Acórdão nº 171/13.6TVLSB.L2-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Junho de 2020
Magistrado Responsável | LUÍS ESPÍRITO SANTO |
Data da Resolução | 02 de Junho de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção).
I – RELATÓRIO.
Instaurou A [ Carlos ….], solteiro, residente na Rua Professor Egas Moniz, lote Egas Moniz, Albergaria-A-Velha, a presente acção declarativa contra: 1.
B [ …..-Companhia Portuguesa de Seguros de Vida, SA], com o NIPC n.º 501 836 926 e sede na Avenida José Malhoa, n.º 27, em Lisboa; 2.
C [ ….. -Companhia Portuguesa de Seguros, SA ], com o NIPC 501 836 918 e sede na Avenida José Malhoa, n.º 27, em Lisboa; 3.
D [ Banco …., SA,] com o NIPC 501 525 882 e sede na Praça D. João I, n.º 28, no Porto, Alegou, essencialmente: Contratou com a 1.ª Ré, na sucursal do D de Albergaria-A-Velha, dois contratos de seguro vida/invalidez total e permanente/invalidez absoluta e definitiva, associados a concessões de crédito que obteve naquela sucursal e a fim de garantirem o pagamento do respectivo capital e encargos, em caso de morte ou invalidez permanente.
Um desses contratos teve início em 27 de Março de 2009 e encontra-se titulado pela apólice n.º 0061190, associado e para garantia do capital de € 30.000,00, de um empréstimo imobiliário concedido ao Autor pelo D.
O outro contrato, titulado pela apólice n.º 00079820, teve início em 10 de Julho de 2009, e foi celebrado para garantia de financiamento do capital de € 6.868,51, prestado ao Autor pelo D a título de crédito pessoal.
Na mesma sucursal, o Autor contratou ainda com a Ré C, um contrato de seguro do ramo “protecção casa mais”, titulado pela apólice n.º MR79337398, com início em 17 de Abril de 2010, incluindo risco de furto/roubo para protecção dos haveres existentes numa outra casa do Autor sita na Avenida de Espanha, n.º 28, 2.º esquerdo, em Castelo Branco.
Em Abril de 2011, o Autor sofreu um AVC em consequência do qual ficou absolutamente incapacitado de cuidar da sua pessoa, necessitando permanentemente do acompanhamento de terceira pessoa para o alimentar, vestir, lavar e ajudar nas suas necessidades básicas, ficando igualmente incapacitado de trabalhar, tendo-lhe sido fixada uma incapacidade total permanente e definitiva de 75%.
Comunicado à 1.ª Ré e ao Réu D o sinistro, a 1.ª Ré negou-se a suportar os pagamentos, invocando que o Autor não a informara que padecia de diabetes quando preencheu as propostas de seguro e respectivos questionários.
O Autor não sabe ler nem escrever pelo que não leu e não preencheu qualquer questionário prévio, não leu as condições gerais nem as particulares dos seguros contratados com as Rés.
O AVC que incapacitou o Autor não resultou nem teve a ver com o facto de ser diabético.
Em 11 de Novembro de 2010, a casa do Autor foi assaltada, em Castelo Branco, tendo sido furtados diversos objectos, entre os quais objectos em ouro que tinham sido objecto do contrato de seguro.
A Ré não questionou o sinistro nem a sua responsabilidade na sua regularização, que aceitou, mas não aceitou pagar a totalidade do ouro que fora roubado, invocando as condições gerais da apólice que o Autor nunca leu (nem ninguém lhas leu).
Todos os contratos celebrados pelo Autor, através do 3.º Réu, são contratos de adesão, e o Autor nunca teve conhecimento prévio dos seus termos e clausulados, que não leu, nem podia ler, e nenhum dos funcionários do Banco com quem tratou lhe leu ou deu a conhecer, apesar de saberem que o Autor não sabia ler e que padecia de diabetes.
Conclui pedindo a condenação: (i) Da Ré B a pagar-lhe a quantia de € 36.868,51; (ii) Da Ré C a pagar-lhe a quantia de € 81.500,00; (iii) Do D a pagar solidariamente com as duas Rés o total de € 118.368,51; (iv) De todos os Réus a pagarem os juros vincendos a partir da citação, à taxa legal.
Citados, todos os Réus contestaram: as Rés B e C invocaram a excepção de coligação ilegal entre as Rés e que o Autor omitiu à 1.ª Ré que padecia de diabetes, ocultando-lhe, assim, e intencionalmente, os reais condicionalismos do “Risco”, que se a 1.ª Ré tivesse conhecimento da mesma nunca teria aceite a adesão do Autor aos contratos de seguro de vida, razão pela qual a 1.ª Ré procedeu à anulação dos seguros de vida.
Relativamente à apólice n.º MR79337398, a Ré C alegou que nos casos em que o tomador do seguro não discrimine os «objectos especiais», como o ouro, o montante do capital dos objectos especiais fica limitado a 20% do valor total do recheio, no máximo de € 7.500,00 e que, no caso concreto, o Autor não discriminou nem tão pouco valorou os objectos em ouro.
Quanto ao Réu D, o mesmo contestou por impugnação, nos termos que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
O Autor apresentou Réplica.
Foi proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a excepção de coligação ilegal.
Procedeu-se à realização da audiência final.
Nesta sede foi apresentado o articulado superveniente que consta de fls. 602 dos autos, o qual foi admitido pelo Tribunal e, consequentemente, foram aditados novos factos aos Temas de Prova.
Foi proferida sentença que julgou a presente acção improcedente a presente acção, absolvendo os Réus B, C e D de todos os pedidos (cfr. 773 a 811) A A. apresentou recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação (cfr. fls. 885).
Contra-alegou a apelada, pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida.
Foi proferido neste Tribunal da Relação acórdão datado de 23 de Janeiro de 2018 (fls. 894 a 924), decidindo julgar procedente a apelação, determinando-se a anulação parcial do julgamento e a anulação da decisão recorrida, procedendo-se à sua repetição do presente acórdão quanto à questão de facto da existência ou inexistência do “sinistro furto”.
Arrolada nova prova e realizada audiência de julgamento nos termos ordenados, veio a ser proferida sentença que julgou improcedente a presente acção, absolvendo os RR.
B e D, de todos os pedidos (cfr. fls. 1081 a 115).
Apresentou, de novo, o A. recurso contra esta decisão, o qual foi recebido como de apelação (cfr. fls. 1173).
Juntas, a fls. 1133 a 1169, as respectivas alegações, destas constam as seguintes conclusões: 1. Circunscreve-se o objecto do presente recurso, de forma simples e singular às seguintes questões a resolver nesta Instância:
-
Se a 3ª Ré podia impugnar todos os factos articulados pelo A., mais concretamente a verificação ou não do sinistro.
-
Se essa impugnação da 3ª R., aproveita à 2ª R.
-
Se em face da prova produzida em sede de audiência de julgamento, conjugada com a prova documental apresentada, resulta provada a ocorrência do sinistro; d) Se em face da prova produzida em sede de audiência de julgamento conjugada com a prova documental apresentada, resulta provado que o valor das peças seguradas pela Ré era de € 119.000,00.
-
Comecemos então por responder à 1ª pergunta: - Podia a 3a Ré impugnar todos os factos articulados pelo A., mais concretamente a verificação ou não do sinistro? - A resposta é: Não! 3. Efectivamente, dispõe o artº 574 nº1 do CPC que o réu deve tomar posição sobre os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.
-
Sendo que, na presente acção existe 1 Autor e 3 Rés em coligação, coligação essa que se verifica, em virtude de, não obstante os pedidos e as causas de pedir serem diferentes, existir um relação de prejudicialidade e dependência entre si.
-
Assim, para cada uma das Rés, o A. invocou factos diversos que constituem as diversas causas de pedir imputadas a cada uma das diferentes Rés.
-
Pelo que, à 2a Ré é imputada a responsabilidade do pagamento de uma indemnização alegando o A. a verificação de um sinistro, que se encontrava por esta segurado.
-
Já à 3ª Ré é imputada a responsabilidade do pagamento solidário da mesma indemnização, alegando o A. que se o preenchimento da proposta de Seguro padecia de algum erro, imprecisão ou causa de exclusão de risco (tal como era alegado pela 2a Ré) tal se tinha ficado a dever à muito deficiente e dolosa (ou, pelo menos, culposa) actuação do Banco ora 3.° Réu, que, na sua actuação, radicou no Autor a convicção firme de que tinha direito às pretensões formuladas, omitindo o dever de o informar sobre todas as condições e clausulados dos contratos, induzindo conscientemente o Autor em erro - vide artigo 37° da petição do A.
-
Assim, no presente processo, o que haveria de se ajuizar seria o seguinte: - Verifica-se ou não a cláusula de exclusão - não discriminação e valorização dos objectos constantes da proposta de Seguros - que fundamenta o não pagamento pela 2a Ré do montante reclamado pelo A.; - Em caso afirmativo se a verificação dessa cláusula de exclusão se ficou a dever à actuação culposa da 3a Ré.
-
Assim, não poderia a 3a Ré impugnar a verificação do sinistro, pois só à 2a Ré tal facto dizia respeito, constituindo a causa de pedir invocada pelo A. contra a 2a Ré.
-
Pelo que, estamos perante uma clara violação ao principio do dispositivo, o que leva à nulidade da sentença.
-
Caso assim não se entendesse teríamos ainda de responder à 2a pergunta: b) A impugnação da 3a R., dos factos articulados pelo A., aproveita à 2a R? Mais uma vez, na nossa opinião, não! 12.
Efetivamente, escreveu Alberto dos Reis (C.P.C. Anotado, vol. 3°, 3a ed., 12), “no processo ordinário os réus não contestantes beneficiam da oposição deduzida pelos contestantes, quer se trate de litisconsórcio necessário, quer de litisconsórcio voluntário”. (o sublinhado é nosso!) 13-Pelo que, sendo a 2a Ré contestante, não beneficia da oposição deduzida pela 3a Ré.
-
De facto a 2a Ré deduziu a sua própria contestação, e impugnou os factos que lhe eram dirigidos e que entendeu que devia impugnar e aceitou os factos que entendeu que devia aceitar.
-
Efectivamente, na sua contestação, a 2a Ré, C , nunca impugnou a existência do sinistro, nem a assunção da sua responsabilidade na regularização do mesmo, como aliás fica bem patente no artigo 86° da sua contestação, na qual a 2a Ré faz questão de impugnar apenas “o alegado nos artigos 28° a partir de “(...) mas que só (...)” até “(...) fora roubado(...)”, 29 e 30.° da P.I.” 16.
Ou seja, a...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO