Acórdão nº 4/17.4VLSB-B.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Julho de 2020
Magistrado Responsável | ABRUNHOSA DE CARVALHO |
Data da Resolução | 02 de Julho de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: No Juízo de Central Criminal de Lisboa, por despacho de 10/10/2019, constante de fls. 83, sobre requerimento de II, foi decidido o seguinte: “… No acórdão proferido nos autos não ficou provado que o veículo automóvel de matrícula …………… se relacionasse com a prática dos factos pelos quais os arguidos foram condenados. Tal resulta da leitura da factualidade que, nessa decisão, resultou provada e não provada. Deste modo, inexiste qualquer lapso ou obscuridade que possibilite a respectiva correcção, por não estarem verificados os pressupostos previstos no art. 380°, nº 1, al. b), do CPP.
Por conseguinte, não se encontrando provados, no acórdão proferido nos autos, factos que permitam declarar a perda do veículo a favor do Estado (nos termos do disposto nos arts. 35º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, e 109º, nº 1, do Código Penal), determino o levantamento da respectiva apreensão e a sua restituição à requerente de fls. 3981, titular inscrita da viatura, nos termos previstos no art. 186°, nºs 2 e 3, do CPP.
…”.
* Não se conformando, o Exm.º Magistrado do MP[1], interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 92/100, com as seguintes conclusões: “…
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Como resulta do douto Acórdão transitado em julgado, não foi aí dado destino ao veículo automóvel de matrícula ……………., impondo o art. 374º, nº 3, al. c), do C.P.P. (requisitos da sentença), que a sentença termina pelo dispositivo que contém a indicação do destino a dar a coisas ou objetos relacionados com o crime.
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Tem precisamente o art. 380º, nº 1, al. a), do C.P.P., aplicação nas situações em que se imponha, verificados os respetivos pressupostos, a correção da sentença em conformidade mesmo após o trânsito em julgado respetivo, uma vez que dispõe o nº1, al. a) do preceito que o tribunal procede, oficiosamente ou a requerimento, à correção da sentença quando, fora dos casos previstos no artigo anterior (art.379.º - Nulidade da sentença), não tiver sido observado ou não tiver sido integralmente observado o disposto no artigo 374.º.
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E, nos termos do art. 135º, nº 2, al. d), da LOSJ, compete ao Juiz presidente do Tribunal Coletivo que proferiu o Acórdão, suprir as deficiências das sentenças e dos acórdãos referidos nas alíneas anteriores, esclarecê-los, reformá-los e sustentá-los nos termos das leis de processo.
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Ao não ter sido corrigido o Acórdão nos termos das referidas disposições legais, não tendo sido acolhido o promovido a fls.3989, ocorreu a violação do disposto nos arts. 380º, nº 1, al. a), e 374º, nº 3, al. c), do C.P.P., correção essa que teria de ser efetuada pelo Juiz presidente do Tribunal Coletivo que proferiu o Acórdão sob pena de nulidade insanável por violação do art. 135º, nº 2, al. d), da LOSJ, nos termos e com os efeitos consagrados nos arts. 119º, al. e), e 122º, do C.P.P..
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Veio II, a fls.3981, invocando a qualidade de interveniente acidental, alegar para requerer a devolução do veículo de marca ………….., com a matrícula ……………, ser sua proprietária, ter sido apreendido ao seu marido DD e desconhecer a sua utilização para além do normal funcionamento.
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Ora, num primeiro momento, há que ser definido na sentença, ou em sede da sua correção posterior por aplicação dos referidos normativos legais como no caso, se o objeto apreendido está ou não relacionado num registo de essencialidade com o crime, face ao disposto nos arts. 109º do C.P. e 35º do D.L. nº 15/93, de 22/01 e, num segundo momento, ainda na sentença, ou em sede da sua correção posterior, importará de seguida decidir o destino do objeto, g) ou a declaração de perda a favor do Estado, se se concluir que o objeto apreendido está relacionado com o crime numa relação de essencialidade, tendo-se ainda presente a necessidade de aplicação do disposto nos art. 111º do C.P. tratando-se de bem pertença de terceiro, o que tem de resultar inequivocamente provado nos autos, h) ou a entrega ao seu assim comprovado legítimo proprietário.
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O terceiro que invoque a titularidade de coisas, direitos ou objetos sujeitos a apreensão ou outras medidas legalmente previstas aplicadas a arguidos por infrações previstas no D.L. nº15/93, de 22/01, pode deduzir no processo a defesa dos seus direitos, através de requerimento em que alegue a sua boa fé, indicando logo todos os elementos de prova, entendendo-se por boa fé a ignorância desculpável de que os objetos estivessem nas situações previstas no n.º 1 do artigo 35.º do mesmo diploma legal.
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Ou seja, parece-nos inegável que sempre o requerente terá de comprovar nos autos o que alega em abono da pretensão formulada, indicando logo todos os elementos de prova, o que no caso não se verificou, cujos pressupostos estão assim por demonstrar terem-se verificado, desde logo quanto ao invocado desconhecimento da utilização da sua viatura pelo arguido, seu marido, para além do normal funcionamento.
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E, no caso, a requerente não fez prova do alegado desconhecimento de tal utilização da sua viatura para além do normal funcionamento.
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Posto isto, no que ao caso importa, da matéria de facto provada decorre inequivocamente que o objeto apreendido está relacionado com o crime, face ao disposto nos arts. 109º do C.P. e 35º do D.L. nº 15/93, de 22/01, verificando-se inclusive o requisito «essencialidade», traduzido na circunstância de o bem em causa ser necessário ao surgimento do ilícito penal ou, pelo menos, à sua manifestação de determinado modo.
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Na verdade, sem o concurso da viatura automóvel em causa o crime de tráfico de estupefacientes não teria ocorrido, face: - Às movimentações e contactos que proporcionou com vista à boa prossecução da conduta de todos atentos os fins pretendidos.
- À deslocação na mesma para Monsanto, essencial para o transbordo e transporte da quantidade de produto estupefaciente, dinheiro demais objetos nela transportados e apreendidos.
- E, posteriormente, à proporcionada fuga e sua...
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