Acórdão nº 732/18.7T8PBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Março de 2020
Magistrado Responsável | LU |
Data da Resolução | 17 de Março de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO F (…) instaurou a presente ação declarativa contra J (…) e C (…) alegando, em síntese, que é proprietário dos prédios descritos no artigo 2.º da P.I. e que os mesmos confrontam com dois prédios pertencentes aos réus, sem que, porém, atualmente estejam marcadas e definidas as linhas divisórias entre os mesmos. Defendem, assim, que entre os seus prédios e um dos prédios do réu existia uma lomba que definia a respetiva linha divisória, junto à qual estavam cravados marcos, e que aqueles réus destruíram esses sinais demarcadores dos limites dos prédios, ao que acresce o facto de o Município de (…) ter efetuado obras junto à Rua K (...) que implicaram uma invasão do prédio dos réus confinante com a mesma, tudo contribuindo para a descaracterização das linhas divisórias pré-existentes.
Pelo que pretende o autor que os réus sejam condenados a ver demarcados os prédios melhor identificados nos artigos 2º e 3º da petição inicial e a reconhecer que a estrema em causa coincide com a linha divisória assinalada na planta topográfica junta a fls. 12, pela linha tracejada a vermelho, com a indicação “limite pelo valado” e a aceitar a colocação de novos marcos, reconhecendo o direito de propriedade do autor sobre os prédios atrás referidos até essa linha divisória ou outra que eventualmente venha a ser fixada pelo Tribunal e abstendo-se de praticar qualquer ato que, de qualquer modo, impeça, dificulte ou diminua o livre exercício do direito do autor sobre tais prédios até tal linha divisória.
* Citados para a presente ação, vieram os réus apresentar contestação, impugnando, desde logo, a factualidade alegada relativamente à configuração da linha divisória dos prédios e alegando que foi o autor quem arrancou os marcos existentes a Sul daquela linha e que demarcavam os limites Nascente/Poente dos prédios de ambos, nomeadamente um que existia em frente da moradia do autor e outro que estava cravado junto a uma oliveira, no limite Sul/Poente do prédio dos réus inscrito na matriz predial sob o artigo 8545 da freguesia da (...), defendendo, pois, que a linha divisória dos prédios era formada pela união desses marcos, terminando a Norte, num outro que ainda lá existe e que serve de demarcação de outros prédios pertencentes às mesmas partes, tudo nos termos do levantamento topográfico que junta a fls. 63. Mais alegam que o autor, para além dos marcos, destruiu também uma cultura de aveia que os réus haviam efetuado no seu prédio supra descrito e procederam à construção de um pavimento que invade a área daquele, numa zona que sempre serviu de passagem, pelos réus e respetivos antecessores, para os seus prédios, à vista de todos, sem oposição e na convicção de exercerem direito próprio. Finalmente alegam que os atos praticados pelos réus lhes causaram prejuízos patrimoniais no valor de € 500,00, pelos quais devem ser responsabilizados.
Por todo o exposto, terminam formulando uma reconvenção, através da qual pedem: i) o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o prédio identificado no artigo 31.º a) da reconvenção, com a área, confrontações e demarcação de acordo com o que se encontra alegado e plasmado no levantamento topográfico junto a fls. 63; ii) a condenação do autor a proceder à recolocação e implantação dos marcos no mesmo local onde se encontravam antes de serem por si arrancados, de forma a identificar claramente a linha divisória da estrema entre os prédios daquele (artigos 8557º, 8556º e 8555º) e o dos réus (artigo 8545º), conforme se encontra representado no referido levantamento topográfico, bem como a retirar toda a parte do pavimento em elementos de betão que construiu no prédio dos réus (artigo 8545º); iii) o reconhecimento do direito de servidão de passagem a pé e carro, pelos prédios do autor (artigos 8556º e 8555º), em benefício do seu prédio (o correspondente ao artigo 8554.º) com início junto à estrada municipal, actualmente identificada como Rua K (...) e atravessando os prédios do autor (artigos 8556º e 8555º) numa faixa de cerca de três metros de largura entre o marco que ali existia (arrancado pelo autor) e a casa do autor e até atingir o prédio dos réus (artigo 8554º) e, finalmente, iv) a condenação do autor a pagar-lhes, a título de danos patrimoniais, a quantia de 500,00 €.
* Seguiu-se a réplica apresentada pelo autor/reconvindo, através da qual este respondeu, impugnando os factos invocados na reconvenção e defendeu, concretamente, que os réus/reconvintes podem ter acesso aos seus prédios diretamente da via pública, não necessitando de passar pelo prédio do autor, pugnando, pois, pela improcedência dos pedidos reconvencionais formulados.
* Foi admitida a reconvenção deduzida e efetuado o saneamento da causa, seguido da prolação do despacho a que alude o artigo 596.º n.º1 do Código de Processo Civil.
* Procedeu-se à realização da audiência final, com observância do formalismo legal, como se alcança das respetivas atas.
Na sentença, considerou-se, em suma, que face à factualidade apurada não se suscitavam quaisquer dúvidas quanto à titularidade do direito de propriedade sobre cada um dos prédios ali descritos, mas já quanto à linha divisória dos prédios, nas suas confrontações Poente/Nascente, na medida em que inexistia qualquer outro elemento de prova incidente sobre as áreas que realmente compõem cada um daqueles prédios e não se tendo provado o exercício por qualquer das partes dos atos de posse alegadamente praticados sobre as faixas de terreno em causa, até aos limites por cada uma delas indicados, importava seguir o critério consignado no art. 1354º nº2 do Código Civil, segundo o qual «a demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes iguais», o que se operou traçando um segmento de reta entre os limites Norte e Sul da parcela de terreno em litígio, concretamente entre os pontos a) e b) identificados na planta de fls. 147 dos autos; já quanto aos pedidos reconvencionais, sublinhou-se que o seu objeto se mostrava parcialmente resolvido pela decisão antecedente [que definiu a linha de estrema Nascente/Poente], e, essencialmente, quanto ao pedido de reconhecimento do direito de servidão de passagem, de pé e de carro, com base na sua aquisição por usucapião, a favor dos prédios descritos nos pontos 4 e 5, sobre uma faixa de terreno que atravessa todo o limite Nascente dos prédios descritos nos pontos 1 e 2, numa largura de 3 metros, concluiu-se pela sua parcial procedência, sendo certo que não se mostrava verificada qualquer causa de extinção da servidão de passagem constituída a favor dos prédios descritos nos pontos 4 e 5.
Nestes termos, concluiu-se pelo seguinte concreto “dispositivo”: «DECISÃO Por todo o exposto:
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Procede-se à demarcação entre os prédios identificados nos pontos 1 e 2, por um lado, e o prédio descrito no ponto 5, por outro, na sua confrontação Nascente/Poente, respectivamente, fixando a sua linha divisória num segmento de recta traçado desde o limite Norte até ao limite Sul da parcela de terreno em litígio, concretamente entre os pontos a) e b) identificados na planta de fls. 147, absolvendo os réus do demais peticionado; B) Julgo parcialmente procedente a reconvenção deduzida e, em consequência: i) Reconheço aos réus/reconvintes J (…) e C (…) a titularidade do direito de propriedade sobre o prédio rústico composto por terra de cultura com oliveiras, a confrontar de Norte com Estrada Nacional, Sul com Estrada Municipal, de Nascente com Estrada Municipal e de Poente com (…), inscrito na matriz predial da freguesia da (...) sob o artigo 8545 e descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º 4653, condenando o autor F (…) a reconhecer tal direito; ii) Reconheço aos réus/reconvintes J (…) e C (…)a titularidade do direito de propriedade sobre o prédio rústico composto por terra de cultura com 3 oliveiras, a confrontar de Norte com (…) de Sul com herdeiros de (…), de Nascente com (…) e de Poente com (…), inscrito na matriz predial da freguesia da (...) sob o artigo 8554 e descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º 6042, condenando o autor F (…) a reconhecer tal direito; iii) Reconheço a existência do direito de servidão de passagem, a pé e com veículos rodados, a favor dos prédios descritos nas precedentes alíneas i) e ii), sobre uma faixa de terreno, situada junto ao limite Nascente dos prédios descritos nos pontos 1 e 2 do elenco da matéria de facto (considerando a linha de demarcação definida em A), com a largura de 2 metros e ao longo de todo o comprimento daquela linha Nascente, até atingir o prédio descrito naquela alínea i), condenando o autor/reconvindo F (…) a reconhecer a existência de tal servidão e a abster-se de praticar quaisquer actos que impeçam, limitem ou prejudiquem o direito de passagem dos réus/reconvintes; iv) Absolvo os réus e o autor/reconvinte de tudo o mais peticionado.
* Custas por ambas as partes, na proporção de 2/3 para os autores e 1/3 para os réus/reconvintes.
* Registe e notifique.
» * Inconformado com essa sentença, apresentou o A.
recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) Apresentaram recurso subordinado os RR., extraindo as seguintes conclusões das alegações que apresentaram: (…) Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações.
* A Exma. Juíza a quo proferiu despacho a admitir os recursos interpostos, providenciando pela sua subida devidamente instruídos.
De referir que com a prolação desse despacho de admissão dos recursos, foi paralelamente e ainda sustentada a não verificação das arguidas nulidades. * Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto dos recursos, cumpre apreciar e decidir.
* 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos recorrentes nas conclusões das respetivas alegações (arts. 635º, nº4, 636º, nº2 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de...
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