Acórdão nº 02546/08.3BEPRT 0192/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | SUZANA TAVARES DA SILVA |
Data da Resolução | 08 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1- A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que, em 6 de Junho de 2017, deferiu a impugnação judicial da liquidação interposta pela A…………, Lda, relativamente ao acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, do exercício de 2003, no valor a pagar de € 38.411,80, apresentou, para tanto, alegações que concluiu do seguinte modo: A - A douta sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial apresentada pela impugnante por falta de fundamentação legalmente exigida do acto tributário impugnado, não concordando a Fazenda Pública com o sentido da douta decisão, por considerar existir excesso de pronúncia na decisão do julgador.
B - Com o assim decidido, e salvo de respeito por melhor opinião, não pode a Fazenda Pública conformar-se, entendendo existir nulidade da sentença, porquanto a douta decisão sob recurso pronunciou-se expressamente sobre questão que não devia apreciar por não ter sido in pela impugnante, o que constitui violação do disposto nos artigos 125°, n.° 1 do CPPT e 615°, n.° 1, alínea d) do CPC.
C - Na douta petição inicial a impugnante conclui, entre outros, no articulado 47.° que o acto impugnado “a) — incorre em VÍCIO DE FORMA (falta de fundamentação legalmente exigida), consistente na ausência ou insuficiente apreciação dos factos invocados pela ora Impugnante, designadamente no exercício do direito de audição relativo à proposta de indeferimento da reclamação graciosa e na preterição de formalidades legais; (nosso negrito e sublinhado) D - Ora, a delimitação ou pedido efectuado (“thema decidendum”) pela impugnante terá que ser respeitado no âmbito da douta apreciação efectuada pelo Meritíssimo Juiz.
E - E, no caso em apreço, a impugnante apenas in a falta de fundamentação legalmente exigida com base nas considerações efectuadas em sede de direito de audição no âmbito do procedimento de reclamação graciosa.
F - Deste modo, não podia o Meritíssimo Juiz apreciar a alegada falta de fundamento do acto tributário impugnado alicerçado na falta de fundamentação de facto e de direito das circunstâncias alegadas em sede de audição pré no âmbito do procedimento inspectivo, sob pena de incorrer em excesso de pronúncia. Caso o faça, então o julgador exerce o seu poder jurisdicional para além do que foi pedido pelas partes.
G - De sublinhar que, contrariamente ao doutamente decidido, nunca foi in pela impugnante a falta de fundamentação legalmente exigida do direito de audição em sede de procedimento inspectivo, mas tão só em sede de procedimento de reclamação graciosa.
H - A limitação ao vício da falta de fundamentação determinado em sede decisória não tem correspondência com o pedido da impugnante, nomeadamente no que concerne à falta de fundamentação legalmente exigida com base nas considerações efectuadas em sede de direito de audição no procedimento de reclamação graciosa.
I - O douto decisório alarga a análise decidenda ao pedido da impugnante relativo ao vício de falta de fundamentação do acto de liquidação, quando a própria peticiona apenas e só a falta de fundamentação da reclamação graciosa.
J - Efectivamente a douta decisão pronuncia-se de forma inequívoca sobre o direito de audição em sede de procedimento inspectivo.
K - Assim, não pode a Fazenda Pública, concordar com a douta sentença recorrida, quando esta estende a fundamentação efectuada em sede de acção inspectiva após direito de audição, na medida em que a impugnante apenas formula o pedido, no que a esta parte respeita, quanto ao vício da falta de fundamentação após direito de audição em sede de procedimento de reclamação graciosa, existindo um nítido excesso de pronúncia, que determina a nulidade da sentença recorrida.
L - O tribunal condena no pedido formulado, mas utiliza um fundamento que excede os seus poderes de conhecimento.
M - Deste modo, haverá nulidade da decisão, por excesso de pronúncia, quando o tribunal se ocupa de questões não suscitadas pelas partes e que não sejam de conhecimento oficioso.
N - Segundo Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado, 6° Edição, Volume II, 2006, pág. 316 “As partes é que circunscrevem o thema decidendum, através do pedido e da defesa. O juiz não tem que saber se, porventura, à situação das partes convida melhor outra providência que não a solicitada, ou se esta poderia fundar-se noutra causa petendi”... “Por outro lado, não basta que haja coincidência ou identidade entre o pedido e o julgado; é necessário, além disso que haja identidade entre a causa de pedir (causa petendi) e a causa de julgar (causa judicandi).” O - Tendo a douta sentença recorrida apenas que decidir sobre o vício de falta de fundamentação designadamente no exercício do direito de audição relativo à proposta de indeferimento da reclamação graciosa e na preterição de formalidades legais, é entendimento da Fazenda Pública que o decisório enferma de nulidade, por conhecer de pedido não formulado pela impugnante, incorrendo em violação do disposto nos artigos 125°, n.° 1 do CPPT e 615.°, n.° 1, alínea d) do CPC.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas, deve ser dado provimento ao presente recurso, e declarada a nulidade, por excesso de pronúncia, no que respeita à procedência da impugnação por falta de fundamentação legalmente exigida».
2 – A Recorrida apresentou contra-alegações que concluiu do seguinte modo: 1.º Vem o presente recurso interposto da sentença de fls. 190/198, que julgou procedente a impugnação de fls. 2/39 e determinou a anulação da liquidação impugnada.
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Este recurso foi interposto, pela Fazenda Pública, para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE (requerimento de fls. 203) 3.º e, como tal, foi admitido (despacho de fls. 208, dado em 27-06-20] 7).
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Na data em que as alegações da Recorrente foram entregues tinha-se operado já o trânsito em julgado do despacho de admissão do recurso.
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É, por isso, extemporâneo o requerido pela Recorrente, na data em que apresentou as suas alegações, no sentido de que o Mmo. Juiz do Tribunal “a quo” se dignasse considerar o recurso interposto para o SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, subvertendo com todo o à vontade o rito processual 6.º Admitido o presente recurso para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE (cfr fls. 208), tal como requerido “cfr. fls. 203), só a este TRIBUNAL podiam ser endereçadas as alegações da Recorrente para que ele viesse a conhecer do recurso.
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Não sendo as alegações da Recorrente para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE (cfr. Página 1 de 7) não está já a Recorrente em tempo para apresentar, correctamente, as suas alegações de recurso, 8.º pelo que deverá o presente recurso ser julgado deserto, nos termos do art. 282.0/4 do CPPT.
SEM PRESCINDIR 9.º A reclamação graciosa e a impugnação judicial, sobre que incidiu a sentença recorrida, tiveram na sua origem uma acção inspectiva realizada pela A.T, cujo objectivo foi a análise da actuação da Impugnante/Recorrida enquanto sujeito passivo de IRC e de IVA, anos de 2003 e 2004.
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Em consequência dessa acção inspectiva foi, por correcções meramente aritméticas, corrigida a matéria tributável da ora Recorrida, em IRC e em IVA, anos de 2003 e 2004, tendo a AT procedido às liquidações adicionais (10) que estão identificadas supra, na nota 2 de rodapé, 11.º Informando-se, na nota 3 de rodapé, a situação em que se e 9 desses 10 processos e adiantando a Recorrida a sua expectativa, em termos meramente temporais, quanto aos processos pendentes há 9/10 anos.
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Como se referiu na conclusão 9.º a reclamação graciosa e a impugnação judicial julgada pela sentença recorrida têm a sua causa remota na acção inspectiva realizada em 2006 e a causa próxima nas liquidações adicionais que se lhe seguiram.
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A forma ligeira, a roçar o arbitrário como decorreu a acção inspectiva e os resultados necessariamente infundamentados a que chegou estão bem patentes no respectivo relatório (RIT) e, por contraste, nos relatórios das 6 perícias já realizadas, todos aprovados por unanimidade dos Srs. Peritos, cujos valores apurados aqui se não repetem por estarem devidamente referidos supra, na nota 3 de rodapé.
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Detalhada e criteriosamente apreciou e julgou a sentença sob recurso a influência que o referido RIT teve no indeferimento da reclamação graciosa e na liquidação adicional do imposto impugnado.
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Porque de nenhum argumento dispunha a recorrente para poder interpor o seu recurso, socorreu-se, como único fundamento (?) do convencimento em que estará de que “a douta decisão sob recurso pronunciou-se expressamente sobre questão que não devia apreciar por não ter sido invocada pela impugnante, o que constitui violação do disposto nos artigos 125°, n.° 1 do CPPT e 615. °, n.° 1, alínea d) do CPC” (n.° 2 conclusão B das respectivas alegações).
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Contrariamente ao que pretende a Recorrente, a sentença recorrida pronunciou-se adequadamente sobre questões pertinentes suscitadas pela Impugnante/Recorrida 17.º Verifica-se dos autos que a impugnação judicial fls. 2/19 foi deduzida, quer contra o acto de indeferimento ‘da reclamação graciosa, quer (contra a liquidação adicional que lhe foi feita em IRC, a o de 2003, pedindo a anulação desta.
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Verifica-se, também, que a Impugnante/Recorrida invocou, na sua p. i., dois vícios DE FORMA — vício por falta de fundamentação legalmente exigida (cfr. arts. 13.º a 19.º da p. i., a fls. 6/8) e preterição de formalidade legal (cfr. arts. 20. ° a 27.º da p. i., a fls. 9/10), e dois vícios DE FUNDO ou de VIOLAÇÃO DA LEI DE FUNDO erro na forma de determinação da matéria tributável (cfr. arts. 28.º a 42.º da p.i., a fls. 11/15) e privação do direito de pedir a revisão da matéria colectável (cfr. arts. 43.° a 46.º da p. i., a fls. 16).
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Por sua vez, a sentença sob recurso fez uma apreciação detalhada e cuidadosa do RIT e do acto de indeferimento da reclamação graciosa, nomeadamente a fls. 197-2.° e 3.º parágrafo, e a...
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