Acórdão nº 01528/08.0BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução30 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 1528/08.0BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul da sentença por que o Tribunal Tributário de Lisboa, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pelo acima identificado Recorrido, na qualidade de responsável subsidiário, anulou a liquidação oficiosa de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 2000 com fundamento em caducidade do direito à liquidação.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «I- Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a impugnação judicial, intentada por A………., já devidamente identificado nos autos e que, em consequência, ordenou a anulação da liquidação oficiosa de IRC do exercício de 2000 cuja destinatária era sociedade relativamente à qual o Recorrido foi constituído em responsável subsidiário por via de reversão efectivada em sede de processo de execução fiscal. Entende a Fazenda Pública que a douta sentença, na subsunção dos factos dados como provados ao direito, promoveu uma errónea aplicação do direito a estes mesmos factos.

II- A Fazenda Pública não se conforma com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa porquanto a mesma não encerra um correcto entendimento do instituto da caducidade do direito de liquidação dos tributos, indo contra diversa jurisprudência dos tribunais superiores que versaram a questão decidenda.

III- Na diferenciação entre os institutos da caducidade e da prescrição, a doutrina indica que aquela tem por objecto direitos potestativos, poderes ou faculdades de constituir ou anular uma situação jurídica subjectiva, ao passo que a prescrição visa já direitos adquiridos. A caducidade espelha o seu sentido no facto objectivo da falta de exercício do direito no prazo pré-estabelecido. Quando o legislador determina a caducidade, tem por motivação razões objectivas de segurança jurídica, sem atender à negligência ou inércia do titular do direito, considerando somente a necessidade de definir com brevidade a situação jurídica. A Administração Tributária, quando liquida um tributo dentro do prazo de caducidade, fá-lo no exercício de um poder-dever que lhe vem atribuído pela lei tributária, definindo assim os contornos do direito que vai exigir ao contribuinte e, consequentemente, definindo a situação jurídica deste. O direito ao imposto passa a existir, dependendo, todavia, a sua exigibilidade da notificação do mesmo ao contribuinte nos termos do disposto nos arts. 38.º e 39.º do CPPT.

IV- Com efeito, comungando o acto tributário dos caracteres do acto administrativo, resulta desta afinidade que a sua validade e eficácia são conceitos que não se confundem. A validade de um acto não importa a sua eficácia, nem a sua eficácia importa a sua validade. No procedimento tributário, a eficácia do acto tributário depende da notificação, como se extrai do n.º 6 do art. 77.º da Lei Geral Tributária (LGT). E esta diferenciação entre validade e eficácia do acto tributário de liquidação assume especial relevância na compreensão dos meios processuais ao alcance do contribuinte para defender os seus direitos perante a Administração Tributária.

V- Com efeito, consagra o artigo 97.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária (LGT), como corolário do princípio da plenitude dos meios processuais, que “a todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo”. A legalidade do acto tributário de liquidação só se afigura sindicável em sede de oposição à execução fiscal, quando “ a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação”, como dispõe a al. h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT. De outro modo, a sindicância da validade do acto está sujeito ao meio processual de impugnação previsto no artigo 99.º e seguintes do CPPT, na medida em que daqui resulta que “Constitui fundamento de impugnação qualquer ilegalidade”.

VI- A sentença ora em causa vem conhecer, em sede de impugnação judicial, de um vício que está previsto somente como fundamento de oposição à execução fiscal. A falta de notificação do tributo no prazo de caducidade contendendo com a eficácia do acto tributário e a sua exigibilidade em sede de execução fiscal é matéria vedada ao conhecimento do Tribunal em sede de impugnação judicial, tal como resulta da al. e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, a contrario.

VII- O julgador, em sede de impugnação judicial, ao aferir da caducidade do direito à liquidação, deve ter presente que a notificação visa apenas garantir que o acto foi praticado dentro do prazo para o exercício desse direito, pois a validade deste está dependente do prazo legalmente fixado. Constatando que o acto foi praticado fora deste prazo, o acto mostrar-se-á ilegal e sujeito a controlo judicial nesta sede. No que se refere à notificação deste acto, acto este emitido dentro do prazo de caducidade, ocorrendo a mesma já fora deste prazo ou sendo esta omitida de todo, estará em causa a exigibilidade do tributo com implicações já em sede de execução fiscal, constituindo fundamento de oposição a esta.

VIII- Mal esteve o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, na medida em que considerou que a falta de notificação da liquidação do tributo dentro do prazo de caducidade importa a apreciação da legalidade do acto tributário podendo ser assim conhecido em sede de impugnação judicial. A sentença em questão ostenta assim uma interpretação errada dos preceitos legais pertinentes, designadamente dos artigos 99.º e 204.º do CPPT, incorrendo em erro de julgamento, motivo pelo qual deve ser revogada, e daqui resultar a improcedência da impugnação apresentada com a consequente manutenção da liquidação de IRC sub judice na ordem jurídica».

1.3 O Impugnante apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor: «A) O presente recurso tem como fundamento exclusivamente matéria de direito, conforme resulta das alegações da Autoridade Tributária, pelo que o recurso deveria ter sido interposto para a Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do n.º 1 do artigo 280.º do CPPT e da alínea b) do artigo 26.º do ETAF; B) Nestes termos, vem desde já arguir-se a incompetência do Tribunal ad quem, devendo a Autoridade Tributária requerer a remessa do processo ao tribunal competente, no prazo previsto no n.º 2 do artigo 18.º do CPPT, sob pena de o processo ser considerado findo; C) O presente recurso tem como objecto a decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial intentada pelo ora...

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