Acórdão nº 0294/13.1BELLE de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução01 de Julho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório - 1 – A……., Unipessoal, Lda, com os sinais dos autos, notificado do acórdão proferido nos presentes autos pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 7 de junho de 2018, que concedeu provimento ao recurso interposto pela AT da sentença do TAF de Loulé que julgara procedente a impugnação judicial por si deduzida contra liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios relativos aos exercícios de 2008, 2009 e 2010, revogando a sentença recorrida e julgando improcedente a impugnação, dele veio arguir nulidade e apresentar recurso de revista, concluindo a sua alegação no recurso de revista nos seguintes termos: A.

A…….., Unipessoal, Lda., infra designado como recorrente, é uma sociedade que tem por objeto a exploração de estabelecimento de restauração, sendo dono de um estabelecimento comercial aberto ao público, que gira sob o nome “ ………".

B.

Na sequência de uma inspeção externa efetuada pelos serviços de inspeção tributária à recorrente em 05/06/2012, de âmbito parcial, com incidência sobre o IRC e IVA dos exercícios económicos de 2008, 2009 e 2010, deduziu o recorrente, processo de impugnação judicial n.º 294/13.1BELLE , no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, das liquidações adicionais de IRC nºs 20128310051759, 20128310051769 e 20128310051778 relativas aos supra referidos anos e respetivas liquidações de juros compensatórios, no valor total de €128.826, 11.

C.

Invocou como fundamento a caducidade do direito à liquidação do IRC do ano de 2008, irregularidades procedimentais no âmbito da inspeção tributária, erro nos pressupostos de recurso a métodos indiretos e erro na quantificação da matéria coletável.

D.

Em 20/02/2017, foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, tendo sido julgada procedente a impugnação judicial em causa, sendo reconhecida a situação de erro na quantificação do imposto e consequentemente anuladas as liquidações impugnadas.

E.

Na sequência da supra referida sentença, veio a representante da Fazenda Pública, em 04/04/2017 apresentar as suas alegações de recurso na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo do Sul, tendo as mesmas sido admitidas e dado provimento ao referido recurso, revogando-se a sentença recorrida e julgando-se a impugnação judicial do reclamante improcedente.

F.

A Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo do Sul ao admitir e julgar o recurso interposto pela representante da Fazenda Pública, violou o disposto no artigo 640.º do CPC.

G.

No recurso interposto pela representante da Fazenda Nacional, o qual impugna a decisão relativa a matéria de facto, nos termos do supra referido artigo, deveria ter sido cumprido pontualmente o ónus de indicar quais os concretos pontos da factualidade dada como provada que considera incorretamente julgados , assim como, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizado, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida H.

No entanto, tal não se verificou, existindo uma omissão da indicação dos concretos pontos que foram julgados incorretamente, assim como, na referência aos testemunhos realizados, não foi indicada com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso.

I.

Um recurso que visa precisamente demonstrar e convencer que ocorreu determinado erro na valoração das provas só pode considerar-se satisfatoriamente cumprido se o recorrente começar por demonstrar, na sua alegação, quais foram as provas relevantes e qual foi o resultado probatório delas emergente.

J.

Impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto sem proceder a uma expressa e concreta referência das provas realmente produzidas em audiência e a uma análise crítica da sua valoração pelo julgador, tendo em conta o teor efectivo e completo dos depoimentos produzidos, não traduzirá seguramente exercício fundado e adequado do "direito ao recurso", que não comporta a possibilidade de vagas , genéricas e indemonstradas imputações de erros de julgamento à decisão do tribunal incidente sobre a matéria de facto.

K.

Para esse efeito, apenas foi referido nas alegações da representante da Fazenda Pública a sua discordância com a interpretação dada aos testemunhos obtidos , nomeadamente quanto há questão dos pratos do dia e aos menus disponibilizados pelo recorrente no seu estabelecimento comercial, sem que para o efeito, fossem referidas as "passagens" que demonstram com exatidão onde se funda a sua discordância.

L.

Existindo apenas, uma referência vaga ao depoimento do Sr. B…….., como se pode constatar no artigo 20° das alegações de recurso da representante da Fazenda Nacional e no ponto 12. das conclusões desse mesmo articulado.

M.

Tal matéria, foi determinante para aferir o funcionamento da atividade do agora reclamante, sendo que os testemunhos obtidos, pela sua credibilidade e espontaneidade, constituíram fontes legítimas que demonstraram em concordância a realidade da atividade do recorrente, e por esse facto, determinantes para formular a convicção do juiz, nos termos do princípio da livre apreciação da prova (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).

N.

Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

O.

Não podem os depoimentos prestados ser postos em causa ou serem considerados insuficientes para demonstrar a realidade da atividade do reclamante, sem que para tal exista uma expressa referência aos momentos desses mesmos testemunhos que demonstre que a decisão tomada em primeira instância não foi a correta, constituindo tal omissão uma violação ao princípio supra referido e do encargo do ónus que recai sobre o recorrente que impugne matéria de facto .

P. A jurisprudência é dominante no sentido, que a omissão dos pressupostos do art. 640 .º do CPC, tem como consequência a imediata rejeição do recurso.

Q.

No entanto, apesar das vicissitudes supra mencionadas nas alegações de recurso da representante da Fazenda Nacional, a mesma, não foi convidada ao aperfeiçoamento das suas alegações, da mesma forma que, o douto acórdão do qual aqui se reclama , não se pronunciou sobre tais questões.

R.

A decisão de admissão do recurso por parte do Tribunal a quo constituiu uma clara violação da lei processual civil, que afeta e vicia a decisão proferida.

S.

Nos termos do art. 150.º do CPTA, " Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo " T.

Dadas as circunstâncias, considera o recorrente que estão preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso de revista.

U.

A "banalização" da imposição do ónus decorrente do art. 640.ºdo CPC, comporta um risco e assume relevância social fundamental V.

A sua violação, pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, estando em causa uma questão de especial capacidade de repercussão social ou de controvérsia relativamente a casos futuros do mesmo tipo, pelo que, a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio e se impõe pela segurança jurídica.

W.

A omissão da imposição do ónus rigoroso da impugnação da matéria de facto, contém uma...

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