Acórdão nº 124/18.8T8FND-F.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução04 de Maio de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO Nos presentes autos de insolvência relativos A..., Lda., apresentado que foi um plano de insolvência pelo Administrador de Insolvência (A.I.) e submetido a votação na Assembleia para o efeito convocada de 04 de dezembro de 2019, fez-se constar da ata que tal plano obteve 38,41% de votos favoráveis, 45,10% de votos contra e 0,22% de abstenções.

Dentro do prazo de 10 dias, o ISS, IP. – Centro Distrital de (…) veio a apresentar o seu voto favorável.

Pela A.I. foi junto requerimento no qual afirma que, pela verificação da maioria qualificada de votos emitidos pelos credores com créditos reconhecidos, se encontra aprovado o plano de pagamentos: i) Número total de credores presentes na assembleia – 97,05%; ii) Votaram favoravelmente 50,89% dos credores reconhecidos; iii) Votaram desfavoravelmente 45,10% dos créditos reconhecidos.

Pelo juiz a quo foi, a 20.12.2019, proferido o Despacho de que agora se recorre, no qual se fez constar que, tendo votado favoravelmente o plano de insolvência credores cujos créditos totalizam 50,89% com direito de voto, e que votaram contra credores cujos créditos representam 45,10% dos créditos com direito de voto, não se encontra verificada a maioria qualificada exigida para a verificação do quórum deliberativo a que se refere o artigo 212º CIRE (2/3 do valor total dos votos emitidos), declarando não aprovado o Plano de Insolvência apresentado pela A.I.

Não se conformando com tal decisão a Insolvente dela vem interpor recurso de Apelação, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões: A. O cerne do recurso prende-se com a legitimidade do voto de um credor que, previamente à assembleia de credores havia já cedido o seu crédito e que na Assembleia que apreciou o plano votou contra este plano.

  1. De facto, a sentença proferida a 19 de Dezembro determina que “não se encontrar verificada a maioria qualificada exigida para a verificação do quórum deliberativo a que se refere o artigo 212.º n.º 1 do CIRE; refere a sentença que o plano de insolvência não foi aprovado por mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e em consequência, declarou-se não aprovado o plano de insolvência apresentado pela Sra. Administradora da Insolvência, tendo para esta contabilização sido determinante o crédito do Credor Banco...

  2. Resulta dos autos, designadamente do mapa dos créditos da Assembleia de Credores, elaborado pela Senhora Administradora, que o credor em causa representa um total de 39,34% dos créditos, o que tem como consequência que a sua não admissão à votação na Assembleia, como defende a Recorrente, tenha como consequência que a decisão do M.mo Juiz a quo haja de ser diversa daquela que foi tomada, atento a que sem este voto contra verifica-se a votação de dois terços de votos favoráveis ao plano.

  3. Esta questão da legitimidade do Banco ... já oportunamente foi suscitada nos autos, em concreto no Apenso “E”, apresentado no dia 5 de Setembro de 2019.

  4. Conforme resulta da comunicação anexada aquele requerimento (e que se anexa uma vez mais ao presente recurso) por carta datada de 12 de Agosto de 2019, a H... comunicou à Recorrente que o crédito detido pelo Banco ... havia sido cedido à entidade A..., S.A.

  5. No apenso “E” veio o M.mo Juiz veio a decidir que enquanto não se mostrasse realizada a habilitação processual nos autos, que “Quanto à reportada cessão de créditos de fls. 116 a 118, não tendo até à data sido promovido nos autos o competente incidente de Habilitação de Cessionário e em face do disposto no artigo 263º, n.º 1, CPC, afigura-se-nos que o credor Banco ... continua a ter legitimidade para a causa, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do mesmo preceito quanto aos efeitos da decisão.” ORA, G. Não obstante este despacho, que até se compreendia no contexto do que estava em discussão no apenso em causa (no caso no Apenso E dos autos), é modesto entendimento da Recorrente que na presente situação apenas a Cessionária dos Créditos poderia votar na assembleia; e que tendo esta questão sido suscitada naquele Apenso em setembro, que até à Assembleia de Dezembro decorreu tempo suficiente para que as interessadas, no caso a Cedente ou cessionária, tivessem promovido a competente habilitação processual.

  6. Não desconhece a Recorrente que nos termos do disposto no artigo 577º, n.º 1 do Código Civil, o credor pode ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito, independentemente do consentimento do devedor. De igual modo não se ignora o que dispõe o n.º 1 do artigo 582º do Código Civil, quando refere que “na falta de convenção em contrário, a cessão do crédito importa a transmissão, para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente”.

    I. O que está em causa é exatamente esta questão, que se extrai do numero 1 do artigo 582.º do Código Civil, que se delimitou supra em termos de legitimidade para um determinado credor poder votar na Assembleia quando é do conhecimento do devedor que já não é o titular do crédito.

  7. Entende-se que conforme resulta da letra deste preceito, a cessão do crédito importa a transmissão, para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente e essa cessão há muito que se havia consumado, razão pela qual não poderá o Cedente votar na Assembleia, atendo a que o direito a votar é inseparável do direito de crédito e assume-se no tocante a este como um direito acessório do direito transmitido.

  8. De outro modo, a admitir-se o voto do Banco ..., tal implica a manutenção na esfera jurídica do novo banco de um direito que é em si mesmo inseparável de um crédito que esta entidade já não detém (e já não detinha na data da votação na assembleia).

    L. Como é consabido e pacífico, a cessão produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite”, artigo 583º, n.º 1 do Código Civil, que foi o que se verificou com a comunicação de 12 de Agosto de 2019, a partir da qual o crédito passou para a esfera jurídica da Cessionária.

  9. No momento desta comunicação consumou-se definitivamente a substituição de credor originário por outro; ou seja, consumou-se a modificação subjetiva da obrigação, pois se até aí o contrato tinha apenas eficácia entre cedente e cessionário, a partir deste momento passou a ter eficácia também relativamente ao terceiro envolvido no negócio, no caso passou a ter efeitos relativamente ao devedor originário.

  10. E se esta questão da eficácia do contrato da cessão de créditos tem suscitado algumas questões e controvérsias ao nível...

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