Acórdão nº 1098/08.9BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução21 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, a qual julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade X….., LDA, tendo por objeto o indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado contra o ato de liquidação oficiosa de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), nº …..502, referente ao exercício de 2005, no valor de €223.440,35.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: A. Em caso de decisão expressa de indeferimento de um pedido de revisão oficiosa do acto tributário, formulado pelo contribuinte nos termos do art.º 78º da LGT, a tutela graciosa dessa decisão é assegurada pelo recurso hierárquico previsto no art.º 66º do CPPT.

  1. Por seu lado, a tutela jurisdicional dessa decisão “pode ser a impugnação judicial ou o recurso contencioso (hoje acção administrativa especial) conforme a decisão comporte ou não a apreciação da legalidade do acto de liquidação” (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 2008-11-06 - Processo n.º 0357/08), tendo por referência o art.º 97º, n.º 1, als. d) e p) e n.º 2 do CPPT.

  2. No caso dos autos, a decisão com que se finalizou o procedimento de revisão oficiosa apenas aquilatou dos pressupostos para sua admissibilidade, à luz do prazo excepcional do n.º 4 do art.º 78º da LGT e da especial motivação que o possibilita, acabando por ter a natureza duma decisão liminar, onde não se chegou a apreciar a legalidade da liquidação oficiosa de IRC.

    O que apenas habilitaria a recorrida a vir junto do Tribunal, mediante a competente acção administrativa especial, contrariar os fundamentos e validade de tal decisão com vista a obter a sua anulação e, em consequência, obrigar a AT a pronunciar-se sobre o mérito do pedido de revisão oficiosa.

  3. Nesse conspecto, mal andou a sentença recorrida, pois com fundamentação de facto e de direito insuficiente, lobrigou descortinar na decisão impugnada uma inexistente apreciação da legalidade da liquidação oficiosa, sufragando-se a errónea forma processual utilizada pela ora recorrida.

  4. Pois sendo nos termos do art.º 98º do CPPT o erro na forma de processo causa de nulidade, é pacífico que tal erro é de conhecimento oficioso e passível de sanação, sendo porém para o Juiz obrigatória, se admissível, a convolação para a forma do processo adequada como prescrito pelo n.º 4 daquela norma.

  5. Desconsiderando-se no aresto recorrido a relevância de tal vício, que fora expressamente invocado pela Fazenda Pública e pelo Ministério Público, o mesmo consuma-se com a prolação da decisão final, sendo assim susceptível de recurso jurisdicional (v. Acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, de 2001-10-02 - Recurso n.º 42385) O que justifica solicitar-se a esse Tribunal Central Administrativo que decrete a nulidade do processo.

    I. Concomitantemente, por não se reputar ser in casu possível a convolação da impugnação judicial em acção administrativa especial, uma vez verificada a aludida excepção dilatória será de se absolver a Fazenda Pública da instância.

  6. Subsidiariamente, assaca-se ainda à sentença contendida o vício de excesso de pronúncia, cominado com nulidade no art.º 125º, n.º 1 do CPPT, pois enveredou pela apreciação da legalidade da liquidação oficiosa de IRC, quando deveria tão só julgar da propriedade da forma de processo utilizada pela ora recorrida.

  7. Pois a obrigação que impende sobre o julgador de se pronunciar sobre todas as questões que as partes submetam à sua apreciação (art.º 608º, n.º 2 do CPC), cede perante a obrigação reflexa de não dever pronunciar-se sobre questão da qual não deva conhecer.

    L. E a pronúncia sobre a inviabilidade da impugnação judicial tributária para reagir da decisão expressa da AT e a necessidade de proceder à sua convolação em acção administrativa especial, impunham ao Tribunal a quo considerar ficar assim esgotado o seu poder de cognição, abstendo-se de apreciar as demais questões suscitadas nos autos.

  8. Não o tendo feito, gera invalidade que deverá merecer a adequada censura do Tribunal de Recurso, por via do decretamento da nulidade da sentença recorrida.

    Nestes termos e nos demais que o Colectivo entenda por bem convocar, defende a Fazenda Pública que se julgue procedente este recurso e seja determinada a anulação da sentença recorrida, fazendo dessa forma V. Exa a tão costumada Justiça”.

    *** A Recorrida apresentou as seguintes contra-alegações: l.Os fundamentos invocados pela recorrente não dizem respeito à justiça da decisão na sua substância, quer no que respeita à decisão da matéria de facto, quer no que respeita à matéria de direito, mas apenas à correção do meio processual utilizado, que a Recorrente entende dever ser a ação administrativa especial e não impugnação judicial, por considerar que a decisão que indeferiu o pedido de revisão oficiosa da liquidação não conheceu do mérito da mesma.

    1. É manifesto que não assiste razão à Recorrente, sendo correto o entendimento da douta sentença recorrida de que a decisão administrativa que indeferiu o pedido de revisão oficiosa conheceu da legalidade da liquidação porquanto a pretensão da Requerente foi efetivamente apreciada de mérito conforme se extrai do texto da informação assumida pela decisão, como fundamento da mesma, onde se pode ler, designadamente, o seguinte, no capitulo "APRECIAÇÃO DO PEDIDO" que: iii) (...) poderá ocorrer injustiça grave ou notória na atuação da administração tributária, quando actue no âmbito da aplicação vinculada da lei, ou quando viole os limites internos e externos da margem de livre apreciação ou discricionariedade; (...) v) (...) a AF actuou no âmbito da aplicação vinculada da lei, situação em que, de facto, pode ocorrer injustiça por ser tomada como base de tributação a matéria colectável de outro exercício(...).

      vi) Todavia, não pode tal injustiça ser considerada grave ou notória, pois, foi o comportamento negligente do contribuinte que a desencadeou, atendendo ao disposto no nº 4 do art.º 78.º da LGT" (...) xi) Por conseguinte, o pedido de revisão não pode ser atendido por não ter cabimento no 4 do art. 78º da LGT.” 3. No capítulo seguinte (V.), propõe-se "o indeferimento do pedido de revisão com os fundamentos expostos no ponto anterior”. E no subsequente a este (VI) escreve-se que "Por não se verificarem os pressupostos para a revisão oficiosa deve o presente pedido ser indeferido” pelo que, é evidente que foi apreciado o mérito/legalidade da liquidação e da pretensão de revisão do ato tributário improcedente a pretensão e não correspondente à realidade que tenha deixado de apreciar o pedido com fundamento na existência de algum hipotético obstáculo a tal conhecimento.

    2. A doutrina e jurisprudência invocada pela Recorrente não sustentam a sua tese, uma vez que se debruça sobre situações em que pela existência de obstáculos de natureza formal a pretensão do Requerente não chegou a ser apreciada, situação que não ocorre no caso dos autos, tendo a pretensão da recorrida sido apreciada e julgada improcedente, com os fundamentos invocados na decisão.

    3. Caso ocorresse alguma dúvida razoável (que no caso não ocorre) seria sempre de aplicar o art. 72 do CPTA, aplicável ex-vi art. 29, al. c) do CPTA e que constitui direito constitucional concretizado, decorrente do princípio da tutela judicial efetiva que dispõe que "Para efetivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas".

    4. Caso assim se não entendesse, o que sem conceder se coloca, a proceder a tese da Recorrente deveria então ordenar-se a convolação do processo na forma considerada adequada, por a isso nada obstar pois conforma acórdão do STA de 11.09.2013, proferido no proc. 669/13 "Havendo erro na forma de processo, haverá que ordenar a "convolação" do meio processual inadequado em meio processual adequado quando a tal não obste, como no caso, a intempestividade da petição de impugnação para ser apreciada como oposição ", situação que por mera hipótese académica e cautela de patrocínio se coloca e com a qual de forma alguma se concorda pelas razões expostas.

    5. De resto, caso colhesse a tese de que a ação administrativa especial seria o meio idóneo em caso de procedência da mesma estando a AT obrigada, em tal para indeferir a pretensão outros fundamentos para além dos que já foram invocados na decisão objeto da impugnação judicial, uma vez que a que a AT não põe em causa a correspondência à realidade dos factos invocados pela Recorrida atinentes à matéria coletável real.

    6. Em suma, a AT não contestou os factos apresentados pela Recorrida mas apreciou a pretensão apresentada e invocou razões jurídicas que no seu entender sustentariam o indeferimento da pretensão da Recorrida a ver revista a liquidação e substituída por outra efetuada de acordo com a matéria tributável real pelo que improcede, manifestamente, a tese de que a decisão que indeferiu o pedido de revisão não apreciou o mérito do requerimento e a legalidade/juridicidade da liquidação.

    7. De resto, constando da sentença que " Da prova documental que foi carreada para os autos, confirmada pelas testemunhas inquiridas e não contraditada pela Fazenda Pública, pode concluir-se que a impugnante, no exercício de 2005, apenas teve matéria colectável no valor de € 144.151,66.” (pag. 13) e tendo a liquidação por base uma matéria coletável, relativa ao exercício fiscal de 2005 da Impugnante, no valor de € 806.336,72, tendo por base a matéria coletável do exercício mais...

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