Acórdão nº 0132/13.5BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução30 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

A A………………….., S.A. interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, em 14 de Janeiro de 2019, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra o acto de liquidação da contrapartida anual relativa ao ano de 2012, concernente à concessão da zona de jogo do Estoril, no montante de €11.468.826,35, que engloba, também, o imposto especial de jogo, apresentando, para tanto, alegações que conclui do seguinte modo: 1.º Na presente impugnação judicial, a ora recorrente contestou a liquidação efectuada pelo Turismo de Portugal, I.P., referente à chamada "contrapartida anual" exigida às empresas concessionárias da actividade do jogo; 2.º A referida contrapartida anual está prevista e regulada no Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de Outubro, e é constituída por 50% das receitas brutas dos jogos explorados nos Casinos; 3.º O referido Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de Outubro, estabelece, também, que a referida contrapartida anual não pode ser inferior a um determinado montante, mesmo que o valor dos 50% das receitas brutas dos jogos não atinja esse mínimo; 4.º Essa contrapartida anual tem a natureza de um imposto, desde logo porque, ao menos em parte, é paga através das liquidações de Imposto do Jogo e, fundamentalmente, porque se trata de uma prestação definitiva, pecuniária, unilateralmente determinada, coerciva e que não corresponde a uma contraprestação específica; 5.º Não obstante exista um contrato de concessão celebrado entre o Estado e a recorrente para a exploração de jogos de sorte e azar, essa contrapartida anual não tem matriz contratual; 6.º O contrato de concessão limita-se a reproduzir o conteúdo de actos legislativos anteriores - o Decreto-Regulamentar n.º 56/84, de 3 de Agosto, e o Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de Outubro; 7.º A exigência do pagamento da contrapartida anual e a sua fórmula de cálculo estão estabelecidos nos referidos instrumentos legais; 8.º Além de que, recorde-se, o pagamento, ao menos em parte, dessa contrapartida é feito com os pagamentos do Imposto de Jogo, imposto esse previsto em acto legislativo – Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro; 9.º A circunstância de haver um contrato de concessão e de a impugnante ter "aceite" o pagamento de tributos, não sana as inconstitucionalidades e/ou ilegalidades dos tributos (Imposto do Jogo e contrapartida anual) já que o Estado e os particulares apenas podem validamente obrigar-se dentro dos limites que a Constituição lhes permite; 10.º Aliás, o STA, a propósito da questão da competência da jurisdição fiscal, já se pronunciou no sentido de que a contrapartida é um tributo; 11.º Não há, assim, qualquer impossibilidade de se apreciar as ilegalidades que a impugnante considera existirem na impugnada liquidação da contrapartida; 12.º É que a referida liquidação é ilegal porque o diploma, com base no qual foi emitida tal liquidação (Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de Outubro) é organicamente inconstitucional por violação dos artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, i), da Constituição da República Portuguesa; 13.º É que o Decreto-Lei n.º 275/2001, foi aprovado sem ser com base em qualquer autorização legislativa concedida pela Assembleia da República ao Governo; 14.º Acresce que, conforme referido, uma parte da contrapartida anual é paga através de pagamentos do Imposto do Jogo; 15.º Ora, o Imposto do Jogo está previsto no Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, diploma esse aprovado com base na autorização legislativa concedida ao Governo pela Lei n.º 14/89, de 30 de Junho; 16.º Porém, essa autorização legislativa é amplamente genérica, não cumprindo o requisito constitucionalmente expresso de definir com rigor e precisão, "o objecto, o sentido, a extensão e a duração da mesma" (cf.

, à época, o artigo 168.º, n.º 11 e, hoje, o artigo 165.º, da Constituição).

17.º Na medida em que está em causa matéria fiscal, que é da competência da Assembleia da República, o referido Decreto-Lei n.º 422/89, é organicamente inconstitucional e, portanto, ao invés do decidido pela douta sentença recorrida, ilegais as liquidações de Imposto do Jogo e, deste modo, ilegal a contrapartida, na parte em que ela é constituída por tal imposto; 18.º Por outro lado, sendo, como é, a "contrapartida anual" um imposto, a sua exigência/liquidação é inconstitucional por violação dos princípios da capacidade contributiva e da tributação do rendimento real; 19.º Na verdade, a "contrapartida anual" incide sobre as receitas brutas obtidas pela recorrente e o valor de tal contrapartida nunca pode ser inferior a um mínimo estabelecido na lei; 20.º O que quer dizer, portanto, que a recorrente é tributada de forma completamente desligada do seu rendimento real/efectivo, podendo ocorrer, até, uma relação inversamente proporcional entre as receitas que obtém e o tributo que é forçado a suportar; 21.º No limite, com a consagração de uma "contrapartida mínima" poderia a recorrente não ter qualquer receitas e, não obstante, está obrigada a pagar a contrapartida; 22.º Aliás, o próprio imposto de jogo que, conforme referido, "integra" a contrapartida anual, é também inconstitucional por violação desses princípios da capacidade contributiva e da tributação pelo rendimento real; 23.º É que, como decorre do artigo 85.º da Lei do Jogo (Decreto-Lei n.º 422/89), a tributação sobre os chamados "jogos bancados" incide sobre a receita bruta, afastando-se, assim, do lucro real e efectivo; 24.º E, quanto à tributação sobre as máquinas automáticas, ela incide sobre um "capital" fixado administrativamente pelo Turismo de Portugal, IP, havendo, deste modo, uma tributação sobre meras presunções de rendimento; 25.º Por estas razões há, repete-se, uma violação do princípio da capacidade contributiva, que decorre dos artigos 103.º, n.º 1 e 104.º, n.º 1 da Constituição da República, além de decorrer, também, do princípio da igualdade (art.º 13.º, da Constituição), bem como há violação do princípio da tributação pelo lucro real consagrado no artigo 104.º, n.º 2 da Constituição.

26.º Há, também, uma violação do princípio da legalidade, na sua vertente de reserva de lei e, deste modo, uma violação dos artigos 103.º, n.º 2, 165.º, n.º 1, da Constituição, na medida em que a matéria colectável da tributação sobre os jogos das máquinas é fixado pela autoridade administrativa.

27.º Deste modo, a impugnada liquidação da contrapartida anual é ilegal, não podendo, deste modo, manter-se a douta sentença...

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