Acórdão nº 088/20.8BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – A…………., com os sinais dos autos intentou neste Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 24.º, n.º 1, al.

iii), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais («ETAF»), e dos artigos 109.º e ss. do Código de Processo nos Tribunais Administrativos («CPTA»), intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, contra a Presidência do Conselho de Ministros, pedindo i) a declaração de inconstitucionalidade, com efeitos circunscritos a si, das normas proibitivas de ajuntamentos retiradas da conjugação dos pontos 1, 2 e 8 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 55-A/2020 e ainda a que se encontra no art. 15.º do Anexo àquela Resolução e, bem assim, de quaisquer normas análogas que viessem a ser aprovadas por renovação do conteúdo da mencionada Resolução; e ii) a condenação da Presidência do Conselho de Ministros a exercer a sua competência relativamente às forças policiais e demais autoridades públicas no sentido de não impedirem o Requerente e as pessoas que com ele venham a estar reunidas de exercer plenamente a sua liberdade jusfundamental de reunião.

2 – A Presidência do Conselho de Ministros, citada, veio apresentar a sua defesa por excepção, alegando falta de jurisdição dos tribunais administrativos e fiscais, ilegitimidade passiva da Presidência do Conselho de Ministros, impropriedade do meio processual e incompetência hierárquica do Supremo Tribunal Administrativo para decidir do segundo pedido; e, por impugnação, sustentando a conformidade constitucional das normas impugnadas.

3 – A protecção requerida ao abrigo da intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias vem enunciada como pedido de declaração de ilegalidade por inconstitucionalidade com efeitos pessoais para as “normas” de “proibição de ajuntamentos de mais de 10 ou 20 pessoas em espaço público”, que segundo o Requerente viola o seu direito fundamental a organizar e participar em “reuniões de amigos e família, jantares, tertúlias, sessões lúdicas ou piqueniques”; proibição que resulta da conjugação dos pontos 1, 2 e 8 e do artigo 15.º do anexo da Resolução do Conselho de Ministros n.º 55-A/2020, publicada no Diário da República n.º 148/2020, 1.º Suplemento, Série I de 31 de Julho de 2020, que declara a situação de contingência e alerta, no âmbito da pandemia da COVID-19 e cujos textos dispõem o seguinte: «[…] 1 - Declarar, na sequência da situação epidemiológica da COVID-19, até às 23:59 h do dia 14 de agosto de 2020:

  1. A situação de contingência na Área Metropolitana de Lisboa; b) A situação de alerta em todo o território nacional continental, com exceção da Área Metropolitana de Lisboa.

    2 - Determinar, sem prejuízo das competências do Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, do Ministro da Administração Interna, da Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, da Ministra da Saúde, do Ministro do Ambiente e da Ação Climática e do Ministro das Infraestruturas e da Habitação, as quais podem ser exercidas conjuntamente com os membros do Governo responsáveis pelas respetivas áreas setoriais, quando aplicável, a adoção, em todo o território nacional, das seguintes medidas de caráter excecional, necessárias ao combate à COVID-19, bem como as previstas no regime anexo à presente resolução e da qual faz parte integrante:

  2. Fixação de regras de proteção da saúde individual e coletiva dos cidadãos; b) Limitação ou condicionamento de acesso, circulação ou permanência de pessoas em espaços frequentados pelo público, bem como dispersão das concentrações de 20 ou 10 pessoas, consoante a situação declarada no respetivo local seja de alerta ou contingência, respetivamente, salvo se pertencerem ao mesmo agregado familiar; c) Limitação ou condicionamento de certas atividades económicas; d) Fixação de regras de funcionamento de estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços; e) Fixação de regras aplicáveis ao tráfego aéreo e aos aeroportos; f) Racionalização da utilização dos serviços públicos de transportes, comunicações e abastecimento de água e energia, bem como do consumo de bens de primeira necessidade.

    (…) 8 - Reforçar, sem prejuízo dos números anteriores, que compete às forças e serviços de segurança e às polícias municipais fiscalizar o cumprimento do disposto na presente resolução, mediante:

  3. O encerramento dos estabelecimentos e a cessação das atividades previstas no anexo i ao regime anexo à presente resolução e da qual faz parte integrante; b) A emanação das ordens legítimas, nos termos da presente resolução, designadamente para recolhimento ao respetivo domicílio; c) A cominação e a participação por crime de desobediência, nos termos e para os efeitos da alínea b) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, na sua redação atual, do artigo 6.º da Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, na sua redação atual, por violação do disposto no artigo 3.º do regime anexo à presente resolução, bem como do confinamento obrigatório por quem a ele esteja sujeito nos termos do artigo 2.º do referido regime; d) O aconselhamento da não concentração de pessoas na via pública e a dispersão das concentrações superiores a 20 ou 10 pessoas, consoante a situação declarada no respetivo local seja de alerta ou de contingência, respetivamente, salvo se pertencerem ao mesmo agregado familiar.

    (…) Artigo 14.º Eventos 1 - Não é permitida a realização de celebrações e de outros eventos que impliquem uma aglomeração de pessoas em número superior a 20 ou 10, consoante a situação declarada no respetivo local seja de alerta e de contingência, respetivamente, salvo se pertencerem ao mesmo agregado familiar, sem prejuízo do disposto no número seguinte.

    2 - A DGS define as orientações específicas para os seguintes eventos:

  4. Cerimónias religiosas, incluindo celebrações comunitárias; b) Eventos de natureza familiar, incluindo casamentos e batizados, quer quanto às cerimónias civis ou religiosas, quer quanto aos demais eventos comemorativos; c) Eventos de natureza corporativa realizados em espaços adequados para o efeito, designadamente salas de congressos, estabelecimentos turísticos, recintos adequados para a realização de feiras comerciais e espaços ao ar livre.

    3 - Na ausência de orientação da DGS, os organizadores dos eventos devem observar, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 8.º a 10.º, bem como no artigo 17.º quanto aos espaços de restauração nestes envolvidos, e os participantes usar máscara ou viseira nos espaços fechados.

    4 - Os eventos com público realizados fora de estabelecimentos destinados para o efeito devem ser precedidos de avaliação de risco, pelas autoridades de saúde locais, para determinação da viabilidade e condições da sua realização.

    5 - Em situações devidamente justificadas, os membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna e da saúde podem, conjuntamente, autorizar a realização de outras celebrações ou eventos, definindo os respetivos termos.

    […]».

    A Resolução do Conselho de Ministros n.º 55-A/2020 foi entretanto modificada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 63-A/2020, publicada em 14, de Agosto de 2020, passando a dispor a nova redacção, no que aqui releva, o seguinte: «[…] 1 - Declarar, na sequência da situação epidemiológica da COVID-19, até às 23:59 h do dia 31 de agosto de 2020: (…).

    E foi posteriormente modificada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 68-A/2020, publicada em 28, de Agosto de 2020, passando a dispor a nova redacção, no que aqui releva, o seguinte: «[…] 1 - Declarar, na sequência da situação epidemiológica da doença COVID-19, até às 23:59 h do dia 14 de setembro de 2020: (…).

    Tendo em conta que o Requerente peticiona não apenas a impugnação da redacção em vigor na data da propositura da intimação, mas também “de quaisquer normas análogas que venham a ser aprovadas por renovação do conteúdo da Resolução […] em crise”, analisaremos o pedido à luz da redacção actual das mesmas.

    Cumpridas todas as diligências deste processo urgente, cumpre decidir.

    II - Fundamentação 3 – Da falta ou não de jurisdição deste Supremo Tribunal Administrativo para julgar o processo.

    Alega a Requerida, no essencial, que o pedido formulado pelo Requerente de declaração de ilegalidade por inconstitucionalidade da norma com efeitos pessoais (circunscritos ao Requerente), ou seja, com efeitos limitados ao caso concreto, não pode ser conhecido por este Supremo Tribunal Administrativo, pois a norma do n.º 2 do artigo 73.º do CPTA, em que o mesmo se fundamenta, não admite um tal pedido, conclusão que se alcança, seja a partir da interpretação da norma em conformidade com a CRP, seja por desaplicação desta norma com o fundamento de a mesma violar a reserva de jurisdição constitucional.

    A excepção que assim vem suscitada pela Requerida – a da interpretação do n.º 2 do artigo 73.º do CPTA e da sua conformidade com a CRP – tem merecido amplo debate doutrinário, como, de resto, a mesma dá nota na sua peça processual, indicando os diversos autores que sufragam as diferentes posições, as quais aqui nos escusamos de repetir.

    Trata-se de uma questão sobre a qual este Supremo Tribunal Administrativo ainda não se pronunciou e que no âmbito do presente processo urgente, terá de ter a sua análise circunscrita à concreta tutela jusfundamental requerida para garantia (ou modo de reacção contra a violação) do direito, liberdade e garantia, tal como ela é configurada pelo autor.

    Neste particular, e sem necessidade e oportunidade para maiores desenvolvimentos atento o carácter urgente do processo, é fácil compreender que no âmbito deste processo apenas se discute a pretensão do autor de não lhe ser aplicável a medida de proibição de ajuntamentos de mais de 10 ou 20 pessoas em espaço público, e que ele enuncia sob o pedido de desaplicação das normas relativamente a si, afirmando até, expressamente...

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