Acórdão nº 01191/16.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2020
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte:*I.RELATÓRIO C., S.A.
(agora S., S.A.
), instaurou, ao abrigo da alínea k) do n.º 1 do artigo 37.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 02 de outubro, a presente AÇÃO ADMINISTRATIVA contra AEDL, S.A. e F., S.A.
, pedindo a condenação solidária destas a pagar-lhe a quantia de 8.159,54 €, acrescida de juros de mora à taxa legal.
Para tanto alega, em síntese, que no dia 29 de abril de 2011, por volta das 22h40m, quando o veículo por si seguro de matrícula XX-GB-XX, conduzido por R., circulava na auto-estrada A43, no sentido Gondomar-Porto, ao km 9,690, embateu num cão de grande porte, que se atravessou no meio da faixa de rodagem, em frente do veículo; O acidente é de imputar à culpa exclusiva da AEDL, que incumpriu o dever de vigilância que sobre ela impendia de manter a via livre e desimpedida.
Em consequência do acidente, o veículo sofreu estragos, cuja reparação importou em 8.159,54 euros, que aquela, enquanto seguradora do veículo, pagou à RC., proprietária/locadora deste.
A Ré F., S.A., contestou impugnando os factos alegados pela Autora e concluindo pela improcedência da ação.
Por sua vez, a Ré AEDL, S.A., contestou defendendo-se por exceção, invocando a ilegitimidade processual passiva para a presente ação; Mais invocou a existência de questão prejudicial; Impugnou parte da factualidade alegada pela Autora, pugnando pela improcedência da ação.
Requereu a intervenção principal provocada da B. .
A Autora respondeu concluindo pela improcedência da exceção dilatória da ilegitimidade passiva suscitada pela Ré AEDL e pela inexistência da questão prejudicial por ela suscitada.
Admitiu-se a intervenção principal provocada, no lado passivo, da B. .
A interveniente B. contestou a fls. 389-448 dos autos (suporte físico), requerendo a intervenção acessória provocada da F., S.A..
Defendeu-se por impugnação, concluindo pela improcedência da ação.
Por despacho de fls. 455-458 dos autos (suporte físico), o 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Gondomar determinou a suspensão da presente instância, por considerar que o objeto dos presentes autos é idêntico ao da ação a correr termos com o n.º 2517/12.5TBGDM, pois, além do mais, “a eventual improcedência da pretensão deduzida naquela ação n.º 2517/12.5TBGDM, com a consequente absolvição da aqui ré, destruiria os argumentos aduzidos pela autora na presente ação, com a consequente absolvição da ré, por nenhuma responsabilidade lhe poder ser imputada na verificação do acidente”.
Em 20 de janeiro de 2016, a Secção Cível da Instância Local de Gondomar proferiu saneador-sentença, julgando procedente a exceção dilatória da incompetência, em razão da matéria, dos tribunais cíveis para conhecer da relação jurídica que lhe foi submetida e absolvendo os Réus da instância, considerando que a competência material para conhecer dessa relação jurídica cabe aos Tribunais Administrativos.
Requerida e deferida a remessa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal [cf. fls. 559 do suporte físico], foi prestada informação de acordo com a qual o Proc. n.º 2517/12.5TBGDM, também se encontrava a correr termos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal, agora sob o n.º 315/16.5BEPRT [cf. fls. 576 do suporte físico].
Por despacho de fls. 590 dos autos (suporte físico), foi, além do mais, deferida a intervenção acessória da F., S.A., que, uma vez citada, nada disse.
Em 25 de julho de 2016, foi emitida certidão referente à sentença proferida em 19 de Julho de 2016 no âmbito do Processo n.º 315/16.6BEPRT, com nota do respetivo trânsito em julgado [fls. 592-605 do suporte físico].
Realizou-se audiência prévia, na qual se suscitou a questão da eventual ocorrência da exceção da autoridade de caso julgado decorrente do trânsito em julgado da sentença proferida no âmbito do Processo n.º 315/16.6BEPRT.
Observado o contraditório, as Rés B., S.A., AEDL, S.A. e F., S.A. pugnaram pela improcedência da presente ação em virtude do efeito positivo produzido pela sentença transitada em julgado proferida no âmbito do Processo n.º 315/16.6BEPRT [cf. requerimentos de fls. 684, 688-689 e 698 do suporte físico].
Por sua vez, a Autora sustentou não se verificar a exceção do caso julgado entre os presentes autos e aquele outro processo, por falta da tríplice de identidade prevista no artigo 581.º do CPC [cf. requerimento de fls. 686 do suporte físico].
Após proferiu-se saneador-sentença, julgando procedente a exceção da autoridade do caso julgado e julgando a presente ação totalmente improcedente e absolvendo as Rés do pedido, constando esse saneador-sentença da seguinte parte dispositiva: «Com os fundamentos supra expostos e de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, julgo a presente ação administrativa totalmente improcedente e, em consequência, absolvo as Rés do pedido.
**Condeno a Autora no pagamento da totalidade das custas processuais”.
*Inconformada com o decidido, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: 1-O presente recurso tem por objeto a seguinte questão, a saber: INEXISTÊNCIA DE CASO JULGADO (na modesta opinião da demandante, claro está), pois a demandante, sempre com o devido respeito, não se pode conformar com a Douta Sentença de que aqui recorre quanto ao entendimento da verificação da exceção de caso julgado e, por conseguinte, com a improcedência (pelo menos nesta fase) do pedido por si formulado, sem a produção de qualquer prova, designadamente testemunhal.
2 - Pelo menos tanto quanto alcança a demandante, baseia-se o Senhor Doutor Juiz "a quo” num único facto para considerar haver caso julgado: o acidente de viação dos presentes autos e o acidente de viação tratado nos autos com o n° 315/16.6BEPRT é o mesmo.
3 - Sendo o mesmo acidente, contudo, as partes não são as mesmas, o pedido não é o mesmo, assim como a causa de pedir não é a mesma.
4-Não se verifica nenhum dos três requisitos de identidade previstos no art° 581o do Código de Processo Civil.
5 - Desde logo, não tendo a demandante sido parte nos autos com o nº 315/16.6BEPRT, neles não interveio, não alegou factos, nem produziu prova; ou seja, no entendimento consagrado na Douta Sentença em recurso, a demandante tem que se sujeitar a uma decisão onde não teve qualquer possibilidade de intervir, de apresentar os seus argumentos e de produzir qualquer prova.
6-Com o devido respeito, não colhe o argumento do perigo de decisões contraditórias quanto ao mesmo acidente; se tiver que as haver, nomeadamente pela prova produzida, assim como a prova que se vier a produzir, que haja.
7- Até porque entende a demandante que essa contradição, verdadeiramente, não existe, pois, apesar de ser o mesmo acidente, pode ser produzida prova em sentido diferente; prova essa que terá, pelo menos, que ter a possibilidade de ser produzida.
8-Neste caso concreto, por exemplo, conforme se alcança da certidão da Douta Sentença proferida nos autos no 315/16.6BEPRT, o segurado da demandante não prestou depoimento (pelo menos, tanto quanto a demandante julga saber), designadamente em sede de declarações de parte; esse mesmo segurado foi arrolado pela demandante na qualidade de testemunha.
9-Estatui o no 1 do art° 581º do Código de Processo Civil o seguinte: "Repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir" (sublinhado e carregado nosso); sendo certo que os nos 2, 3 e 4 desse mesmo artigo concretizam cada um dos conceitos, a saber: 2 - "Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica" (sublinhado e carregado nosso); 3 – "Há identidade de pedido quando numa outra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico" (sublinhado e carregado nosso); 4 - "Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico.
(...)" (sublinhado e carregado nosso).
10- No presente caso, resulta evidente que nenhum dos requisitos de identidade se encontra preenchido.
11- As partes são diferentes, os pedidos são diferentes e as causa de pedir são igualmente díspares.
12- O único elemento em comum é que ambas as ações emergem do mesmo acidente de viação.
13- E, diga-se desde já, antes existam decisões contraditórias do que impedir uma parte de fazer a prova dos factos que alega só porque numa outra ação as coisas não correram bem ao aí demandante.
14- Esse entendimento, salvo o devido respeito, com a recusa em pronunciar-se sobre os factos alegados nos presentes autos, representa uma autêntica denegação, uma inconstitucionalidade, nos termos e para os efeitos dos artºs 2° e 202°, ambos da Constituição da República Portuguesa.
15- Assim sendo, não se considerando que se verifica qualquer caso julgado, deverão os autos prosseguir os seus termos.
16 - A Douta Sentença recorrida violou, entre outros, o art° 581 do Código de Processo Civil, assim como os arts. 20° e 202° da Constituição da República Portuguesa.
NESTES TERMOS, dando provimento ao recurso e, por conseguinte, alterando a Douta Sentença recorrida no sentido de considerar que não existe qualquer exceção de caso julgado, ordenando o prosseguimento dos autos para produção de prova.
A apelada AEDL contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação e apresentando as conclusões que se seguem: A. O acidente de viação constante dos autos do processo n.º 315/16.6BEPRT é efetivamente o mesmo acidente dos presentes autos, ocorrido no dia 29 de abril de 2011 na autoestrada A43, com o veículo segurado pela Recorrente, de matrícula XX-GB-XX.
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A sentença do processo n.º 315/16.6BEPRT, que já transitou em julgado, declarou totalmente improcedente o pedido, dando como não provada a existência de ilicitude e culpa e absolvendo, em consequência, as Rés e Interveniente Principal AEDL.
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A pretensão indemnizatória dos presentes...
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