Acórdão nº 109/17.1PBPTS.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelVIEIRA LAMIM
Data da Resolução15 de Setembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa: Iº–1.-No Processo Comum (Tribunal Singular) nº109/17.1PBPTS, da Comarca da Madeira (Juízo Local Criminal do Funchal - Juiz 3), o Ministério Público acusou A., imputando-lhe a autoria material de um crime de violência doméstica, p. e p. pelos artigos 10, nº1, 14, nº1 e 26 e 152, nº1, al. b) e c) e 2, al. a), todos do Código Penal, com referência ainda ao artigo 152, nºs 4 e 5, do mesmo diploma legal.

Após julgamento, o tribunal, por sentença de 21Nov.19, decidiu: “… A)–Condenar o arguido A. , pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo art.

152, nº1 a) e 2, 4 e 5 do Código Penal, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão.

B)–Suspendo a execução da pena de prisão pelo período de 3 anos e 6 meses, sujeita ao seguinte: - a regime de prova, pelo período de suspensão, no sentido de melhor orientar o arguido e o inserir na sociedade e destinado a afastar o arguido da delinquência e consciencializar-se da gravidade da sua conduta, devendo a DGRSP elaborar o respectivo plano individual de readaptação – cf. art.s 53, nºs 1, 2 e 3 e 54, ambos do Código Penal, - Obrigação de se submeter formações de prevenção de violência doméstica, orientadas pela DGRSP, durante o período de suspensão.

Nos termos do art.

152, nºs 4 e 5 do CP, a pena acessória de proibição de contacto com a ofendida, com afastamento da residência da ofendida, com fiscalização através de meios técnicos de controlo à distância, tudo durante o período de suspensão.

C)–Condenar o arguido a pagar à ofendida a quantia de 3.500,00€ nos termos do artº 21º da Lei 112/2009.

….” 2.–Desta decisão recorre o arguido A. , motivando o recurso com as seguintes conclusões: 1)- Dificulta excessivamente o exercício do direito de defesa do arguido em termos incompatíveis com o direito constitucional a um processo justo equitativo, nos termos consagrados nos artºs 20º e 32º da C Rep Port., o balizamento temporal contido numa acusação penal de factos situados em datas não concretamente apuradas nos anos de 2014, 2015 e 2016, sendo a mesma nula, por falta de concretização, nos termos do artº 283º, nº 3 do CPP, tanto mais que os factos constantes na matéria provada atinente à acusação, 3 a 19.

foram objecto de denuncia criminal que obteve despacho de arquivamento com base na falta dos elementos subjectivo e objectivo do tipo legal do crime de violência doméstica, certidão de fls.

61 a 93 – procº 855/16.7PBFUN. O despacho de arquivamento proferido nos termos do artº 277º do CPP tem efeitos preclusivos, com excepção da situação prevista no artº 279º do mesmo diploma tornando-se, para isso, necessário para a reabertura de inquérito e apreciação dos factos entretanto arquivados que entretanto tenham surgido novos elementos de prova – que no caso do mencionado processo de inquérito não aconteceu - tornando assim impossível o aproveitamento daquela factos objecto do arquivamento.

2)–Existe contradição insanável da fundamentação (vicio da decisão por si só e conjugado com as regras da experiência), subsumível no vício da decisão previsto no artº 410º, nº 2 al. b) do CPP e a determinar a anulação do julgamento, quando, relativamente ao episódio do acidente, por um lado se dão como provados os factos constantes dos pontos 28 a 32 da sentença, provenientes da acusação e, por outro, se dão igualmente provados os factos 9 a 11 que advinham da contestação. Enquanto dos pontos 8. a 11. dos factos provados atinentes à contestação, não só se sabe o tema da discussão (tentativa de convencimento do arguido a não usufruir do direito que lhe foi atribuído de levar a filha para o continente e a resposta negativa do arguido) como quem ía a conduzir era este, que se despistou. Pelo contrário, nos pontos 28. a 32.

da matéria provada e constante na acusação, era a ofendida quem conduzia o veículo, a discussão foi gerada pelo arguido, inopidamente, apelidando-a com os epípetos de “ és uma puta de merda”, tendo este puxando o travão de mão, fazendo o veículo despistar-se e guinar para esquerda.

A referida contradição constitui contradição insanável na apreciação da prova erro na apreciação da Prova- artº 410º nº 2 al. b)do CPP; 3)–Incorre a sentença em erro de Julgamento no termos do artº do CPP, quando na sua Motivação de Facto, com vista a credibiliz410ºar o depoimento da ofendida, faz referência ao depoimento da testemunha A.... P..., mãe da ofendida, que alegadamente corroborou o depoimento da ofendida e percorrendo-se o depoimento daquela testemunha – que se encontra integralmente transcrito no corpo das alegações e para o qual se remete-, a valoração do depoimento da mãe da ofendida não encontra qualquer sustentação no que realmente se passou em Audiência de Julgamento. O único episódio presenciado pela testemunha que se resumiu a um acontecimento ocorrido no tempo de namoro do arguido com a ofendida, em que esta ainda estava a viver com a sua mãe, e que o arguido terá ido bater à janela da casa da namorada, consta ao minuto 2:29 daquele depoimento sendo que, tal facto, não consta sequer da acusação e, como tal, não pode ser valorado porquanto, a acusação delimita o objecto do processo.

4)–Em igual vicio – Erro de Julgamento - incorre a sentença quando com base na mesma convicção referida na Conclusão anterior, dá como provados os factos 24. e 25 da matéria atinente à acusação, e a testemunha A...P...

entre o minuto 10:59 a 11:20 do seu depoimento, explica que a ofendida foi trabalhar para uma creche para fazer uma substituição e que tinha deixado de trabalhar porque tinha terminado o período de substituição e, por sua vez a ofendida, entre o minuto 19:45 e o minuto 20:36 do seu depoimento, refere ter deixado de trabalhar porque o arguido a impedia de sair com o seu automóvel. 5)–Ao credibilizar o depoimento da ofendida com base no depoimento da testemunha sua mãe, que nada declarou sobre os factos provados de 3 a 9 da matéria atinente à acusação, e deu explicação diferente para os factos vertidos em 24 e 25 estamos em presença dos vícios dos artºs 410º nº 2 al. a). b) do CPP.

6)–A ofendida, ao minuto 25:39 e 52:54 assume circular à velocidade de 100Km/h e ao minuto 25:39 a 25:43 refere que com o acionamento do travão de mão pelo arguido o veículo fez meio pião. Tais factos, apesar de decorrerem do depoimento da ofendida, que mereceu do tribunal total credibilidade, não constam na matéria provada constante nos pontos 28 a 32, não se deslumbrando razão para que os mesmos não tenham sido dados como provados, impondo-se por isso sejam estes factos aditados àqueles pontos. 7)–Não é, sequer, compaginável com as regras da experiência, que um veículo que circulasse a uma velocidade próxima dos 100 Km/h numa via com duas filas de trânsito no mesmo sentido, no momento em que efetuava uma ultrapassagem fazendo-o pela fila via mais à esquerda, depois do passageiro ao seu lado puxar repentinamente do travão de mão, o veiculo pudesse fazer meio pião embatendo com a parte lateral e a frente esquerdas no rail do mesmo lado sem que embatesse igualmente no veiculo que estava a ser ultrapassado, visto que sempre teria que rodar para o seu lado direito, sabendo-se que com o embate do lado esquerdo ainda mais impulsionaria o veiculo da assistente para o lado oposto (o direito). Conforme transcrições constantes no corpo das alegações e para as quais se remete.

8)–Ante o que vertido na conclusão antecedente, tendo-se dado como provados os factos constantes dos pontos 28 a 32 que vinham da acusação, o tribunal incorreu, igualmente, em erro notório na apreciação da prova, tanto mais quanto é certo que omitiu dois factos absolutamente essenciais na dinâmica do acidente ( velocidade - 100KM e consequência do acionamento do travão de mão: meio pião) fundamentais para a boa decisão da causa padecendo a decisão do vício do mesmo artº 410, nº 2, alínea c) do CPP, determinante da anulação de julgamento.

9)–O facto 34 da matéria atinente à acusação mostra-se mal julgado, porquanto de acordo com o depoimento da ofendida não resultou que o arguido lhe tenha colocado as mãos no pescoço – cf. minuto 30:24 a 30:48 do seu depoimento - tendo antes aquela afirmado não se lembrar declaração esta que não se mostra verosimel já que se trata de uma conduta que assume alguma gravidade e que, jamais em tão pouco espaço de tempo se justifica a sua falta de lembrança.

10)–O relato da ofendida, do dia do acidente de viação, que vai do minuto 27:16 a 28:30 do seu depoimento, designadamente os pontapés inflingidos pelo arguido, os empurrões, (que objectivamente revelam uma verdadeira tareia) não são de todo compatíveis com o auto de exame de fls. 33 e 34 correspondente à perícia de avaliação de dano corporal e que consta no ponto 37 dos Factos Provados atinentes à Acusação e que refere a existência de apenas uma equimose amarela acinzentada 2,00x2,00cm no hemetórax direito, sendo que, no mínimo, seria espectável muitas mais equimoses. Por outro lado, a referida equimose e a sua localização é absolutamente compatível com o acidente de viação que ambos, ofendia e arguido foram intervenientes. Pelo que o facto 37 mostra-se igualmente mal julgado.

11)–Relativamente à matéria cível, tendo a assistente, em audiência de julgamento, conforme transcrição realizada no corpo das alegações ocorrida desde o minuto 1:00:45 e até final do depoimento, manifestado expressamente que não pretendia ser indemnizada, depois de questionada pela Mmª Juiz para o efeito, conforme transcrição no corpo das presentes alegações e para cujos trechos se remete, estava vedado ao tribunal condenar o arguido no pagamento de indemnização à assistente em face do disposto no artº 21º da Lei 112/2099, de 16 de Setembro.

12)–A condenação do arguido no pagamento do montante de 3.500€, além de ilegal, não assenta em decisão fundamentada, não se alcançando dos termos da decisão de que modo ou qual o critério utilizado pelo tribunal para a fixação daquele montante...

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