Acórdão nº 1012/15.5T8VRL-AM.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelRAIMUNDO QUEIRÓS
Data da Resolução01 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I- Relatório: AA veio impugnar a lista de credores reconhecidos alegando, em suma, ter celebrado com a insolvente um contrato promessa de compra e venda relativo a fracção autónoma tipo T3, no 2º andar topo norte interior, com lugar de garagem na cave, situada no prédio urbano em regime de propriedade horizontal, no Lote número 1, inscrito na matriz predial urbana da freguesia da ... sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número ..., tendo pago a totalidade do preço ajustado, ou seja a quantia de €122.954,00.

Mais alegou que, logo após a construção do imóvel, as chaves da fracção foram-lhe entregues, tendo desde então integrado a posse da fracção, no decurso da qual a arrendou há cerca de 5 anos. Termina pedindo o reconhecimento de um crédito no valor de €245.908.00, correspondente ao sinal em dobro garantido por direito de retenção.

O Tribunal proferiu saneador-sentença reconhecendo o referido crédito como comum.

Inconformado o Autor interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães.

Este Tribunal por acórdão proferido, em 16 de Novembro de 2017, julgou totalmente improcedente a apelação, mantendo integralmente a sentença com a seguinte fundamentação: “Como bem entendeu a sentença recorrida, não foram alegados factos de molde a poder habilitar o tribunal a decidir se o impugnante tem ou não esse estatuto de consumidor. A cedência de arrendamento da fracção tanto pode constituir uma actuação isolada do impugnante como também é perfeitamente compatível com o exercício duma actividade profissional lucrativa”.

Do acórdão da Relação veio o impugnante AA interpor recurso de revista excepcional, concluindo o seguinte: “1a O presente Recurso de Revista Excecional em tempo interposto, uma vez que entende o Recorrente relativamente esta questão, per si, reúne também os pressupostos previsto no Art. 672º,n.°2 do CPC.

2a Com efeito, refere tal acórdão ora posto em crise, que não mereceu acolhimento o recurso de Apelação apresentado por duas ordens de motivos, ou melhor, por um entendimento do qual se subtraiu o subsequente: a falta de natureza de "consumidor final" do ora Recorrente e, consequentemente não lhe ver se aplicado o respetivo direito de retenção.

3a Assim, e preenchendo o requisito de tal alínea a) do Art. 672° sempre se dirá ser fundamental, do ponto de vista factual definir o que se entende por consumidor final, em concreto nos presentes autos e atendendo ao dispositivo do recente Acórdão desse douto Supremo Tribunal de 03/10/2017 (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Processo: 212/1 L1T2AVR-B.P1.S1, 6ª SECÇÃO, Relator Júlio Gomes).

4a O AUJ n,° 4/14 e o atual acórdão do STJ, importa articular ambos os dispositivos, para se consagrar uma delimitação concreta e uniforme do que se entende por "consumidor final", não só no âmbito dos presentes autos, como para dar a necessária e imprescindível certeza e segurança jurídica.

5a Releva, ainda, de fulcral importância para tal desiderato que fique bem claro o que se entende como consumidor final e, do ponto de vista processual, com é definido o mesmo.

6a Ou seja, e não obstante a existência ou não de factos que assim concretizem tal definição, é poder/dever do julgador determinar tal classificação e que critérios deverão operar, existindo ou não prova e delimitadores da atribuição de tal classificação.

7a E também curial entender, em caso de dúvida, se o sujeito dever-se-á atender como consumidor final ou não e o porquê de tal opção.

8a Assume ainda fulcral importância jurídica e social aferir todas estas questões, não só para situações que no passado se criaram e atualmente se encontram em discussão, como para acautelar futuras situações como apresente e que, infelizmente, não são pouco vulgares no país, apesar da anunciada diminuição do número de insolvências pendentes em Tribunal.

9a Acrescentando, ainda e nos termos da alínea b), n.° 1 do citado preceito legal, esta questão, pelos motivos acima expostos, e que aqui se dão por integralmente reproduzidos suscitam "interesses de particular relevância social", sendo curial fornecer tal segurança e certeza a todos os operadores judiciários e, especialmente, económicos e cidadãos, atendendo aos valores e importância que imóveis, como a situação nos presentes autos, têm para qualquer economia familiar.

10a É também a própria natureza dos bens (e valores dos mesmos) justificativa, per si, do presente recurso, aliás, no seguimento do espírito da própria lei substantiva geral que sempre acautela (e bem) todos os atos de disposição relacionados com bens imóveis - note-se, a mero título de exemplo o regime relativo à alienação de imóveis por um cônjuge casado, mesmo quando é sem bem próprio...

11a Ora, o que o Recorrente fez foi relatar (e ver provada) a mais escrupulosamente possível a realidade fatual existente.

12a E fê-lo, sendo tendo alegado e provado os factos constantes dos artigos 12° a 91° da Impugnação à Lista de Credores reconhecidos e ainda o aditamento ao requerimento de prova através do requerimento datado de 17.10.2016, com a Ref ..., nos termos do qual se peticionou que fossem transmutados para estes autos os meios de prova apresentados no Apenso AB (ação de restituição e separação da massa) através dos requerimentos com as referências ... f06.06.20l6'), … (06.06.2016), ... f01,06.2016) e ... (20.05.2016) tendo sido requerida a dispensa da sua junção em suporte informático dado ao elevado número de folhas, remetendo-se para aquele apenso, por uma questão de economia processual, o que foi deferido pelo Tribunal a quo por despacho datado de 14,07.2016, com a referência ….

13a Nesses requerimentos a prova que foi junta diz respeito ao contrato de arrendamento celebrado entre o Impugnante e o arrendatário, à sua declaração de IRS, aos pagamentos da água, eletricidade e telecomunicações da fraçao em causa, e ainda ao articulado de oposição à Insolvência apresentado pela Insolvente no âmbito do processo n.° 1484/13.2TBVRL que correu termos no Tribunal Judicial de Vila Real, Io Juízo, onde a BB Lda. se opôs à declaração de insolvência e alegou no artigo 35° e 36° que o ora Impugnante AA, estava na posse da fração respetiva, dela usufruindo totalmente e que já havia negociado e acordado com este a outorga da respetiva escritura, o que de facto não se veio a concretizar.

14a Portanto, tendo sido admitida a junção aos presentes autos, da prova documental junta ao apenso AB e tendo ainda sido dispensada a sua junção aos presentes autos por parte do Impugnante atento o princípio de economia processual, deveria o tribunal a quo ter tido em linha de conta tal prova documental, o que não sucedeu.

15a Portanto, contrariamente àquilo que considera o Tribunal a quo, o Impugnante expressou bem nos presentes autos que o imóvel se destinava à sua habitação e que só o arrendou por motivos profissionais, pois teve de ir viver para outra cidade, onde teve de arrendar casa, e por tal facto por forma a obter uma receita para poder pagar a renda da casa onde reside por motivos profissionais é que arrendou o imóvel.

16a Contudo é preciso notar que o imóvel está arrendado há 5 anos, mas o Impugnante já tem a tradição dele desde 2005, porquanto, durante 7 anos, o Impugnante viveu no referido apartamento, como se fosse seu, como de facto é, uma vez que já o pagou na totalidade, como aliás veio o gerente da Insolvente atestar através de declaração por si assinada e junta pelo Impugnante na açao de separação e restituição de bens da massa.

17a Ou seja, o Recorrente enunciou toda a matéria...

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