Acórdão nº 02326/19.0BEPRT-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO O MUNICÍPIO DE (...), réu no Processo de Contencioso Pré-contratual que contra si foi instaurado em 26/09/2019 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto pela sociedade U., SA, e no qual é contra-interessada a sociedade G., S.A.

(todos devidamente identificados nos autos) – no qual foram impugnados o ato de exclusão da proposta por si apresentada e de adjudicação à sociedade contra-interessada no âmbito do procedimento concursal para fornecimento de refeições escolares aos alunos do 1º ciclo do ensino básico e da educação pré-escolar para o ano letivo de 2019-2020 – inconformado com a decisão de 07/11/2019 do Tribunal a quo, que indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA, que havia sido por ele requerido, dela interpõe o presente recurso (apelação autónoma com subida em separado), pugnando pela sua revogação e substituição por outra que defira o levantamento do efeito suspensivo automático, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: I. Aplica-se, integralmente, à questão jurídica que se discute o vertido no douto Acórdão do STA, proferido, em 05-04-2017, no proc. 031/17.

  1. Pelos fins a que se destina – providenciar refeições escolares a crianças –, o contrato que se discute não pode aguardar pela decisão final a proferir quanto à sua validade.

  2. Conforme se diz naquele douto acórdão do STA (a adaptação ao caso vertente consiste, meramente, em pôr no singular as frases que mencionam as recorridas ou as autoras...), isso «significa que, de qualquer forma, no período em que decorrer a acção pré-contratual e até ao trânsito em julgado da mesma, nunca as aqui recorridas e autoras na acção de contencioso pré-contratual vão poder executar o referido contrato ainda que obtenham procedência na acção, pura e simplesmente porque o tempo que passou já passou».

  3. «Ou seja, para as autoras da acção, e face à natureza do contrato em causa, sempre no período a decorrer até à decisão da acção, a actividade a que se refere o contrato (ou outra de natureza idêntica) terá de ocorrer, pelo que lhe é indiferente que seja o adjudicatário do mesmo ou outro adjudicatário que o Município venha a contratar por prorrogação de contratos existentes ou por ajuste directo, a proceder à referida actividade.» V. Fica, pois, por saber em nome de que interesse é que a recusa do levantamento do efeito suspensivo poderia ser declarada, dado que, como se demonstra, não pode sê-lo em nome de um qualquer interesse da Recorrida.

  4. Por outro lado (mas em íntima conexão com o que antecede): a Recorrida defende apenas o legítimo, mas vulgar, «interesse particular de qualquer concorrente com expectativas de vir a ser o escolhido e das vantagens/benefícios que poderá retirar da futura adjudicação», em contraponto com a Recorrente, que visa prosseguir um interesse público de incomensurável relevância, consistente na satisfação de necessidades fundamentais dos munícipes.

  5. Nestas circunstâncias, a escolha entre os interesses em presença é óbvia, não carecendo o Município de alegar outros factos de que resultem os seus danos.

  6. Como argutamente se escreve no mesmo acórdão, «o prejuízo para o interesse público resulta essencialmente do facto de ele ter de ser imediatamente satisfeito, não sendo possível pactuar com quaisquer delongas, o que implica que o interesse da aqui recorrida nunca poderá ser salvaguardado em qualquer situação».

  7. Na ponderação a fazer, não pode olvidar-se que «a permanência ou o levantamento do efeito suspensivo automático faz-se por referência ao contrato correspondente» e não quanto a qualquer «contratação alternativa» ou à sua possibilidade.

  8. Por todo o exposto, o Tribunal a quo, ao recusar o levantamento do efeito suspensivo da impugnação, incorreu em erro de julgamento, por interpretação e aplicação erróneas do disposto no art. 103-A-2-4 do CPTA.

A recorrida U., SA, autora na ação, contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida.

Subiu o recurso em separado a este Tribunal em 16/01/2020, instruído com certidão das peças processuais atinentes ao incidente de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA (cfr. fls. 1 ss.-67 SITAF).

Neste notificada a Digna Magistrada do Ministério Público nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, não emitiu Parecer.

*Sem vistos (cfr. artigo 36º nº 1 alínea e) e nº 2 do CPTA), foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

* II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.

O presente recurso vem dirigido à decisão do Tribunal a quo que indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA, sendo a questão essencial a decidir a de saber se o Tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação dos nºs 2 e 4 do artigo 103º-A do CPTA.

* III. FUNDAMENTAÇÃO 1.

Da decisão recorrida Pela decisão recorrida o Mmº Juiz do Tribunal a quo indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA, que havia sido requerido pelo réu MUNICÍPIO DE (...).

  1. Da tese do recorrente Sustenta o recorrente MUNICÍPIO que o Tribunal a quo, ao recusar o levantamento do efeito suspensivo automático da impugnação, incorreu em erro de julgamento, por interpretação e aplicação erróneas do disposto no artigo 103º-A nºs 2 e 4 do CPTA.

    Suporta-se para tanto no Acórdão do STA de 05/04/2017, Proc. nº 031/17, que invoca e cita, dizendo, em suma, que pelos fins a que se destina – providenciar refeições escolares a crianças – o contrato objeto do procedimento pré-contratual não pode aguardar pela decisão final a proferir quanto à sua validade; que conforme se diz naquele acórdão do STA isso «significa que, de qualquer forma, no período em que decorrer a ação pré-contratual e até ao trânsito em julgado da mesma, nunca as aqui recorridas e autoras na ação de contencioso pré-contratual vão poder executar o referido contrato ainda que obtenham procedência na ação, pura e simplesmente porque o tempo que passou já passou»; que «Ou seja, para as autoras da acção, e face à natureza do contrato em causa, sempre no período a decorrer até à decisão da acção, a atividade a que se refere o contrato (ou outra de natureza idêntica) terá de ocorrer, pelo que lhe é indiferente que seja o adjudicatário do mesmo ou outro adjudicatário que o Município venha a contratar por prorrogação de contratos existentes ou por ajuste direto, a proceder à referida atividade»; que fica, pois, por saber em nome de que interesse é que a recusa do levantamento do efeito suspensivo poderia ser declarada, dado que, como se demonstra, não pode sê-lo em nome de um qualquer interesse da Recorrida; que por outro lado (mas em íntima conexão com o que antecede): a Recorrida defende apenas o legítimo, mas vulgar, «interesse particular de qualquer concorrente com expectativas de vir a ser o escolhido e das vantagens/benefícios que poderá retirar da futura adjudicação», em contraponto com a Recorrente, que visa prosseguir um interesse público de incomensurável relevância, consistente na satisfação de necessidades fundamentais dos munícipes; que nestas circunstâncias a escolha entre os interesses em presença é óbvia, não carecendo o Município de alegar outros factos de que resultem os seus danos; que como se escreve naquele mesmo acórdão, «o prejuízo para o interesse público resulta essencialmente do facto de ele ter de ser imediatamente satisfeito, não sendo possível pactuar com quaisquer delongas, o que implica que o interesse da aqui recorrida nunca poderá ser salvaguardado em qualquer situação»; que na ponderação a fazer, não pode olvidar-se que «a permanência ou o levantamento do efeito suspensivo automático faz-se por referência ao contrato correspondente» e não quanto a qualquer «contratação alternativa» ou à sua possibilidade.

  2. Da análise e apreciação dos fundamentos do recurso 3.1 Cumpre começar por explicitar que tendo o processo de contencioso pré-contratual sido instaurado em 26/09/2019, a versão do artigo 103º-A do CPTA aplicável, e que ademais foi a convocada, é o decorrente do CPTA na versão decorrente da revisão operada pelo DL. n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, na medida em que as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei nº 118/2019, de 17 de setembro, lhe são ulteriores e apenas posteriormente entraram em vigor (cfr. artigos 13º e 14º).

    Pelo que todas as referências feitas aos normativos do CPTA, em especial a do artigo 103º-A, devem considerar-se feitas para a versão dada pelo DL. n.º 214-G/2015.

    3.2 Dito isto, vejamos então, se foi ou não correta a decisão do Tribunal a quo que indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático.

    Para tanto atentemos no enquadramento legal que lhe é aplicável.

    3.3 As ações de impugnação ou de condenação à prática de atos administrativos (ou equiparados, para tal efeito) relativos à formação de contratos de empreitada de obras públicas, de concessão de obras públicas, de concessão de serviços públicos, de aquisição ou locação de bens móveis e de aquisição de serviços, seguem a forma de processo de contencioso pré-contratual prevista e regulada nos artigos 100º ss. do CPTA.

    Sempre que o processo de contencioso pré-contratual seja intentado com vista à impugnação de atos de adjudicação, a sua instauração suspende automaticamente os efeitos do ato de adjudicação ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado.

    É o que resulta do artigo 103º-A nº 1 do CPTA, introduzido pelas alterações resultantes do DL. n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, que dispõe o...

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