Acórdão nº 2100/18.1T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 2100/18.1T8STR.E1 Comarca de Santarém Juízo Central Cível de Santarém – Juiz 4 I. Relatório (…) instaurou contra (…) – Companhia de Seguros S.A. a presente acção declarativa de condenação, a seguir a forma única do processo comum, pedindo a final a condenação da demandada no pagamento à Caixa Geral de Depósitos, na sua qualidade de beneficiária designada, dos montantes que se mostrarem em dívida relativamente aos contratos de mútuo por si celebrados com esta entidade, e ainda a restituir-lhe as quantias que entretanto se viu obrigado a pagar à mesma instituição bancária nos montantes de € 2.450,00 e € 10.926,55, acrescidas dos juros vencidos e vincendos, bem como aquelas que vier a pagar e juros respectivos. Em fundamento alegou, em síntese, ter celebrado com a CGD, em conjunto com o seu cônjuge, dois contratos de mútuo nos montantes de € 23.000,00 e € 102.000,00, destinado o primeiro a liquidar o saldo em dívida de um empréstimo antes concedido pelo BII, SA tendo em vista a aquisição de habitação própria, e o segundo a realização de obras no imóvel. Na mesma data, 4 de Fevereiro de 2005, o demandante e o cônjuge celebraram com a Ré contrato de seguro do ramo vida, garantindo o pagamento dos montantes mutuados e em dívida em caso de morte ou invalidez das pessoas seguras. Mais alegou que na sequência de insuficiência renal que lhe foi posteriormente diagnosticada ficou a padecer de uma incapacidade permanente global fixada em 26/11/2013 em 70%, o que determinou a sua passagem à situação de reformado por invalidez. Não obstante tratar-se de risco coberto pelo contrato celebrado, a ré recusa-se a pagar à CGD as quantias em dívida, tendo procedido à anulação do mesmo com o argumento de que aquando da sua celebração já o demandante era portador da doença cuja evolução veio a determinar a sua incapacidade, facto que dolosamente omitiu. Porque tal não corresponde à verdade, deverá ser condenada nos termos peticionados. * Regularmente citada a Ré apresentou contestação, peça na qual sustentou ser o contrato celebrado com o autor anulável nos termos do art.º 429.º do Código Comercial, aqui aplicável, ao que acresce o facto de aquele não se encontrar afectado de uma invalidez absoluta e definitiva, conforme a define o art.º 1.º das condições gerais, carecendo em todo o caso de fundamento a pretensão formulada em segundo lugar, atenta a natureza pecuniária das prestações, caso a contestante fosse de algum montante devedora, o que repudia. O autor respondeu, alegando não ter tido conhecimento, por nunca lhe terem sido presentes, das condições particulares do contrato juntas pela ré. * Tendo os autos prosseguido para julgamento teve lugar a audiência final em cujo termo foi proferida sentença que decretou a condenação da Ré “a pagar à Caixa Geral de Depósitos os montantes que se mostrarem em dívida relativamente aos contratos de mútuo celebrados entre o Autor e o seu cônjuge em 04 de Fevereiro de 2005, até ao limite do capital em dívida que em 03 de Julho de 2015 era de € 17.318,26 e € 76.802,36; a pagar ao Autor as quantias que entretanto este se viu obrigado a pagar à Caixa Geral de Depósitos, que em 29 de Junho de 2018 eram de € 2.450,54 e € 10.926,55, acrescidas de juros vencidos e vincendos contados à taxa legal desde a citação até integral pagamento, e ainda as prestações que o Autor entretanto for pagando, acrescidas de juros à taxa legal, cuja liquidação se remete para execução de sentença”. Inconformada, apelou a Ré e, tendo desenvolvido nas alegações apresentadas as razões da sua discordância com a decisão, formulou a final as seguintes conclusões: “a) O ora recorrido prestou à ora recorrente declarações inexatas no momento em que preencheu os boletins de adesão aos dois seguros em causa nos autos. b) Tais declarações inexatas influenciaram a própria existência dos contratos a que o ora recorrido aderiu, assim como as condições dos mesmos. c) Razão porque se devem ter essas adesões como anuladas e, assim, inexistente qualquer relação contratual entre recorrente e recorrida quanto aos seguros em causa nos presentes autos. d) Nos contratos de seguro de grupo, como é o dos autos, o dever de informação sobre as cláusulas contratuais gerais impende sobre o tomador daquele, e não sobre a seguradora. e) Existe legislação específica e posterior à legislação geral sobre cláusulas contratuais gerais e relativamente ao dever de informação relativamente a contratos de seguro de grupo, pelo que tem que ser aquela, e não esta, a aplicável a situações como a dos presentes autos. f) O elemento literal da norma específica, ao impor esse dever de informação ao tomador e ao estabelecê-lo apenas como ónus da seguradora quando o contrato excecionalmente o preveja, o que não acontece na situação dos autos, não deixa margem para interpretação como a defendida na sentença recorrida. g) Acresce que, do ponto de vista prático, só o tomador de seguro está em condições de cumprir com os deveres de informação, por ser a única entidade a contactar com o destinatário dessa obrigação, sendo para mais certo que este em caso algum sai prejudicado por uma eventual violação desse dever de informação por parte do tomador/banco, já que a mesma pode sempre ser resolvida diretamente entre ambos e no âmbito da própria relação de crédito a favor da qual o seguro existe. h) Com o que o eventual incumprimento do dever de informação por parte do banco credor do ora recorrido não é oponível à ora recorrente, devendo ter-se todas as cláusulas contratuais, e no âmbito da relação entre aquele e esta, plenamente válidas, incluindo as do art.º 2º, n.º 5.3, das condições gerais do contrato ajuizado. i) A cláusula que define a Invalidez Absoluta e Definitiva é plenamente válida, quer por não ser abusiva, quer por corresponder a uma escolha feita entre duas de conteúdo diverso e às quais correspondem prémios de valor bastante diferentes. j) Abusivo seria impor a uma das partes o conteúdo de uma cláusula mais cara pelo preço de outra mais barata, violando-se assim o princípio do equilíbrio das prestações contratuais. k) De resto, o interesse a proteger pelos contratos de seguro com o dos autos não é o dos segurados que, não sendo obrigados pelas instituições de crédito, nem celebrariam aqueles, só o fazendo para garantirem que os bancos lhes emprestam os valores de que necessitam. l) O interesse a proteger é o das entidades credoras que, estas sim, pretendem acautelar os seus créditos e que obrigam os clientes a quem concedem créditos a subscrevê-los. m) A cláusula que define Invalidez Absoluta e Definitiva como «a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a Pessoa Segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando duma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária» há-de ter-se como válida, mas inaplicável na situação dos autos porque não preenchidos os requisitos que a mesma prevê. n) A condenação da ora recorrente «a pagar ao Autor as quantias que, entretanto, este se viu obrigado a pagar à Caixa Geral de Depósitos que em 29 de Junho de 2018, era de € 2.450,54 e € 10.926,55 (…) e ainda as prestações que o Autor entretanto for pagando, (…) cuja liquidação se remete para execução de sentença» não tem causa de pedir nem tem acolhimento contratual nem legal. o) A única possível base seria uma eventual mora por parte da ora recorrente, mas que não também não permite a procedência deste perdido já que, sendo a eventual obrigação de natureza pecuniária e não assentar a mesma em responsabilidade por facto ilícito nem pelo risco, a consequência prevista na lei é apenas a do pagamento de juros à taxa legal, com expressa exclusão de qualquer outra consequência. p) Foram violadas as normas dos arts. 429º do C. Comercial, 4.º do decreto-lei nº 176/95, de 26 de julho, 286.º, 550.º e seguintes e 806º do C. Civil, 21.º, n.º 2, do decreto-lei nº 349/98, de 11 de novembro, e o decreto-lei nº 446/85, de 25 de outubro, e legislação que o alterou”. Conclui pela revogação da sentença recorrida e substituição da mesma por decisão que, julgando anulado por declarações...

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