Acórdão nº 1343/10.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução04 de Junho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO I….., SA (doravante 1.ª Recorrente ou Impugnante) e a Fazenda Pública (doravante 2.ª Recorrente ou FP) vieram apresentar recurso da sentença proferida a 19.06.2013, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação apresentada pela primeira, que teve por objeto a liquidação adicional de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), relativa ao exercício de 2007.

Os recursos foram admitidos, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, a 1.ª Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “A - O contrato de suprimento é insusceptível de “ser contratado(s), aceite(s) e praticado(s) em termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis; B - A contrapartida de um contrato de suprimento consiste prima facie na valorização da participação social do prestador (seja através do incremento dos dividendos esperados, seja através da valorização do investimento) sendo que apenas, acessoriamente e quando o interesse concreto do sócio na prestação de suprimentos ultrapasse o fim social, se justifica a estipulação de juros.

Por outras palavras, C - A finalidade social congénita do contrato de suprimento tem por corolário necessário que a compensação do sócio prestador, muito embora susceptível de ser combinada com outros elementos, há-de residir sempre num acréscimo dos lucros esperados e/ou numa valorização da sua participação em capital.

Mas mais, D - Não cabe nas competência da administração fiscal, sob pena de intromissão ilegítima na autonomia e liberdade de gestão do contribuinte, pronunciar-se sobre se a relação causa-efeito de determinada despesa incorrida (no caso, a través da retribuição através de juros ou da valoração da sua participação social) com vista à obtenção de lucros deve ser directa ou indirecta E - Não tem assim fundamento aplicar aos contratos de suprimento o regime da remuneração de plena concorrência contemplado no art.º 58.º CIRC (na redacção vigente à data dos factos) F - Ao estender aos suprimentos concedidos pela recorrente à sua participada I….. o tribunal à quo violou norma legal expressa - o art.º 58.º CIRC na redacção então vigente; Acresce que, G - Não sendo os contratos de suprimento e os contratos de mútuo equiparáveis, muito especialmente no que respeita às distintas realidades económico-financeiras a que se referem, é destituído de todo e qualquer fundamento acolher como padrão/referencial para aferir da remuneração dos primeiros a remuneração correntemente praticada relativamente aos segundos.

H - Ao acolher como padrão/referencial da remuneração dos suprimentos concedidos pela recorrente à sua participada a remuneração praticada no mercado relativamente aos contratos de mútuo, a aliás douta sentença recorrida violou norma legal expressa - o art.º 58.º CIRC na redacção então vigente.

Mas mesmo que assim se não entenda, I - A não remuneração dos suprimentos prestados pela recorrente à sua subsidiária I….. teriam sempre que se ter por justificados, quando por maioria de razão o são em casos de mútuo, sempre que se demonstre a debilidade económico financeira da beneficiária, conforme entendimento expresso da AT integralmente acolhido pelo Tribunal a quo.

Ora, J - A ora recorrente fez manifestamente prova bastante da debilidade económico financeira da sua subsidiária I….. e correspondente da necessidade de apoio financeiro por parte da sociedade-mãe, a ora recorrente.

K - Tal circunstância resulta patente da nota 16 (informação relativa a empresas do grupo e associadas) do anexo às demonstrações financeiras individuais do sujeito passivo referentes ao exercício de 2007 que é parte integrante do seu dossier fiscal junto aos presentes autos.

L - Ao desconsiderar em absoluto as demonstrações financeiras da recorrente, cujo rigor e credibilidade em momento algum foram postos em crise, o Tribunal a qual violou frontalmente os princípios da valoração da prova produzida.

M - Perante tal circunstância, não pode esse Venerando Tribunal deixar de considerar como indiscutivelmente demonstrada a debilidade económico-financeira da beneficiária dos suprimentos e, desde logo como justificado, independentemente de todo o demais, a não remuneração do financiamento concedido pela ora recorrente.

N - E mesmo que assim se não entenda, o que só em tese se concede, impunha-se sempre que os serviços da AT, em obediência ao princípio da colaboração reciproca contemplado no art.º 59.º da LGT, a considerarem os indicados elementos como insuficientemente esclarecedores, solicitar do sujeito passivo as informações complementares que houvessem por adequadas.

O - Ao não actuarem em obediência a tal preceito legal os serviços da AT violaram disposição legal expressa.

P - Em igual violação de lei incorreu o Tribunal a quo ao retirar de tal omissão as necessárias consequências - a nulidade da liquidação impugnada”.

A FP não contra-alegou.

Por seu turno, a 2.ª Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “A. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a impugnação judicial parcialmente procedente, anulando a liquidação na parte correspondente às prestações concedidas pela impugnante à I….., SGPS, SA, no montante de €6.531.565,84.

B. A decisão ora recorrida, no que concerne às prestações acessórias concedidas e não reembolsadas pela sociedade participada I….., SGPS, S.A., não faz, salvo o devido respeito, total e acertada aplicação das normas legais aplicáveis ao caso sub-júdice e, bem assim, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante. Vejamos: C. A sociedade I….., S.A., NIPC ….., ora impugnante, é a sociedade dominante e responsável pela auto-liquidação do Imposto sobre o Rendimento das pessoas Colectivas ("IRC") devido pelo grupo ao qual, no exercício de 2007, foi aplicável o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades ("RETGS"), composto por si e pelas sociedades G….., S.A. e I….., S.A.

D. Em cumprimento da Ordem de Serviço nº ….. de 2009/07/06, a inspecção tributária procedeu à análise interna relativa a IRC e IVA, reportada ao exercício de 2007, da sociedade ora impugnante, tendo sido efectuadas duas correcções ao lucro tributável em sede de IRC: • Anulação da dedução à matéria colectável de € 6.5631.565,84, correspondente a 50% da perda suportada pelo sujeito passivo a título de prestações acessórias concedidas e não reembolsadas pela sociedade I….., SGPS, S.A., em sede da sua liquidação; • Acréscimo ao resultado tributável da importância de € 172.498,98 a título de remuneração de plena concorrência associada a suprimentos prestados a entidades relacionadas.

E. Não se conformando com as aludidas correcções, a I….., S.A. interpôs a presente impugnação.

F. No que concerne à correcção relativa ao acréscimo ao resultado tributário de € 172.498,88, a título de remuneração de plena concorrência associada a suprimentos prestados à sociedade dominada I….. SAS, a Fazenda Pública nada tem a acrescentar à douta sentença proferida no Tribunal a quo que decidiu pela manutenção da liquidação.

G. No entanto, no que diz respeito à perda relativa a prestações acessórias concedidas e não reembolsadas pela sociedade participada I….., SGPS, S.A., no montante de 6.531.565,84€, a Fazenda Pública não pode conformar-se com a decisão.

H. O Tribunal anulou a liquidação, defendendo que "(...) atendendo a que não foi posta em causa pela IT a comprovação do montante em causa, nem a sua contabilização, nem mesmo a sua relação com o objecto da sociedade, deverá o mesmo ser relevado fiscalmente nos termos do art. 23º do CIRC, devendo para o efeito atender-se ao disposto no art. 42°, n°3 do CIRC, na redacção então vigente, considerando-se que concorre para a formação do lucro tributável metade do valor das prestações em causa, no montante de 6.531.565,84€, pelo que nesta parte assiste razão à impugnante." I. Conforme refere o Relatório da Inspecção Tributária "A I….., S.A. deduziu indevidamente no apuramento do lucro tributável o montante de 6.531.565,84 € correspondente a 50% da perda decorrente das prestações acessórias concedidas à sua participada I….., SGPS, SA e não reembolsadas à data da liquidação desta empresa. Face ao exposto será efectuada uma correcção de acordo com o estatuído no artigo 23° tendo em conta o disposto no artigo 39º, ambos do Código do IRC." (sublinhado nosso) J. Com a dissolução de uma sociedade termina a prossecução do objecto social e dá-se início à fase de liquidação que consiste no conjunto de actos realizados com vista á satisfação dos direitos de terceiros e a realização de activos com vista á repartição pelos sócios do conjunto de valores a partilhar.

K. No caso em análise importa analisar a figura das prestações acessórias sob o regime das prestações suplementares no momento da dissolução e liquidação de uma sociedade.

L. "Enquanto a sociedade vive a sua vida normal, não pode o sócio exigir a restituição da prestação suplementar, mas quando a sociedade é liquidada (exceptuada a liquidação em caso de falência, por força do artigo 213º nº3) há necessariamente um momento em que as prestações suplementares devem ser restituídas (...) as dívidas da sociedade por prestações suplementares devem ser satisfeitas antes de se efectuar a partilha do saldo entre os sócios ou, reflexamente, deve ser reconhecido ao sócio um direito de crédito à restituição da prestação suplementar, condicionado à existência de activo social bastante, depois de satisfeitas na fase de liquidação as dívidas externas da sociedade." (Raul Ventura in Sociedade por Quotas Vol.1) M. Assim se conclui que, em relação às prestações "acessórias" concedidas pela impugnante à sociedade I….., estas tornam-se créditos exigíveis na data da liquidação da sociedade, sendo reembolsados caso exista activo suficiente para, depois...

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