Acórdão nº 19/17.2GABCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelC
Data da Resolução14 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Desembargadora Relatora: Cândida Martinho Desembargador Adjunto: António Teixeira I. Relatório 1.

No processo comum singular 19/17.2GABCL que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga - Juízo de Competência Genérica de Esposende -Juiz 1, realizado julgamento foi proferida sentença que, para além do mais, condenou o arguido J. P. pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelo art. 4º., nº 1 e 3 do Código da Estrada, na coima de € 600,00 (seiscentos euros).

  1. Não se conformando com essa condenação, vieram os arguidos recorrer da sentença, extraindo da motivação as conclusões que a seguir se transcrevem: «III – CONCLUSÕES SOBRE A MATÉRIA DE FACTO: A) Não se concebe como o Mmo. Juiz tenha considerado provado que o arguido tenha desobedecido à ordem de paragem feita pelos dois militares da GNR, uma vez que dos depoimentos prestados pelos três militares da GNR que se encontravam no local e depuseram sobre o momento em que o arguido passou pelos mesmos, não resulta qualquer declaração que demonstre ao tribunal que o arguido tivesse visionado a ordem de paragem; B) Refira-se que o militar S. G. refere de forma espontânea que quando se preparava para proceder à ordem de paragem, vê o arguido a cerca de 100 metros do local onde se encontrava, em grande velocidade e até chegar ao local onde se encontrava, o arguido ainda ultrapassou dois veículos; C) Ora, resulta da experiência comum que seria difícil ao arguido no espaço de cerca de 100 metros, seguindo a uma velocidade excessiva para o local, ultrapassar duas viaturas e ainda fazer retomar o veículo à sua hemi-faixa direita de modo a visionar os militares da GNR e a carrinha caraterizada que se encontrava estacionada na berma da estrada, do lado em que o arguido seguia. Aliás, as testemunhas S. G. e V. R. referem até que o arguido vem pelo meio da faixa sempre em ultrapassagens sucessivas e em excesso de velocidade; D) Aliás, do depoimento dos militares retira-se de forma clara que não existiu qualquer alteração da velocidade a que o arguido seguia quando passou pela patrulha da GNR que ali se encontrava na beira da estrada; E) Ficou, aliás, demonstrado que o arguido não aumentou a velocidade (como erradamente constava da acusação pública) nem diminuiu a velocidade antes, manteve a velocidade a que seguia; F) Ora, de acordo com as regras da experiência comum, caso o arguido tivesse visionado os militares ou a ordem de paragem e pretendesse desobedecer à mesma, era normal que tivesse acelerado a sua marcha, o que não ocorreu, circunstância (que resulta provada pelo depoimento dos militares) que permite a conclusão que o arguido não terá visto a ordem de paragem; G) Conclusão que não choca já que o arguido vem em fuga de um veículo de cor branca com dois indivíduos lá dentro, cuja identificação ou razão de perseguição desconhecia; H) Retira-se ainda de depoimento do militar da GNR que o arguido vinha a meio da faixa de rodagem em constante ultrapassagem, não sendo difícil admitir que o arguido, encontrando-se em fuga de uma viatura que desconhecia, nunca admitisse por hipótese que surgisse uma paragem stop por autoridade policial, tanto mais que o local onde os militares se encontravam é uma recta e, portanto, o sítio ideal para o arguido se tentar distanciar do veículo que o perseguia e fazer várias ultrapassagens, como de facto resulta dos depoimentos das testemunhas e do próprio arguido que confessa que seguia a alta velocidade e a fazer ultrapassagens e a olhar constantemente para o espelho retrovisor para vigiar o carro que o perseguia; I) Acresce que, os depoimentos acerca do local exato do posicionamento dos dois militares da GNR aquando da ordem de paragem não foi, cremos, consistentes e coerentes entre si, o que se exigia, perante um facto que supostamente foi vivenciado e presenciado pelos militares; J) Aliás, sem olvidar da prevalência da produção da prova que é feita na audiência de julgamento, o arguido não pode deixar de referir as contradições manifestas que resultam dos depoimentos dos militares na fase de inquérito, assim como do auto de notícia cujo escrito é um claro exemplo da falta de rigor e competência pela qual se deve pautar uma autoridade policial, com a agravante, de estarmos perante um documento oficial que gerou a instauração de um processo-crime a um cidadão, sendo, por isso, inexplicável como a sentença considerou o teor do auto de notícia quando este é um claro exemplo de má prática policial, pelo seu conteúdo mal intencionado e falso; K) Regista-se, por fim, aquele que achamos o depoimento mais isento, prestado pelo militar J. A. (que o Mmo. Juiz o considerou credível e, como tal, considerado) na medida em que o mesmo era o condutor da carrinha onde seguiam todos os militares, e que estacionou a carrinha de frente para o sentido de marcha em que o arguido surgia e que assinalou, de forma espontânea que às tantas o arguido não os viu, tal era a velocidade a que seguia, tanto mais que as fardas que usam (cor azul escura), não são facilmente destacadas ou visíveis ao longe pois, a sua cor não sobressai (como ocorreria se os militares ostentassem por exemplo, coletes refletores ou sinaléticas refletoras); L) Assinala-se que este militar em concreto, que se encontrava no lugar do condutor de uma carrinha “furgão” em uso por aquela força e, portanto, com o campo de visão sem quaisquer obstáculo e a cerca de dois metros acima do solo, é o único espectador privilegiado, em condições únicas e privilegiadas para observar tudo o que se passou; M) Deste modo, ouvir da boca do mesmo, de forma espontânea, admitir que o arguido pudesse não ter visto a ordem de paragem, traz ao processo e ao julgador uma convicção forte e inabalável de tal evidência, o que presta um contributo decisivo para a alteração da condenação aplicada ao arguido; N) Deveria ter prevalecido na apreciação de toda a prova o princípio do in dúbio pro reo já que o relato do arguido sai corroborado pelo militar que em melhores condições se encontrava para visionar o ocorrido, os dois militares da GNR que deram a ordem de paragem, pese embora, admitam impossível ou difícil o arguido não os ter visto, não trazem ao processo qualquer circunstância ou facto que “tirasse todas as dúvidas”, cingindo-se a demonstrar a sua opinião pessoal sobre o sucedido, não tendo demonstrado disponibilidade ao longo em todo o depoimento de se colocar no lugar do arguido, preferindo optar pela comodidade de referir que o arguido só os podia ter visto, não obstante não relatarem qualquer facto, sinal, expressão ou reação externa que aquele ou a viatura em que seguia, tivessem manifestado; O) Não resultou demonstrado que no primeiro momento (quando o arguido foi abordado pelos militares “à paisana” e num veículo descaraterizado) que os militares tivessem dirigido qualquer ordem ou instrução ao arguido (veja-se os dois primeiros parágrafos dos factos não provados) pelo que, a comunicação que foi dada pelos militares que seguiam o veículo do arguido aos militares que fizeram a ordem de paragem é suportada num facto falso e inexistente pois, o arguido não se encontrava em fuga ou desobediência a qualquer ordem policial, que nunca lhe foi dada (resulta apenas dos factos provados que o militar à paisana, num carro branco descaraterizado, de dentro do seu carro, identificou-se como GNR perante o arguido que por sua vez também se encontrava dentro do seu carro! Situação risível e insólita que não é objecto do presente recurso por a mesma não colidir, cremos, com o sentido da decisão da contra-ordenação aqui posta em causa); P) Aliás, neste particular, lamenta-se que o Mmo. Juiz se tenha convencido no depoimento dos militares R. P. e C. R. na parte em que o primeiro se identificou como sendo militar da GNR ao arguido pois, aqueles nunca se identificaram como tal, antes, tendo o R. P. dirigido as palavras em tom agressivo “sai do carro caralho” enquanto tentava colocar a mão no volante para o impedir de seguir a marcha. Todavia, porque entende que tal momento não colide diretamente com os factos aqui postos em causa (que ocorreram noutro local e com outros intervenientes) não debruçará o presente recurso a esta matéria, sendo certo que se assume importante, pese embora não seja essencial, assinalar que no momento em que o arguido passou pela patrulha que lhe deu ordem de paragem continuava a julgar (erradamente) que era perseguido por dois indivíduos cuja identidade desconhecia (o arguido declara que só fica a saber que havia sido perseguido por militares da GNR à paisana através de familiares, quando já se encontrava em casa do tio); Q) Ora, salvo melhor opinião, entende que antes de se considerar se o arguido viu a ordem de paragem e, nessa medida, desobedeceu ou não à mesma, deverão ser avaliadas as concretas circunstâncias fácticas que motivaram a referida ordem pois, entende o arguido que inexistem quaisquer circunstâncias que pudessem motivar ou justificar como legal a referida ordem de paragem que foi dada ao arguido, que se suportou numa informação falsa (de que o arguido desobedeceu aos militares); R) Pois, resulta demonstrado dos autos que os militares que deram a ordem de paragem não estavam em fiscalização de rotina (que nunca fazem pois são uma força de intervenção) mas antes que, por ordem errada dos colegas que perseguiam o veículo do arguido, que afirmaram que o mesmo lhes fugia (como poderia fugir se os militares não lhe deram qualquer ordem ou instrução?) decidiram parar a sua viatura com o fim específico de dar ordem de paragem. E aqui pergunta o arguido: qual o fundamento ou legitimidade desta ordem de paragem? Mesmo que tivesse visto os militares (o que não se verificou), incorreria o arguido numa contra-ordenação mesmo que se considere que tal ordem se baseou em pressupostos errados e inexistentes? Somos do parecer de que como aquela ordem não é legítima, a não paragem do arguido não infringe qualquer disposição legal, e em particular a correspondente à disposição...

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