Acórdão nº 376/10.1BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução17 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 11.09.2019, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, na qual foi julgada procedente a oposição apresentada por P…..

    (doravante Recorrido ou oponente), ao processo de execução fiscal (PEF) n.º ….. e apensos, que o Serviço de Finanças (SF) de Sintra 2 lhe moveu, por reversão de dívidas de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) dos exercícios de 2005 e 2006 e de coimas, da devedora originária W….., S.A. (antes designada de V….., S.A.).

    O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I - Visa o presente Recurso reagir contra a douta Sentença que julgou procedente a presente oposição, com a consequente extinção do processo de execução fiscal n.º ….. e apensos, contra o Oponente e, a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de custas.

    II - o oponente logrou provar que não foi por ação ou omissão do cumprimento dos seus deveres funcionais, tal como0 plasmado no artigo 64.º do Código das Sociedades comerciais, que a devedora originária ficou numa situação de insuficiência patrimonial, razão pela qual deverá a presente acção ser julgada procedente, por provada a argumentação invocada pelo oponente quanto à sua ilegitimidade enquanto responsável subsidiário, afastando a presunção de culpa que sobre o mesmo recaía, nos termos previstos no referido artigo 24.º, n.º 1, b) da LGT».

    III - Não se conforma a Fazenda Pública com a douta decisão ora recorrida, sendo outro o seu entendimento, já que considera que a presente decisão judicial incorreu em erro de julgamento quer quanto à matéria de facto quer com a aplicação do direito ao facto.

    IV - Conforme resulta dos autos, o Recorrido foi citado nos termos do disposto no artigo 24, n.º 1, alínea b) da LGT, o qual refere: «Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento» (sublinhado nosso).

    V - Em suma, a Fazenda Pública está dispensada de provar a culpa dos gerentes porque beneficia da prova legal plena da presunção dessa mesma culpa (não constituindo esta) o simples ónus de contraprova, que mais não exige do que pôr em evidência a margem de dúvida que possa subsistir sobre o facto.

    VI - A culpa relevante para a imputação da responsabilidade subsidiária é a que deriva da diligência exigível a um gerente, no sentido de cuidar do património da empresa para que esta se mantenha viva, progrida e cumpra com os seus credores, e a não satisfação desse desiderato leva a concluir pela sua omissão.

    VII - A culpa aqui apreciada assenta na conduta funcional imputada ao Recorrido enquanto gerente ou administrador – pelo que a sua culpa reconduzir-se-á aos atos (de representação, disposição e gestão/administração) praticados em nome da devedora originária.

    VIII - À luz daqueles que são os deveres gerais de diligência, dos deveres funcionais de administração, daquela que é a atuação prudente e exigível na defesa dos interesses da sociedade de que é seu administrador, o ora Recorrido não conseguiu ilidir a presunção de culpa que sobre ele recai relativamente à insuficiência patrimonial da devedora originária, pois que não ousou sequer enunciar uma qualquer conduta pró-activa na defesa do interesse da sociedade.

    IX - Como prescreve o artigo 347.º do Código Civil, “A prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objeto”, cabendo ao gerente/oponente a prova positiva e direta contra o facto presumido no artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT.

    X - Face ao exposto e, contrariamente ao expendido na douta sentença, concluiu-se que o ora Recorrido agiu com culpa quando o património da executada se tornou insuficiente para o pagamento das dívidas, logo é parte legitima para a reversão, devendo, por esse facto o PEF n.º …..e apensos, manterem-se na ordem jurídica para cobrança coerciva das dívidas em crise.

    XI - Assim, a douta sentença ora recorrida a manter-se na ordem jurídica, é convencimento da Fazenda Pública que incorreu em erro de julgamento, quer sobre a matéria de facto quer sobre a matéria de direito”.

    O Recorrido não apresentou contra-alegações.

    Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência.

    É a seguinte a questão a decidir:

    1. Há erro de julgamento em virtude de não ter ficado demonstrada a falta de culpa do oponente recorrido? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A.

    O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “A) . A 13.02.2001 foi registada na Conservatória do Registo Comercial de Sintra, a constituição da sociedade “V….., S.A.”, nipc ….., com o objecto social de produção e comercialização de margarinas, óleos alimentares e outros produtos alimentares, compra e venda de imóveis e investimentos imobiliários [cf. cópia da certidão do registo comercial a fls. 155 e 156 do PEF em apenso].

    1. . Em 2005 o crescimento das vendas da sociedade conduziu a um aumento de compras a fornecedores [cf. prova testemunhal].

    2. . As compras identificadas no ponto anterior eram pagas com prazos de dilação grandes [cf. prova testemunhal].

    3. . A sociedade devedora originária teve de recorrer à via judicial com vista à cobrança de dívidas de clientes [cf. a título de exemplo, os documentos juntos à p.i. referentes à acção de processo ordinário n.º 915/2002, que correu termos nas Varas de Competência Mista de Sintra – 2.ª Vara Mista, a fls. 76 e 77 dos autos, acção de execução sumária n.º 5943/03.7TMSNT, que correu termos no Tribunal de Família e Menores e Juízos Cíveis de Sintra – 1.º Juízo Cível, a fls. 78 a 81 dos autos].

    4. . A 21.11.2005 a sociedade devedora originária apresentou um pedido de pagamento em prestações junto do Serviço de Finanças de Sintra 2, em sede do processo de execução fiscal n.º ….., instaurado por dívidas de IVA referentes aos exercícios de 2004 e 2005 [cf. cópia do requerimento a fls. 93 a 106 dos autos].

    5. . Com data de 20.12.2005 a sociedade devedora originária apresentou junto do Serviço de Finanças de Sintra 2 um pedido de cedência de créditos que detinha junto do Ministério da Defesa Nacional – Exército, Manutenção Militar, no valor de €83.328,53 [cf. cópia do requerimento a fls. 107 dos autos].

    6. . Na sequência da penhora do crédito identificado no ponto anterior, veio o Ministério da Defesa Nacional – Exército, Manutenção Militar proceder ao depósito de €73.924,89, aplicado no processo de execução fiscal n.º ….. e apensos [cf. cópia da guia de pagamento a fls. 147 do PEF em apenso].

    7. . A 01.02.2006 o Banco Santander Totta comunicou à sociedade devedora que em cumprimento de determinação do Serviço de Finanças de Sintra 2 havia procedido à inibição da conta de que aquela sociedade era titular junto do banco [cf. cópia do ofício a fls. 108 dos autos].

    8. . A 10.04.2006, contra a sociedade...

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