Acórdão nº 24/17.9JAPTM.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Outubro de 2019
Magistrado Responsável | LOPES DA MOTA |
Data da Resolução | 09 de Outubro de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.
Por acórdão de 26 de Junho de 2018 proferido pelo tribunal colectivo do Juízo Central Criminal de … (Juiz …), da comarca de Faro, foi o arguido AA, com a identificação dos autos, condenado nas penas de 20 anos de prisão, pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, de 4 anos de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 203.º e 204.º, n.º1, al. a), do Código Penal, de 2 anos de prisão, pela prática de um crime de falsificação de documento p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, alíneas c) e e), do Código Penal e, em cúmulo jurídico destas penas, na pena única conjunta de 24 anos de prisão.
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Discordando da decisão, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Évora, o qual, por acórdão de 4 de Dezembro de 2018, determinou a correcção de lapsos de escrita, nomeadamente a referência, no dispositivo, à norma incriminadora do crime de homicídio qualificado, de modo a que, em vez da alínea f), passasse a constar a alínea e) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal, e reduziu a pena única para 22 anos de prisão, mantendo, no mais, o acórdão recorrido.
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Não concordando com o decidido no acórdão da Relação, dele vem agora o arguido interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando motivação de que extrai as seguintes conclusões (transcrição): “1 - Aberto inquérito foram realizadas todas as diligências entendidas como necessárias. Após o Ministério Público deduziu acusação contra o aqui Recorrente.
2 - Foi-lhe imputada a prática de: A) - um crime de homicídio qualificado, previsto e punido nos termos do disposto nos artigos 131.º e 132.º, n.ºs. 1 e 2, alínea e), do Código Penal; B) - um crime de falsificação de documento, previsto e punido nos termos do disposto no artigo 256.º, alíneas c) e e), do Código Penal; C) - um crime de furto qualificado, previsto e punido nos termos do disposto nos artigos 203.º e 204.º, n°. 1, alínea a) do Código Penal.
3 - A Demandante - BB - deduziu pedido de indemnização cível. Foram pedidos 475.779,55 € (quatrocentos e setenta e cinco Euros e setecentos e setenta e nove Euros e cinquenta e cinco cêntimos), a título de danos patrimoniais e morais.
4 - Foi recebida a acusação e o pedido de indemnização.
5 - O ora Recorrente apresentou contestação e arrolou testemunhas.
6 - Realizada audiência de discussão e julgamento foram analisadas as provas documentais e periciais juntas aos autos. Foram, ainda, ouvidas as testemunhas arroladas quer pela acusação, quer pela defesa.
7 - Foi proferido acórdão.
8 - Foi o arguido condenado por: A) - um crime de homicídio qualificado, previsto e punido nos termos do disposto nos artigos 131.º e 132°, n.ºs. 1 e 2, alínea e), do Código Penal; B) - um crime de falsificação de documento, previsto e punido nos termos do disposto no artigo 256.º, alíneas c) e e), do Código Penal; C) - um crime de furto qualificado, previsto e punido nos termos do disposto nos artigos 203.º e 204.º, n.º. 1, alínea a) do Código Penal.
9 - Nas penas parcelares de: A) - um crime de homicídio qualificado - 20 (vinte) anos de prisão B) - um crime de falsificação de documento - 2 (dois) anos de prisão C) - um crime de furto qualificado - 4 (quatro) anos de prisão.
10 - Em cúmulo Jurídico na pena de 24 (vinte e quatro) anos de prisão.
11 - Inconformado o arguido, ora Recorrente interpôs recurso da decisão proferida em primeira instância.
12 - Foi chamado a intervir o Venerando Tribunal da Relação de Évora. Pedia o Recorrente a revogação do Acórdão proferido.
13 - Analisado o recurso os Exmos. Senhores Colendos Juízes Desembargadores junto do Venerando Tribunal da Relação de Évora decidiram conceder parcial provimento.
14 - Relativamente à pena única, resultante do cúmulo das penas parcelares viu o Recorrente a pena baixar para os 22 (vinte e dois anos) de prisão - fls. 55 do Acórdão proferido.
15 - Foram corrigidos lapsos que se entenderam ser de escrita nos termos do constante de fls. 55 da citada decisão.
16 - Ora, notificado, o aqui Recorrente mantém a discordância. Atenta a discordância interpõe o presente recurso.
17 - Entende o Recorrente que a decisão proferida ainda não alcança o Direito e não permite a realização de justiça.
18 - A não conformação resulta essencialmente de estarmos perante uma decisão que não aprecia na globalidade os factos, não conhece o arguido, nem integra na verdade apurada.
19 - A não conformação consubstancia-se nos elementos constantes da factualidade apurada que, afinal, apesar de relevantes não constam nem da factualidade dada como provada nem da factualidade dada como provada.
20 - Vide factos primeiro, terceiro, quarto, décimo terceiro e décimo quarto.
21 - Assim, não conseguimos perceber / conhecer da proximidade existente entre AA e CC, nem logramos apurar a razão / intenção subjacente ao encontro mantido no dia 28 de Fevereiro de 2017.
Também não conseguimos relacionar a navalha que acompanhava AA com a intenção de desferir golpe (s) a CC.
Do processo não resulta a razão que determinou o alegado "desentendimento", sendo este eventualmente o impulso determinante e por isso um elemento essencial para a determinação da culpa do agente e em consequência da pena a aplicar.
Desconhecendo-se a causa / razão / motivo / impulso que determinou o acto, impossível é concluir pela vontade de AA.
A justificação proposta no ponto décimo quarto da factualidade dada como provada não é compatível com a lógica, a experiência comum e a razoabilidade, nem decorre do processo - prova documental ou testemunhal.
22 - Então, pacífico será defender que da factualidade indicada não decorre o como e o porquê.
23 - Estes elementos são essenciais, entre o mais, na avaliação da culpa do agente.
24 - Sabendo-se que a pena não pode ultrapassar a medida da culpa são esses elementos essenciais para aferir da medida da pena a aplicar.
25 - Conforme já se salientou em sede de contestação apresentada, em sede de alegações proferidas no âmbito da audiência de discussão e julgamento e, bem assim, em sede de recurso interposto, faltam elementos relevantes para conseguirmos determinar com a certeza e a segurança que a Lei impõe e o Direito exige a qualificação jurídica e, consequentemente a moldura penal aplicável.
26 - Mais, o aqui Recorrente foi condenado nos termos da alínea f) do artigo 132° do Código Penal.
27 - Ora, do processo não resulta: A) - ódio racial, B) - ódio religioso, C) - ódio político, D) - ódio gerado pela cor, E) - ódio gerado pela origem étnica ou nacional, F) - ódio gerado pelo sexo, G ) - ódio gerado pela orientação sexual, H) - ódio gerado pela identidade de género da vítima.
28 - Assim, necessário será concluir que não se mostra preenchida a alínea f), do n.º. 2, do artigo 132.º.
29 - Ora, ao cair a alínea f) estaríamos, na linha do acórdão proferido, perante o disposto no artigo 131° do Código.
30 - Tal disposição, obviamente, 31 - Atendendo-se à integração social, pessoal e profissional do arguido, à confissão e ao arrependimento demonstrado, necessário seria configurar como adequada e suficiente uma pena muito próxima dos limites mínimos - 8 (oito) anos de prisão.
32 - Note-se que o homicídio é horrendo e violador do mais elementar direito cuja dignidade lhe reserva um lugar na Constituição da República, porém, não é todo o homicídio que preenche os conceitos constantes do n.º 2, do artigo 132.º do Código Penal. Falamos de "especial censurabilidade ou perversidade".
33 - Mas mais, tendo em atenção as peculiares circunstâncias do caso, a factualidade dada como provada, a factualidade dada como não provada, a forma como foram desferidos os golpes, a utilização de uma ferramenta de trabalho, a desorientação, a descoordenação, a confusão e, bem assim, a perturbação decorrentes de todo o cenário descrito, o Recorrente socorre-se do disposto no artigo 133.º do Código Penal.
34 - Atendendo-se à integração social, pessoal e profissional do arguido, à confissão e ao arrependimento demonstrado, necessário seria ponderar numa pena muito próxima dos limites mínimos -1 (um) ano de prisão.
35 - Note-se que o aqui Recorrente tem residência fixa, sempre trabalhou e mantém possibilidade de ser reintegrado, tem família que o aguarda, é base relevante para o sustento da casa, é estimado e querido entre vizinhos, amigos e, bem assim, por todos quantos com ele privam.
36 - Caso assim se não entenda necessário será ordenar a baixa dos autos para apuramento dos factos indicados, e a prolação de novo acórdão.
37 - Relativamente aos crimes de furto qualificado e falsificação de documento, atendendo-se à integração social, pessoal e profissional do arguido, à confissão e ao arrependimento demonstrado, necessário seria ponderar, em obediência à Lei, na aplicação de pena de multa.
38 - Mais, a perícia requerida era absolutamente indispensável.
39 - Falamos de 26 (vinte e seis) golpes desferidos alegadamente para apropriação de um veículo automóvel.
40 - Falamos da dúvida quanto às faculdades do arguido, aqui Recorrente.
41 - Reitera-se o que sobre esta matéria refere o Mui Dino Procurador junto do Tribunal de … em sede de alegações proferidas na audiência de discussão e julgamento.
"Não sei se tem a ver com distúrbios, momentâneos ou permanentes que o arguido possa ter..."- CD um - 01.16 42 - Entende o aqui Recorrido que o artigo 40.º do Código Penal estabelece que "a aplicação das penas e das medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade" 43 - O artigo 70.º do mesmo diploma estabelece que "se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição." 44 - O n.º 1, do artigo 71.º do Código Penal define qual o modo de determinar a medida da pena, sendo que...
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