncias igualmente não concretamente apuradas –mas anteriores à aquisição da fracção pela E – foi falado entre os condóminos que, a partir de então, a manutenção das varandas passaria a ser da responsabilidade de cada fracção.” – ponto 18 dos factos provados; e. “Facto esse que foi referido à E aquando da interpelação que a mesma fez na Assembleia de Condóminos de 29 de agosto de 2015.” – ponto 19 dos factos provados; f. “Após essa Assembleia Geral a E não fez chegar à Administração do condomínio qualquer reclamação escrita, telefónica ou pessoal.” – ponto 20 dos factos provados; e, g. “No dia 2 de agosto de 2016 faleceu E, em consequência de uma queda da varanda da sua referida fracção.”.

  2. Constituía objecto do litígio, conforme resulta do Despacho Saneador proferido a fls. …, a determinação da classificação da varanda como parte comum ou própria da fracção autónoma, importando em função dessa classificação determinar sobre quem recaía a obrigação da sua reparação. Para o caso de se concluir que era uma parte comum e a responsabilidade recaía sobre o condomínio, aferir os danos patrimoniais e não patrimoniais e sua quantificação.

  3. Decidiu o Tribunal a quo que a varanda e seu gradeamento eram partes comuns do edifício, porquanto «Entre as partes comuns, de natureza obrigatória, destaca-se “o solo, bem como os alicerces, colunas pilares, paredes mestras e todas as partes restantes que constituem a estrutura do prédio”, atento o estipulado pelo artigo 1421.º, n.º1, a), do CC. Na verdade, o gradeamento de uma varanda, na propriedade horizontal é propriedade dos condóminos … Trata-se de uma parte, forçosamente, comum, pela função capital de elemento estético da fachada do imóvel que, no interesse colectivo, exerce em relação a toda a construção.».

  4. Acrescentando “por outro lado, não se encontrando o gradeamento especificado como privativo, no título constitutivo da propriedade horizontal, todas as coisas que não estejam afectas ao uso exclusivo de um deles, devem ainda as mesmas ser consideradas, presumivelmente, como partes comuns e, portanto, compropriedade de todos os condóminos, com possibilidade de afastamento dessa presunção, nos termos do estipulado pelo artigo 1421.º, n.º2, e), do CC.”; 6. Prosseguindo “Quer isto dizer que deixam de ser comuns aquelas coisas que estejam afectadas ao uso exclusivo de um dos condóminos, bastando, para o efeito, a fim de afastar a presunção de comunhão, uma afectação material, uma destinação objectiva, mas já existente à data da criação do condomínio, embora não se exija que ela conste do respectivo título da propriedade horizontal.”; e, 7. Concluindo “Revertendo ao caso em exame, constata-se, todos os elementos fazem parte integrante da fachada do prédio, assente nas paredes exteriores do prédio, razão pela qual não podemos falar de uma afectação material, no sentido da utilização exclusiva do gradeamento da varanda pela proprietária. (...) Concluindo: as estruturas metálicas das varandas existentes nas fachadas de um prédio, integram essa mesma fachada sendo por isso parte comum do imóvel (artigo 1421.º n.º1 a) do CC).”.

  5. S.m.o., andou mal o Tribunal a quo, porquanto interpretou a norma constante no art.1421.º, n.º1, al. a) do CC, misturando e confundindo duas realidades distintas: a parte estrutural do prédio e a parte estética do prédio.

  6. Dispõe o art.1421.º, n.º1, al. a) do CC que “São comuns as seguintes partes do edifício: a) o solo, bem como os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as partes restantes que constituem a estrutura do prédio;” – negrito e sublinhado nossos.

  7. Se consultarmos a definição de “estrutura” obtemos, nomeadamente, “o que permite que uma construção se sustente e se mantenha sólida” – conforme definição constante e disponível no endereço electrónico https://dicionario.priberam.org/.

  8. Donde, as...

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