Acórdão nº 01065/17.1BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Fevereiro de 2020
Magistrado Responsável | NEVES LEITÃO |
Data da Resolução | 19 de Fevereiro de 2020 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
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RELATÓRIO 1.1. A…………, S.A.
interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 10 julho 2018 que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra decisão de indeferimento de reclamação graciosa tendo por objecto autoliquidação de IRC (exercício de 2015) do qual resultou € 55 752,39 a reembolsar 1.2. A recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões: i. A solução jurídica propugnada pelo Tribunal a quo acarreta, salvo o devido respeito, a violação dos princípios da legalidade e tipicidade fiscais, - arts. 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, i) da CRP – na medida em que o artigo 88.º n.º 14 do CIRC, vigente no exercício de 2015, foi interpretado no sentido que apenas lhe veio a ser ulteriormente conferido, no exercício de 2016, pelo n.º 20 do artigo 88.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30.03.
ii. Só através da Lei n.º 7-A/2016, de 30.03, veio o legislador a aditar ao artigo 88.º n.º 1 do CIRC o seguinte: «20 - Para efeitos do disposto no n.º 14, quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades estabelecido no artigo 69.º, é considerado o prejuízo fiscal apurado nos termos do artigo 70.º. – com (suposta) natureza interpretativa.
iii. Através do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 395/2017, de 12.07 - aqui dado como reproduzido - foi julgado inconstitucional por violação da proibição da retroatividade fiscal, consagrada no artigo 103.º, n.º 3, da CRP, o segmento normativo do artigo 135.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, que atribui natureza interpretativa ao artigo 133.º do mesmo diploma, na parte em que vem fixar o sentido do artigo 88.º, n.º 14, do CIRC, nos termos do n.º 20 desse artigo.
iv. Vale isto por dizer que, no caso dos autos - e pese embora directamente confrontada com a existência de falsa lei interpretativa - com inerente violação dos princípios da segurança jurídica e irretroactividade fiscal - o Tribunal a quo aplicou uma norma que viola a lei fundamental, o que determina a anulação da sentença.
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Sem prejuízo, além de estar em causa uma tributação materialmente distinta do IRC, a consideração da tributação autónoma para efeitos do RETGS carece totalmente de sentido - quer literalmente, quer em substância.
vi. O n.º 14 do artigo 88.º do CIRC refere-se apenas "aos sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal no período de tributação", nada estabelecendo, especificamente, quanto às empresas enquadradas no RETGS - ao invés do que expressamente sucede noutros pontos da lei fiscal23 (23 Cfr. Artigo 14.º n.º 8 da Lei n.º 2/2007; artigos 87.º-A, 104.º-A e 105.º-A CIRC.).
vii. Como os lucros tributáveis positivos ou negativos e a matéria colectável positiva ou negativa em nada afectam a tributação autónoma, a agregação das tributações autónomas das empresas que compõem o Grupo em nada difere das somas das suas tributações autónomas individuais.
viii. Quando a lei vigente no exercício de 2015 estabelece o agravamento das tributações autónomas em 10% quando os sujeitos passivos apresentem prejuízo fiscal, não pode deixar de ter por referência as despesas concretas sobre as quais incidem aquelas tributações autónomas.
ix. De igual modo, e na medida em que se refere a despesas concretas, a lei tampouco pode deixar de ter por referência, portanto, as empresas concretas que realizaram essas mesmas despesas.
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Dentro desta evidente lógica, inerente à técnica legislativa e fiscal subjacente à tributação autónoma, também o critério da existência de prejuízos fiscais é igualmente aplicável, obviamente, a cada uma das empresas que realiza a despesa autonomamente tributada.
xi. O legislador criou as taxas de tributação autónoma com o intuito de dissuadir as sociedades de apresentar determinado tipo de despesas, e de forma a evitar, igualmente, que os sujeitos passivos utilizassem determinadas despesas para proceder à distribuição camuflada de lucros, bem como para evitar a fraude e a evasão fiscal.
xii. Paralelamente, por exemplo, também os pagamentos especiais por conta foram criados, pelo Decreto-Lei n.º 44/98, de 03.03, com idêntica justificação do combate «às práticas evasivas de ocultação de rendimentos ou de empolamento de custos», sendo que, no RETGS, o pagamento especial por conta é calculado e pago por cada uma das empresas que compõem o Grupo e por referência aos seus resultados individuais24 (24 Cfr. artigo 106.º n.º 13 do CIRC.).
xiii. Caso o propósito do legislador - ao proceder ao agravamento da taxa de tributação autónoma - fosse considerar os prejuízos fiscais do grupo, em detrimento dos prejuízos fiscais de cada uma das empresas onde são realizadas as despesas que se pretendem tributar, constata-se que falharia por completo o desígnio subjacente a esta técnica tributária.
xiv. É que, como o resultado do grupo depende da soma aritmética de resultados positivos e negativos, não existiria qualquer indicador fiável para o destinatário da norma aferir o pretendido agravamento da taxa de tributação autónoma, gorando-se também o efeito dissuasor e extrafiscal da norma - e continuando cada uma das empresas a incorrer nas despesas que o legislador pretendera desincentivar pela via fiscal...
xv. Com a interpretação da AT, uma empresa que venha a integrar o grupo fiscal já no decurso do respectivo período económico25 (25 Cfr. Art. 69.º n.º 7 do CIRC) veria...
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