Acórdão nº 69/19.4JAPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelBEATRIZ MARQUES BORGES
Data da Resolução08 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório 1. Da decisão No Processo Comum Coletivo n.º 69/19.4JAPTM da Comarca de Faro, Juízo Central Criminal de Portimão, Juiz 2, submetido a julgamento por acusação do MP, foi o arguido (...):

a) Condenado pela prática de um crime de homicídio qualificado dos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea h) do CP, agravado pelo artigo 86.º, n.ºs 3 e 4 da Lei 5/2006 de 23/02, na pena de dezasseis anos de prisão; b) Absolvido do crime de detenção de arma proibida por que vinha acusado, por se encontrar em concurso aparente com o crime de homicídio em que foi condenado; c) Obrigado a aguardar os ulteriores termos do processo em prisão preventiva, por não se terem alterado os pressupostos de facto e de direito que determinaram a sua aplicação em sede de 1.º interrogatório judicial, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea j) do CP e 191.º, 202.º, n.º 1, alínea a) e 204.º, alíneas a) e c), 213.º, alínea b) e 215.º do CPP; d) Condenado a pagar ao assistente/demandante (...) a quantia global de cento e trinta e um mil e seiscentos e cinquenta euros a título de indemnização por danos, dos quais três mil seiscentos e cinquenta euros a título de danos patrimoniais e o restante a titulo de danos não patrimoniais; e) Absolvido das restantes quantias peticionadas pelo demandante (...)(...); f) Condenado a pagar à assistente/demandante (...), a quantia de quarenta mil euros a título de indemnização por danos não patrimoniais; g) Condenado no pagamento dos juros vincendos, a acrescer às quantias arbitradas aos demandantes a titulo de indemnização por danos não patrimoniais à taxa legal dos juros civis, a partir da presente decisão e até integral pagamento; h) Condenado no pagamento dos juros vincendos, a acrescer à quantia arbitrada ao demandante a título de indemnização por danos patrimoniais, à taxa legal dos juros civis, a partir do trânsito em julgado da presente decisão e até integral pagamento; o) Obrigado, após trânsito, a sujeitar-se à recolha de ADN em conformidade com o disposto no artigo 8.º, n.º 2 da Lei 5/2008 de 12/2.

2. Do recurso 2.1. Das conclusões do arguido Inconformado com a decisão o arguido interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1. O recurso visa submeter à apreciação do tribunal superior o incorreto julgamento em matéria de facto, o erro de julgamento em matéria de direito – artºs.412º, nº2 e 3, do C.P.P, a redução da pena e a impugnação do quantum indemnizatório; 2. O recorrente considera incorretamente julgados os factos 1.3, 1.5, 1.6,1.12 e 1.13, não quanto à sua dinâmica mas quanto à autoria dos mesmos, requerendo o reexame da prova por declarações e testemunhal; 3. Enuncia a decisão recorrida que, para dar como provados os factos descritos em 1.3, 1.5,1.6, 1.12 e 1.13, o tribunal socorreu-se dos depoimentos das testemunhas (…) e declarações do assistente (...), conforme vem elencado a pág.29; 4. Quanto ao reconhecimento do arguido como autor do crime, extrai-se do texto da decisão que tribunal não retirou qualquer contributo, para a versão vertida na matéria de facto, dos depoimentos das testemunhas (…) –não estavam no local do crime; 5. A testemunha (…) estava no local do crime, mas o tribunal não retirou do seu depoimento qualquer consequência quanto ao reconhecimento da autoria dos factos (pág.17; 6. Quanto às circunstâncias em que o crime ocorreu o tribunal, no exame crítico, considerou que foram fundamentais os depoimentos das testemunhas (…) (págs.13 e 14) e… 7. não retirou quaisquer consequências desses depoimentos quanto ao reconhecimento do autor dos factos; 8. O tribunal concluiu que o assistente reconheceu o arguido como autor dos factos porque o conhecia de viverem na mesma comunidade (pág.12); 9. Quanto à autoria do crime, o tribunal considerou que as declarações do assistente encontraram suporte nos depoimentos das testemunhas (…) (pág.12); 10. Não foi feita qualquer interpretação conjugando e correlacionando entre si as declarações do assistente e daquelas testemunhas… 11. que permita saber qual o contributo dado pelos depoimentos de (…) quanto à autoria do crime; 12. Há uma contradição na fundamentação entre o exame crítico dos depoimentos daquelas testemunhas e do assistente… 13. Que não permite compreender a racionalidade e lógica do exame… 14. No exame crítico dos depoimentos dessas testemunhas, feito pelo tribunal extraiu-se que as mesmas não reconheceram o arguido como autor..

15. Tais depoimentos apenas foram considerados, pelo tribunal, importantes quanto às circunstâncias do crime; 16. Mas no exame crítico das declarações do assistente já considerou, quanto à autoria do crime, que essas declarações encontraram suporte nos depoimentos de (…); 17. A decisão recorrida é violadora do princípio da inocência e in dubio pro reo… 18. …ao considerar que as declarações do assistente encontraram suporte nos depoimentos daquelas testemunhas quanto à autoria do crime, porquanto… 19. …aquelas testemunhas não reconheceram o arguido.

20. Apenas (…) e o assistente (...) estavam no local do crime, como se extrai do texto da decisão; 21. Da leitura conjugada dos factos 1.12 e 1.13 extrai-se que o suposto atirador terá feito - a pé, a correr- o percurso entre o local dos factos e o restaurante (...).

22. Do exame crítico resulta que (…) viram o atirador abandonar o local dos factos a pé… 23. … que (…) estavam no restaurante (...)… e que o arguido também lá esteve… 24. Não foi feita prova do que aconteceu no percurso entre o local dos factos e o (...).

25. O arguido tinha por hábito correr, andar de bicicleta e andar a cavalo-depoimentos de (…).

26. Para julgar provados os factos 1.3,1.5 e 1.12, o tribunal fundamentou-se, entre outros, nos depoimentos das testemunhas (…) (gravação da audiência de 21/06/2019, pelas 10H56, entre 00:00 e 18:07 m), e (…) (gravação da audiência de 21/06/2019, pelas 10H15, entre 00:00 e 04:32 m e gravação do mesmo dia pelas 10H35, entre 00:00 e 20:23 m); 27. Estas testemunhas não reconheceram o arguido como autor dos factos pelo que… 28. o seu depoimento só pode relevar para prova da dinâmica dos factos; 29. Para prova do facto 1.5, o tribunal socorreu-se também do depoimento da testemunha (…) … 30. declarou ter visto uma pessoa alta de cara tapada e só dos ombros para cima porque tinha o balcão do bar à frente…; (gravação da audiência de 17/02/2020, pelas 11H32, entre 00:00 e 17:31 m) 31. Declarou residir na (...) há 8/9 ano e não obstante conhecer e conviver com o arguido… 32. …declarou não ter reconhecido o atirador como sendo o arguido… 33. Relativamente ainda à prova do facto 1.5 e também 1.6, o tribunal fundou-se nas declarações do assistente (...).

34. Declarou ter visto atirador da cintura para cima (porque tinha o balcão do bar à frente), todo vestido de preto e com uma máscara na cara.

35. Disse ter reconhecido o arguido como autor dos disparos pela característica física da “largura e altura” do atirador; 36. Mas a final, declarou que a primeira pessoa com quem falou foi o tio a quem relatou o que se passou, nos seguintes termos -“não disse concretamente que tinha sido o (...) (…)as palavras que eu disse ao meu tio foi que eu achava que era o (...)”; 37. Perante um atirador vestido de preto e de cara tapada e tudo tendo acontecido repentinamente não é credível reconhecer uma pessoa apenas com base na “altura e na largura; 38. Não se provou qual era a altura e largura do arguido; 39. Tanto mais que o assistente teve dúvidas quando disse que “achava que era o (...)”.

40. Não indicou um concreto sinal distintivo, uma sólida razão de ciência, que pudesse associar o atirador ao arguido; 41. O tribunal não discorreu sobre as razões de ciência que retirou das declarações do assistente para que possa ter reconhecido o encapuzado de cara tapada como sendo o arguido (pág.10).

42. Apenas descreve que o assistente reconheceu o arguido porque o conhecia de viverem na mesma comunidade (pág.12).

43. Tendo o assistente declarado que conheceu o arguido pela altura e largura, impunha-se que indicasse um claro sinal distintivo que naquelas circunstâncias… 44. …perante um encapuzado, permitisse distinguir o arguido de outras pessoas conhecidas com a mesma altura e largura.

45. Para além da altura e da largura o assistente não apresentou qualquer outra razão de ciência.

46. Mas expressou claramente que tinha dúvidas ao declarar: “não disse concretamente que tinha sido o (...) (…) as palavras que eu disse ao meu tio foi que eu achava que era o (...)”.

47. Como se extrai pode da audição das declarações, na questão concreta da identificação do autor dos factos, o assistente fez um discurso arrastado, enrolado e impreciso; 48. Tentando incriminar o arguido –pela altura e pela largura- embora sabendo que não reconheceu ninguém; 49. O assistente é parte interessada no desfecho do processo, tendo peticionado uma milionária indemnização; 50. E requereu abertura de instrução tendo em vista pronunciar o arguido pela prática de um crime de homicídio tentado contra o assistente (fls. ), não obstante ter declarado… 51. …com grande frieza,ter assistido ao 1º tiro, ter dado a volta e observado de outra perspectiva e “fiquei a assistir”! – ao 2º tiro que matou o pai.

52. E perante esta sua conduta ainda realizou ter sido objecto de uma tentativa de homicídio! 53. De acordo com princípio da investigação, recai sobre o acusador público e sobre o tribunal o ónus de investigar e esclarecer os factos submetidos a julgamento.

54. No caso concreto impunha-se que o tribunal extraísse do assistente uma sólida razão de ciência quanto à identificação do arguido como autor.

55. Sem sucesso, bem procurou o Tribunal e o Sr. Procurador, esse item, sinal ou razão de ciência que sustentassem as declarações do assistente, como bem ilustra a sua transcrição na motivação deste recurso; 56. Como disse o Sr...

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