Acórdão nº 00735/19.4BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução15 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Ministério do Ambiente veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 13.03.2020, que julgou totalmente procedente o pedido de execução da decisão cautelar proferida nos autos que a V., Lda.

promoveu contra o ora Recorrente.

Invocou para tanto em síntese que: a sentença recorrida é nula por contradição entre os fundamentos e a decisão, desconformidade com a lei e obscuridade; em todo o caso viola diversas normas legais.

A Recorrida contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso porque, no seu entender, a sentença ao considerar as meras informações que foram comunicadas à ora Recorrida como actos administrativos violou o disposto no artigo 148.º do Código de Procedimento Administrativo; e ao, dessa forma, dar procedência ao pedido de execução violou os artigos 127º, nº 1, 164º, nºs 1, 2, 3 e 4 e 167º, nº 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, devendo ser revogada e julgando-se procedente o recurso.

A Recorrida veio responder a este parecer reiterando no essencial a posição que assumiu nas contra-alegações.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1- A decisão proferida na acção cautelar em que foi demandado o Ministério da Agricultura, o Tribunal a quo julgou procedente o pedido cautelar e, em consequência, suspendeu “a eficácia do acto administrativo notificado à Requerente através do ofício com a referência OF/462/(2019/DAAP, de 15/10/2019, o qual lhe impôs a destruição de todos os vegetais de citrinos existentes nas suas plantações ou, em alternativa, a manutenção desses vegetais num local oficialmente aprovado sob proteção física completa que exclua totalmente a introdução do inseto, durante o período mínimo de um ano e com proibição da sua movimentação.”.

2- Acatando a sentença proferida, a Administração por uma questão de igualdade para com todos os viveiristas revogou o acto proferido, no entanto, em cumprimento dos princípios da atividade administrativa, informou os viveiristas em causa, onde constava o, ora Recorrido, dos normativos em vigor e das implicações dos mesmos, nada inovando em relação a estes.

3- O ora Recorrido requereu a execução de sentença por entender que a mesma não tinha sido executada mais considerando que a Administração tinha utilizado de expedientes para violar o caso julgado, alegando para tanto que a informação prestada pela Administração consubstanciava um ato e afirmando que as suas plantas apesar de estarem na zona demarcada (zona tampão), eram sãs, mas sem exibir algo que o provasse.

4- O, ora, Recorrente em sede de oposição à execução alegou que deu cumprimento à sentença, tanto que retirou ao acto praticado todos os seus efeitos ao ponto de o ter revogado, e que o oficio notificado ao, ora, Recorrido a 04.02.2020 não poderia consubstanciar um acto porque não passava de uma informação para dar conhecimento dos normativos legais em vigor, a que o, ora Recorrido estava sujeito por ser um viveirista com viveiros numa região demarcada como zona tampão para efeitos de Trioza erytreae.

5- Proferida que foi a sentença, julgou improcedente a oposição deduzida pelo executado, e que, em consequência, declarou “a nulidade dos actos que foram notificados à Exequente através do ofício com a referência n.º OF/68/2020/NAJ e com n.º de saída 000881, de 31/01/2020 (ato que procedeu à revogação do despacho cuja eficácia foi suspensa), e através do ofício com a referência n.º OF/56/2020/DAAP e com n.º de saída 000913, de 04/02/2020 (ato que impôs à Exequente o cumprimento de condicionantes à circulação de produtos vegetais), ambos subscritos pelo Diretor Regional de Agricultura e Pescas do Centro;” e condenou “o Executado a dar cumprimento à sentença exequenda, abstendo-se de informar ou, directa ou implicitamente, compelir a Exequente no sentido da não comercialização das suas plantas sãs do ponto de vista fitossanitário, até, caso a tal nada obste, à decisão final a proferir no processo principal.” .

6- Tal sentença de que se recorre enferma de vários vícios por violação de Lei.

7- O Tribunal a quo fez tábua rasa da legislação em vigor, no referente ao “regime fitossanitário” que cria e define as medidas de protecção fitossanitária destinadas a evitar a introdução e dispersão em território nacional e comunitário, incluindo nas zonas protegidas, de organismos prejudiciais aos vegetais e produtos vegetais qualquer que seja a sua origem ou proveniência, constante do Decreto-Lei n.º 154/2005, de 06.09, publicado no Diário da Republica n.º 171/2005, série I-A de 06-09-2005 e suas alterações e republicações designadamente os Decretos-Lei n.ºs 193/2006, de 26 de Setembro; 16/2008, de 24 de Janeiro; 4/2009, de 05 de Janeiro; 243/2009, de 17 de Setembro; 7/2010, de 25 de Janeiro; 32/2010, de 13 de Abril; 170/2014, de 07 de Novembro; 137/2017, de 08 de Novembro; 41/2018, de 11 de Junho; 154/2019, de 18 de Outubro.

8- Este Decreto-Lei consagra o regime fitossanitário, transpondo para a ordem jurídica interna as Diretivas n.ºs 2002/89/CE, do Conselho, de 28 de Novembro; 2004/102/CE, da Comissão, de 5 de Outubro; 2004/103/CE, da Comissão, de 7 de Outubro; 2004/105/CE, da Comissão, de 15 de Outubro; 2005/15/CE, do Conselho, de 28 de Fevereiro; 2005/16/CE, da Comissão, de 2 de Março; 2005/17/CE, da Comissão, de 2 de Março e 2005/18/CE, da Comissão, de 2 de Março.

9- Estatui a subalínea i) da alínea d) do n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 154/2005, que “É proibida a introdução e circulação dos vegetais, produtos vegetais e outros objetos constantes da parte A do anexo IV quando não satisfaçam as exigências específicas aí indicadas para cada um deles”. Dispondo o ponto 10.1 da Secção II da Parte A do anexo IV, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 137/2017, de 8 de novembro, a seguinte correspondência: “Vegetais, produtos vegetais e outros objetos” - Vegetais de Citrus L., Choisya Kunth, Fortunella Swingle, Poncirus Raf., e os seus híbridos, e Casimiroa La Llave, Clausena Burm f., Murraya J. Koenig ex L., Vepris Comm., Zanthoxylum L., com exceção de frutos e sementes, tendo como “Exigências especificas” - Declaração oficial de que os vegetais: a) São originários de uma zona isenta de Trioza erytreae Del Guercio, estabelecida pela organização nacional de proteção fitossanitária em conformidade com as normas internacionais pertinentes relativas às medidas fitossanitárias; ou b) Foram cultivados num local de produção registado e supervisionado pelas autoridades competentes no Estado-Membro de origem, e onde os vegetais são colocados num local com proteção física total contra a introdução de Trioza erytreae Del Guercio, e onde, durante o último ciclo vegetativo completo antes da circulação, foram efetuadas duas inspeções oficiais em momentos oportunos, não se tendo observado sinais de Trioza erytreae Del Guercio nesse local nem na zona circundante com uma largura de pelo menos 200 m. (sublinhado e negritas nosso); 10- Da sentença recorrida resulta a desconsideração completa do texto anteriormente referido, que faz parte integrante da lei em vigor e aplicável ao caso vertente. Pois na sentença foi decretada “a nulidade dos actos que foram notificados ao Exequente através do ofício com a referência n.º OF/56/2020/DAAP e com o n.º de saída 000910, de 04.02.2020 (acto que impôs ao Exequente o cumprimento de condicionantes à circulação de produtos vegetais) ”, subscrito pelo Diretor Regional de Agricultura e Pescas do Centro, o que, salvo melhor opinião, não poderia acontecer, atendendo a que tinha de ser manifesto para o Tribunal a quo que, ao assim decidir, estava a violar o vigente no Regime Fitossanitário em vigor.

11- Donde se retira que o Tribunal estava impedido de se pronunciar naquele sentido, atento o texto da lei, porquanto nada do constante no referido ofício inovou relativamente ao quadro legal estavelmente fixado na lei desde finais de 2017, sendo que o tribunal não pode ir contra o legalmente estabelecido.

12- Sobretudo em face da publicação do Despacho n.º 1525-B/2020, proferido pelo Diretor-Geral de Alimentação e Veterinária e publicado em Diário da República, 2.ª Série, n.º 22, de 31 de janeiro, por meio do qual foram aprovadas as listagens das freguesias que integram a zona demarcada para a Trioza erytreae, o qual foi mantido incólume na ordem jurídica pela sentença a quo.

13- Assim, na verdade, salvaguardando o devido respeito por melhor opinião, a desconsideração do texto da lei aplicável, constitui uma situação de nulidade da sentença, em conformidade com a alínea c) do n.º 1 do art.º 615.º do Código do Processo Civil (CPC) aplicável ex vi o artigo 1.º do CPTA.

14- Sendo também este o entendimento da jurisprudência – cfr. Acórdão do STJ datado de 09-02-2017, Proc.º 2913/14.3TTLSB.L1.S1 ( ) onde se estriba que “Ocorre a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, al. c) do CPC quando os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente (…)”.

15- Atrevemo-nos a dizer que, se o Tribunal a quo se tivesse apercebido que era a própria lei a definir as condições legais de circulação (as limitações/condicionantes colocadas em crise no requerimento executivo) e não o ofício circular, o mesmo não teria seguramente decidido no sentido em que o fez.

16- Não imputando a sentença recorrida nenhum vício ou razão de inaplicabilidade à lei, no sentido da declaração da sua não obrigatoriedade no caso vertente, tendo assim deixado incólume o diploma e preceitos referidos, não poderia a Meritíssima Juiz a quo afastar a sua aplicação.

17- A sentença é, também, nula, atendendo a que está...

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