Acórdão nº 3853/18.2T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução05 de Março de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

APELANTE: X,S.A.R.L.

APELADO: M. M.

Tribunal da Comarca de Viana do Castel, Juízo do Trabalho de Viana do Castelo, Juiz 1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO M. M.

, residente na Rua …, em Viana do Castelo, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra: “Y – SGPS, S.A.”, com sede na Rua …, Edifício … Lisboa; “X, S.A.R.L.”, com sede na Rue …, Luxemburgo; “W – TECNOLOGIAS DE CAMINHOS DE FERRO, S.A.”, sociedade comercial com sede na Rua …, Edifício … Lisboa; e “G. – FUNDAÇÕES E GEOTÉCNICA, LTª.”, com sede na Rua …, Edifício … Lisboa, peticiona o seguinte: - que a 1ª R. seja condenada a reconhecer que o A. resolveu o contrato de trabalho com justa causa e a pagar-lhe a quantia de €29.148,78 a título de indemnização pela resolução com justa causa; a quantia de €15.772,54 de retribuições em falta; a quantia de €868,88 de despesas; a quantia de €787,50 a título de formação não ministrada, tudo acrescido dos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa de 4%; - que as restantes RR. sejam condenadas, em regime de solidariedade, condenadas a pagar todos os montantes supra identificados, que se encontrem vencidos há mais de três meses aquando da prolação da sentença.

Alega em síntese, que foi admitido ao serviço da 1ª Ré em 14/05/1996, para exercer as funções de arvorado, ultimamente tinha a categoria de encarregado de 1ª e auferia mensalmente a retribuição base de €1.300,00, acrescida da isenção de horário de trabalho, no valor de €325,00.

Desde 2016 que a 1ª Ré passou a liquidar a retribuição do autor com irregularidade razão pela qual este em 15 de Outubro de 2018 enviou uma carta registada com aviso de recepção à 1ª Ré manifestando a sua intenção de por termo ao contrato alegando justa causa com fundamento na falta de pagamento na falta de pagamento pontual da retribuição por um período superior a 60 dias sobre a data do seu vencimento, pois estavam por lhe liquidar, além do mais, os salários respeitantes aos meses de Junho (parcial), Julho, Agosto e Setembro de 2018 Mais alega que nos últimos três nos de vigência do contrato não lhe foi ministrada qualquer formação profissional.

As Rés fazem parte de um grupo estruturado de empresas liderado pela 3ª Ré, mantendo uma estrutura organizativa comum, participando no capital umas das outras.

As Rés contestaram, por excepção e por impugnação alegando a ilegitimidade da 3ª Ré, a impossibilidade de responsabilização das 2ª, 3ª, 4ª e 5ª Rés pelo pagamento dos créditos não vencidos há mais de 3 meses atento o disposto no art.º 334.º do CT e a inexistência de comportamento culposo, no que respeita aos atrasos no pagamento do salário do autor, concluindo não ser devida ao autor a indemnização peticionada ou caso assim no se entenda então tal indemnização não deverá exceder os 15 dias de remuneração por cada ano de antiguidade O Autor respondeu às deduzidas excepções, concluindo pela sua improcedência.

Os autos prosseguiram a sua normal tramitação e por fim foi proferida sentença pela Mmo. Juiz, que terminou com o seguinte dispositivo: “Julgar a presente acção procedente, por provada, e em consequência, condenar a R. “Y – Engenharia” a reconhecer a justa causa da resolução do contrato de trabalho operada pelo A. e a pagar-lhe: - a quantia de liquida €29.148,78 a título de indemnização pela resolução com justa causa; - a quantia ilíquida de €15.772,54 de retribuições em falta a que há que descontar a quantia liquida de €2.542,27; - a quantia de €868,88 de despesas; - a quantia de €787,50 a título de formação não ministrada; - tudo acrescido dos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa de 4%; Condenar solidariamente as restantes RR. No pagamento das quantias supra referidas.

Custas pelas RR.

Registe e notifique.”*Inconformada com esta sentença, dela veio a Ré “X, S.A.R.L.” interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que depois de aperfeiçoadas terminam mediante a formulação das seguintes conclusões: “A. O presente recurso é interposto da sentença proferida em 7 de Junho de 2019, que julgou totalmente procedente a acção apresentada, por provada, condenando, assim, a 1ª Ré a, por um lado, reconhecer que o Recorrido resolveu o contrato de trabalho com justa causa, bem como, por outro lado, a proceder ao pagamento dos valores peticionados, acrescidos dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de 4%, num total de € 44.195,53 (quarenta e quatro mil, cento e noventa e cinco euros e cinquenta e três cêntimos).

  1. A decisão recorrida condenou solidariamente as demais Rés, onde se inclui a Recorrente, ao pagamento daquelas quantias, condenação com a qual a Recorrente não se pode conformar, desde logo, em virtude de não ser parte legítima nos autos a quo.

  2. Assim, o objecto do presente recurso consiste na apreciação da ilegitimidade passiva da Recorrente nos autos a quo, da qual decorre que não poderá ser condenada, na qualidade de responsável solidária da 1.ª Ré., bem como da inexistência da obrigação de indemnização da 1.ª Ré D. Quanto ao primeiro, considera a Recorrente que o Tribunal a quo fez uma incorrecta interpretação e aplicação das disposições legais aplicáveis, nomeadamente dos artigos 334.º do Código do Trabalho e 481.º do Código das Sociedades Comerciais (“CSC”).

  3. Isto porque, por força do regime legal vigente, por não ter sede em Portugal, a Recorrente encontra-se excluída do âmbito de aplicação do Título V do CSC e, por conseguinte, do regime de responsabilidade solidária previsto no artigo 334.º do Código do Trabalho.

  4. A Recorrente não concorda com o teor do Acórdão n.º 227/2015 do Tribunal Constitucional, invocado pelo Recorrido para fundamentar a responsabilidade solidária da Recorrente.

  5. Sumariamente, entendeu aquele Tribunal que “(…) a interpretação conjugada das normas contidas no artigo 334.º do Código do Trabalho e no artigo 481.º, n.º 2, proémio, do Código das Sociedades Comerciais, na parte em que impede a responsabilidade solidária da sociedade com sede fora de território nacional, em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo com uma sociedade portuguesa, pelos créditos emergentes da relação de trabalho subordinado estabelecida com esta, ou da sua ruptura, por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, da CRP(…)”.

  6. Parece claro à Recorrente que o Tribunal Constitucional não ponderou o facto de o legislador ordinário ter, sem suporte legal, estendido a aplicabilidade da sua lei material a sociedades sedeadas no estrangeiro – contra o disposto no proémio do n.º 2 do artigo 481.º do CSC - às quais deverá antes ser aplicada, nos termos das normas de conflitos vigentes, a lei da sua sede.

    I. Deverá ser tomado em conta o conteúdo dos votos de vencido do referido Acórdão, de onde resulta a conclusão de não violação do princípio da igualdade, uma vez que a desigualdade de tratamento “(…) é uma decorrência da aplicação da norma de conflitos, não dos regimes em si.” J. O referido acórdão não contém qualquer referência à interpretação dos artigos 3.º, n.º 1 do CSC e 33.º, n.º 2 do Código Civil, os quais estabelecem que às sociedades estrangeiras, nomeadamente em matéria de responsabilidade, lhes é aplicável a respectiva lei pessoal (e tais normas, diga-se, nunca foram votadas a um juízo de inconstitucionalidade!) K. Do disposto naquelas normas resulta a inaplicabilidade a sociedade estrangeira (i.e., sem sede em Portugal) do regime de responsabilidade solidária previsto no artigo 334.ºdoCódigo do Trabalho, atenta a inaplicabilidade antecedente do regime previsto nos artigos 481.º e ss do CSC.

    L. À luz do quadro legal vigente, não restam dúvidas de que a Recorrente não é parte legítima na presente acção, sendo a ilegitimidade processual passiva uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do mérito da causa e dá lugar à absolvição da Ré da instância, nos termos conjugados do disposto nos artigos 278.º, n.º 1, alínea d), 576.º, n.º 1 e 2, 577.º, alínea e) e 578.º, todos do Código de Processo Civil.

  7. Por este motivo, a decisão recorrida deverá ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente da instância.

  8. Sem prescindir, cumpre referir que o regime do artigo 334.º do Código do Trabalho é claro no sentido da extensão da responsabilidade para lá da esfera jurídica do empregador, mas apenas “[p]or crédito emergente de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, vencido há mais de três meses (…)” (sublinhado e realce nossos).

  9. O que equivale a dizer que, ainda que se admitisse que a Recorrente é parte legítima, a Recorrente apenas poderia responder solidariamente pelos valores, que à data da propositura dos autos a quo, se encontrassem vencidos há mais de três meses, isto é, em data anterior a 09.11.2018.

  10. Por fim, no que diz respeito à responsabilidade da 1ª Ré , a verdade é que, ainda que a falta de pagamento da retribuição possa ser considerada fundamento de justa causa de resolução do contrato de trabalho, a inexistência de culpa daquela Ré afasta a obrigação de indemnização prevista no artigo 396.º do Código do Trabalho.

  11. De facto, a falta de liquidez vivida pela 1.º Ré à data da resolução do contrato do Recorrido – e que se mantém na presente data - é consequência de factores externos e complemente alheios àquela Ré, impedindo-a de cumprir pontualmente com a totalidade das suas obrigações para com os seus trabalhadores.

  12. A 1.ª Ré tudo tem feito para combater e contrariar a situação actual de crise, razão pela qual qualquer incumprimento contratual para com o Recorrido não decorre de culpa sua.

  13. Ainda que assim não fosse, o grau da eventual culpa da 1.ª Ré é reduzido designadamente porque resultante de todos os condicionalismos externos que lhe são completamente alheios, mas que foram os únicos responsáveis pela actual situação de crise vivida no seu seio.

  14. Consequentemente, qualquer indemnização que possa entender-se...

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