Acórdão nº 00036/06.8BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução13 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I-RELATÓRIO 1. O. C. N. e “C. C. N. T., LDA”, intentaram ação administrativa comum contra o Município de (...), na qual formularam os seguintes pedidos: «a) a condenação do R. no montante indemnizatório de € 300.955,86, correspondente a danos emergentes e, bem assim, aquele que vier a ser determinado em sede de liquidação de sentença, a título de vantagens perdidas pelo comportamento ilícito e culposo do R.; b) ou, se assim não se entender- a título subsidiário- condenar o R. ao pagamento aos AA. do valor do terreno, acrescido pelas despesas notariais e pelos honorários do gabinete de arquitetura, ou seja, um montante indemnizatório global de €500.955,86.» 1.1.Como fundamento da sua pretensão indemnizatória, os Autores alegaram em síntese, que em 29/06/99 O. C. N. e Outros, apresentou um pedido de informação prévia, de cujo deferimento foram notificados em 17/03/2000, no qual foi aceite para o terreno aedificandi uma «volumetria de r/c +3+recuado nos blocos 1,2 e 4, r/c+4+recuado nos blocos 5,6 e 7 e 1 piso (r/c) no bloco 3».

1.2.Que na sequência de contrato-promessa outorgado pelo autor O. e os outros dois sócios da sociedade autora, esta última adquiriu o terreno aedificandi através de escritura pública de compra venda, celebrada em 27/06/2000, pelo valor de setenta e cinco milhões de escudos (375.000,00€), valor muito superior ao preço de mercado, tendo gasto 35.506,47€ a título de pagamento de sisa e despesas com a escritura e o registo da propriedade, o que apenas fizeram considerando o teor da informação prévia referida e o índice de edificabilidade nela projetado para aquele terreno.

1.3.Em 01/09/2000, “O. C. N. e Outros” apresentaram pedido de licenciamento referente ao terreno objeto da referida informação prévia. Na sequência de parecer técnico do Réu que levantou a questão da ilegitimidade do autor O. C. N. como requerente do licenciamento, a autora “C. C. N. T., Lda”, requereu, em 08.09.2003, o averbamento do processo de licenciamento em seu nome, o que foi deferido em 13.10.2003, data em que a mesma autora foi notificada da impossibilidade do deferimento da sua pretensão nos moldes que constavam da informação prévia, vindo o pedido de licenciamento a ser indeferido em 31.03.2004.

1.4. Após, em 10.05.2004, os autores apresentaram um aditamento ao projeto inicial, tendo o Réu informado que só seriam viáveis construções com uma cércea correspondente a R/C+ 2, implicando um défice na área de construção para habitação de 4710,87 m2 face à constante da informação prévia, impossibilitando-os de construir dois T1, dez T2, catorze T3 e cinco T4, num total de trinta e um (31) apartamentos por referência à dita informação prévia.

1.5. Caso tivessem tido conhecimento de todo este circunstancionalismo, nunca teriam adquirido o referido terreno, o que fizeram por confiar na informação prévia que lhes foi prestada, a qual, desconheciam que não tinha natureza jurídica vinculativa pela razão de não ter sido requerida pela referida sociedade de construções mas pelo autor O. C., situação que sempre poderia ter sido ultrapassada pelo Réu, bastando que sufragasse o entendimento segundo o qual o Autor O. C. e os demais Autores interviessem no processo como gestores de negócios ou no âmbito de um mandato sem representação, tudo agravado pela circunstância do deferimento de um pedido de informação prévia ter eficácia real.

1.6.O Réu, para além de não ter resolvido a questão da legitimidade da forma referida, nada fez que permitisse aos Autores conceber que não iria ser proferida uma decisão constitutiva de direitos mas uma informação simples, situação que apenas começou a ser posta em crise pelo Réu em 2003, sendo toda essa confusão, desinformação, descaminho e errónea informação prestada pelo R. e os prejuízos daí emergentes, a causa de pedir da pretensão indemnizatória que formulam.

1.7.Concluem que foi violado o princípio da confiança, tendo-se o Réu constituído em responsabilidade civil por ato ilícito e culposo, havendo claramente uma “faute servisse”.

*2.Foi apresentada contestação, na qual o Réu se defendeu por exceção e por impugnação.

2.1.O Réu suscitou a exceção da ilegitimidade dos Autores, pedindo a absolvição do Réu da instância nos termos previstos no art.º 493.º do CPC, alegando, em síntese que a ação se estribou no pressuposto que os Autores identificam no artigo 99.º da PI, pelo que, se verifica, por um lado, a falta de legitimidade da Autora sociedade para invocar erro ou lapso de uma informação que lhe não era dirigida ( foi proferida num processo em que não era requerente, nem interessada, nem titular) e, por outro, a falta de legitimidade do Autor O. C. por ter deixado de ser requerente, titular ou até interessado no Processo n.º 744/00 ( processo de licenciamento), para além de, reconhecendo os Autores a inexistência de um pedido de informação prévia, não ser admissível a formulação de qualquer pedido contra o Réu pois o “lapso” que lhe assacam não foi praticado perante a Autora sociedade mas antes perante o Autor O. C., que por seu lado deixou de ser o titular do respetivo processo de licenciamento, não tendo legitimidade para deduzir qualquer pedido contra o Réu, que tenha essa posição como pressuposto.

2.2..Por impugnação, alegou, em suma, não assistir aos autores o direito que pretendem ver reconhecido, porquanto a informação que foi prestada ao autor O. C. foi-o “no âmbito do direito à informação” e não enquanto aprovação de um pedido de informação prévia, e que os Autores sabiam disso desde 17.03.00 e que, pese embora o indeferimento do pedido de licenciamento por despacho de 30.03.2004, não o impugnaram contenciosamente, conformando-se com o mesmo, pelo que todo o procedimento se encontra consolidado, não podendo agora vir deduzir um pedido de indemnização cível.

2.3. Formulou pedido de condenação dos Autores como litigantes de má fé.

2.4. Concluiu, pedindo a sua absolvição da instância com fundamento na ilegitimidade ativa dos Autores e, para o caso de assim se não entender, que a ação seja julgada não provada e improcedente.

*3.Efetuada a notificação da contestação, os Autores replicaram, sustentando que a legitimidade para a presente ação, se afere pelo critério do art.º 26.º do CPC e não pelo disposto nos artigos 10.º e 14.º do D.L. n.º 445/91, de 20 de novembro, pelo que à luz do critério plasmado no seu n.º3, os Autores são partes legítimas.

3.1.Acrescentaram, não se poder olvidar que existia um contrato-promessa de compra e venda do terreno para onde foi projetada a operação urbanística em que eram promitentes compradores os três sócios gerentes da sociedade “C. C. N. T., Lda”, que já existia enquanto sociedade de facto ou sociedade irregular, havendo já entre os mesmos um acordo quanto à criação e funcionamento do ente e tendo sido já então definido como seu objeto social, a construção e alienação de imóveis a edificar no referido terreno.

3.2.Que relativamente ao autor O. C., foi o mesmo quem sempre dirigiu as negociações com os então proprietários do terreno, quem direta e pessoalmente sinalizou o negócio e quem convenceu os outros sócios da sociedade, na altura sócios de facto, quanto à adequação das características do terreno para a concretização do projeto social, pelo que, impende sobre o mesmo a eventualidade de contra si ser intentada pela autora sociedade de construções uma ação indemnizatória, nunca podendo ser julgado parte ilegítima.

3.3.Invocaram, dever ser esclarecido que tudo o que antecedeu o momento da criação formal da sociedade Autora (contrato-promessa e pedido de informação prévia), foi feito com incontestável animus societatis, tendo após a sua constituição formal, passado aquela sociedade a atuar como dominus de todo o processo, tendo outorgado a escritura de compra e venda do terreno e surgido depois como requerente no processo de obras n.º 744/00 fov ( processo de licenciamento referente à construção a implantar no terreno que foi objeto da informação prévia).

3.4. A dita sociedade já existia quando foi apresentado o pedido de informação prévia embora em termos irregulares, pelo que a informação prévia deve considere-se como tendo sido prestada à autora sociedade, que foi quem sofreu de facto e efetivamente os prejuízos que nesta sede se invocam.

3.5. Criou-se uma situação de legítima confiança nos autores, decorrente da informação prévia prestada, independentemente da sua natureza, o que juntamente com os danos que essa situação de confiança causou aos autores constitui causa de pedir na presente ação.

3.6. Concluíram, pedindo a improcedência da exceção da ilegitimidade e do pedido de condenação como litigantes de má-fé.

*4.Realizada audiência preliminar, após suspensão da instância, notificou-se as partes da possibilidade de conhecer de mérito e para o Réu juntar aos autos o PA.

*5.Por decisão proferida a fls. 289 a 297 (processo físico), julgou-se o autor O. C. N. parte ilegítima na presente ação e a autora” S C. C. N. T., Lda”, como parte legítima.

*6.Mais se notificou as partes que, em função da ilegitimidade do autor O. C., e considerando a causa de pedir em que se funda a pretensão indemnizatória, se afigurar ao tribunal a quo que o pedido formulado se poderá mostrar ininteligível, podendo a petição ser julgada inepta com a consequente absolvição da instância do Réu município, podendo sempre a Autora intentar nova ação ( art.º 289.º, n.ºs 1 e 2) mas estando vedado ao juiz fazer uso do poder dever conferido pelos art.º 508.º, n.ºs 2 e 3 em conjugação com o art.º 265.º do CPC, por tal poder configurar violação do princípio do dispositivo na alegação dos factos pertinentes e relevantes para a decisão, para se pronunciarem, querendo, sobre a prefigurada ineptidão da petição inicial, oficiosamente suscitada.

*7.Inconformado com tal decisão que o julgou parte ilegítima e o absolveu da instância, o Autor O. da Costa interpôs...

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