Acórdão nº 9104/18.2 T8LSB.L-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Maio de 2020
Magistrado Responsável | TERESA SANDI |
Data da Resolução | 14 de Maio de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa J… e L...
instauraram ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra F…, Lda., pedindo: a)- Ser decretada a cessação, por caducidade, com efeitos à data de 31 de Dezembro de 2017, dos contratos de arrendamento, para fins não habitacionais, celebrados entre a primitiva proprietária, mãe dos Autores, e a Ré, em 10 de Abril de 1970 e 07 de Abril de 1975, relativos às frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B”, respetivamente, correspondentes às lojas n.ºs 101 a 103 e 105 a 107, destinadas a comércio, do prédio urbano sito na Rua da Madalena, n.º … a …., freguesia de Madalena, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º ...3 e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 2... da freguesia de Santa Maria Maior.
b)- Ser a Ré condenada a desocupar os imóveis locados, devendo os mesmos ser entregues aos Autores livres de pessoas e bens, e, consequentemente, no levantamento das montras construídas nos pilares da fachada, sem autorização dos Autores, com a inerente reposição dos mesmos pilares; c)- Ser a Ré condenada no pagamento aos Autores de uma indemnização, no valor de € 1.485,00 (mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros)/mês, devida desde 01 de janeiro de 2018, e que até março inclusive, totaliza € 4.455,00 (quatro mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros), devendo a mesma ser elevada para o dobro após ser decretada judicialmente a cessação dos contratos em apreço, tudo de harmonia com o artigo 1045.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil.
A R. apresentou contestação, pugnando pela improcedência da ação.
Realizada audiência prévia, foi de seguida proferido despacho saneador sentença que julgou improcedente a ação.
Os AA. interpuseram recurso desta decisão, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões (após convite para a sua sintetização), que aqui se reproduzem: “1.- Os AA. peticionaram fosse declarada a resolução, por caducidade, dos contratos de arrendamento, com base nas cartas que enviaram à R. para transição imediata dos contratos para o NRAU (em 2012), de Oposição à sua renovação (volvidos 5 anos) e cessação com efeitos em 31 de dezembro de 2017.
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- Todavia, o tribunal “a quo” decidiu que os contratos de arrendamento em causa se mantêm em vigor, improcedendo todos os pedidos formulados pelos AA..
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- Contudo, a sentença é omissa no que se refere aos demais pedidos, já que o Juiz “a quo” não se pronunciou sobre questões que deveria apreciar.
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- E, por outro lado, conheceu de matéria que não foi Contestada ou excecionada pela R., quando refere que a carta de oposição à renovação enviada pelos AA. não tem qualquer validade ou eficácia em relação à R..
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- Pelo que a sentença deverá ser declarada nula, nos termos do artº 615º, nº1, al. d) do CPC.
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- Ademais, o Tribunal Recorrido considerou que a R. invocou, em tempo, tratar-se de uma microempresa; que não o comprovou (em 2012, mas já no decurso deste processo de despejo), mas que os AA. também não o exigiram, pelo que aceitaram essa qualidade da R. e a inerente transição para o NRAU, que era de 5 anos, mas que em 2017 passou para 10 anos.
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- Contudo, muitas são as contradições entre os factos provados, os fundamentos da decisão e a legislação aplicável.
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- Ficou provado (ponto 10 dos factos provados) que a R. invocou ser microempresa, mas não juntou qualquer documento comprovativo, o que contraria o disposto nos artºs 51º, nºs 4 e 6 e 54º, nº 1 do NRAU.
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-Pelo que o arrendatário não pode prevalecer-se da circunstância invocada, nem beneficiar do regime transitório dos 5 anos (à data de 2012), nem de 10 anos (em 2017, com a entrada em vigor da Lei n.º 43/2017, de 14 de Junho).
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- Também não colhe o fundamento de que se trata de uma “Realidade que está demonstrada nos autos.”, como o refere a decisão ora recorrida, até porque a eventual transição para o NRAU ou o início da sua contagem, nunca poderiam ocorrer no processo judicial.
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- Esta prova é um ónus do arrendatário e não do senhorio.
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- Invertendo este princípio, o Juiz do Tribunal A QUO referiu (no 3º parágrafo da página 8ª da sentença) que os AA. “(…) não exigiram a apresentação dos documentos em causa nem manifestaram qualquer oposição à invocação daquela qualidade. Ou seja, os AA. acabaram por aceitar a invocada qualidade da R. sendo agora abuso de direito tomar posição contrária, negando a eficácia da invocação.” 13.- Termos em a decisão sub judice deverá ser alterada, no sentido de ser declarada a resolução dos contratos por caducidade, atenta a imediata submissão dos contratos ao NRAU por um período de 5 anos, tal como proposto aliás pela própria R. (doc. junto a fls. 122 dos autos), com início em dezembro de 2012 e termo em 31 de dezembro de 2017; 14.- E atenta a oposição à sua renovação, por carta registada com aviso de receção, enviada pelos AA. à R., em 24 de julho de 2017 (com 120 dias de antecedência).
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- Por outro lado, a sentença recorrida tem duas discordâncias inconciliáveis (na 7ª folha da sentença e os dois parágrafos seguintes) quanto ao momento em que, afinal, o Meritíssimo Juiz considera ter havido transição dos contratos em apreço para o NRAU, cujo entendimento não se alcançou.
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- De igual forma se entende que a circunstância da R. ser distinguida em janeiro de 2019 como “loja com História”, não releva para a presente ação. Já que, 17.- A R. não invocou tal circunstância, na carta que enviou para os AA. em 11 de dezembro de 2012 (doc. 5 junto à PI), nem sequer na carta que lhes enviou em 07 de Setembro de 2017, altura em que o n.º 4 do artigo 51.º do NRAU (com a redação que foi dada ao n.º 4 do artigo 51.º do NRAU pela Lei n.º 42/2017, de 14 de junho), já contava com esta disposição.
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- Foi só após o recebimento da carta de resolução dos contratos (31 de agosto de 2017) que a R. se candidatou ao programa Lojas Com História (ver ponto 17 dos factos provados); 19.- Classificação esta que foi comunicada à R. no dia 2 de janeiro de 2019. (v. ponto 18 dos factos provados) 20.- Assim, ao contrário do que foi o entendimento do Tribunal A QUO, não pode ser aplicado ao caso sub judice o n.º 3 do artigo 13.º da Lei n.º 42/2017, de 14-06, já que, a esta data, o imóvel em apreço não se encontrava na situação prevista na al. d) do nº 4 do artº 51º do NRAU.
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- Em suma, impunha-se, outrossim, que o Tribunal Recorrido tivesse decretado a cessação, por caducidade, com efeitos à data de 31 de dezembro de 2017, dos contratos de arrendamento sub judice.
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- Assim como se impunha que o Tribunal Recorrido tivesse condenado a R. a desocupar os imóveis locados e a entregá-los aos Autores livres de pessoas e bens, e, consequentemente, a repor os pilares da fachada, bem como a pagar-lhe uma indemnização nos termos peticionados.” A apelada apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, tendo formulado as seguintes conclusões: “1)- Da Nulidade da Sentença 1ª)- A douta Sentença não padece de qualquer nulidade, seja por omissão, seja por excesso de pronúncia.
a)- Da omissão de pronúncia 2ª)- Através da utilização do artigo definido masculino plural: “os” e da contração da preposição “de” e do artigo “o”: “dos”, o Meritíssimo Tribunal a quo deixa bem claro que julga improcedente todos os pedidos formulados pelos AA.
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)- Concluindo que os contratos de arrendamento em causa se mantêm em vigor, ficou necessariamente prejudicada a apreciação do pedido indemnizatório apresentado pelos Demandantes, impondo-se tão somente a absolvição da R. deste pedido à semelhança dos demais.
b)- Do excesso de pronúncia 4ª)- A R. ora Apelada contestou a presente ação, impugnando expressamente a matéria de facto relevante e alegada pelos A/A., e opondo-se claramente ao entendimento da alegada transição imediata para o NRAU.
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)- Não se vislumbra qualquer excesso de pronúncia por parte do Meritíssimo Tribunal a quo, o qual se limitou a partir dos factos assentes e a aplicar e interpretar a Lei.
2)- Das qualidades / classificações da R.: a)- Quer como “microempresa” (Conclusão H, J a FF); i) Da comprovação da qualidade de “microempresa” 6ª)- O entendimento manifestado pelos A/A. ora Recorrentes no sentido de que a ausência do envio de documentos comprovativos de que a R. se trata de uma microempresa determina a não aplicação do regime previsto no artigo 54º do NRAU é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, decorrente da consagração do princípio do Estado de direito democrático no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa” – cfr. alegado no artigo 50º da contestação.
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)- De forma a sustentar tal alegação, chamar-se-á à colação a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, conforme resulta do Acórdão nº 277/2016, de 4 de maio, segundo o qual: Julga inconstitucional a norma extraída dos artigos 30.º, 31.º e 32.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação dada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, segundo a qual «os inquilinos que não enviem os documentos comprovativos dos regimes de exceção que invoquem (seja quanto aos rendimentos, seja quanto à idade ou ao grau de deficiência) ficam automaticamente impedidos de beneficiar das referidas circunstâncias, mesmo que não tenham sido previamente alertados pelos senhorios para a necessidade de juntar os referidos documentos e das consequências da sua não junção» – vide artigo 51º da contestação.
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)- Semelhante entendimento foi acolhido pelo Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa no dia 9 de março de 2017: 4.–Não será de aplicar a norma decorrente do art. 54º, nº 5, em conjugação com o art. 51º, nºs 4 a 6, do NRAU, na redação introduzida pela Lei nº 31/2012, de 14-08, segundo a qual uma empresa que tenha invocado tratar-se de uma microentidade, fique, por não ter feito, no mês correspondente àquele em que a invocou, a comprovação...
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