Acórdão nº 0762/16.3BESNT 0718/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelNEVES LEITÃO
Data da Resolução01 de Julho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1. A………. – …………, L.da, interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra em 10 abril 2018 que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios (exercício de 2009) no montante global de € 85 543,20 1.2. A recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões: 1.

    Nos termos dos artigos 103º nº 3 e 104º nº 2 da CRP a liquidação dos impostos deve seguir a lei e a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real.

  2. Nos termos do artº 752 da LGT, já atrás enunciado, presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal. A presunção aqui referida poderá ser elidida nos termos do nº 2 do mesmo artigo caso se verifiquem algumas das quatro situações aí referidas.

  3. Nos termos da Inspecção realizada pela AT em 2013 e 2014, esta considerou a Contabilidade da Recorrente como não credível no período de 2009 a 2012 inclusive. Deste modo avançou para aplicação de métodos indirectos no ano de 2011 e de correcções aritméticas nos anos de 2009, 2010 e 2012.

  4. As liquidações adicionais de 2009, em sede de IRC e acrescido, no montante de Euros 85.543,20, foram obtidas pela AT através de presunções e estimativas com base em avaliação indirecta, denominada de correcções meramente aritméticas, não pondo em causa o sistema de facturação certificado, o que contraria a lei.

  5. Ora contrariando o que seria razoável e como é expresso na pág 9 do Relatório, a utilização de métodos indirectos cingiu-se apenas ao exercício de 2011, procurando a AT por em causa a Margem bruta do negócio e os resultados tomando por base as chamadas correcções aritméticas nos anos de 2009, aqui em Recurso, em 2010 e 2012. Repete-se foi invocado pela AT a aplicação apenas de correcções aritméticas e não de métodos indirectos com as inerentes consequências em termos de mecanismos de defesa, constitucionalmente garantidos aos contribuintes e do prazo de caducidade que seria reduzido para três anos.

  6. Mas o que são correcções aritméticas para a AT e para o Tribunal a quo no ano de 2009 no contexto do Relatório inspectivo da Autoridade Tributária que considerou não credível a Contabilidade da empresa? -Como se sabe e nos termos do SNC os resultados das empresas são apurados pela diferença entre Proveitos e Gastos em sentido económico, não interessando se tais movimentos foram pagos ou não.

    Ora as liquidações adicionais da AT foram baseadas em presunções e estimativas como segue: f) Todos os depósitos (receitas e não rendimentos) foram vendas; g) Todos os cheques emitidos para os sócios da empresa (considerados todos distribuição de resultados) foram considerados mais vendas, quando a empresa mantinha até 2008 inclusive resultados transitados positivos que poderiam ser distribuídos a qualquer momento.

    1. Havendo mais vendas nestas presunções, a AT presumiu igualmente mais gastos, em Matérias Primas, não se sabendo quem os forneceu e pagou.

    2. Foi presumido que os Inventários finais eram iguais aos iniciais.

    3. Chegando a um Resultado adicional por esta via, desdobrou-o mensalmente por critério aleatório.

    Não pondo em causa o sistema de facturação por si certificado, será possível que a AT possa dizer a alguém que o processo por si seguido corresponde exclusivamente a correcções aritméticas? Será possível que um Tribunal de 1ª instância valide um procedimento nulo com o argumento que a AT pode usar em simultâneo métodos indirectos e correcções aritméticas? Toda a gente sabe desta brilhante conclusão, só que a AT usou avaliação indirecta por via de presunções e estimativas sem por em causa o sistema de facturação por si certificado, rotulando este procedimento exclusivamente de correcções aritméticas. Porquê? Por vários motivos. Entre eles para que o período de caducidade não fosse reduzido para três anos, o que conduziria a que antes do início da inspecção, o exercício de 2009 estivesse caducado e por outro lado a via da criminalização decorrente da aplicação de métodos indirectos ficaria prejudicada.

  7. Onde é que a realidade descrita se cruza com o conceito de correcções aritméticas descrito no Acórdão de 13/9/2013 do TAF do Porto no processo 00120/03 - 2ª secção do contencioso tributário onde se lê "são correcções meramente aritméticas da matéria tributável aquelas em que a AT não recorre a qualquer método de avaliação da matéria colectável (directo ou indirecto) para determinar o imposto devido e se limita a corrigir erros de cálculo das declarações-liquidações" ? EVIDENTEMENTE QUE NÃO HÁ CRUZAMENTO NENHUM POIS SÃO REALIDADES DISTINTAS.

  8. Admitindo, sem conceder, que o processo seguido pela AT eram correcções aritméticas, este caminho não deixa de estar eivado de dúvidas e incertezas pois não nos podemos esquecer que estamos em presença de presunções. Assim: -Sem reconciliações bancárias, como é possível garantir que todos os depósitos são vendas? Sem por em causa a facturação certificada? -Existindo movimentos creditados numa conta do sócio, mais tarde devolvidos, total ou parcialmente (?) para contas da empresa, como é possível garantir que todos os movimentos são exclusivos da actividade da empresa? -Chegando a vendas adicionais, presumiram gastos em matérias primas, em que base ou percentagem das vendas? Quem efectivamente comprou tais matérias-primas e as pagou? -Quem garante que as existências finais reais foram iguais às iniciais? -Quem garante que o acréscimo de vendas arranjado pela AT foi proporcional às vendas em cada mês de 2009, o que tem implicações por exemplo no cálculo de juros? Torna-se claro que, mesmo admitindo o procedimento que consideramos nulo, o mesmo está eivado de dúvidas. E quando um cidadão médio perante isto tem dúvidas, as mesmas têm de reverter a favor do contribuinte, por via de anulação das liquidações oficiosas nos termos do artigo 100º nº 1 do CPPT.

  9. Por fim a fundamentação da AT, no âmbito do seu processo inspectivo, não é minimamente adequada para a aplicação de correcções aritméticas, antes legitimando a aplicação de métodos indirectos o que foi feito mas não assumido pela AT.

  10. Nos termos do artº 104º nº 1 da CRP a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real. Igualmente nos termos do artº 103º nº 3 da CRP ninguém deve ser chamado a pagar impostos cuja liquidação não seja feita nos termos da lei.

  11. A aqui Reclamante cumpriu o seu dever declarativo nos anos de 2009 a 2012, apresentando em tempo o modelo 22, com a determinação do lucro tributável nos termos do artº 17º do CIRC, lucro esse suportado na sua contabilidade e correspondente á diferença entre Rendimentos e Gastos, obtidos numa óptica económica, isto é independentemente dos recebimentos e pagamentos, cumprindo assim o princípio da especialização dos exercícios e as normas do SNC e do anterior POC.

  12. Nos termos do artº 75º da LGT, já atrás enunciado, presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal. A presunção aqui referida poderá ser elidida nos termos do nº 2 do mesmo artigo caso se verifiquem algumas das quatro situações aí referidas.

  13. Apesar dos rácios do Resultado Líquido sobre Vendas serem muito superiores à tabela fiscal para a actividade de restauração normal, antigo CAE 55301, a que correspondia uma rentabilidade percentual de 1,43%, a AT através da sua inspecção veio a declarar, expressamente, os factos que a levam a considerar que a Contabilidade da aqui Recorrente não mereciam confiança em todo o período decorrido entre 2009 e 2012 inclusive.

  14. Ora a Douta Sentença do Tribunal a quo constitui uma autêntica falácia demonstrativa da colagem à tese da AT e do não conhecimento efectivo do que são correcções aritméticas.

  15. Passar por cima dos factos e vir afirmar que os pressupostos do acréscimo de vendas e do Iva determinados por via de presunções e critérios incorrectos e altamente duvidosos, aplicados sobre uma contabilidade que não lhes merece confiança, são correcções aritméticas, é uma subversão ao próprio conceito de correcções aritméticas.

  16. Diz o Acórdão de 13/9/2013 do TAF do Porto no processo 00120/03 -2ª secção do contencioso tributário que "são correcções meramente aritméticas da matéria tributável aquelas em que a AT não recorre a qualquer método de avaliação da matéria colectável (directo ou indirecto) para determinar o imposto devido e se limita a corrigir erros de cálculo das declarações-liquidações" .

  17. Com o devido respeito, tal conceito legal nada tem a ver com o aplicado pela AT e que foi sufragado indevidamente pelo Tribunal a quo.

  18. A Douta Sentença do Tribunal a quo disserta do ponto de vista da aplicação de métodos correctivos por parte da AT, afirmando, o que já é conhecido, que a AT pode utilizar métodos indirectos e correcções aritméticas em simultâneo e que podem utilizar métodos diferentes em exercícios distintos desde que devidamente justificados.

  19. Ora o exposto em 18) seria verdadeiro se a realidade de partida em cada um dos anos fosse diferente. Ora o que aconteceu é que o Relatório Inspectivo declara taxativamente que a Contabilidade da Recorrente não era credível no período entre 2009 e 2012. Não há qualquer alteração ano a ano para o exposto.

  20. Mas mesmo admitindo que tal fosse verdade, aquilo que a AT e o Tribunal a quo não podem fazer ou permitir é fazer avaliações indirectas da matéria colectável com base em presunções e estimativas que deixam dúvidas e afirmarem...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT