Acórdão nº 0714/18.9BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução31 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1.

    A………… - procurador-adjunto, a exercer funções no Juízo Local de ……… - impugna o acórdão proferido em 10.04.2018 pelo Plenário do CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO que lhe aplicou a pena disciplinar de suspensão por 50 dias [Processo Disciplinar nº ………].

    Pede a declaração da sua nulidade, apontando-lhe, para tanto, ilegalidades por dupla valoração dos factos puníveis e contradição insanável da fundamentação, e por omissão de diligência essencial para descobrir a verdade e falta de fundamentação.

    1. O CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO [CSMP] impugna a pretensão do autor, sustentando que o acórdão visado não enferma das «ilegalidades que lhe são apontadas».

    2. Por despacho do «Relator» foi dispensada a realização da audiência prévia e convidadas as partes a apresentar alegações, o que fizeram.

    3. O autor conclui as suas alegações finais retirando as seguintes conclusões: A) A descrição exaustiva da actuação do autor durante o período de 01.10.2015 a 31.03.2016 - objecto de punição disciplinar no PD ………-RMP-PD - não assumiu apenas o propósito de contextualizar a sua actuação funcional, pois, a mesma assumiu relevância disciplinar tendo-se verificado uma dupla valoração dos factos; B) É também evidente, no que concerne ao acto impugnado, vício de contradição insanável de fundamentação, ou no mínimo, de fundamentação deficiente e errada; C) As circunstâncias da vida pessoal do ora autor não foram efectivamente ponderadas no acto impugnado, pois, caso o tivessem sido, concluir-se-ia que ele estava à data dos factos privado - acidentalmente - das suas faculdades mentais, verificando-se uma circunstância dirimente da sua responsabilidade; D) A acusação, por não concretizar os parâmetros da distribuição de inquéritos, sendo apenas perspectivada em termos numéricos, e abstractos, e omissa quanto aos aspectos qualitativos, designadamente quanto à natureza dos crimes, ao número das pessoas envolvidas e densidade factual, não se mostra devidamente fundamentada; E) A não realização da perícia a todos os processos em termos «estatísticos», «quantitativos» e «qualitativos», desde Maio de 2016 a Dezembro de 2016, traduz-se numa omissão de diligência «essencial para a descoberta da verdade material», consubstanciando o seu indeferimento uma «nulidade insuprível» nos termos do disposto no artigo 204º do Estatuto do Ministério Público; F) Ademais, a omissão dessa diligência, acarretou, por um lado, uma falta de esclarecimento dos factos, e, por outro lado, uma situação de dúvida insanável quanto à verificação dos factos que se imputam ao autor; G) A acusação sofre também de «falta de fundamentação» por ser omissa no que concerne ao trabalho desenvolvido pelo autor em processos de inquérito criminal, na intervenção processual em processos administrativos e nos actos processuais [julgamentos] e no trabalho prévio a estes, designadamente, quanto ao tempo despendido no seu estudo e preparação; H) Além disso, a acusação assenta em meras presunções e segmentos subjectivos; I) O enquadramento funcional de um procurador de comarca média é totalmente diferente de um procurador do DIAP de Lisboa, do Porto, de Setúbal e de outras grandes comarcas; J) Pois, numa comarca como «………», os procuradores dos inquéritos, das instruções, e dos processos administrativos, acumulam essa função com a de procurador de julgamento, e não se mostra ponderada em nenhum lugar, quer quanto à caracterização da própria infracção, quer quanto à atenuação da mesma, esse facto essencial; K) O ora alegante fez muitos mais julgamentos do que os seus colegas, e foi, inclusive, elogiado pela qualidade dos mesmos, pelo próprio inspector; L) Mesmo a aplicar-se pena de suspensão ela não deveria nunca ter sido superior a 20 dias; M) Os mencionados vícios, nulidades e demais moléstias constantes da acusação, acabaram por contaminar o acórdão da Secção Disciplinar, de 07.11.2017, bem como o acórdão impugnado, na medida em que tais decisões se ancoraram na dita acusação.

      Termina pedindo que se declare a «nulidade/ilegalidade» do acórdão impugnado, com as devidas e legais consequências.

    4. O CSMP culmina as suas alegações finais com as seguintes conclusões: A) Como consta do «relatório final» do processo disciplinar a actuação do Magistrado ora autor apreciada nos autos em apreço, considerada violadora dos deveres de zelo e de prossecução do interesse público, reporta-se ao período de 01.04.2016 a 06.01.2017, tendo já sido anteriormente objecto de punição disciplinar conduta ilícita do mesmo Magistrado, agora relativa ao período de 01.10.2015 a 31.03.2015, no processo nº ……… RMP-PD; B) Tendo o Instrutor considerado estar precludida a possibilidade de ser apreciada e punida a sua conduta anterior, que serviu apenas para contextualizar a acusação, nos termos do disposto no artigo 110º, nº2, do EMP, não ocorrendo nulidade por violação do princípio «ne bis in idem»; C) Os factos ora objecto de avaliação e punição resultaram de novas participações disciplinares, «inexistindo dupla valoração de factos puníveis», não se verificando ampliação ilegal, por inexistência de delimitação definitiva dos factos inicialmente objecto do processo, uma vez apurada a existência da violação de diversos deveres funcionais, determinantes da conversão em processo disciplinar; D) As circunstâncias e os factos praticados pelo Magistrado, ora autor, e que conduziram à sua punição com cinquenta dias de pena única, estão suficiente e exaustivamente documentados e fundamentados nos autos e dispõem de relevância disciplinar, não se mostrando necessária a perícia indeferida, como demonstrado; E) Sendo a prova produzida «suficientemente elucidativa» quanto à gravidade e censurabilidade das condutas em apreço, e face ao exposto, não enferma o despacho que indeferiu a perícia do vício de falta de fundamentação, nem se verifica a nulidade da acusação - artigos 152º e 153º, nº1, do CPA; F) Como já exposto, o autor violou o dever geral de zelo funcional a que estava obrigado - nos termos dos artigos 163º, 108º e 216º do EMP, e 73º, nº2, alínea e), e nº7, da LGTFP - e também o dever geral de prossecução do interesse público - nos termos dos artigos 163º, 108º e 216º do EMP, e 73º, nº2, alínea a), e nº3, da LGTFP [esta Lei aplicável subsidiariamente aos Magistrados do Ministério Público] - tendo sido calculada uma pena unitária, nos termos do artigo 188º do EMP; G) As circunstâncias da sua vida familiar, pessoal, e situação de doença, foram invocadas pelo autor, e sendo por isso referidas no acto impugnado, apenas atenuam a sua conduta, no que se refere à diminuição da sua capacidade de trabalho, mas não podem excluir a culpa, nem se verifica contradição insanável na fundamentação; H) Deste modo, não ocorrendo os vícios alegados pelo autor, nem ofensa do princípio invocado, deverá a acção ser julgada totalmente improcedente e não provada, e, em consequência, ser o CSMP absolvido do pedido pelo mesmo formulado.

    5. Colhidos que foram os «vistos» legais, importa apreciar e decidir a acção.

  2. De Facto Resulta provado nos autos o seguinte quadro factual: 1- A………… - autor - é magistrado do Ministério Público, com a categoria de «procurador-adjunto», a exercer funções junto do «Tribunal da Comarca de ………» - ver «Nota Biográfica», a folha 65 do processo administrativo apenso [PA nº ……… - sendo seu anterior número o de ………-RMP-PD], volume I, cujo teor aqui se dá por reproduzido; 2- Em 20.12.2016, por acórdão do «Plenário do CSMP», confirmativo de anterior deliberação da Secção Disciplinar [27.09.2016], foi aplicada ao autor a «pena disciplinar de 25 dias de suspensão de exercício de funções», abrangendo o seu desempenho profissional no período compreendido entre 01.09.2015 a 31.03.2016 na «Comarca de ………» [inquérito ………, convertido no PD nº ………-RMP-PD, deste fazendo parte instrutória] - ver «Nota Biográfica», folha 65 do PA apenso, volume I; «Relatório» de Inspecção, de 12.04.2016, folhas 191 a 215; «Acusação» no PD nº ………-RMP-PD, folhas 216 a 244; «Relatório» do PD nº ………-RMP-PD, de 11.07.2016, folhas 245 a 268; acórdão da Secção Disciplinar do CSMP no PD nº ………-RMP-PD, de 27.09.2016, folhas 269 a 284; e acórdão do Plenário do CSMP, de 20.12.2016, folhas 285 a 317, no PD nº ………-RMP-PD - documentos cujo teor aqui se dá por reproduzido; e acórdão da Secção Disciplinar do CSMP, de 07.11.2017, página 5, ponto 10, e página 33, ponto 108, junto com a petição inicial como documento nº4, cujo teor aqui se dá por reproduzido; 3-...

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