Acórdão nº 72/14.0JAPRT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelC
Data da Resolução13 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Desembargadora Relatora: Cândida Martinho Desembargador Adjunto: António Teixeira Acordam, em conferência, os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório 1.

No processo comum coletivo 72/14.0JAPRT 9/15.0ZRBRG que corre termos no Tribunal da Comarca de Braga - Juízo Central Criminal de Guimarães - realizada a audiência com vista à efectivação do cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido no âmbito dos presentes autos com aquelas que lhe foram aplicadas no processo comum colectivo 203/12.5JBLSB, foi proferido acórdão cumulatório, de acordo com o qual o arguido P. M., foi condenado na pena única de 14 anos de prisão.

  1. Não se conformando com essa condenação, o arguido recorreu do acórdão extraindo da motivação as conclusões que a seguir se transcrevem: «1.

    O processo n.º 72/14.0JAPRT foi extraído, mediante o expediente de separação processual,atentos os prazos previstos nos artigos215ºe276ºdoCódigodeProcesso Penal, do processo n.º 203/12.5JBLSB, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Évora, na (então) Instância Central – Secção Cível e Criminal de Évora – J3, com acórdão proferido em 10 de Abril de 2015 e transitado em 9 de Maio de 2016.

  2. Independentemente da compreensível ânsia em ver a sua situação jurídico-penal definida em Portugal, certo é que o Arguido, ora recorrente, não se pode conformar com odecidido,e comodecidido,peloacórdão cumulatórioproferido em 10deAbril de 2019 e de que o ora recorrente foi notificado em 5 de Junho de 2019, e de que resultou lhe ter sido aplicada pelo Tribunal ora recorrido uma pena única de 14 (catorze) anos de prisão efectiva.

  3. O Arguido, ora recorrente, impugna quanto o Tribunal a quo deu como provado no ponto C. dos Factos Provados (item I do Acórdão recorrido), não só porque não foi acusado, muito menos julgado e condenado por cinco crimes de falsificação de “atas”, como ali se dá por assente, como também porque incorreu o Tribunal recorrido em erro, por excesso, quanto às medidas concretas das penas parcelares em concurso que ali dá por provadas, e que, após, veio, também por manifesto erro, a considerar ao estabelecer a moldura penal do concurso e, bem assim, para efeitos e em sede de pena única que entendeu e decidiu aplicar ao Arguido, ora recorrente.

  4. Ao ter omitido pronúncia sobre elementos de prova, demonstrativos de factos relevantes para a aplicação e a determinação da medida da pena única, cuja junção aos autos foi admitida por despacho de 21 de Março de 2019, incorreu o Tribunal a quo em violação do disposto nos artigos 97º, n.º 5, e 374º, n.º 2, do Código de Processo Penal, bem como do consagrado no artigo 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, sendo a decisão nula ao abrigo do artigo 379º, n.º 1, alínea c) e também alínea a), do Código de Processo Penal.

  5. Ainda que possam V. Ex.ªs entender não se estar perante nulidade da decisão proferida pelo Tribunal a quo ao abrigo do artigo 379º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, sempre se estará perante vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto previsto no artigo 410º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Penal, atenta a desconsideração pelo Tribunal recorrido de factos e elementos de prova relevantes para aquela sua decisão.

  6. OTribunalaquorefere,arespeitodamoldurapenaldoconcursoqueolimitemínimo a considerar é de 6 (seis) anos de prisão efectiva e, com erro patente no acórdão recorrido, que o limite máximo é de 50 (cinquenta) anos de prisão, quando, mesmo quesecingindo,àreveliadaleiedoqueéperfilhadonaDoutrinaenaJurisprudência, à soma, sem mais, das penas parcelares concretamente aplicadas enquanto limite máximo da pena aplicável, essa coma tem como resultado 43 (quarenta e três) anos e 9 (nove (nove) meses de prisão.

  7. Incorreu o Tribunal a quo em violação, por incorrectas interpretação e aplicação no acórdão recorrido, do disposto no artigo 77º, n.º 2, do Código Penal, bem como de quanto, em devida articulação com aquele preceito legal, se prevê nos artigos 41º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, ao referir e estabelecer, sem mais, que o limite máximo da moldura penal do concurso corresponde à soma das concretas penas parcelares, quando, em devida aplicação do expressamente determinado no próprio artigo 77º, n.º 2, do Código Penal, o limite máximo da moldura penal da pena aplicável (qualquer que venha a ser depois a pena aplicada de entre os limites mínimo e máximo) não pode ultrapassar os 25 anos de prisão.

  8. Todos os factos (ilícitos) concorrentes e aqui em apreço foram praticados há mais de 5 (cinco) anos e 5 (cinco) meses atrás, sendo indubitável a relação e a conexão entre os mesmos, direccionados contra o património e num modus operandi idêntico, caracterizado por uma atitude tranquila e tranquilizadora, cordial e educada mesmo - como dito e atestado por todas as testemunhas, inclusivamente as que foram consideradas vítimas da prática de sequestro por ali terem permanecido enquanto foram executados os assaltos e até à sua consumação, em curto espaço temporal.

  9. Como dito no Acórdão de 21 de Abril de 2016 do Supremo Tribunal de Justiça, proferidonoâmbitodoprocesson.º203/12.5JBLSBeincidentesobre alargamaioria dos delitos ora em concurso (31 do total de 39 delitos), para além dos 3 crimes de roubo das agências bancárias, “A prática de todos os outros crimes” estavam “em estreita conexão com aqueles, destinados uns a facilitá-los, outros a dificultar a identificação dos recorrentes como seus autores” (p. 56), o mesmo se passando com os remanescentes 8 crimes ora também em concurso, pelos quais o ora recorrente veio a ser julgado, por força de separação processual, no âmbito do processo n.º 72/14.0JAPRT, evidenciando-se a exacta mesma conexão dos demais 7 delitos ao crime, objectivo primeiro e último dos dois arguidos, de roubo da agência bancária do Banco ..., ou seja, a afronta ao património desta agência, enquanto bem (patrimonial) juridicamente protegido.

  10. Contrariamente ao que foi entendido pelo Tribunal a quo, o ilícito global, circunscrito a um espaço temporal de apenas cerca de 1 (um) ano e em que se evidencia, em todos os delitos, o objectivo primeiro e último do roubo das quatro agências bancárias, ou seja, a lesão do património enquanto bem juridicamente protegido, por parte do recorrente, que nem antecedentes criminais anteriores tinha, conduz, com justeza, a uma conclusão no sentido de uma “determinação pluriocasional dasuaactividadecriminosa”,sem queexistafundamentoconsistente para que se possa, na “inter-relação entre os factos e a personalidade do arguido”, concluir por uma propensão, muito menos “bastante” como dito no acórdão recorrido, para a delinquência.

  11. Tal como consideraram o Tribunal da Relação de Évora e o Supremo Tribunal de Justiça com respeito a 31 dos 39 delitos aqui em concurso, de forma alguma se poderá concluir por que o Arguido ora recorrente tem tendência para a prática de ilícitos ou actos criminosos, muito menos que vinha traçando e/ou perseguindo trajecto na sua vida dessa forma (nem antecedentes criminais tinha), antes se tendo reconduzido o ilícito global aqui em apreço a um período curto e excepcional na sua vida, em que, por força da situação de desemprego em que se encontrava, praticou, em co-autoria, factos tipificados como crime(s) e afrontosos, em primeira e primacial linha, de bens patrimoniais (dinheiro de quatro agências/instituições bancárias).

  12. Como é também entendido e referido na Jurisprudência, subjaz enquanto intençãolegislativa, e é de lógica e senso comuns atentos os factores que haverá que se considerar para determinar a medida justa da pena única, incluindo, e com particular importância, as exigências de prevenção especial, de ressocialização do agente, o tribunal competente para a realização do cúmulo jurídico é o da última condenação precisamente também porque se pretende seja a decisão pautada por actualidade e, comtanto,atendendoaoprópriopercurso,àposturaeàscondiçõesderessocialização actuais do Arguido.

  13. Importa também aqui levar à Vossa consideração não só o próprio tempo muito significativodecorridodesdeaprática dos delitosem concurso- há mais de 5(cinco) anos e quase 6 (seis) meses atrás - e o tempo igualmente muito significativo de reclusãodoArguidodesde6deFevereirode2014,comotambémaformadereclusão especialmente penosa a que o mesmo (contrariamente aos seus co-arguidos) foi sujeito durante 2.339 dias, mais de 5 anos (!), de forma manifestamente desumana, dita por especialista que de tortura, e sem que se vislumbre o que o possa ter justificado, até porque o Arguido nunca teve qualquer incidente ou infracção disciplinares.

  14. Por não ser, de forma alguma, despiciendo na ponderação do que foi já concreta advertência e punição, vivenciada de forma especialmente penosa pelo ora recorrente, permitimo-nos indagar se 1 dia, 1 mês, 1 ano de reclusão no regimedesegurançavivenciadopeloorarecorrentepodeservistoeponderadodamesmaforma que1dia,1mês,1anodereclusãoem regimecomum: aquantos dias,quantos meses, quantos anos corresponderão, na verdade e no que representaram de diferente e tortuoso,cadadia,cadamês,cadaanoem isolamento,afectoaregimedesegurança?! 15.

    E, como resulta demonstrado, mesmo em tais circunstâncias e vivenciando a forma mais gravosa de reclusão, desumana mesmo, o Arguido comportou-se exemplarmente, pugnou por trabalhar e por se dedicar positivamente ao que podia e lhe era permitido no seu isolamento, manifestou e continua a manifestar postura e personalidade empenhadas em retomar a sua vida com a mesma honestidade, ora mais reforçada, por que era pautada antes de ter praticado os delitos numa fase e período delimitados, circunscritos a apenas cerca de 1 (um) ano.

  15. A pena única aplicada ao Arguido, ora recorrente, de 14 (catorze) anos de prisão revela-se manifestamente excessiva, desconforme aos factores que concretamente e na verdade são de atender no caso concreto, e, ademais, às próprias exigências actuais de prevenção especial, de...

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