Acórdão nº 7848/17.5 T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelANA DE AZEREDO COELHO
Data da Resolução07 de Maio de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM na 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I) RELATÓRIO J….

instaurou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra M…, ambos com os sinais dos autos, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de € 310.000,00 e juros de mora à taxa legal desde a propositura da acção até integral pagamento.

Alegou, em suma, que o Réu foi nomeado seu patrono, ao abrigo do regime de apoio judiciário, e, por ter interposto recurso fora de prazo, sem pedir a prorrogação do mesmo e sem impugnar adequadamente a decisão que o indeferiu, agiu com negligência que violou a confiança que o Autor nele depositou, bem como os seus deveres deontológicos, com o que causou danos patrimoniais e não patrimoniais ao Autor.

O Réu contestou por excepção, invocando ilegitimidade passiva e activa, ineptidão da inicial e prescrição, e, ainda, por impugnação.

Houve audiência prévia na qual foram julgadas improcedentes as excepções dilatórias invocadas, foi relegada para final a apreciação da excepção de prescrição, foi fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Cumprido o demais legal, teve lugar audiência de julgamento após o que foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.

O Autor interpôs o presente recurso dessa sentença e, alegando, concluiu como segue as suas alegações: 1 – A sentença ora recorrida encontra-se viciada, porque não considerar como provado que a informação transmitida ao R., apesar de não ser clara, era mais do que suficiente para que um advogado a actuar com o zêlo devido, se apercebesse que se tratava de um processo administrativo e não de um processo judicial.

2 – A classificação de um prazo como administrativo ou judicial, não é uma questão de boa ou má fé; integra-se, isso sim, na questão de saber se o advogado em causa actuou, ou não, com o zêlo devido. Entramos, portanto, na área do cumprimento (ou incumprimento) do mandato forense.

3 – Se a responsabilidade civil do Advogado é de natureza contratual, desde que o ilícito se traduza no incumprimento do mandato forense, não restarão dúvidas de que o erro na classificação de um prazo constitui violação de um dever decorrente da obrigação emergente do mandato forense.

4 – Ao contrário do que se diz na sentença recorrida o dano que é alegado existe – o A. pretendia registar uma marca em seu nome e não o conseguiu. Esse dano não está é quantificado.

5 – Padece, pois a sentença recorrida da nulidades prevista na al. c) do n.º 1 do art. 615º do CPC.

Termos em que, Deverá ser revogada a sentença, substituindo-a por outra que condene o R. no pagamento do que se vier a apurar em execução de sentença, Assim se fazendo JUSTIÇA!!! O Réu contra-alegou defendendo o bem fundado do julgado.

O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. A Ex.ma Senhora Juiz pronunciou-se pela inexistência da nulidade arguida.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II) OBJECTO DO RECURSO Tendo em atenção as conclusões da Recorrente - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC, quanto a possibilidade de apreciação oficiosa -, cumpre apreciar das seguintes questões: 1) Da nulidade da sentença.

2) Do mérito da sentença quanto à absolvição por não verificados os pressupostos da responsabilidade civil.

III) FUNDAMENTAÇÃO 1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Estão assentes os factos constantes da decisão de primeira instância, não impugnada quanto a tal:

  1. O A., a 21.02.2013, requereu apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento de compensação a patrono, indicando como finalidade do seu pedido “propor acção judicial – tipo de acção Propriedade Industrial”, na qualidade de “autor”, com indicação de não ter tido intervenção processual.

b) O R. foi nomeado patrono oficioso do A. em 10.07.2013, em substituição de outra advogada, referindo a O.A – que o “apoio judiciário foi pedido para efeitos de instaurar acção”.

c) Com data de 17.04.2013, o A enviou mail ao Instituto de Propriedade Industrial, comunicando que requereu protecção jurídica para efeitos de recurso e que aguarda decisão.

d) O réu, na qualidade de patrono do A, interpôs o recurso da decisão do INPI, junto do Tribunal de Propriedade Intelectual a 03.10.2013; e) O R não requereu à Ordem dos Advogados (OA), a prorrogação do prazo.

f) O recurso foi julgado extemporâneo por douta sentença do Tribunal da Propriedade Intelectual, por terem passado mais de dois meses a contar da decisão do INPI recorrida; g) Desta decisão, o R. apresentou reclamação, dirigida ao Tribunal da Propriedade Intelectual, com fundamento na apresentação do pedido de protecção jurídica a 25.02.2013; h) O Tribunal manteve a decisão, referindo que a acção também não foi intentada no prazo de 30 dias a contar da nomeação, nem foi pedida a prorrogação do prazo; i) O R. apresentou uma Reclamação para o Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos do n.º 2, do artigo 559.º do CPC, que não veio a ser admitida por não ser o meio próprio para atacar a decisão do Tribunal de 1.ª Instância que determinou a extemporaneidade do recurso; j) O R não apresentou recurso e a decisão transitou em julgado; k) Inconformado com a situação, o A. apresentou participação do R. na Ordem dos Advogados (OA); l) Tendo a OA aberto processo disciplinar que levou a despacho de acusação do aqui R., mas que terminou com o arquivamento dos autos; m) O R. depois de ter sido notificado da decisão do TPI, referida em i) não informou o A.; n) O A transmitiu ao R que “apoio judiciário é para apresentar recurso de nulidade (?) do despacho/notificação de Fevereiro de 2013 a recusar a transmissão da marca em meu nome, recusa que ainda não foi publicada no Boletim da Propriedade Industrial”; o) A informação prestada pelo A ao R não permitia a este perceber que este pretendia reagir contra uma decisão de suspensão do processo de registo de marca a favor do A enquanto estivesse pendente acção no TAF do Porto, considerada prejudicial.

  1. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO 2.1. Da nulidade da sentença 2.1.1.

Alega o Recorrente que a sentença padece da nulidade prevista nas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 615º do CPC por os fundamentos estarem em oposição com a decisão e por se verificar ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

Considera que existe oposição entre os fundamentos e a decisão por se ter dado como provado que o Autor transmitiu ao Réu que o “apoio é para apresentar recurso de nulidade do despacho/notificação de Fevereiro de 2013 a recusar a transmissão da marca em meu nome” o que está em contradição com ter igualmente sido considerado provado que a informação prestada pelo A. ao R. não permitia a este perceber que aquele (o A.), pretendia reagir contra uma decisão de suspensão do registo de marca.

2.1.2.

Do mero enunciado resulta que a alegada contradição não se verifica entre os fundamentos e a decisão, pelo que não se enquadra a situação na nulidade invocada – artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC.

A contradição invocada, a existir, seria intrínseca à própria decisão de facto que, justamente, pode ser alterada com esse fundamento, nos termos do artigo 662.º, n.º 1, se constarem do processo todos os elementos que permitam a alteração, ou anulada, nos termos do artigo 662.º, n.º 2, alínea c), se esses elementos não constarem do processo.

Assim enquadrada juridicamente, vejamos se se verifica a alegada contradição.

2.1.3.

O primeiro facto refere-se à informação prestada pelo Autor ao Réu, quando este foi nomeado patrono, quanto à finalidade da nomeação. Foi julgado provado que o Autor disse ao Réu que essa finalidade consistia em apresentar recurso de nulidade do despacho/notificação de Fevereiro de 2013 a recusar a transmissão da marca em meu nome.

O segundo facto refere que essa informação quanto à finalidade não permitia que o Réu percebesse que o Autor pretendia reagir contra uma decisão de suspensão do registo de marca.

Ou seja, enquanto o primeiro afirma uma informação genérica, o segundo afirma que tal informação genérica não permitia que o Réu soubesse o que especificamente era pretendido. Não existe qualquer contradição entre uma coisa e outra pelo que, mesmo considerada como pretendendo alteração da matéria de facto improcede a pretensão.

2.1.4.

Entende ainda o Recorrente que se verifica a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC, na modalidade de ininteligibilidade da decisão.

A tal respeito refere que foi considerada questão de boa ou má fé a do conhecimento da natureza administrativa do prazo para recurso.

Não é assim, como resulta da mera leitura da decisão. As questões relativas à má-fé das partes foram apreciadas separadamente daquelas que se referiam aos pressupostos da responsabilidade civil, sendo claro o que se argumenta numas e noutras.

Não vemos a ininteligibilidade na sentença, nem o Recorrente a indicou em concreto, limitando-se a uma arguição vaga e genérica, aliás contraditória com a perfeita compreensão da decisão que o recurso evidencia.

Improcede também a arguição de nulidade nesta parte.

2.1.5.

Defendeu ainda o Recorrente que a sentença está ferida da nulidade a que alude a alínea d) da norma citada, a qual estatui: é nula a sentença quando (…) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Fê-lo citando a norma, mas não o que determinaria a integração da sua previsão no caso concreto da sentença recorrida. Admite-se que queira argumentar que a questão do conhecimento da natureza do prazo não foi apreciada senão em sede de apreciação da eventual litigância de má-fé, numa outra perspectiva do que se apreciou no ponto anterior.

Mas não tem razão ao assim alegar uma vez que a sentença abordou expressamente essa questão como se vê do trecho que se transcreve: Ficou demonstrado que...

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