Acórdão nº 160/20 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução04 de Março de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 160/2020

Processo n.º 9/2020

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. No processo comum para julgamento por tribunal coletivo com o n.º 380/08.0TACTB, que correu os seus termos no Juízo Central Criminal de Viseu, foram submetidos a julgamento vinte arguidos (A., o ora reclamante, e outros), sendo-lhes imputada a prática de diversos crimes, entre os quais o crime de lenocínio, previsto e punido pelo artigo 169.º, n.º 1, do Código Penal.

Foi proferido acórdão, datado de 04/12/2019, no qual não foi qualquer dos arguidos condenado pela prática do crime de lenocínio. Na fundamentação da decisão, foi recusada a aplicação da norma contida no artigo 169.º, n.º 1, do Código Penal, considerando-se, em suma, que a eliminação do segmento relativo à exploração da situação de abandono ou necessidade económica da vítima, pela Lei n.º 65/98, de 2 de setembro, deixou o tipo de crime de lenocínio desprovido de bem jurídico com dignidade penal, concluindo-se que “[…] não é mais sustentável hoje, sem falsos pecados, numa hipocrisia social que finge não ver com os olhos fechados, a necessidade da pena suposta pela incriminação do artigo 169.º, n.º 1, do Código Penal, a qual – com os fundamentos expostos – deverá considerar-se destituída de valor por infringir o disposto na Constituição”.

1.1. O Ministério Público interpôs recurso daquela decisão para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da LTC, tendo em vista a apreciação da inconstitucionalidade da norma cuja aplicação foi recusada, recurso que foi admitido pelo Juízo Central Criminal de Viseu e deu origem aos presentes autos.

1.1.1. No Tribunal Constitucional, foi proferida decisão sumária (coube-lhe o número 79/2020), pelo relator, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, no sentido de “[(a)] não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 169.º, n.º 1, do Código Penal, na redação conferida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro; e, consequentemente, [(b)] conceder provimento ao recurso, determinado que os autos sejam remetidos ao Juízo Central Criminal de Viseu, a fim de que este reforme a decisão em conformidade com o julgamento sobre a questão da inconstitucionalidade”, com os fundamentos seguintes:

“[…]

2. A inconstitucionalidade da norma contida no artigo 169.º, n.º 1, do Código Penal (e da norma correspondente do artigo 170.º, n.º 1, do mesmo Código, na numeração anterior à Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro) foi já apreciada pelo Tribunal Constitucional, em diversas decisões – v., designadamente, os acórdãos n.os 144/2004, 196/2004, 303/2004, 170/2006, 396/2007, 522/2007, 141/2010, 559/2011, 605/2011, 654/2011, 203/2012, 149/2014, 641/2016, 421/2017, 694/2017, 90/2018 e 178/2018 – sempre no sentido da não inconstitucionalidade.

Se é certo que nem todos os acórdãos atrás referidos foram tirados por unanimidade, não é menos certo que as maiorias se têm formado sucessivamente no sentido apontado. Dessa orientação resulta, em suma, que não se visa tutelar através do direito penal uma certa moralidade sexual, mas antes que “a ofensividade que legitima a intervenção penal assenta numa perspetiva fundada de que as situações de prostituição, relativamente às quais existe promoção e aproveitamento económico por terceiros, comportam um risco elevado e não aceitável de exploração de uma situação de carência e desproteção social, interferindo com – colocando em perigo – a autonomia e liberdade do agente que se prostitui” (Acórdão n.º 641/2016). Não estando, manifestamente, em causa ‘saber se a incriminação do lenocínio, nos moldes em que se se encontra prevista, traduz a melhor opção ao nível da política criminal’ (Acórdão n.º 421/2017), importa notar que ‘o critério da necessidade de tutela penal, enquanto decorrência do princípio da proporcionalidade, na dimensão acolhida no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, foi sempre apreciado pela jurisprudência constitucional proferida sobre a incriminação do lenocínio’, o que não impediu que se concluísse pela ‘legitimação material da norma incriminadora constante do artigo 169.º, n.º 1, do Código Penal, na redação conferida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, à luz do princípio da proporcionalidade’ (Acórdão n.º 694/2017). Este entendimento foi reiterado, por último, nos Acórdãos n.os 90/2018 e 178/2018, para além de diversas decisões sumárias (v., designadamente, as Decisões Sumárias n.os 375/2016, 359/2017, 737/2017, 129/2018 e 519/2018).

Tratando-se, no presente recurso, da mesma interpretação normativa e não se prefigurando quaisquer motivos para divergir dos fundamentos ali operantes, resta reafirmar o sentido da jurisprudência citada – remetendo para os fundamentos dos Acórdão atrás referidos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos –, ou seja, não...

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