Acórdão nº 00407/07.2BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução17 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel instaurou acção administrativa comum com processo ordinário em representação do Estado Português - Direcção Regional de Educação do Norte (DREN), contra o Município de (...), pedindo a condenação deste no pagamento do montante total de € 967.523,78, acrescido dos respectivos juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

Por sentença proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada procedente a acção e condenado o Réu a pagar ao Autor a quantia de € 967.523,78, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação (26/06/2007) até integral pagamento.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Réu formulou as seguintes conclusões: 1. A decisão sobre a matéria de facto, no que respeita aos pontos de facto nºs 2º, 3º, 4º, 5º, 6º da Base Instrutória que o tribunal recorrido deu como não provados, deve ser alterada por este Venerando Tribunal de 2ª instância, nos termos do disposto no artº 662º do CPC.

  1. Os pontos de facto constantes dos artigos nºs 2º, 3º, 4º, 5º, 6º da Base Instrutória devem ser considerados como provados restritivamente, com a seguinte redacção: Base Instrutória: 2 - A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte: O montante global dos encargos anuais da autarquia com as amortizações e juros dos empréstimos, de médio e longo prazo, calculado segundo a LFL, seria em 2003 era, no pior cenário, de € 1.394.851,22.

    3- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte: O montante dos fundos relevantes para o efeito, no mesmo período, era de € 13.221.652,00, pelo que a soma dos duodécimos atingia 3.305.413,00.

    4- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte: Montante correspondente a 20% das despesas realizadas para investimento pelo R. no ano de 2000 foi de € € 2.425.574,42.

    5- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte: De acordo com a LFL o limite de endividamento do R. seria de € 2.425.574,42.

    6- A resposta que deve ser dada a este facto deve ser a seguinte: O empréstimo a contrair para pagamento do preço da aquisição do terreno implicaria, no total dos encargos anuais com esse serviço de dívida do R, um acréscimo de juros e amortizações que tivessem sido contratados e se vencessem nesse ano e, ainda, que com a contracção do referido empréstimo o que aumentaria seria o stock da divida de empréstimos de Médio e Longo Prazo e não, necessariamente, o serviço da dívida.

  2. A fundamentação para a pretendida alteração desses pontos de facto é o teor do Relatório Pericial que confirmou, embora restritivamente, essa matéria factual, a fls. 27 a 23 do mesmo.

  3. Independentemente do facto de dever ser alterada a decisão sobre a matéria de facto também a acção deverá improceder tendo em conta apenas a matéria de facto dada como assente pela sentença recorrida.

  4. O CPA de 1991 e o Dec. Lei nº 100/84 estatuem o princípio da especialidade dos órgãos das pessoas colectivas.

  5. No que respeita especificamente às autarquias territoriais, nenhuma lei lhes confere poderes em matéria de assunção de custo de aquisição de terrenos para cedência à administração central do Estado.

  6. A lei das atribuições das autarquias locais (Lei nº 100/84 – e mais, recentemente, também, a Lei nº 159/99, de 14 de Setembro) não menciona em lado nenhum a possibilidade de os municípios se encarregarem da aquisição de terrenos para construção de escolas para a Administração Central.

  7. Ora, as atribuições das autarquias territoriais, obedecem ao princípio da enunciação ou princípio da atribuição específica, e não a um princípio geral de competência universal dessas autarquias - artigos 76º do Dec Lei nº 100/84e13º e 14º da Lei 159/99.

  8. O Dec Lei nº 100/84 procede a uma elencagem das competências da Assembleia Municipal e da Câmara Municipal nos artºs 39º, 41º, 51º, 52º, e 53º.

  9. As obrigações assumidas pelo Réu no protocolo em referência violam o disposto nos arts. 39º, 41º, 51º, 52º, e 53º do DL nº 100/84, pois as obrigações ali assumidas não integram nenhuma das competências legalmente atribuídas aos órgãos do Réu no supra referido diploma, pelo que viola o princípio da especialidade previsto no art. 76º do referido diploma.

  10. Falta um dos requisitos para que o ajuizado Acordo de Colaboração seja qualificado como contrato administrativo, uma vez que não foi celebrado para a prossecução das atribuições da pessoa colectiva em que se integram, violando o artº 179º do CPA de 1991.

  11. À data da celebração de tal acordo, nenhuma legislação atribui competências ou atribuições legais ao Município para custear a expensas próprias terrenos para a construção de escolas por parte da administração central do Estado.

  12. A possibilidade de as populações do município beneficiarem da construção da escola não acarreta atribuição legal para o efeito e é irrelevante para a vinculação á lei.

  13. A Escola referida no Acordo de Colaboração está arredada do âmbito do artigo 8º, n.º1, alíneas b) e c), da Lei 46/86, de 14.10 (Lei de Bases do Sistema Educativo).

  14. O compromisso assumido no dito “Acordo de Colaboração” de o Réu providenciar pela aquisição dos terrenos necessários à construção de uma escola que, integra o ensino secundário, está fora das atribuições e competências do Município de (...).

  15. O Decreto-Lei n.º 77/1984, de 8 de Março define a construção da rede escolar nos artºs 40º a 45º os quais não atribuem às autarquias a responsabilidade de adquirir terrenos ou contribuir para a edificação desse tipo de construções escolares.

  16. À míngua de norma específica que atribuísse tais competências aos órgãos do Município de (...), é ilegal e inválido o aludido acordo de colaboração.

  17. E o artº 76º do Dec Lei nº 100/84 tem que ser conjugado com o art. 2º nº1 f) da Lei nº 100/84, versando quer sobre matéria das atribuições da autarquia quer sobre a competência dos seus órgãos, que impede as obrigações assumidas pelo R. no citado acordo de colaboração.

  18. A ilegalidade do Acordo de Colaboração viola, ainda, o disposto nos arts. 43º, 74º, 75º, 90º al. b), da CRP, uma vez que a garantia dos direitos ali consagrados incumbe ao Estado e não ao Réu que é uma autarquia local.

  19. Os arts. 6º, 235º e 237º, sendo normas meramente programáticas todos da CRP têm que ser integrados com o disposto no artº 237º nº 1 da CRP que dispõe que nas atribuições e organização das autarquias locais, bem como a competência dos seus órgãos serão reguladas por lei, de harmonia com o princípio da descentralização administrativa.

  20. Por força da entrada em vigor da Lei nº 159/99, de 14/08, já depois da celebração do acordo de colaboração, o Autor não fica desonerado da obrigação de proporcionar ao Réu os recursos adequados e necessários à execução do acordo, designadamente, no caso de impossibilidade de cumprimento por parte do Réu da pagar a expensas suas o preço do terreno para a construção da Escola.

  21. Teria o Autor de reassumir a sua obrigação arcando com esse custo cfr. art. 8º nº 2 da referida lei.

  22. Tendo entrado em vigor a Lei das Finanças Locais (Lei nº 42/98, de 06/03), publicada depois da assinatura do protocolo e antes da declaração de resolução constata-se que a mesma dispõe para o passado, abrangendo a realidade fáctica das autarquias anterior à data da entrada em vigor dessa Lei e contrariando o princípio da não retroactividade das leis.

  23. Após a celebração do acordo em causa nos autos entrou em vigor a Lei das Finanças Locais (Lei nº 42/98, de 06/03), que impossibilitou o Réu de recorrer a empréstimos para poder assumir os encargos decorrentes do acordo celebrado.

  24. Uma vez que, por força do art. 19º nº 1 da Lei nº 32-B/2002, de 30/12, a capacidade de endividamento dos municípios para o ano de 2003 foi drasticamente reduzida.

  25. O nº2 do referido art. 19º dessa lei bloqueou, ainda, o recurso a novos empréstimos de médio e longo prazo dos municípios que, devido a empréstimos contraídos em anos anteriores, já excedam o maior dos limites previstos no art. 19º nº 1 da Lei nº 32-B/2002.

  26. Esta norma tinha efeitos retroactivos, dispondo para o passado e contrariava o princípio da não retroactividade das leis e que por força do art. 19º nº 2 da Lei nº 32-B/2002, e da situação de tesouraria resultante dos empréstimos de médio e longo prazo contraídos em anos anteriores pelo Réu.

  27. O R. não dispunha à data de resolução do acordo de possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola, o que constituiria um grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº 2 al. d) da Lei nº 169/99, de 18/09.

  28. Do elenco dos factos provados pelo Tribunal e, também, dos factos que, em sede de ampliação da matéria de facto neste recurso é patente a impossibilidade de contracção de empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola.

  29. Por força do art. 19º nº 2 da Lei nº 32-B/2002, e da situação de tesouraria resultante dos empréstimos de médio e longo prazo contraídos em anos anteriores pelo Réu, este não dispunha, à data de resolução do acordo, de possibilidade de contrair um empréstimo equivalente ao montante do preço do terreno para construção da Escola.

  30. Caso o Réu violasse essa Lei, incorreria na prática de um grave delito financeiro contrário ao art. 53º nº 2 al. d) da Lei nº 169/99, de 18/09 32.A entrada em vigor desta Lei das Finanças Locais introduziu uma alteração anormal e não prevista nas condições e pressupostos que determinaram a celebração do acordo entre Autor e Réu.

  31. O R. tendo sido parte afectada por tais alterações legislativas tem direito à resolução do contrato ou à modificação do mesmo, nos termos do disposto nos arts. 266º nº 2 da CRP, 6º-A do CPA e 13º do DL 97/99, de 08/06.

  32. Sendo certo que foi o próprio Autor que, pela aprovação e promulgação da referida legislação (através dos seus órgãos...

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