Acórdão nº 10665/15.3T9PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelCLÁUDIA RODRIGUES
Data da Resolução10 de Dezembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo Comum (Tribunal Singular) nº 10665/15.3T9PRT.P1 Comarca do Porto - Juízo Local Criminal do Porto – J7Tribunal da Relação do Porto (2ª Secção Criminal – 4ª Secção Judicial)Acordam, em conferência, na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: * 1. RELATÓRIO A) Decisão recorrida:Após realização da audiência de julgamento no Processo Comum Singular nº 10665/15.3T9PRT.P1 no Juízo Local Criminal do Porto – J7 do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, foi em 28.05.2019 proferida sentença, na qual se decidiu (transcrição): “Pelo exposto decide-se: a) Condenar o arguido B… pela prática como co-autor de um crime falsidade informática, p. e p. pelo artigo 3º, nº 1 da Lei nº 109/2009, de 15/09, na pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de €7,00 (sete euros), o que perfaz a multa de €1.400,00 (mil e quatrocentos euros); b) Condenar o arguido C… pela prática como co-autor de um crime falsidade informática, p. e p. pelo artigo 3º, nº 1 da Lei nº 109/2009, de 15/09, na pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz a multa de €1.400,00 (mil e quatrocentos euros).”B) Recurso:Inconformados com esta decisão, os arguidos recorreram para este Tribunal da Relação do Porto, com os fundamentos descritos na respectiva e única motivação e contidos nas seguintes “conclusões”, que se transcrevem: “1ª Na acusação pública (fls. 150) e no despacho de pronúncia (fls. 331) consignou-se como prova documental «a dos autos».

  1. Essas expressões não passam de uma inexistência jurídica, um nada.

  2. Neste contexto, as imagens de fls. 19 não faziam parte dos meios de prova da acusação, nem do processo.

  3. O problema não foi ultrapassado porque as imagens foram visualizadas e dadas a conhecer aos arguidos, ao abrigo do artº 371º do CPP, como consta da acta de fls. 369, porque em momento algum do processo foi proferido despacho a determinar que aquelas imagens constituíam um meio de prova da própria comissão do crime e da culpabilidade, só tendo sido avocadas para efeitos de determinação da sanção e no âmbito do artº 371º do CPP, e para esse efeito de nada adiantam.

  4. Sendo assim, as imagens não podiam ser utilizadas para a prova dos factos 2 a 14, como foram.

  5. A sentença errou ao dar como provada a matéria dos factos 2 a 14, com base no depoimento da testemunha D…, inquirida no dia 19.3.2019, como consta da acta, conjugado com as imagens de fls. 19.

  6. Essa testemunha, no seu curto depoimento, na passagem a partir do minuto 2, não se pronunciou sobre as imagens juntas aos autos, que só foram visualizadas em 11.4.2019, em momento algum as tendo validado e esclarecido, apenas tendo afirmado que fez um relatório do que viu no CCTV e estavam os arguidos, mas nada mais esclareceu, não tendo dito o que afirmou no relatório, que não se encontra no processo, que imagens viu e como foram obtidas e sobretudo, e é o que verdadeiramente interessa, não disse que as imagens em causa eram as juntas aos autos com a queixa a fls. 19 e nomeadamente as que foram visualizadas posteriormente em audiência, no dia 11.4.2019, não se podendo afirmar como se faz a pgs. 13 da sentença, que as imagens «apenas vêm documentar o referido pela testemunha D…, pois é inequívoca a coincidência entre a hora da imagem e a da respectiva operação informática levada a cabo pelos arguidos».

  7. Ora o fulcro do processo «reconduzia-se em associar as operações realizadas informaticamente aos arguidos» - pg. 12 da sentença, o que não foi feito, nem pela testemunha D…, isolada ou conjugadamente com as imagens de fls. 19, que não viu e sobre que se não pronunciou.

  8. Conclui-se pois que existe erro na apreciação da prova e na fixação dos factos 2 a 14.

  9. Não tendo havido qualquer produção de prova, relativamente às imagens, para além da mera visualização documentada na acta de fls. 369, não pode conferir-se validade e licitude à produção desse meio de prova: Não se sabe de que imagens se trata, como foram obtidas, sem são genuínas e legítimas e nomeadamente extraídas escorreitamente do sistema de CCTV da assistente.

  10. Se trata de imagens dos arguidos, foram fotografias tiradas à socapa, sem o conhecimento e a autorização dos arguidos e contra a sua vontade, sendo ilícitas (artº 199º, nº 2, do Cód. Penal, e artº 126º do CPP).

  11. Apesar de não estar estabelecida a proveniência das imagens, a autorização da CNPD (nº 74/2015 – doc. junto pelos arguidos em 22.4.2019) não permitia à queixosa a captação de imagens, por força da injunção dela constante de proibição de filmagem de trabalhadores no exercício das suas funções.

  12. Tudo é dizer que não existe prova do ilícito e devem os arguidos ser absolvidos.

    Nestes termos, - Deve o recurso merecer provimento, com as consequências legais.” Foi o recurso regularmente admitido.

    1. Resposta ao recurso:A Magistrado do Ministério Público junto do tribunal a quo apresentou resposta, na qual pugnou pela improcedência do recurso.

      Neste Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no qual, acompanhando a resposta apresentada pelo Ministério Público na 1ª Instância, pugnou pelo não provimento do recurso dos arguidos e pela confirmação da sentença recorrida.

    2. Tramitação subsequente:Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, não tendo sido apresentada resposta.

      *Colhidos os vistos legais foi o processo à conferência.

      Cumpre pois apreciar e decidir.

      * 2. FUNDAMENTAÇÃO A) Objecto do recurso:Conforme jurisprudência constante e assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior. Entre outros, pode ler-se no Ac. do STJ, de 15.04.2010, in http://www.dgsi.pt: “Como decorre do art. 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso”.

      * B) Apreciação do recurso:Com relevo para a resolução das questões objecto do recurso importa recordar a fundamentação de facto da decisão recorrida (transcrição):“II. FUNDAMENTAÇÃO 1. Factos provados 1. Os arguidos exerceram funções como recepcionistas, no Grupo E…, S.A., concretamente na E1…, sita na Estrada Nacional …, Porto; 2. Em conjugação de esforços, em data não concretamente apurada, mas situada no início do ano de 2015 até 26 de Fevereiro desse ano, os arguidos elaboraram um plano, que consistia em apropriarem-se, ilegitimamente, de quantias pagas em dinheiro por clientes da E1…, ocultando tais apropriações através do acesso ao sistema informático “G…”, mediante registo informático de operações e transacções fictícias; 3. No dia 26 de Fevereiro de 2015, a cliente F… efectuou um consumo na E1…, que associou à conta final da sua estadia, no valor de €51,00, débito este lançado no sistema informático G… como “G1…”; 4. No dia 28 de Fevereiro de 2015, a cliente fez o check out, liquidando o valor de €51,00, em numerário, ao arguido B….; 5. Pelo valor pago por esta cliente, supra descrito, o arguido B… não emitiu factura; 6. No dia 6 de Março de 2015, o cliente H… efectuou um consumo no restaurante da E1…, no valor de €151,90, débito este lançado no sistema informático Opera como “G2…”, que associou à conta final da sua estadia; 7. No dia 8 de Março de 2015, este cliente fez o check out, liquidando o valor total em dívida, em numerário, ao arguido C…; 8. Pelo valor pago por este cliente relativo ao consumo no restaurante, supra descrito, o arguido C… não emitiu factura; 9. Os arguidos apropriarem-se desta quantia, integrando-a no seu património, conforme tinham planeado; 10. Posteriormente, os arguidos, em conjugação de esforços, para ocultarem aquela apropriação, acederam ao sistema informático, concretamente ao programa “G…”, onde realizaram as seguintes operações de anulação com justificação em descontos e de lançamento em contas de outras reservas, de forma a ocultar a apropriação daquele valor em numerário: - no dia 08.03.2015, às 07h58, o arguido C…, utilizando o seu nome de utilizador, transferiu a conta do quarto n.º 401 para o quarto n.º 418; - no dia 08.03.2015, às 12h14, o arguido C…, utilizando o nome de utilizador I…, pertencente à colega J…, transferiu para uma conta de recebimentos, denominada “G3…” o valor de €59,90, com a indicação de que a quantia tinha sido paga; - no dia 08.03.2015, às 14h21, o arguido B…, utilizando o nome de utilizador I…, dividiu o valor remanescente de €92,00 em dois valores, de €82,65 e €9,35; - no dia 08.03.2015, às 14h21, o arguido B…, utilizando o nome de utilizador I…, anulou o valor de €9,35, por motivo de desconto e transferiu esse valor para a conta “G4… Conta de Correções”; - no dia 08.03.2015, às 14h53, o arguido B…, utilizando o nome de utilizador I…, transferiu o valor de €82,65, para o quarto n.º 409; - no dia 09.03.2015, às 00h27, o arguido B…, utilizando o nome de utilizador K1…, pertencente ao colega K…, dividiu o valor de €82,65 em dois valores, de €65,00 e de €17,65; - no dia 09.03.2015, às 11h27, o arguido B…, utilizando o nome de utilizador K1…, anulou o valor de €17,65, por motivo de correcção e transferiu-o para a conta “G3… Micros Cash”; - no dia 09.03.2015, às 07h27, o arguido C…, utilizando o seu nome de utilizador C1…, dividiu o valor de €65,00 em dois valores, de €45,02 e €19,98; - no dia 09.03.2015, às 07h28, o arguido C…, utilizando o seu nome de utilizador, efectuou a transferência do valor de €19,98 para o quarto 403; - no dia 09.03.2015, às 21h06, o arguido B…, utilizando o seu nome de utilizador, dividiu o valor de...

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