Acórdão nº 00231/19.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução31 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO A sociedade M., S.A.

(devidamente identificada nos autos) instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela o processo de contencioso pré-contratual em que é réu o MUNICÍPIO DE (...) e contra-interessada a sociedade V., S.A.

(igualmente devidamente identificada nos autos), no qual, por referência ao procedimento de consulta prévia para “Aquisição de Serviço de Comunicações Fixas e Móveis incluindo Serviço de Divulgação e Informação via SMS” peticionou o seguinte: i) que fosse declarada como não válida, por ilegal, a proposta apresentada pela contrainteressada V., SA, por violação do Caderno de Encargos e consequentemente no disposto no CCP; ii) que fosse anulada a decisão de adjudicação da proposta; iii) que a adjudicação, por fundamentada, fosse entregue, à autora por ser a única legal e válida à luz das regras do Procedimento.

Por sentença datada de 29/10/2019 (fls. 542 SITAF) o Mmº Juiz do Tribunal a quo julgando a ação procedente anulou o ato de adjudicação e condenou o réu MUNICÍPIO DE (...) na adjudicação do contrato à Autora.

Inconformada a contra-interessada V., SA Portugal dela interpôs o presente recurso de apelação (fls. 592 SITAF), pugnando pela revogação da decisão recorrida, mantendo-se o ato de adjudicação a seu favor, tendo formulado as seguintes conclusões nos seguintes termos: 1. A sentença de que ora se recorre revoga o acto de adjudicação tomado em favor da ora Recorrente V., SA e condena o Município de (...) a adjudicar a proposta da M., SA, ora Recorrida.

  1. Esta decisão representa para o Município demandado um custo superior de cerca de 15% face à proposta adjudicada; colide contra a vontade expressa pela Entidade Adjudicante nas peças que aprovou e nas decisões que tomou ao longo do procedimento; faz uma interpretação incorrecta da proposta da V., SA; obriga o Município de (...) a contratar com uma proposta que oferece uma solução tecnologicamente obsoleta e contra sua vontade.

  2. O Tribunal a quo entendeu que a proposta da viola o CE, devendo ser excluída nos termos do art.º 70.º, n.º 2, alínea b), do CCP, porque não assume expressamente que na mesma se inclui um circuito de internet de 30Mbps, mas apenas um outro circuito para voz, também com 30Mbps.

  3. Nos termos da Cláusula 25.ª do CE eram pedidos dois circuitos, sendo um para a solução de voz com um mínimo de 4Mbps, e outro para internet em fibra óptica, com 30Mbps.

  4. A sentença sob recurso parte do incorrecto pressuposto de que, para o circuito de internet, também se definia um parâmetro base mínimo, pelo que era necessário que cada concorrente definisse quanto em concreto oferecia, pressuposto esse que altera, completamente, a conclusão jurídica tirada pelo Tribunal a quo.

  5. Na verdade, se aquela especificação técnica fixasse um mínimo, seria naturalmente exigível aos concorrentes que indicassem que largura de banda, em concreto, ofereciam.

  6. Ao contrário, se a largura estivesse desde já fixada – como estava -, não se exigia aos concorrentes sua expressa indicação, já que o CE a dava já e os concorrentes haviam já aderido expressamente e sem reservas a este documento do procedimento.

  7. A menos que a Entidade Adjudicante o pedisse expressamente, nos termos do art.º 57.º, n.º 1, alínea c), e art.º 115.º, n.º 1, alínea d), ambos do CCP, o que não aconteceu, como se retira do constante do Ponto 4. do Convite.

  8. Ora, tendo a proposta da V., SA apresentado todos os documentos exigidos, bem como toda a informação exigida pela Entidade Adjudicante, e dado que para a internet se fixava um circuito com 30Mbps, e não este valor como mínimo, nenhuma razão há para dizer que algo falha nesta proposta, sendo que se assume nela a obrigação do escrupuloso cumprimento das especificações técnicas constantes da Cláusula 25.º do CE.

  9. Resulta patente do Convite, que o Município de (...) não pediu este tipo de documentos indicados no art.º 115.º, n.º 1, alínea d), e 57.º, n.º 1, alínea c), ambos do CCP.

  10. Pelo que, em escrupuloso cumprimento da Lei e das normas do procedimento, a V., SA na sua proposta evidenciou o débito proposto para o circuito de voz (que era um parâmetro aberto), e já não para o de internet (que era um parâmetro fechado), declarando apenas que cumpria as determinações e especificações constantes da Cláusula 25.ª do CE onde aquele parâmetro estava indicado de forma fechada, como se deu como provado, aliás, na sentença recorrida (cfr. ponto 2 da matéria assente), sendo que os termos da proposta da V., SA constam também dos factos provados (cfr. respectivo Ponto 6), e facilmente se encontram na sua proposta junta com o processo instrutor.

  11. Assim, afirmar que o valor para a largura de banda pedida para a internet consubstancia um parâmetro mínimo, e não fixo, consubstancia um pressuposto errado da sentença.

  12. Acresce que a sentença falha ainda quando interpreta o Ponto 4 do Convite no sentido de neste se exigir uma valorização expressa a cada especificação e que, como a V., SA não indicava expressamente o circuito de internet pedido, também o não o havia valorizado, pelo que a sua proposta não incluía todos os encargos e despesas que deviam ser discriminados, no entendimento do Tribunal a quo, o que implicava a sua exclusão.

  13. Ora, se assim fosse, nenhuma das propostas poderia ter sido aceite, incluindo a proposta da M., SA a quem o Tribunal a quo entrega a adjudicação.

  14. Mas, na verdade, quando no sub-ponto III do Ponto do Convite se exige os preços das propostas, os quais “devem incluir todos os encargos inerentes ao objeto do contrato a celebrar”, tal não significa que os concorrentes devessem enumerar e valorar, especificação a especificação, tudo quanto era exigido na Cláusula 25.ª do CE.

  15. Tal significa, como é normal em contratação pública, que o preço oferecido inclui tudo quanto é necessário para executar o serviço a prestar, de acordo com o previsto, aliás, na Cláusula 10.ª, n.º 4, do CE.

  16. Pelo que, uma vez mais, falha a sentença na interpretação e aplicação das normas do Concurso, o que levou à assumpção de determinadas premissas e pressupostos incorrectos que, por sua vez, induziram o Tribunal a quo a aplicar o Direito também incorrectamente, tendo em conta as normas aplicáveis e a realidade sobre a qual foi chamado a julgar.

  17. Assim, não se encontrando qualquer violação do CE ou das normas que no Convite indicavam como devia ser apresentada a proposta, e não faltando à proposta da V., SA qualquer termo ou condição que nela obrigatoriamente devesse constar, expressa ou implicitamente, não se encontra qualquer base para a mesma ser excluída por força do disposto no art.º 70.º, n.º 2, alínea b), do CCP, ao contrário do que se conclui na sentença sob recurso, o que determina a sua revogação.

  18. Da sentença sob recurso resulta ainda um segundo motivo que, no entender do Tribunal a quo, deveria levar à exclusão da proposta da V., SA: o de que se teria alterado a proposta original através dos esclarecimentos prestados nos termos do art.º 72.º do CCP.

  19. De novo, este segundo motivo parte de um pressuposto incorrecto, com origem numa errada interpretação da proposta da V., SA, lendo nela o que nela não está, o que é feito também com base numa leitura das peças do Concurso lendo nelas o que nelas não se pede.

  20. O Tribunal a quo, sem conhecimentos ou pareceres técnicos que pudessem suportar a sua decisão, abalançou-se a afirmar que o que era pedido no CE era uma e uma só solução para as ligações de as linhas analógicas, que a V., SA se teria obrigado a executar o contrato através dessa única solução, mas que depois, em sede de esclarecimentos, teria apresentado uma outra solução.

  21. O que não é verdade em nenhum dos casos.

  22. Em primeiro lugar, não se encontra na proposta da V., SA qualquer elemento que possa sugerir – a quem conheça as regras da arte deste sector -, que não se propunha executar esta parte do serviço através de frequências GSM/UMTS.

  23. Ora, o que consta da proposta da V., SA é que esta assumiu “garantir a ligação das linhas analógicas com terminação a 54 volts DC” àquelas instalações, isto é, assumiu garantir a ligação de comunicações exterior à infra-estrutura existente naquelas instalações, que se compunha de “linhas analógicas com terminação a 54 volts DC”.

  24. Na verdade, em termos técnicos e práticos, no que toca às linhas analógicas para voz, o que era necessário era garantir a ligação dos equipamentos de cada um dos 5 locais identificados, que funcionam por linha analógica com terminação a 54 volts, à rede exterior e oferecer 600 minutos para chamadas para rede fixa.

  25. O facto de se ter depois esclarecido que a rede de acesso que seria utilizada seria suportada em frequências GSM/UMTS nada altera quanto à obrigação assumida na proposta: os equipamentos com aquelas características funcionarão de igual forma e como sempre funcionaram, isto é, de modo analógico, pois a informação voz que é transportada por GSM/UMTS é convertida ao chegar no equipamento de terminação, de forma a que a informação siga por linha analógica na infra-estrutura instalada nos serviços do Município de (...).

  26. Na proposta simplesmente se estava a dar cumprimento ao exigido no Ponto 4.IV do Convite que pedia preços unitários para cada tipo de serviço, e a este serviço era dado o nome de linhas analógicas no CE, como se retira da parte da Cláusula 25.ª que acima se reproduziu.

  27. Da mesma forma, no CE não se exigia que o serviço voz tivesse de funcionar sempre, ponto a ponto, por linhas analógicas da origem ao seu destino, e vice-versa.

  28. E bem, dado que, se assim fosse – como se disse na contestação que o Tribunal a quo nem sequer considerou -, a única concorrente que se poderia ter apresentado a concurso era a M., SA, o que tornaria o concurso ilegal por injustificada restrição da concorrência, aliás em prejuízo da própria Entidade Adjudicante, seja do ponto de vista financeiro, seja do ponto de vista...

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