Acórdão nº 2189/18.3T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelL
Data da Resolução22 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I RELATÓRIO (seguindo de perto o elaborado em 1ª instância).

X, Lda., NIIPC ………, com sede no Largo ...

, n.º ..

, Barcelos, instaurou a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra M. D., NIF …….., residente no Largo …, Barcelos, P. F., residente na Rua …, Barcelos, e J. F., residente na Travessa …, Barcelos, enquanto Herdeiros da Herança Ilíquida a Indivisa aberta por óbito de A. V., pedindo que a ação seja julgada procedente e, em consequência que: a) os réus sejam condenados, solidariamente, a repor o imóvel arrendado no estado em que se encontrava aquando da sua intervenção, nomeadamente a reparar o linóleo recortado no chão da fração, a recolocar as paredes divisórias na fração, a recolocar a calha técnica e respetivos cabos elétricos com todas as tomadas e iluminarias desde o quadro elétrico até toda a zona circundante; b) os réus sejam condenados, solidariamente, a pagar à Autora o valor de todas as rendas que esta se viu obrigada a suportar com um novo local arrendado, nomeadamente as rendas referentes aos meses de março de 2017 a outubro de 2018, num total de vinte meses à razão de 250,00 € (duzentos e cinquenta euros) mensais, o que perfaz presentemente um total de 5.000,00 € (cinco mil euros) de rendas já pagas; c) os réus sejam condenados, solidariamente, a pagar à Autora o valor de todas as rendas mensais que esta continuará a suportar como o novo arrendado, no valor de 250,00 € mensais, a calcular até ao momento que os réus reponham o imóvel no estado em que se encontrava antes da sua intervenção no mesmo, nomeadamente através da realização das obras descritas na alínea a) do petitório da ação; d) os réus sejam condenados, solidariamente, a pagar à Autora a quantia de 10.000,00 € (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais; e) os réus sejam condenados, solidariamente, a pagar à Autora a quantia de 50,00 € (cinquenta euros) diários por cada dia em que as obras mencionadas na alínea a) se mantenham por realizar e que impedem a Autora de laborar no arrendado, a contar desde a citação; f) os réus sejam condenados, solidariamente, a pagar à Autora os correspondentes juros de mora sobre cada uma das individualizadas quantias, à taxa de juro legal, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Para tanto alega, em síntese, que é arrendatária de uma fração que identifica, sendo senhorios os réus, na qualidade de herdeiros do falecido senhorio A. V.. Sucede que, no dia 02.02.2017, ocorreu um incêndio no restaurante situado por baixo da fração arrendada, em virtude do qual a fração arrendada ficou com muito fumo. Contudo, o incêndio não provocou danos na instalação elétrica nem no imobiliário existente na fração.

Os réus, enquanto proprietários do prédio, assumiram as obras de reparação e conservação do imóvel com vista a repô-lo no estado em que se encontrava.

Com a execução de tais obras, os réus acederam à fração arrendada à autora, onde retiraram as paredes divisórias amovíveis, cortaram o linóleo e retiraram e danificaram toda a calha técnica e respetivos cabos elétricos. Com a conduta dos réus, a fração arrendada, que inicialmente apenas necessitava de uma limpeza geral, ficou parcialmente destruída, sem condições de uso, pelo que a autora ficou impossibilitada de continuar a laborar na fração arrendada a partir desse momento.

Os réus foram interpelados para reparar tais danos, mas recusam fazê-lo, dizendo que deve ser a autora a reparar os danos existentes no interior da fração.

Por força do sucedido, a autora ficou impossibilitada de utilizar a fração e como tal teve que arrendar outro espaço, com o qual despende mensalmente a quantia de €.250,00 e que à data da propositura da ação ascendiam já a €.5000,00. Acresce que a autora teve de pesquisar um novo imóvel para laborar com as inerentes preocupações e perdas de tempo, e quando encontrou o imóvel com as características desejadas, teve de fazer obras necessárias para que pudesse iniciar a laboração, bem como teve de efetuar as mudanças. Teve ainda de comunicar aos seus clientes a mudança de instalações, para além de que tal situação causou uma afetação na imagem da autora que se viu obrigada a deslocar-se de um dos principais arruamentos da cidade para uma zona deslocada do centro. Tudo isto causou danos não patrimoniais à autora que esta avalia em €.10.000,00.

*Os réus contestaram e deduziram reconvenção.

A título de exceção os réus invocam a ilegitimidade dos réus P. F. e J. F., uma vez que a fração dada de arrendamento pertence exclusivamente a M. D., por força da partilha efetuada na sequência do óbito de A. V..

Por impugnação, os réus defendem que o incêndio ocorrido na fração do rés-do-chão se propagou a todo o rés-do-chão bem como ao teto do mesmo que é também piso da fração arrendada. Acresce que o incêndio danificou parte da instalação elétrica e do pavimento da fração arrendada à autora. Assim, nenhuma responsabilidade pode ser assacada aos réus no incêndio, nem nos danos que daí resultaram para a fração arrendada.

Acresce que a reparação levada a cabo pela ré M. D., foi realizada após prévio acerto com o legal representante da autora, que acompanhou a execução da reconstrução e limpeza do edificado. A reparação foi realizada pela ré com a máxima urgência, para que os inquilinos pudessem retomar a laboração o mais rapidamente possível. A autora foi esclarecida de que a proprietária não iria reparar, nem assumiria qualquer responsabilidade pela reparação dos danos da fração e recuperação do linóleo, das calhas, do sistema elétrico e das divisórias, cabendo essa reparação à autora. Assim, a pretensão da autora carece de qualquer fundamento.

Acresce que a autora, com algumas centenas de euros e em poucos dias poderia ter reparado e limpo a fração, pelo que o seu pedido, constitui um abuso do direito.

E depois das reparações, os réus não tinham acesso à fração, pelo que a pretensão da autora constitui uma censurável tentativa da autora enriquecer às custas dos réus, o que deve ser avaliado como eventual litigância de má fé.

Em reconvenção, alegam que a autora só ficou temporariamente impossibilitada de utilizar o arrendado, mas o mesmo não ficou definitivamente destruído, estando na disponibilidade da autora, pelo menos, a partir de abril de 2017. Mas a autora, em vez de reparar a fração, cancelou os contratos de fornecimento de água, luz e telecomunicações e abandonou o local arrendado sem justificação e até ao presente. Deslocou toda a maquinaria e documentação para outro local que diz ter arrendado ao seu sócio gerente. O local arrendado permanece encerrado de forma continua e interrupta há mais de um ano, pelo que há fundamento para pedir a resolução contratual.

Acresce que o contrato de arrendamento em questão transitou para o novo regime de arrendamento urbano, e foi acordado entre as partes que o mesmo teria a duração de 5 anos; e decorrendo o prazo de 5 anos de 09.01.2014 a 09.01.2019, a ré M. D. comunicou à autora, por carta de 04.01.2018, a sua oposição à renovação, pelo que a denúncia do arrendamento produz efeitos a 09.01.2019. Assim, se o contrato de arrendamento não cessar por qualquer forma admitida por lei, em 09.01.2019, o mesmo essa por ter atingido o termo da atual renovação acordada.

Terminam, pedindo que: a) seja declarada a ilegitimidade dos réus P. F. e J. F., exceção dilatória que, nos termos dos artigos 576º, n.º 1 e 2 e alínea e) do artigo 577º, todos do CPC, obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa e deverá dar lugar à absolvição da instância quanto a estes mesmos réus; b) A ação seja julgada totalmente não provada e improcedente, absolvendo-se os réus dos pedidos formulados, com custas pela autora.

Seja a reconvenção julgada provada e procedente e, em consequência, que: c) seja decretada a resolução do contrato de arrendamento em causa nos autos e que tinha por objeto o primeiro andar do imóvel de que é proprietária a ré M. D., com os fundamentos alegados, sendo a autora condenada a despejar o local arrendado e a restituir este à sua proprietária; d) assim não se entendendo e em alternativa, deve ser declarado e a autora condenada a tal reconhecer que aquele contrato de arrendamento tem o seu termo em 09.01.2019, ou noutra data em que o Tribunal o venha a declarar, por oposição à sua renovação e denúncia legal por parte da proprietária, devendo a autora ser condenada a restituir o local arrendado, despejado de pessoas e coisas, com custas pela autora.

*A autora veio apresentar réplica, impugnando a factualidade alegada pelos réus e repetem que a fração apenas ficou inapta para a autora exercer a sua atividade por força da conduta dos réus, não sendo a impossibilidade de uso da mesma decorrente do incêndio. E por isso é sobre os réus que impende a obrigação de recolocar a fração no estado em que se encontrava antes da sua intervenção. A destruição dos elementos da fração e a subsequente inércia em repor a situação foram factos voluntários dos réus que tiveram a clara intenção de impedir a autora de continuar a laborar no arrendado, coagindo-a a abandonar a fração e a fazer cessar o contrato de arrendamento sem indemnização, o que resulta evidente da reconvenção, pois os réus alegam o encerramento do arrendado durante um ano de forma ininterrupta. Tal conduta dos réus, constitui um claro abuso do direito.

Quanto à oposição à renovação, não tendo havido acordo entre o senhorio e o arrendatário para que o novo contrato fosse submetido ao NRAU, só em 09.01.2019, é que o senhorio poderia promover a transição do contrato para o NRAU e só então se iniciaria o contrato de arrendamento por um período de 5 anos, pelo que o mesmo apenas cessaria em 09.01.2024. Sucede que, entretanto, o regime do contrato de arrendamento sofreu nova alteração legal, pelo que só em 2024, é que o senhorio pode promover a transição para o NRAU e como tal o contrato de arrendamento não cessará...

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