Acórdão nº 1430/11.8BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelLURDES TOSCANO
Data da Resolução07 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A Representante da Fazenda Pública, com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, a qual julgou procedente a oposição deduzida por M….. e E….. contra a execução fiscal (processo n.º …..612) instaurada por efeitos da reversão operada contra si para pagamento de uma dívida referente a IRS/retenção na fonte do exercício de 2009, no montante de €21.587,20. Mais determinou aquela sentença, em consequência da procedência da oposição, a anulação dos despachos de reversão e a extinção do processo de execução fiscal supra identificado, contra as oponentes.

A Recorrente termina as alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: « A. Entendeu-se na douta sentença que a AT não logrou provar a gerência de facto das oponentes na sociedade "O….. - ….., Lda.”, determinando assim o Tribunal a quo, com este fundamento, serem as oponentes partes ilegítimas na execução.

B. Ora, salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com a douta decisão recorrida porquanto, não só a mesma não faz, uma correta eleição e apreciação da matéria de facto relevante para os autos, sendo que da prova produzida se não podem extrair as conclusões que lhe serviram de base, como também não procede a uma total e acertada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso subjudice. Vejamos, C. Face aos meios de prova documentais que constam dos autos de primeira instância e à força probatória dos mesmos, pelo Tribunal a quo deveriam ter sido considerados para a boa decisão da causa, determinados factos, nomeadamente, que a)as oponentes assinaram vários documentos da sociedade devedora originária a pedido de J….. e C….., inclusive cheques, no caso da Oponente M….. - conforme declarações de parte da Oponente M…..; b) Na declaração modelo 22 da devedora originária relativa ao exercício de 2008 e entregue em 31.05.2009, foi indicado como representante legal o número de identificação fiscal ….. que pertence à oponente M….., uma vez que dos mesmos resulta, em conjugação com os restantes elementos dos autos, que as ora recorridas ao praticarem tais atos, exercerem de facto a gerência da sociedade devedora originária D. Por outro lado, pelo douto tribunal a quo também não foi devidamente valorado o facto de em sede de petição inicial de oposição as oponentes afirmarem que "não tiveram gerência de facto da sociedade em causa após a atrás referida data [29.01.2008] em que deixaram de ser gerentes de tal sociedade", pelo que, contrariamente às declarações de parte prestadas e aos depoimentos das testemunhas que se identificaram como colegas de trabalho, as oponentes nunca negaram a gerência de facto da sociedade devedora originária até à data de 29.01.2008, o que aliás facilmente se comprova pela certidão permanente da sociedade devedora originária, na qual se constata que desde a data da sua constituição em 18.03.2002, até pelo menos à data de 29.01.2008 (não obstante a renuncia das oponentes apenas ter sido registada em 27.08.2009 - Ap. …..) que a gerência da sociedade O….. sempre esteve a cargo dos sócios F….., E….. e M…...

E. Mais, do confronto entre as várias apresentações inscritas no Registo Comercial, relativas à gerência e à forma de obrigar da sociedade, não se alcança como é que pode ser valorada uma procuração outorgada em 12.06.2006 por C….. e por A….. na qualidade de representantes legais da O….. (apenas designados gerentes da sociedade por deliberação de 29.01.2008 inscrita no registo comercial pela AP ….., que vem a ser posteriormente retificada pela AP ….. de 2010.10.12, ou seja em data posterior ao falecimento de C….. em 13.05.2010, de forma a que passasse a constar como data de deliberação 31.08.2005), a favor de J….. e das Oponentes, ao abrigo da qual estas alegadamente atuavam, porquanto na data em que a mesma foi outorgada, não possuíam aqueles quaisquer poderes de vinculação da sociedade.

F. Por outro lado, também não foram devidamente valorados pelo douto tribunal a quo, determinados atos praticados pelas oponentes, e que o próprio deu como provados, os quais evidenciam o exercício de funções de gerência por parte das oponentes, a saber: certidão de citação assinada, em 10-09-2009, pela oponente E…..

(cfr. alínea H do probatório fixado na sentença recorrida) e pedido de pagamento de divida em prestações, de 10-09-2009, subscrito por ambas as oponentes.

G. Perante isto, entende a Fazenda Pública que erra a douta sentença ao considerar que não se encontra comprovado o exercício de facto de funções de gerência da sociedade executada, por parte das oponentes.

H. É certo que a gerência de direito permite inferir, em determinadas circunstâncias e por presunção judicial, a gerência de facto. Todavia, no caso em apreço, do teor da certidão de registo comercial não se retira a conclusão, que desde 29/01/2008, as Oponentes deixaram de ser gerentes de direito da devedora originária. Pelo contrário, os sucessivos registos e renúncias, depois retificadas quanto às datas das respetivas deliberações, dos vários gerentes da devedora originária, contradizem essa afirmação das Oponentes. Sendo que em certos períodos temporais, as suas assinaturas teriam sido juridicamente necessárias à vinculação da sociedade.

I. Acresce que perante a Administração fiscal, que é terceira em relação à sociedade, foi praticado pelas Oponentes, um ato concreto de gerência de facto destas relativamente à devedora originária: o pedido em prestações no PEF ao qual foi deduzida a presente oposição, apresentado em 10.09.2009. E não obstante nesse requerimento não ser indicado que o fazem na qualidade de gerentes da sociedade, todavia, trata-se de um requerimento da sociedade, o qual a ser deferido como foi, a constituiu na obrigação de proceder ao pagamento das prestações deferidas. Enquanto tal, foi, portanto, um ato, praticado perante a Administração fiscal (terceiro), suscetível de vincular a sociedade.

J. Por outro lado, e não obstante não constar do elenco dos factos dados como provados, o certo é que a Oponente Maria João, após 29/01/2008, continuou a constar da declaração modelo 22 da sociedade como sua representante legal.

K. Ora, a eventual circunstância de terem praticado esse ou outros atos (como resulta provado) por instruções de outros responsáveis da sociedade, pelo menos, também sócios, e nos impedimentos destes, não invalida a conclusão de que em determinados momentos, tenham agido perante terceiros, como gerentes de facto da sociedade devedora originária.

Formal ou informalmente, tiveram poderes para tal, e representaram a sociedade perante terceiros.

L. Nestes termos, provada a prática de um ato de gerência de facto em 10.09.2009, e apresentando-se como representante legal da sociedade em 31/05/2009, no caso da Oponente M….., numa sociedade cuja gerência de direito, quer das Oponentes quer de outros gerentes, ou mesmo a forma de obrigar a sociedade, não resultam clarividentes da respetiva certidão do Registo Comercial, não permite concluir que as Oponentes não eram gerentes de facto à data do pagamento voluntário da dívida exequenda, ou seja, em 2009-03-20, 2009-04-20, 2009-05-20 e 2009-06-20.

M. A lei não define, de forma exata e perentória, os poderes de administração ou gerência. No entanto, da leitura das normas do CSC nomeadamente os artigos 259° e 260° facilmente se afere que esses poderes se traduzem na representação da empresa face a terceiros (ex: credores, trabalhadores, fisco, fornecedores, entidades bancárias, etc.) de acordo com o objeto social e mediante os quais o ente coletivo fique vinculado.

N. Isto é, um administrador/gerente, uma vez nomeado e iniciado o exercício das suas funções passa a ter direitos e obrigações para com a sociedade e para com terceiros.

O. Assim sendo, resulta provado nos autos o exercício de poderes de gerência de facto pelas Oponentes, cumprindo a Autoridade Tributária, o ónus da prova que sobre si impendia. Razão pela qual, se conclui que à data da reversão estavam verificados os pressupostos legais para a reversão da divida exequenda quanto às ora oponentes.

P. Por todo o exposto, no modesto entendimento da Fazenda Pública - e salvo sempre melhor entendimento -, o Ilustre Tribunal recorrido, ao decidir como decidiu, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, violando a douta sentença o preceituado nos art. 24°, n° 1, al. b) da LGT, art. 153° do CPPT, 64.º, 259 e 260.° todos do CSC.» **** Notificadas, as Recorrentes apresentaram as suas contra-alegações, nos termos das quais concluíram o seguinte: “ A - Encontrando-se absolutamente assente nos autos que as oponentes não eram gerentes de direito da sociedade devedora originária, O….., Lda, na data do facto constitutivo da dívida tributária (Fevereiro a Maio de 2009) nem tão-pouco na data final do prazo legal de pagamento de tal dívida (20 de Junho de 2009), só na gerência de facto por parte das oponentes se poderia fundamentar a responsabilidade subsidiária destas e a consequente reversão.

B - De resto, no próprio despacho que determinou a reversão se menciona que esta se fundamenta na aludida gerência de facto.

C - Ora, tal gerência de facto teria...

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