Acórdão nº 64/01.0TALLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | ANA BRITO |
Data da Resolução | 06 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1.
No Processo Comum Singular n.º 64/01.0TALLE do Juízo Local Criminal de Loulé – Juiz 3, foi proferido despacho a declarar “a prescrição da dívida à Segurança Social que consubstancia causa de pedir nos presentes autos” e a dar “sem efeito a continuação da audiência de discussão e julgamento, determinando-se o oportuno arquivamento dos autos”.
Inconformado com o decidido, recorreu o Instituto da Segurança Social, I.P., concluindo da forma seguinte: “1. O recorrente viu-se privado de valores a que, por força da Lei, tinha direito, ou seja, a conduta dos arguidos foi causa direta e necessária de tal privação e, deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos, no montante de €85.424,29 acrescido de juros de mora à taxa legal, referente à soma das quotizações deduzidas nas remunerações pagas aos trabalhadores e que não foram entregues à Segurança Social.
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O pedido de indemnização civil deduzido, é fundado na prática de um crime (abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punido pelos artigos 107.º e 105.º do RGIT), e consubstanciado no facto de terem sido deduzidas no valor das remunerações devidas a trabalhadores, quotizações legalmente devidas e não entregues à Segurança Social, no prazo legal e é deduzido no processo penal respetivo por força do Princípio da Adesão, só o podendo ser em separado nos casos previstos na Lei (artigo 71.º do CPP). Pelo que, o que está em causa, nos presentes autos é a responsabilidade civil dos arguidos, por facto ilícito, e não uma mera responsabilidade obrigacional relativa a quotizações não pagas.
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O ISS, IP encontra-se lesado no seu património, na medida em que não deram entrada nos cofres da Segurança Social, as quotizações no montante total de €85.424,29, ao qual deverão acrescer juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento. É por isso notório que a conduta ilícita dos demandados – não entrega das quantias descontadas das remunerações pagas aos trabalhadores da sociedade arguida, é causa direta e necessária do prejuízo patrimonial ao demandante ISS, IP.
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O valor do dano causado à Segurança Social corresponde, em regra, ao valor da contribuição em falta, mas a causa do dano é a prática do crime de Abuso de Confiança contra a Segurança Social. Assim, o objeto do pedido Cível deduzido não é a dívida tributária, mas sim os prejuízos, geradores de responsabilidade civil, provocados pelos demandados e emergentes da prática do crime de Abuso de Confiança à Segurança Social e cuja responsabilidade é determinada e regulada de acordo com as regras do Código Civil, para o qual remete o art. 129.º do CP e 3.º do RGIT.
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Acresce ainda que o prazo de prescrição ordinária é de 20 anos, nos termos do disposto no artigo 309.º do CC, sujeito a determinadas vicissitudes que condicionam o regular decurso do prazo prescricional, desde o seu início até à sua consumação, interrompendo-o ou suspendendo-o e o prazo de 20 anos conta-se a partir do facto danoso (artigo 498.º CC).
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Deste modo, salvo melhor e douta opinião, deveria a douta decisão proferida, ter determinado o prosseguimento dos autos.” O Ministério Público respondeu, concluindo: “Se os montantes que constituem a causa de pedir estão extintos por prescrição, não podem agora, em processo civil enxertado em processo penal, ser exigidos e cobrados coercivamente, donde o Ministério Público, entender, que o presente recurso não merece qualquer provimento, mantendo-se na íntegra o douto despacho recorrido.” O arguido (...) também respondeu, concluindo: “1. Atendendo a que prescreveu o procedimento criminal contra o arguido, deixou de ser possível comprovar a prática do crime.
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Não se comprovando o facto ilícito criminal, o ressarcimento pelos eventuais danos provocados, não se enquadra nos prazos da responsabilidade civil por factos ilícitos mas sim no regime previsto no artigo 187.º, n.º 2, do Código Contributivo, encontrando-se prescritas as referidas dívidas à Segurança Social.
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Mesmo que assim não se entendesse, o que se admite por mera hipótese académica, sempre teria ocorrido a prescrição do pedido de indemnização civil formulado pela demandante por força do decurso do prazo de 5 anos (art..498, n.º 1 e n.º 3 do Código Civil).” Neste Tribunal, o Sra. Procurador-geral Adjunto não emitiu parecer, atenta a natureza cível do recurso interposto, e, colhidos os Vistos, teve lugar a Conferência.
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O despacho recorrido é do seguinte teor: “Suscitada oficiosamente a questão prévia da prescrição da dívida tributária em causa nestes autos, o arguido Diamantino e a demandante ISS, IP, pronunciaram-se.
Cumpre apreciar e decidir.
Compulsados os autos, verifica-se que: 1. Os arguidos encontram-se pronunciados pela prática em co-autoria de um crime de abuso de confiança fiscal em relação à segurança social na forma continuada p. e p. pelos artigos 27.º B e 24.º n.º1 do DL 20-A/90 de 15 de Janeiro, na redacção dada pelo DL 394/93 de 24 de Novembro de DL 140/95 de 14 de Junho, por factos ocorridos nos anos de 1995 a 2000 – cfr. pronúncia de fls. 153 e ss.
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Os últimos factos imputados aos arguidos na continuação criminosa remontam a 15.5.2000.
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A acusação foi proferida em 31.05.2001, tendo as notificações da acusação sido remetidas aos arguidos em 08.06.2001 (fls. 246, 247).
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O despacho de pronúncia...
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