Acórdão nº 3038/18T8STR-J.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 3038/18T8STR-J.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo de Comércio DE Santarém – J3 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: Nos presentes autos de processo de insolvência, a Massa Insolvente de “(…) e (…), Lda.”, representada pelo seu Administrador de Insolvência (…), interpôs recurso por não se conformar com o teor do despacho que ordenou a correcção de erro na forma do processo.

* (…) e outros 39 (trinta e nove) trabalhadores vieram propor, em coligação, contra a Massa Insolvente da requerida “(…) e (…), Lda.”, os credores da “(…) e (…), Lda.” e “(…) e (…), Lda.”, na qualidade de devedora e insolvente, acção de verificação ulterior de créditos.

* Os trabalhadores em causa afirmam que todos eram trabalhadores da insolvente “(…) e (…), Lda.”, que a empresa continuou a laborar após ser sido declarada insolvente e que encerramento da actividade ocorreu no dia 06/05/2019. Reclamam o pagamento dos créditos laborais vencidos depois do mês de Março de 2019 e alegam que o prazo para a reclamação de créditos já se encontrava findo.

* Em 05/02/2020, foi proferido o seguinte despacho: «Os requeridos, apesar de devidamente citados não deduziram oposição, não constituíram mandatário nem intervieram de qualquer forma no processo, pelo que a sua revelia terá os efeitos previstos no artigo 567º do CPC.

Nestes termos: a) Julgo a citação devidamente realizada (artigo 566º do Código de Processo Civil e 146º/1 do CIRE); b) Julgo confessados os factos articulados pelo requerente (artigo 567º/1 do Código de Processo Civil); c) Cumpra o disposto no artigo 567º/2 do Código de Processo Civil».

* Em 10 de Abril de 2020, (…) e outros trabalhadores vieram requerer o seguinte: «a reclamação de créditos foi apresentada com recurso à acção de verificação ulterior de créditos, no entendimento de que se trata de créditos sobre a insolvência e não sobre a massa, na esteira do teor do douto Acórdão citado na petição – Ac. Rel. Coimbra de 14/07/2010, processo 562/09.7T2AVR-P.C1 in CJ 2010, t. III, pág. 38 – onde se entendeu que deve ser considerado como crédito sobre a insolvência o crédito resultante e emergente da cessação do contrato de trabalho declarado cessado pela administração da devedora/insolvente que, ao abrigo do artº 224º, nº 1, do CIRE está a administrar a massa insolvente e que “os créditos consistentes na compensação/indemnização por cessação do contrato de trabalho, subsequente às vicissitudes/encerramento da empresa insolvente, são créditos da insolvência; não preenchendo alguma das alíneas do art.º 51º do CIRE”.

(…) É que, a reconhecer-se como responsável pelo pagamento destes créditos a massa insolvente, ir-se-ia colocar trabalhadores com créditos idênticos em posições muito diferentes para receber as quantias reclamadas e devidas, pois os que vissem os seus créditos reconhecidos e devidos pela massa insolvente iriam sem dúvida prejudicar e, eventualmente, inviabilizar, na totalidade, o recebimento de créditos de igual natureza anteriormente reclamados pelos restantes trabalhadores, o que inviabilizaria o objectivo prosseguido no processo de insolvência de satisfação igualitária de créditos de idêntica natureza, devidamente agrupados em função da sua natureza.

Nos termos expostos, se requer a V. Exa. que considere como processual e juridicamente correta a reclamação de créditos nos termos efetuados pelos requerentes».

* Em 04/05/2020, foi proferido o despacho recorrido, o qual tinha o seguinte conteúdo: «apesar de a presente ação ter sido proposta como verificação ulterior de créditos, a verdade é que a dívida reclamada pelos trabalhadores constitui dívida da massa e não dívida da insolvente, uma vez que a mesma consiste numa condenação em custas cujo título executivo se formou após a declaração de insolvência da devedora. Estando em causa uma dívida da massa insolvente – art. 51º/1-d do CIRE – então o que deveria ter sido proposto pelo M.P. era uma ação relativa a dívida da massa insolvente, a correr termos como processo declarativo comum (art. 89º do CIRE). Considerando que a massa insolvente, representada pelo AI, foi regularmente citada para os termos da presente acção, e que não foi prejudicada em nenhum dos seus direitos de defesa com a forma processual escolhida pelo A. – uma vez que o prazo de defesa é o mesmo – determina-se, ao abrigo do art. 193º do CPC: 1. O aproveitamento dos actos praticados; 2. A correcção da forma do processo, que deverá passar a ser Acção de Processo Comum, em vez de verificação ulterior de créditos. Após trânsito, conclua para sentença».

* Inconformada com tal decisão, a recorrente apresentou recurso de apelação e o articulado continha as seguintes conclusões: I – A acção de verificação ulterior de créditos prevista nos termos do disposto no art. 146º do CIRE, é uma acção que serve para a reclamação de créditos sobre a insolvência, em complemento da reclamação de créditos prevista nos termos do art. 128º do CIRE.

II – Para peticionar uma dívida sobre a massa insolvente, deverá a parte interessada deduzir a sua pretensão, para obter o pagamento nos termos do disposto no art. 172º do CIRE, directamente para o Administrador de Insolvência ou mediante acção judicial sob a forma de processo declarativo que correrá por apenso ao processo de insolvência, nos termos do art. 89º do CIRE.

III – No caso sub judice, os créditos laborais vencidos desde a data em que foi proferida a sentença de declaração de insolvência (08 de Março de 2019) até ao encerramento da empresa a 06 de Maio de 2019, nomeadamente a retribuição pelo trabalho prestado, subsídio de férias e de natal e proporcionais de subsídio de férias e natal constituem dívidas da massa insolvente e não créditos sobre a insolvência.

IV – Os Autores intentaram a acção de verificação ulterior de créditos para reclamar como dívida da insolvente os créditos emergentes do contrato de trabalho referentes a salários, subsídio de férias e de Natal, subsídio de alimentação, como créditos remuneratórios que são, não sendo este o meio processual adequado a tal desiderato porque tais créditos incidem sobre a massa insolvente – e não sobre a insolvência – pelo que deveriam ser reclamados com recurso a uma acção declarativa nos termos do disposto no artigo 89º do CIRE e não através da acção prevista nos termos do disposto no art. 146º do CIRE.

V – Tendo sido intentada pelos Autores a acção de verificação ulterior de créditos nos termos do disposto no artigo 146º do CIRE, o tribunal a quo deverá conhecer dela e da existência dos créditos que incidam sobre a insolvência pelo que não poderá julgar verificados os créditos remuneratórios sobre a massa insolvente como é o caso dos créditos emergentes do contrato de trabalho referentes a salários, subsídio de férias e de Natal, subsídio de alimentação.

VI – O Tribunal a quo, se vier a considerar verificados os créditos remuneratórios reclamados pelos Autores na dita acção de verificação ulterior de créditos está a violar frontalmente o disposto nos artigos 89º, 128º e 146º do CIRE, pelo que qualquer decisão nesse sentido deverá ser anulada e revogada porque tal acção é o meio processualmente inadequado à sua pretensão.

VII – Os créditos indemnizatórios são aqueles que, mesmo perante uma situação de insolvência da entidade empregadora, a cessação dos contratos de trabalho deve ocorrer com respeito pelas disposições previstas nos artigos 359º e seguintes do CT, nomeadamente pelos artigos 360º e 363º do CT que preveem a existência de uma comunicação da intenção de proceder ao despedimento colectivo que mais tarde efectivam noutra comunicação a tomar a decisão de despedimento.

VIII – Os créditos compensatórios, cumulados com os indemnizatórios na acção de verificação ulterior de créditos deduzida pelos Autores, são aqueles que resultam de uma compensação devida pela cessação do contrato de trabalho por força de uma deliberação da Assembleia de Credores, que no entender dos Autores é calculada nos termos do disposto no artigo 391º e 396º do CT.

IX – Quer os denominados créditos compensatórios ou indemnizatórios, pese o facto de a cessação do contrato de trabalho apenas se verificar em momento posterior à declaração de insolvência, são estes qualificados como uma dívida da insolvência.

X – Pese embora a cessação do contrato de trabalho ocorra após a declaração de insolvência da empregadora por um ato do administrador de insolvência ou por decisão dos credores tomada em assembleia é, todavia, consequência do estado de insolvência, dado que a compensação é um direito adquirido com referência à duração do vínculo laboral cujo contrato foi produzindo os seus efeitos enquanto a empresa insolvente esteve em actividade e até ao momento do seu encerramento.

XI – Salvo melhor entendimento, com apoio na doutrina e jurisprudência citada, entendemos ser de qualificar os créditos laborais de cariz indemnizatório ou compensatório como dívidas da insolvência ou créditos sobre a insolvência, munidos dos privilégios creditórios que os tutelam, e não dívidas da massa insolvente conforme decorre do douto despacho que aqui se põe em crise.

XII – O meio legalmente adequado para reclamar as dívidas sobre a insolvência é precisamente a acção de verificação ulterior de créditos nos termos do disposto no artigo 146º do CIRE e não a acção de processo declarativo comum prevista no art. 89º do CIRE para demanda de dívidas da massa insolvente, o que de resto é defendido pelos Autores da acção no requerimento datado de 10 de Abril de 2020.

XIII – A decisão proferida pelo Tribunal a quo de considerar dívida da massa insolvente os também créditos remuneratórios ou indemnizatórios reclamados pelos Autores na acção de verificação ulterior de créditos viola, entre outros, o artigo 51º do CIRE bem como o artigo 46º e 47º do mesmo diploma legal e ainda os artigos 172º a 184 do CIRE porque a decisão em crise constituí uma violação frontal à graduação e pagamento de...

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