Acórdão nº 1016/20.6T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelROS
Data da Resolução24 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na 1ª seção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO R. M.

veio propor contra L. C.

procedimento cautelar de arrolamento dos bens identificados no requerimento inicial.

Como fundamento do seu pedido alegou, em síntese, que viveu durante cerca de sete anos em união de facto com a requerida, união essa que terminou em 8.2.2020.

Na vigência da união de facto, requerente e requerida adquiriram património com dinheiro pertencente a ambos. Porém, todos os bens foram registados apenas em nome da requerida em virtude de o requerente ter pendentes problemas relacionados com avais de uma empresa da qual foi sócio-gerente.

Após a separação, a requerida decidiu arrogar-se proprietária de todos os bens que integram o património comum, pretendendo vendê-los sem prestar contas ao requerente e sem com ele partilhar o produto dessa venda.

Pretende, assim, o requerente que se proceda ao arrolamento dos bens que identificou no requerimento inicial, instaurando o procedimento como preliminar da ação a instaurar contra a requerida para o reconhecimento da compropriedade dos bens.

*Foi dispensado o contraditório da requerida, nos termos do art. 366º, nº 1, do CPC, por se ter considerado que o mesmo colocava em risco sério o fim ou a eficácia da providência.

*Foi proferida decisão que julgou procedente a providência e decretou o arrolamento dos bens.

*Depois de realizado o arrolamento, a requerida foi citada e deduziu oposição.

*Foi proferido despacho que concedeu às partes prazo para se pronunciarem sobre a incompetência do tribunal em razão da matéria, faculdade que ambas usaram.

*De seguida foi proferido despacho que julgou o tribunal incompetente em razão da matéria e absolveu a requerida da instância.

*O requerente não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “1- À data da prolação da Sentença recorrida não se verificavam os pressupostos em que esta se fundou, designadamente a falta do fundamento de conexão p. e p. no artigo 117.º n.º 1 al. c) da LOSJ – Lei 62/2013 de 26-08 na sua atual redação.

2- O recorrente propôs no Juízo de Família e Menores de Viana do Castelo ação de declaração da cessação da relação de União de Facto, atribuição de casa de morada de família, destino dos animais de companhia e liquidação e divisão do património comum, tendo desistido parcialmente da instância quanto a esta última matéria.- Cfr. Requerimento com o registo de entrada 35908922 de 29.06.2020, junto aos autos.

3- A desistência parcial da instância ocorreu em data anterior à prolação desta sentença e decurso do prazo concedido ao requerente para se pronunciar sobre a matéria da exceção de incompetência material, pelo que à data da sentença não existia qualquer pendência relativamente à liquidação e divisão do património de requerente e requerida.

4- Este tipo de ações não deve ser tramitado nos Juízos de Família e Menores, como defende o Tribunal A Quo, mas sim nos Juízos Cíveis, como refere a jurisprudência dominante dos Tribunais Superiores, que não consente, sequer, na aplicação por analogia das regras da partilha subsequente ao divórcio à divisão patrimonial entre os unidos de facto, atenta a natureza especial destas normas.

5- “É ao Juízo central Cível e não ao de Família e Menores que cabe a competência em razão da matéria para conhecer da ação …fundada em enriquecimento sem causa, atinente às quantias que durante a vivência em comum foram entregues pelo A. para a aquisição pela Ré da fracção autónoma e para fazer face a outras despesas com o imóvel”- situação versada no Acórdão da Relação de Lisboa, proferida no processo 195/17.8T8ALM.L1., que em tudo se assemelha à presente.

6- Os efeitos patrimoniais da união de facto estão sujeitos ao regime geral das obrigações e dos direitos reais, pois sendo regras especiais as que regulam as relações entre os cônjuges, estas últimas não compreendem a possibilidade da sua aplicação por analogia.

7- A interpretação contida na Douta Sentença recorrida contraria assim a Jurisprudência unanime dos Tribunais Superiores e viola por errada interpretação e aplicação o disposto nos artigos 122.º n.º 2) a contrario e 117.º al. c) e a) da L.O.S.J.

8- Esta sentença deve ser revogada e substituída por decisão que julgando competente em razão da matéria o Juízo Central Cível para conhecer da ação de que esta pretensão cautelar é preliminar, ordene o prosseguimento dos autos.

Sem prescindir, 9- Não é este o momento para o Tribunal a Quo apreciar a questão do condicionamento da procedência da ação de liquidação e divisão do património, à procedência da ação de declaração da cessação da relação de União de Facto, pois não são esses os pressupostos do decretamento da providência de arrolamento, mas antes os p. e p. no artigo 403.º n.º 1 do CPC, que de resto já foram julgados verificados, nos termos constantes dos autos e sem a audição prévia da requerida, por serem evidentes e notórios.

10- A cessação da relação de união de facto foi confirmada, de resto, pela requerida em sede de oposição – artigos 11.º e 14.º, independentemente da veracidade ou falsidade dos motivos que ali invocou.

11- O Tribunal A Quo, não pode nem deve condicionar o conhecimento da pretensão cautelar à questão da procedência, ou não, da ação de declaração da cessação da relação de união de facto, que precede o conhecimento da ação de liquidação e divisão do património comum, pelo que a desistência da instância quanto a esta matéria na acção instaurada para declaração da cessação da relação de união de facto, não deve conduzir, sem mais, à extinção do procedimento cautelar, por força do disposto no artigo 373.º n.º 1 al. c) do C.P.C.

12- Nada obsta a que o recorrente que não desistiu do pedido de liquidação, mas apenas parcialmente da instância quanto a esta matéria e que não desistiu da instância quanto à questão prévia da declaração de cessação da relação de união de facto, instaure a ação de divisão e liquidação na instância competente que é a central cível, mesmo que a decisão desta venha a ser suspensa por determinação do Juiz, nos termos dos artigos 269.º n.º 1 al. c) e 272.º n.º 1, ambos do CPC, até à decisão da acção pendente no Juízo de Família e Menores, acautelando assim os prazos para a sua instauração atempada e consequentemente a sua caducidade.

13- A procedência da providência cautelar não depende da procedência da ação que vier a ser proposta, mas sim da verificação dos requisitos para o seu decretamento p. e p. no artigo 403.º n.º 1 do CPC: justo receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens.

14- A providência cautelar não depende assim da procedência, mas apenas é dependência da ação à qual interessa a especificação dos bens ou a prova da titularidade dos direitos relativos às coisas arroladas. Cfr. art.º 403.º n.º 2 do C.P.C.

15- O Mm.º Juiz A Quo julgou verificados estes mesmos pressupostos quando decretou o arrolamento sem a audição prévia da requerida e que cumprirá confirmar ou infirmar na produção e avaliação da prova por ela arrolada em sede de oposição.

16- Ao confundir dependência com procedência o Mm.º Juiz A Quo violou por errada interpretação e aplicação o disposto no artigo 403.º n.º 2 do CPC.

17- A decisão recorrida, que viola por errada interpretação e aplicação o disposto nos artigos 403.º n.º s 1 e 2, 373.º n.º 1 al. c), 117.º n.º 1, al. c) e 122.º n.º 2 a contrario da L.O.S.J. e ainda os artigos 96.º al. a), 97.º n.º 2 e 99 n.º 1, estes do CPC, deverá ser assim revogada e substituída por outra que julgando materialmente competente para a lide o Juízo Central Cível de Viana do Castelo, de harmonia com os dispositivos citados, ordene a baixa do processo aquele Juízo, para prosseguimento dos autos, seguindo-se os termos ulteriores à oposição deduzida pela requerida.”*A requerida contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, tendo terminado com as seguintes conclusões: “1.º Não se conforma a aqui Recorrido com o sentido preconizado nas Alegações de Recurso, vindo assim contra-alegar das mesmas, devendo o recurso daquele ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se na íntegra a Douta Sentença recorrida.

  1. Note-se que, quando o Recorrente intentou a providência...

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